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Deus fez o Flamengo (um mundo à parte) em 8 ou 9 dias

Fabio Zoboli, Elder Silva Correia 13 de outubro de 2021

O livro bíblico de “Gênesis” apresenta a narrativa mítica da criação do mundo pelas mãos de Deus. A fábula cristã nos conta os trabalhos de Deus para fazer o mundo em sete dias. O que pouca gente sabe é que, para fazer o Flamengo, Deus demorou um pouco mais: foram necessários oito ou nove dias. E você leitor(a) deve estar se perguntando, mas o Flamengo já não faz parte do mundo?

A resposta é: Em partes!

Vamos a explicação do litigioso mistério:

Primeiro, faz-se necessário compreender que Deus fez o Flamengo muito antes do mundo existir. O Flamengo foi criado por Deus à sua imagem e semelhança, mas, antes de “tomar forma” (no planeta Terra, em 1895), ele vagava imaterialmente pelo cosmos, assim como outras entidades divinatórias. Ou seja, no princípio, o Flamengo era uma força majestosa imaterial, que peregrinava no além-mundo. Por isso, faz-se imperativo se ter essa ideia de que desde os primórdios o Flamengo é “um mundo à parte” e, por este motivo, o Flamengo precisa ser acessado. Novamente o(a) leitor(a) mais atento(a) dever estar se indagando, mas de que forma se acessa esse lugar?

A resposta é: Para acessar o Flamengo você precisa ser uma espécie de “avatar”!

“Avatar” é um termo proveniente da religião hindu e tem a ver com a manifestação corporal de um ser imortal. “Avatara” significa descida, a encarnação de um Deus, uma imortalidade que toma forma via corpo. Deste modo, o corpo de um(a) flamenguista é um corpo-matéria “animado” por uma entidade maior (imaterial) chamada Flamengo. Ser Flamengo é então “en-carnar” uma entidade maior, acessar um mundo à parte.

Torcida do Flamengo
Mosaico da Torcida do Flamengo. Foto: Pedro Martins/MoWA Press.

Bem, mas o objetivo desta crônica é dissertar como Deus deu forma material ao Flamengo, ou dito de outro modo, de como Deus trouxe o Flamengo à dimensão terrena. Vamos, portanto, aos fatos dessa criação.

– É sabido que Deus já tinha feito a Terra, o ar, a água… a água salgada, o mar. Depois Ele fez o Rio de Janeiro, para daí colocar no mar um barco, dois remos e um remador. Pronto, neste dia foi criado o “Clube de Regatas do Flamengo” – 17 de novembro de 1895.

– Mas o Flamengo ainda não tinha futebol e, por isso, no segundo dia Ele fez o Fluminense. Nascemos do Fluminense, pois Deus precisava se manifestar no humano, “o verbo precisava se fazer carne e habitar entre nós”. Em 1912, de uma briga interna no clube das Laranjeiras, um grupo de jogadores se tornaram avatares de uma divindade maior e, assim, o Flamengo passou a jogar futebol.

– No terceiro dia Deus pegou um pouco de magia e misturou com duas cores já existentes: o vermelho e o preto. Esse dia marcou o antes e o depois dessas duas cores. Nesse instante, pela benevolência do universo, também nasceram duas expressões: “rubro-negro” e “bem-aventurados”.

– No quarto dia, então sob os sortilégios do vermelho e do preto, Ele cria a torcida do Flamengo. Em tal dia os anjos acharam que Deus estava fazendo uma “companheira” para Si. Por fazer nascer a torcida do Flamengo, Deus é conhecido até hoje como “o todo-poderoso”.

– No quinto dia Deus, vendo que os rubro-negros cresciam e se multiplicavam de modo demasiado rápido, pensou em fazer um espaço digno do tamanho dessa nação emergente. Dessa forma, Ele fez o Maracanã. Uma espécie de templo, um altar onde seus súditos travariam cerimoniais dignos de sua santidade. Você deve estar pensando, mas o Maracanã não é do Flamengo? Exatamente – é a resposta! Foi com o Maracanã que surgiu a famosa expressão: “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e sereis salvo”. Pronto! É só entrar no Maraca e dizer a palavra “Mengo” e ele já é nosso. Pode dizer quantas vezes você conseguir, pode gritar, cantar… Pode fazer tremer, se quiser.

– No sexto dia Deus fez os avatares superiores: os jogadores do Flamengo. A cada novo jogo do Flamengo, no vestiário se dará a consagração. No momento em que cada jogador coloca sua camisa ocorre a deportação da condição humana à condição de avatares de um divino. Dentro das quatro linhas estes jogadores são, a cada partida, ritualisticamente comungados pelos demais avatares: a torcida, onipotente e onipresente. Do céu, com sua coroa, o urubu-rei guiará a todos. E está feita a “Santíssima Trindade” – jogadores/torcida/urubu.

– No sétimo dia Deus inventou os campeonatos e os adversários. Afinal, eles são as provações de onde os avatares flamenguistas (maiores e menores) professam sua fé. Não só diante de vitórias, mas também frente às derrotas, ritualiza-se o “ser Flamengo”. Os adversários são centrais para esse processo de ascensão, pois é através deles que é escrita a história sagrada dessa entidade maior.

– No oitavo dia Deus viu que tudo era muito bom. Se você for pegar o currículo de Deus vai ver que o Flamengo está lá como uma de suas mais importantes e belas obras. Até hoje, de tempos em tempos, estarrecido do alto dos céus, Ele assiste os jogos do Mengão.

– Não se sabe ao certo se o Corinthians foi uma criação que Deus fez à parte, ou se o Corinthians é parte da construção mítico divinatória do Flamengo, a exemplo do Fluminense. No entanto, o que se sabe é que num dia (não sabemos se no nono ou em algum outro) Deus fez o Corinthians para, em 2020, empatar com o Inter e fazer o Flamengo ficar campeão, mesmo perdendo. Isso é que é feito!

Depois de ter feito o Flamengo Deus foi elevado a OUTRO PATAMAR!!!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Fabio Zoboli

Professor do Departamento de Educação Física da Universidade Federal de Sergipe - UFS. Membro do Grupo de pesquisa "Corpo e política".

Elder Silva Correia

Mestre em Educação Física pela Universidade Federal do Espírito Santo - UFES. Membro do Grupo de pesquisa "Corpo e Política" da Universidade Federal de Sergipe - UFS.

Como citar

ZOBOLI, Fabio; CORREIA, Elder Silva. Deus fez o Flamengo (um mundo à parte) em 8 ou 9 dias. Ludopédio, São Paulo, v. 148, n. 22, 2021.
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