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Democratização: mais “governança” no futebol brasileiro (Parte II)

Daniel Vinicius Ferreira 2 de setembro de 2021

Blatter e a “chuva de dinheiro”. O “Fifagate” é citado frequentemente como o maior caso de corrupção do futebol e considerado um marco de inflexão para melhor “governança” do desporto.    

O avanço da “governança” no esporte em geral

Na esfera esportiva global, a inserção (e adaptação) de paradigmas de “governança” (vindos no “Mundo Corporativo”) é um movimento recente e ainda em construção (das duas últimas décadas, sobretudo da última), que pode ser entendido como um processo mais amplo por busca de melhor funcionamento/regulação. Refletem uma percepção disseminada (já há algum tempo) sobre a necessidade de maior fiscalização e controle do desporto, pelo seu impacto/interesse social, político, ambiental e econômico. O futebol (por exemplo), como fenômeno social, é um universo intrinsecamente ligado ao político, mas notabilizado (muitas vezes e historicamente) por estabelecer relações escusas com ele. Também, por inúmeros casos de ilícitos (como doping, assédio moral/sexual, tráfico de pessoas, venda de resultados, favorecimentos diversos, lavagem de dinheiro), notáveis escândalos de corrupção, má gestão de recursos, além da sua desconexão com a dimensão e responsabilidade sociais, de onde se funda.

Segundo Barros (2020), seria (sobretudo) por um ambiente pouco transparente e de recorrentes casos de denúncias graves que uma maior regulação começou a ser demandada, e estabelecida, também na esfera do desporto, em geral (semelhante ao que acontecera no mundo empresarial). Movimento que vem sendo reforçado em parte, também, por indução de alguns agentes da própria esfera empresarial, estímulo que se dá na dinâmica e crescimento de relações entre esses dois espaços, com a mercantilização e globalização do desporto, e a consagração de determinados padrões para a integração.

O estabelecimento dessa regulação tem se dado tanto na esfera de Governos (como, por exemplo, o reconhecimento da União Européia do interesse social que tem o esporte[1]) como na esfera de grupos de interesse da sociedade civil (através de jornalismo especializado, organizações que formulam relatórios, rankings de boas práticas, etc.), além do próprio universo empresarial (como já ressaltado).

Apesar de um movimento ainda em construção, no esporte em geral, há iniciativas e práticas regulatórias partindo de governos e/ou sociedade civil já pronunciadas em alguns países como: dentro da União Europeia, nos países nórdicos, Reino Unido, Alemanha, Dinamarca, Austrália, Canadá e Estados Unidos, por exemplo (BARROS, 2020; HAAS, 2020)[2]. Instituições centrais como “FIFA”, “COI” e “UEFA”, clubes, e outras federações tem também incorporado (em maior ou menor grau) princípios da “governança” e de “sustentabilidade”[3].

Alguns clubes tem adotado a “sustentabilidade” como elemento de diferenciação e posicionamento de marketing, como do “Real Bétis Balompié”, que promove a plataforma “Forever Green” (ver vídeo acima). Além deste, se notabilizam (por essa abordagem)  o “VfL Wolfsburg”, “Bayer 04 Leverkusen”, “Juventus FC”, “Arsenal FC” e de forma bem destacada o “Forest Green Rovers”, denominado recentemente pela “FIFA” como “o clube mais verde do mundo”.

Nos clubes de futebol europeu, vale fazer menção aos grupos de torcedores ativistas (sobretudo ingleses) que recentemente foram “percebidos” como “partes interessadas” importantes para gerência dos clubes[4] (historicamente já reconhecidos pelo próprio governo britânico e pela UEFA), tal como o modelo associativo alemão notabilizado tradicionalmente por uma massiva participação dos sócios na vida dos clubes, tendo estes maior consistência financeira, quando comparados às outras grandes ligas europeias (FERREIRA, 2019). Ainda, destaca-se o crescimento de organizações torcedoras para representação em nível nacional/supranacional, como a “FASFE”, “SD Europe”, “Supporters In Campo”, “Fans Europe” (FSE), “The Fans Supporters Association” (“The FSA”), “Supporters Direct”, entre outras. Embora mereçam uma análise mais ampla, essas iniciativas torcedoras sintonizam com o conceitual de “governança”, pois se pautam em configurações de representatividade (“partes interessadas”) exigindo o atendimento de interesses coletivos os quais os clubes representam socialmente, tal como o resguardo das “tradições locais” envolvidas ao “clubismo”.

Melhor regulação do futebol brasileiro: lenta e muito protagonizada pela dimensão econômica

Adentrando a esfera do futebol brasileiro, nas últimas décadas, um cenário de melhor regulação parece ter emergido fomentado bastante pelo combate à corrupção (contexto de 2 CPIs do futebol, 2000/Câmara e 2015/Senado), mas muito também para tornar os clubes mais profissionais e com melhor “saúde financeira”, tendo o atendimento à dimensão social e política nem sempre um lugar de destaque. Somada a esta limitação (e provavelmente também por isso), pode-se dizer que ainda é um processo (apesar dos avanços) que caminha com lentidão.

Nessa perspectiva, em termos normativos, pode-se apontar que um futebol um pouco melhor regulado vem se estabelecendo a partir “Lei Pelé” (1998/2000)[5] e o “Estatuto do Torcedor” (2003). Com a “lei do PROFUT” (2015), se fortaleceriam princípios e práticas de responsabilidade fiscal, financeira, além de alguns impositivos normativos para gestão mais democráticas e transparentes, para as entidades esportivas[6]. Ainda, desde 2017, surgiram novas exigências da CBF para licenciamento dos clubes, com padrões mínimos de funcionamento (obrigatoriedade de estruturas, departamentos e profissionais). A própria CBF passaria a adotar um modelo de “governança” também desde 2015.

Para além do aspecto normativo, das análises financeiras dos clubes (promovidas por jornalistas, especialistas e consultorias), vale destacar a ascensão de instituições formativas/acadêmicas (como a “Universidade do Futebol”, ou o “Ludopédio”), além de propostas – tão pioneiras quanto necessárias – como o “Observatório do Racismo” e o canal “Na Bancada”.

Na esfera torcedora, vale menção às iniciativas de grupos como o Renova Galo (Atlético), Democracia Celeste (Cruzeiro), o Povo do Clube (Internacional), o Bahia é de Todos e Todas (Bahia), Frente Vitória Popular (Vitória), Flamengo da Gente (Flamengo), Nosso Avaí (Avaí), Ocupa Palestra (Palmeiras), Democracia Santacruzense (Santa Cruz) entre outros.

Na esfera dos negócios, houve também um movimento de algumas empresas, que passaram a exigir dos clubes o atendimento a critérios objetivos de “governança” para receber investimento, como por exemplo o chamado “pool” “Pacto pelo esporte”: um conjunto de 25 empresas investidoras que se comprometeram a investir apenas em entidades desportivas que cumprirem critérios objetivos de “Governança”, “Transparência” e “Integridade” (MONFARDINI, 2020).

De forma geral, este “avanço” regulatório na configuração do futebol brasileiro precisa, porém, ser visto com cuidado. Não se trata, simplesmente, de um processo linear e evolutivo, envolvendo atores (por vezes) com propostas conflitantes e prioridades diferentes.

Clubes brasileiros: como democracias frágeis promovem falta de “governança”

Uma revisão na literatura acadêmica, consulta em fontes diversas, somada a uma análise geral nos sites e redes sociais dos clubes participantes das séries A e B do Campeonato Brasileiro (2021), nos permite avaliar um pouco em que medida eles se aproximam do conceitual da “governança”, sobretudo na perspectiva da “democracia”.

Em geral, em termos de “transparência” (até por força da “Lei Pelé”) a avaliação é que houve algum avanço, mas mais no aspecto contábil[7] e documental (como a publicação de estatutos e atas de reuniões; alguns clubes têm promovido até portais/abas de transparência nos seus sites). Em termos de “responsabilidade social”, encontrou-se algumas promoções de projetos sociais/ambientais e preocupação com temas de inclusão. Nos últimos anos, também em datas celebrativas (por exemplo), publicações sobre equidade de gênero, combate ao racismo, à homofobia e transfobia (e até a defesa da democracia) se tornaram mais frequentes em redes sociais de parte dos grandes clubes. Foi também comum encontrar canais de “Ouvidoria” e “Denúncia” (que sugerem pelo menos a existência de programas de “compliance”).

Bahia
Foto: Fotos Públicas

Sobre “prestação de contas”, aproximamos esta análise pensando na questão da “democracia” cuja avaliação geral, ainda, é de uma grande carência. Neste caso, fazemos uma retrospectiva histórica e melhor caracterização, a seguir (e como aquela carência afeta o estabelecimento da “governança”, como um todo).

No futebol brasileiro, a grande maioria dos clubes profissionais se caracteriza como associativo[8]. O modelo associativo brasileiro (como em outras partes do mundo) surgiu com os primeiros clubes, entre fins do XIX e inícios do XX, tendo-se inspirado e construído a partir de princípios clássicos da democracia como o direito da “livre associação”, eleições periódicas (“democracia representativa”), a “separação de poderes” (representados por “Conselhos “Executivo , “Fiscal , “Deliberativo , etc), entre outros. A forma como este modelo associativo funciona, em geral entretanto, se caracterizou pela desconexão histórica com seus princípios democráticos estruturais e sua dimensão social, com pouca pluralidade, participação e representatividade da comunidade do clube nas esferas de poder.

O que se destaca é que prevaleceram (em geral) nos clubes de massa brasileiros um perfil “aristocrático” além da concentração e o exercício centralizado do poder (em termos de cultura institucional). Em geral, estas instituições seriam historicamente muito fechadas, permanecendo bem demarcadas em termos de classe, gênero e etnia (por exemplo), com pouca abertura no quadro dos seus “conselhos”, prevalecendo aí homens brancos de classe média/alta. Estes “conselhos” seriam notabilizados historicamente, também, pelo trânsito persistente e continuidade de círculos restritos de indivíduos e grupos (com pouca alternância e vagarosa renovação social, mesmo com eleições). Também, (muitas vezes) por colégios eleitorais reduzidos, reflexo de seus quadros associativos diminutos e (em geral) pouco acessíveis, demarcadas nas suas esferas de poder pela hegemonia de figuras das elites econômicas locais (MONFARDINI, 2020; SANTOS & SANTOS, 2018), por vezes com ligações ou mesmo com carreira na esfera política tradicional, dos partidos à gestão pública.

Eleições em alguns clubes (2020/2021)

Ano das Eleições

Clube

Votaram

Tipo

2020

Atlético

189

indireta

2020

Bahia

11930

direta

2020

Botafogo

825

direta

2020

Corinthians

2873

direta

2020

Coritiba

3570

direta

2020

Cruzeiro

205

indireta

2020

Goiás

157

indireta

2020

Internacional

29041

direta

2020

São Paulo

251

indireta

2020

Santos

8154

direta

2021

Sport

2359(1a) / 1304 (2a)**

direta

2020

Vasco da Gama

3054

direta

*Aproximadamente; **O Sport Club Recife teve duas eleições em 2021

Fonte: diversas, elaboração do autor (2021).

O exercício do voto (nos casos acima, para escolha do presidente) pode servir como um referencial indicativo de como ainda são restritos os quadros sociais dos clubes, no Brasil. Na lista acima, com exceção de Bahia e Internacional, a maioria entre as 12 agremiações (de torcidas que se medem em milhões), não tiveram mais do que 5 mil votantes (em cinco delas, não chegaram a mil). Isto se agrava pelo fato de que “votar diretamente para presidente”, mesmo sendo possível em determinados clubes para o sócios, não significa necessariamente ampla participação destes na vida política dos clubes, pois os círculos dos conselhos costumam ser ainda mais restritos e fechados.

Como característica comum, os referidos quadros sociais restritos seriam as bases das chamadas “alas políticas”: blocos fragmentados, mais ou menos permanentes de coletivos de indivíduos, sedimentados no entorno de algumas lideranças em núcleos com forte envolvimento pessoal/afetivo, lutando pelo poder dentro do clube. Esta disputa, por vezes, seria descrita como um “jogo” autofágico no cerne da entidade, que dividiria e atrapalharia aquilo que deveria ser o interesse e atenção principal e comum destes quadros sociais empoderados: o desenvolvimento e aperfeiçoamento da gestão da entidade financeiramente/desportivamente. Por isso, uma dada leitura frequentemente argumenta ser a “política”, o mal dos clubes[9].

Os clubes se caracterizariam ao longo do tempo, ainda, em maior ou menor grau pela incorporação de um corpo de profissionais. No Brasil, o profissionalismo consolidou-se mais firmemente no departamento de futebol dos clubes (a profissionalização de jogadores de futebol foi normatizada na década de 1930), e este regime se expandiu em maior ou menor grau para outras áreas (como no direito, finanças, marketing, etc.), de acordo com o clube. Em regra geral, pareceu desenvolver e estabelecer-se um modelo híbrido, associando dirigentes voluntários (por vezes acusados “amadores” e “políticos”), com alguns profissionais, mas (muitas vezes) em uma confusa combinação em termos gerenciais e separação de papéis.

Finalmente, no plano da “cultura organizacional” prevaleceu e exacerbou-se o protagonismo do “conselho executivo” (ou mesmo do presidente do administrativo) sobre os outros “conselhos”[10], ou em uma espécie de cooptação/acordo destes (possivelmente porque a estrutura esportiva brasileira herda também uma construção em bases autoritárias, uma legislação da década de 1930, contexto do Estado Novo), em ambientes (em geral) ainda de parca fiscalização e controle, pautados no trabalho voluntário, supostamente abnegado e desinteressado.

Há, assim, um histórico e situação comum de pouca democracia geral nos clubes, em que estão apartados os principais “grupos de interesse” de participação mínima. Isto se associa a poucos mecanismos de controles efetivos, onde a “prestação de contas” é frágil e se faz a um número restrito de indivíduos (o que contribui na resolução amistosa das cobranças ou até em conchavos entre alguns), facilitando a manutenção de modelos/decisões gerenciais confusos, obsoletos, instáveis, baseados na pessoalidade, nas disputas internas por poder e no conflito de interesses. Eles acabam travando a ascensão de projetos gerenciais consistentes e duradouros, que possam ser controlados, monitorados e aperfeiçoados. Contribuem para consagrar “dirigentes” operando no imediatismo, geralmente muito mais preocupados com a imagem pública (por vezes até com interesses escusos e autopromoção política). Este modelo, seria, por isso tudo também frequentemente responsabilizado pela crise[11] esportiva, econômica e gerencial que acometeu o futebol brasileiro nas últimas décadas. Crise caracterizada pelo endividamento geral das agremiações (chegando a níveis inadministráveis), baixas receitas, amadorismo administrativo, alto custo administrativo/operacional.

Pior, esta ausência de controles efetivos (que poderiam ser suportados na participação de coletivos mais amplos, mais difíceis portanto de cooptar), tendem a favorecer também práticas que atingem a barreira da legalidade: casos de doping de jogadores, manipulação de resultados, lavagem de dinheiro (estimulada pela quantidade de dinheiro e operações realizadas nas agremiações), envolvimento em negócios obscuros e com parceiros de má reputação, corrupção e atividades ilícitas (em vários níveis, e diversas formas), assédio moral/sexual, racismo, homofobia (MONFARDINI, 2020).

Nessa perspectiva, a percepção é de que uma melhor “governança” (entendida como um modelo sistêmico) dos clubes brasileiros avançaria muito através de um processo amplo de “democratização” dessas organizações. Isto ajudaria reforçar os outros pilares, empurraria essas entidades para processos gerenciais mais consistentes e mais afinados aos principais valores e objetivos da instituição, dos seus coletivos e da sociedade. Além de melhor expostos a uma regulação social mais contundente e efetiva (em termos de finanças, profissionalismo e condutas).

______

Por hoje ficamos por aqui. Voltaremos com a Parte III desta discussão, onde apresentaremos possibilidades para “democratização” dos clubes, um diagnóstico de resistências a esse processo (em um clube), fechando a discussão com algumas considerações finais. Um grande abraço e até lá!

Notas

[1]Desde a Declaração de Nice em 2000 (e depois com o “Livro Branco” do esporte, em 2007) a União Europeia emite normativas e fomenta projetos para seguir este princípio.

[2] No plano internacional, vale menção ao “Play the Game”, grupo dinamarquês que desde 1997 vem promovendo ações no sentido de estimular um desporto mais ético. Desde 2015 o “Play the Game” organiza o “National Sports Governance Observer”, um projeto internacional que conta com outros parceiros e financiamento da própria União Européia, e que busca mensurar a qualidade da governança nas entidades esportivas ao redor do globo de forma comparativa, com a elaboração de um sofisticado instrumento. No Brasil, destaca-se a “Sou do Esporte”, organização existente desde 2015, voltada a analisar (também com uma ferramenta de avaliação) e fomentar a “governança” nas entidades olímpicas, através inclusive de um prêmio anual.

[3]Além das tradicionais análises financeiras, tem se disseminado na Europa e mundo, vários relatórios e organizações promovendo e avaliando o compromisso dos clubes com a “sustentabilidade”/”ESG”. Entre eles, pode-se citar: “Sports for Climate Change”(ONU), “Sustainable Sports/DEKRA”, “Life Tackle”, “Sustainability Report”, “Match for green”, “The Football Climate”, “T20 Italy”, “Healthy Stadia”, “Basis The Sport Ecology Group”, “Sport Positive”, “Sport and Sustainability International”, “Sustainability & Sport”, “Eco Athletes”, “Green Sports Hub Europe”, “Playgreen Sports”, “Phase 3 Sports Sustainability”, entre outros. Em 2012 a ISO emitiu uma padronização para o atendimento à sustentabilidade em eventos. Este tema tem sido incorporado (também) pelas principais ligas europeias e norte-americanas, e atletas diversos.

[4]Nos referimos aos recentes episódios da tentativa malsucedida de formar uma Superliga na Europa (ESL), que repercutiu em protestos intensos de grupos torcedores ingleses, e alguma aproximação com esses grupos buscada pelos proprietários, como do Liverpool FC ou do Chelsea FC.

[5]A “Lei Pelé” já destacava alguns princípios democráticos para os clubes receberem aportes públicos, bem como passou a obrigar a publicação de balanços financeiros anuais.

[6]Como a exigência de mandatos administrativos de no máximo 4 anos, e a restrição de uma reeleição, preconizando a alternância de poder, tratando ainda mais objetivamente de casos de gestão temerária nos clubes Vale também destacar que houve mudanças recentes no estatuto do COB, e a própria criação do APFUT, órgão destinado a aplicar punições aos clubes que não cumpram o referido PROFUT.

[7]Aqui nos baseamos na avaliação do jornalista Rodrigo Capelo (2021), por ocasião da publicação da 2a edição de um ranking nacional sobre “transparência” dos 60 clubes das séries A, B e C. A leitura é de que houve um avanço, pois muitos destes clubes passaram a publicar (nos últimos anos) os balanços, informações contábeis e outros documentos importantes em seus sites. A análise, entretanto, aponta que a qualidade e frequência desses informativos podem melhorar, além (é claro) da necessidade de muitos clubes começarem a publicar, pois no ano de 2021, 38 haviam publicados, destes nem todos dentro do prazo legal. 

[8]Desde as Leis “Zico” (1993) e “Pelé” (1998/00) existe a possibilidade dos clubes transformarem-se em formatos empresariais, embora poucos tenham adotado esse modelo. Vale destacar que a Constituição brasileira (1988) não permite leis que obriguem os clubes a deixar o formato associativo.

[9]Há já uma literatura considerável sobre gestão de clubes, no Brasil, em que este argumento é recorrente. É preciso tomar um certo cuidado, entretanto, em reduzir essas disputas apenas como um “egoísta desejo pelo poder e pelas suas benesses” entre os envolvidos, apartados totalmente de ideais sobre o coletivo e a instituição. Ademais, este seria um conceito muito reduzido de “política”, que se ancora, geralmente, em uma dicotomia simplória na qual o “mercado”/empresa seriam o contraponto: o “reino das virtudes”, da “técnica” universal, desprovido de “política” e interesses escusos, portanto a solução.

[10]Não se afasta também de que o fato da participação muitas vezes inexpressiva de vários membros do “conselhos deliberativo” (por exemplo), se dê por falta de compromisso em estudar os temas de discussão, e até mesmo em ir às reuniões e/ou participar de grupos de trabalho, figurando  a cadeira mais como objeto de “status”, ou outro tipo de benefício, e/ou mero instrumento para apoio de uma “ala política”.

[11]O conceito de crise do futebol brasileiro foi muito debatido por Ronaldo Helal e Marcelo Proni (HELAL, 1997; PRONI,2000).

Referências

Blog do Rodrigo Capelo

Canal Na bancada

Sites de clubes da série A e B (2021)

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Daniel Vinicius Ferreira

Doutor em História pela Universidade Federal do Paraná e Universitat Autònoma de Barcelona (doutorado sanduíche). Estuda a questão das identidades, pertencimentos e a globalização do futebol.

Como citar

FERREIRA, Daniel Vinicius. Democratização: mais “governança” no futebol brasileiro (Parte II). Ludopédio, São Paulo, v. 147, n. 2, 2021.
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