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Bragantino – O Tubarão do Rio Caeté

Max D'Carmo 16 de fevereiro de 2021
Brasão do Bragantino
Bragantino do Pará. Fonte: Wikipédia

Arrastando o chinelo pela orla de Bragança, olho de longe o mirante do santo preto e sem delongas, puxo um cigarro e penso:

Amassado demais…

Meu semblante, é claro. Reflexo desse mundé de meu deus (e de São benedito). Eita mundão, de pernas reta, sem qualquer suingue ou simpatia. A coisa anda em linhas sérias e a contrapartida é a aglutinação. Gororoba geral. Nosso poder de síntese. Mistura, bebe, junta, espirra, tosse, dança, vive e morre. 

Continuei ciscando até passar pelo Bem querença e subi até o primeiro bar, tinha jogo do bragantino e tava todo mundo com fé no bené, mais do que em vacina. Mina – Benin ou essa maniçoba cultural que dá vida ao imaginário Bragantino. Feira lotada, centro histórico, tudo lotado, camisetas do braga, em todo canto, que povo bom pra torcer pro clube da cidade. Me entusiasmo quando vejo tanta camisa do time em seu próprio torrão. A Bragança que eu vi, é o próprio Tubarão.

As cores do clube, as cores da marujada, tudo se cruza, vermelho, azul e branco. A histórica igreja de São Benedito, erguida por braços de devotos negros, e que em 223 anos festejam e reverenciam sua devoção ao santinho, a devoção ao Bragantino que começa em 1975 e de lá pra cá essas cores se perpetuam entre fé e festa. Janelas abertas pra frente do Rio Caeté, por onde se encanta o querido mascote do clube, me faz refletir sobre um outro sincretismo: futebol x religião. Ou futebol, crença, fé. Esse poder de acreditar e querer acreditar.

O Tubarão por pouco não saboreou as águas salgadas de Ajuruteua e adentra para Série C com grande estilo. Seria momento de festividade entre santos e cores, coisa que não houve. E que sem dúvida o povo Paraense e excepcionalmente, o Bragantino ainda aguarda salivando aquela farofa de arraia.

Haja Xote, mazurca, chorado, retumbão. Creio eu que até Mestre Verequete, já encantado, deve ter ficado chateado com a situação. Mas é assim que acontece, o futebol tem disso. Provemos do sabor, do dissabor, e principalmente, observa o que nos cerca.

Embarcações no Rio Caeté – Bragança – PA
Embarcações no Rio Caeté – Bragança – PA. Foto: Priscilla Olegario.

Essa mescla que carrega o místico tubarão do rio, de um mestre de carimbó que tem no tambor de Mina o nome sincretizado com o co-padroeiro da cidade, e faz do Bragantino um clube especial, desde sua morada, o Estádio Olímpico São Benedito “Diogão”, cores de marujada, a mistura de foguetes que se confundem com o festejo do santinho e com a peteca rolando solta, com sabor de rio e mar, música e esse toque de bola e fé, onde se provoca ardor de sol, sal e doçura

As máscaras no rosto, a condição social, a desordem e a falta de progresso não inibiram o tubarão. Agora uma coisa é certa, pra quem fez promessa, amigo. Essa tem que ser paga. O santo vai só até onde dá, ainda mais nesses tempos de barbárie.

Estádio Olímpico São Benedito (Diogão)
Estádio Olímpico São Benedito (Diogão).

E o santo tentou… Promessa vai, promessa vem. Não foi dessa vez. A dívida com o santinho tem que ser paga mesmo assim.

Fazer o que né? Esse ano é tentar mais uma vez.

E aí de ti que não pague o santo! Te faz de doido que o pau te acha!


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Camaradinho Maxi

Periodista, pesquisador de cultura popular e futebol. Curadoria e escritos no livro: As veias abertas do futebol brasileiro. Idealizador da página O Canhotinho F.C. Músico e criador do selo Mafuá.co e da Agência Xequerê Music.

Como citar

D'CARMO, Max. Bragantino – O Tubarão do Rio Caeté. Ludopédio, São Paulo, v. 140, n. 35, 2021.
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