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Dieu est mort: Diego Armando Maradona

Claudinei Reis Pereira 16 de abril de 2021

Diego Armando Maradona, ídolo, craque, mágico, gênio, adorável, entretanto, como diria Fernando Signorini: “ele era um tremendo filho da puta”. “Maradona era um gênio do futebol que se tornara uma estrela da televisão argentina: la noche del 10 De zurda. Mas, como todo gênio era sem freio às vezes”. Para os amantes do futebol, um gigante, único e inesquecível, para outros não passava de um derrotado e um viciado, um agressor de suas mulheres, um homem que fora morrendo aos poucos, mas para muitos sua reverência permanecerá de maneira singular.

Todavia, podemos dizer Maradona “fez bem em usar drogas”, pois, do contrário, não chegaria aonde chegou. Na verdade, o “profissional e gênio da bola” eram uma só pessoa dentro e fora de campo.  

Mesmo assim, Maradona tinha “carta” branca por onde passava. Em uma de suas passagens pela cidade de Moscou teve acesso livre na famosa praça vermelha [karasnaya]. No “Ano da Glória” (copa de 1986) contra a Inglaterra, no memorável episódio que ficou conhecido como “La Mano de Diós“, entre os conflitos históricos e políticos que rondavam aquele período, Deus, ao que parece, “tocou” a mão de Maradona e lhe rendera um título, para a alegria dos argentinos. Em Nápoles, cidade italiana do clube em que fez história, deu aos napolitanos os títulos inéditos da série A e Copa da Itália (1984 – 1991). 

Não era para menos: após a vitória e título da Copa de 1986, ao retornar a cidade de Napoli, os cartórios estavam uma loucura: dezenas de recém-nascidos receberam o nome de Diego Armando. Em Nápoles Maradona era “Deus”, milagroso mais que San Gennaro, padroeiro e protetor da cidade. Na cidade, Maradona “disputa espaços entre os ícones religiosos”. O altar no bar Nilo presta sua devoção ao ídolo argentino.

Maradona
Foto: Reprodução Twitter.

Para muitos, assim como eu, não houve a chance de ver o craque argentino em campo ao vivo, todavia, o sentimento de comoção assola não só os argentinos, mas todas as gerações. Aliás, a notícia inesperada de sua morte, no dia 25 de novembro de 2020, atinge a todos de uma maneira singular, para os críticos e não críticos. É como o sentimento que nos aproxima do dia 25 de dezembro, em que até os nãos cristãos se veem tocados pelo sentimento de solidão da festa natalina. De fato, não é hora de palavras, mas de silêncio. Parece que a profecia do filósofo Friedrich Nietzsche se cumprira nos clamores argentinos: “Dieu est mort”. A liturgia entre o sagrado e o profano se materializa na iglesia maradoniana, em que o Clube Official SSC Napoli se reverencia em lacrime:

“tutti si aspettano le nostre parole. Ma quali parole possiamo usare per un dolore come quello che stiamo vivendo? Ora è il momento delle lacrime. Poi sarà il momento delle parole”.

A pergunta que fica é: o que faz alguém tão contraditório e ao mesmo tempo genial ser aclamado e adorado pela nação? A pergunta é tão enigmática quanto sua possível resposta. Mas não são tempos de razão, é o momento do coração. 

 O ídolo do Palestra Itália e dos campos de La Coruña, Djalminha afirmara: “sem palavras para descrever o que foi você para o futebol, acho que o futebol não perder um de seus deuses, acho que ele vai se acabando sem você”. Seus fãs na Cidade de Napoli em uma só voz, clamam, homenageiam, reverenciam, poetizam talvez aquele que o futebol nunca mais trará de volta: “Diego, il tocco di una danza. I palleggi, che delizia. Napoli orgogliosa e sempre più innamorata”[Diego, o toque de uma dança. Os dribles, que delícia. Nápoles orgulhosa e cada vez mais apaixonada”].  

Talvez as palavras de Joza Novalis, um dos maiores especialistas do futebol da América Latina, foram a melhor descrição para mágico Diego Armando Maradona: “estamos muito poucos preparados para falar o que é ou discutir o foi Maradona”.  

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Claudinei Pereira

Doutorando em Filosofia pela Universidade Federal do Espírito Santo  - UFES

Como citar

PEREIRA, Claudinei Reis. Dieu est mort: Diego Armando Maradona. Ludopédio, São Paulo, v. 142, n. 32, 2021.
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