O torneio olímpico de futebol, passou por momentos distintos ao longo da história. Desde suas primeiras aparições em 1900 e 1904, apenas como um torneio não oficial, até chegar aos XXXI Jogos Olímpicos Rio 2016. Baseado no livro La ráfaga olímpica de Gerardo Bassorelli, o presente texto pretende apresentar um pequeno recorte das duas vitoriosas participações uruguaias nos Jogos de 1924 e 1928.
A seleção masculina de futebol da República Oriental do Uruguai, é uma equipe tradicional no mundo da bola, isto deve se muito aos anos de 1920, início dos anos de 1930. Bicampeões olímpicos e campeões da primeira copa do mundo, além da conquista da copa de 1950 alguns anos depois.
Os Jogos Olímpicos da Era Moderna, foi idealizado pelo Barão de Coubertain, e deram início em 1896 na Grécia. Nessa edição não houve nenhuma partida de futebol, somente em 1900 em Paris começariam as primeiras apresentações da modalidade. Nos Jogos na França e em Saint Louis, EUA em 1904, o torneio de futebol foi extra-oficial, ou seja não houve premiação de medalhas, e as equipes participantes não representavam países, e sim clubes. Em Paris três equipes europeias disputaram o torneio, uma local, uma britânica e uma belga, sedo a vencedora a equipe do Reino Unido. Já nos EUA, também três equipes participaram do torneio, desta vez eram duas locais e uma canadense, que se sagrou campeã.
Somente em 1908 o torneio de futebol passou a ser oficial nas olimpíadas, que foram realizadas em Londres. Contudo o número de participantes ainda era baixo, seis seleções disputaram os Jogos na Inglaterra, quatro anos depois em Estocolmo, 1912, foram onze equipes em busca do ouro na Suécia e em 1920 na cidade belga de Antuérpia, foram quatorze. Até então somente seleções do velho continente haviam disputado o torneio de futebol olímpico. Nas olimpíadas de 1924 em Paris, começariam as primeiras seleções não europeias a participar dos Jogos. EUA, Egito e Uruguai disputaram o torneio de futebol dos VII Jogos Olímpicos, que já contava com vinte e duas seleções.
Antes de chegar a Paris, a seleção uruguaia teve que enfrentar problemas internos para formar uma equipe competitiva para as olimpíadas. Em 1922 deu-se início a uma ruptura no futebol local, de um lado a Federación Uruguaya de Fútbol (FUF), que era liderada pelo Peñarol e do outro lado liderada pelo Nacional, a Asociación Uruguaya de Football (AUF). A AUF contava com o apoio de um importante político, José Batlle y Ordóñez (Don Pepe) foi presidente uruguaio por duas vezes, 1903-1907 e 1911-1915 pelo partido Colorado. E com o dirigente do Club Nacional de Football, Atilio Narancio, que também era vinculado ao partido Colorado e amigo de Don Pepe.
Narancio foi o responsável pela seleção uruguaia no sulamericano de 1923 realizado no Uruguai. Antes do início da competição, ele prometeu aos jogadores que se ganhassem o torneio continental, os levaria para os Jogos de 1924. E assim foi feito, a seleção celeste venceu os três jogos do sulamericano contra Paraguai, Brasil e Argentina. Porém, foi preciso afiliar-se a FIFA para que fosse possível fazer a inscrição para as olimpíadas de 1924. A Liga Uruguaya de Football, órgão anterior a AUF, havia enviado o pedido de filiação a entidade máxima do futebol em 1915, contudo não chegou a concluir o processo por falta de documentação que a FIFA tinha solicitado ao então presidente da Liga, Juan Blengio Rocca. Para concluir a filiação a AUF contava com o apoio do presidente uruguaio José Serrato e com o ministro de relações exteriores, Pedro Manini Ríos.
Manini Ríos era um forte candidato a presidência do país pelo partido Colorado nas eleições de 1926 e seu adversário dentro do partido era justamente o presidente da FUF, entidade rival da AUF dentro do futebol uruguaio, Julio María Sosa. Para que a FUF não pudesse ter chances de filiar-se a FIFA antes da AUF, Manini Ríos contactou rapidamente o diplomata uruguaio na Holanda, Enrique Buero, que tinha boa relação com Jules Rimet, presidente da FIFA e filiação foi concluída antes mesmo da disputa do sulamericano.
Após longa viagem de navio partindo de Montevideo no dia 16 de março de 1924 e chegando em Vigo, na Espanha em 7 de abril daquele ano, o jogadores uruguaios realizaram alguns amistosos antes de chegar na França. A equipe uruguaia era composta somente por jogadores de clubes vinculados a AUF devido a ruptura das entidades no fim do ano de 1922, contudo havia ali um representante do Peñarol, clube ligado a FUF. Ernesto Fígoli, era uma espécie de coringa da seleção e antes da divisão das entidades ele já fazia parte da comissão exercendo múltiplas funções, além de massagista, roupeiro e barbeiro, neste torneio olímpico ainda realizou a função de cozinheiro.
As partidas de futebol dos Jogos de 1924, foram realizadas em sua maioria no estádio olímpico de Colombes, região metropolitana de Paris. Esta foi a última edição dos Jogos Olímpicos que o Barão de Coubertain esteve à frete e por isso foi realizada na França. Outras cidades haviam se candidatado para ser sede dos Jogos, inclusive o Rio de Janeiro, a atual cidade olímpica. Tóquio que viria ser a sede em 1964 e voltará em 2020 e Los Angeles, que foi sede em 1984 e por pouco não sediou os Jogos de 1924, devido ao atraso e não conclusão de um novo estádio olímpico em Paris. O COI acabou permitindo que os Jogos fossem realizados uma vez mais em Colombes, assim como foi em 1900.
Depois de vencer com facilidade pelo placar de 7×0 a Iugoslávia na estreia do torneio, a seleção uruguaia venceu os também estreantes EUA pelo placar de 3×0 e seguiram para as quartas de final para jogar contra os donos da casa. No dia 1 junho de 1924, os uruguaios derrotaram a França por 5×1. Na semifinais venceram os holandeses por 2×1, chegando a final em sua primeira participação. A disputa do ouro foi no dia 9 de Junho às 16h30 horário francês com um público de 40.522 pessoas. Com gols de Pedro Petrone, Pedro Cea e Ángel Romano, a seleção celeste venceu a Suíça por 3×0 sagrando-se campeã olímpica pela primeira vez.
O ano de 1925 foi a ano da reconciliação do futebol uruguaio. O presidente José Serrato que já havia se manifestado anteriormente a favor da unificação entre as entidades dissidentes, foi quem conseguiu chegar a um acordo entre a AUF e a FUF. Devido a isso, neste ano a seleção uruguaia não participou do sulamericano realizado na Argentina e os campeonatos locais foram interrompidos. No ano seguinte, 1926 o campeonato uruguaio foi realizado com todos os times em um só torneio e ao passar dos anos foram sendo ajustados os clubes que desciam e subiam das duas divisões que foram reformuladas. Ainda no final do ano de 1926 e já unificada seleção uruguaia tornaria a disputar o sulamericano e seria campeã no torneio realizado no Chile.
Na preparação para os Jogos Olímpicos de Amsterdã em 1928, os uruguaios disputaram o sulamaricano no Peru no fim do ano de 1927 e ficaram em segundo lugar atrás da Argentina que também embarcou para a Europa em 1928 para disputa do torneio olímpico de futebol. Os Jogos de 1928 foram os primeiros jogos em que a pira olímpica permaneceu acessa durante toda a disputa do torneio, a tocha foi colocada em uma torre construída em uma das laterais da arquibancada do estádio olímpico de Amsterdã. Dois anos depois com o termino da obra do estádio Centenário em Montevidéu, os uruguaios copiaram a torre de Amsterdã em homenagem ao bi campeonato olímpico.
Como o número de participantes do torneio de futebol em Amsterdã era ímpar, houve uma preliminar entre duas equipes estreantes em olimpíadas. Portugal venceu o Chile por 5×2 e passou para a fase seguinte. Já a seleção uruguaia estreou no torneio no dia 30 de junho vencendo os anfitriões por 2×0 e avançando as quartas de final contra a Alemanha. No dia 3 de julho pelo placar de 4×1 os uruguaios venceram mais uma seleção europeia e enfrentaria a Itália nas semi-finais. Vencendo os italianos por 3×2 a final seria contra os vizinhos argentinos no dia 10 de junho.
Estreantes em olimpíadas, os argentinos realizaram o mesmo feito uruguaio de quatro anos antes, chegar a final em sua primeira participação. As duas equipes se conheciam bem, se enfrentavam algumas vezes por ano e a última partida no sulamericano de 1927 foi vencida pelos albicelestes. Em Amsterdã a partida terminou em 1×1 e depois de 30 minutos de prorrogação sem gols o jogo foi remarcado para o dia 13 de junho. Com um publico de 28.113 pessoas no estádio olímpico de Amesterdam, os uruguaios venceram por 2×1 com gols de Roberto Figueroa e Héctor Scarone e se tornaram bicampeões olímpicos de futebol. Dois anos mais tarde confirmariam a supremacia no primeiro mundial de futebol e se consagrariam para sempre na história do desporto como a CELESTE OLÍMPICA!