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Do arroz de polvo à empanada

Pedro Zan 7 de março de 2023

No último domingo (5), estive em Itu para acompanhar o jogo decisivo da última rodada do Paulistão entre os donos da casa e o Santos. Para ambos, valia a vaga na próxima fase e, para o Galo, também a fuga do rebaixamento para a Série A2. 

Não ia a um jogo do Peixe no estádio há muito tempo – e que falta fazia. Convenci seu Zan a colocar até uma camisa do time, coisa que jamais fez, nem para assistir pela TV, nem para ir à arquibancada. Nos deslocamos de Campinas até a “cidade onde tudo é grande” com confiança.

Ao chegar em Itu, a ideia, claro, era almoçar no famoso Bar do Alemão. Mas que ilusão. Como entrar no mais famoso restaurante da cidade em um domingo com jogo no Novelli Júnior? Tivemos que nos resignar a um restaurante espanhol, no mesmo quarteirão, que parecia oferecer uma boa comida.

Nas sugestões, um arroz de polvo que logo agradou a ambos, em especial a seu Zan, que come cada vez menos carne vermelha. Pedimos e esperamos.

“2 a 1 hoje”, disse meu pai.

Seria perfeito, mas também era preciso ficar de olho no jogo do São Paulo em Ribeirão, pois a classificação dependia de uma combinação de resultados com o jogo do Botafogo. Mas a esperança existia, coisa que o Santos não teve nos últimos dois anos de Campeonato Paulista.

Conversa vai, conversa vem, mas o que não vinha era o prato. Ao questionarmos a atendente sobre a situação do nosso almoço, a resposta desanimou: por conta da alta procura naquele dia e a ausência de funcionários na cozinha, a demora seria grande. Tão grande, que seria impossível chegar no jogo a tempo.

Tivemos que nos resignar a comer empanadas, que já estavam prontas e sairiam mais rápido. Por conta do atraso, conseguimos chegar nos arredores do Novelli Júnior apenas na hora do apito inicial. Cerca de dez minutos de bola rolando depois, apenas, que passamos pela catraca. Seria um sinal do que viria?

E foi. Na verdade, o que veio foi pior, mas muito pior. 

Estádio Novelli Junior
Estádio Novelli Junior. Fonte: Wikipédia

Pouco depois de nos acomodarmos na arquibancada destinada para a torcida visitante, veio o gol do Ituano, com uma facilidade e uma liberdade invejáveis. Ainda antes do intervalo, saiu o segundo, em mais uma falha bizonha do sistema defensivo santista.

No intervalo, os comentários eram uníssonos: o time é muito ruim. Mas, vamos apoiar, é o que restou. Acho que o santista nunca cantou tanto o famoso canto de que o Santos é o time da virada quanto neste Paulistão. Para piorar, o São Paulo, naquele momento, ainda perdia para o Botafogo, o que destruia qualquer chance de classificação. Nem a virada seria mais suficiente.

A segunda etapa reservou mais do mesmo: nenhuma chance clara de gol para o Santos, enquanto o Ituano chegava com muita facilidade na frente da meta defendida por João Paulo. Tanta facilidade que não demorou muito para que viesse a pá de cal: Ituano 3, Santos 0.

O Tricolor ainda fez a “sua parte” e venceu a Pantera de virada no Santa Cruz, de modo que o Santos precisava apenas de um empate. Mas isso não aconteceria nem se o jogo perdurasse até a segunda feira. O que o torcedor santista viu em Itu nesta ensolarada e quente tarde de domingo foi digno de pena.

É impressionante como, ao final de mais uma campanha vexatória no Campeonato Paulista, não existe absolutamente nada de positivo para se tirar do Alvinegro da Vila.

O ataque é inoperante, especialmente sem Marcos Leonardo e Ângelo. O meio de campo é inexistente – não tem Lucas Lima que resolva. E, no aspecto defensivo, cede loteamentos inteiros no setor para o adversário. Mas o pior, disparado, é a defesa. 

É simplesmente muito, mas muito fácil marcar contra o time do Santos. Toda bola levantada na área é uma chance clara de gol (nos três clássicos neste ano, o time levou incríveis SEIS gols de bolas alçadas na área). Qualquer equipe minimamente preparada, que é capaz de trocar três passes em sequência, consegue, por baixo, ficar cara a cara com o pobre João Paulo, de longe o jogador do elenco que mais sente o momento do clube. Hoje, o Ituano, uma das piores defesas do campeonato e, até então, integrante da zona de rebaixamento do campeonato, parecia um time profissional contra um catado de jogadores amadores que vestiam a camisa que uma vez foi de Pelé.

Não existe padrão de jogo nenhum: a estratégia do Santos é trocar passes nada produtivos, que culminam em lançamentos longos vindo da zaga, em especial de Maicon, e que terminam, invariavelmente, no pé do adversário, seja de maneira imediata ou, o que mais chama a atenção, nas famosas “segundas bolas”.

Parece-me que o maior problema do time do Santos hoje é esse: sua falta de combatividade. É um time que não disputa. Todas as bolas espirradas, todos os rebotes, todas as divididas terminavam, hoje, nos pés de um jogador de vermelho e preto. E isso desde 2021. É um time incapaz de competir no mais alto nível e isso leva a três anos de vergonha atrás de vergonha.

O problema é o técnico? Difícil saber. Odair claramente ainda não conseguiu dar uma cara ao time. Nada do seu trabalho até agora pode ser aproveitado para o restante da temporada. Mas, até aí, não é isso que se vê no Santos com todos os técnicos que passaram pelo clube desde que Rueda assumiu?

Santos
Foto: Ivan Storti/Santos FC/Fotos Públicas

Claramente o problema é bem mais embaixo. O elenco é fraquíssimo, tecnicamente, fisicamente e, mais importante, psicologicamente. É um conjunto de jogadores que não brigam em campo e parecem não se importar com as derrotas que se empilham. Não parece haver indignação ou revolta, da maioria dos jogadores do Santos atual. Como já disse Mano Brown: falta alma.

Ao final do jogo, na saída do estádio, encontrei pessoalmente pela primeira vez um colega de um grupo de WhatsApp para discutir sobre futebol. Em nossa conversa, ele disse que precisa de mais uns quatro ou cinco reforços. E é verdade. Com esse elenco atual, o rebaixamento no Brasileirão é mais que uma possibilidade, é quase uma certeza. Mas o sentimento é até pior: será que os que virão vão resolver?

Já entramos em março e a sensação é de que o Santos está no começo da temporada, iniciando um trabalho completamente do zero. É terra completamente arrasada. E, para piorar, a temporada de 2024 já está comprometida com a provável ausência do Santos na próxima Copa do Brasil por conta dos novos critérios para a classificação, que acabaram com as vagas pelo ranking da CBF. 

A questão que fica é: onde estão Rueda e o diretor-fantasma Falcão? Contratações virão? Há um novo nome para o comando? Qual o plano para, mais uma vez, tentar salvar o Santos e evitar o maior desastre de sua história? Como sempre, calados.

Assim como a expectativa de um arroz com polvo terminou com a realidade de empanadas requentadas, a esperança de uma classificação para as quartas do Paulistão e de, talvez, um verdadeiro início de temporada do Santos acabou com um passeio do Ituano, mais uma eliminação no Estadual e a perda de uma vaga em Copa do Brasil. 

O time do Santos é muito ruim. E ao vivo é ainda pior.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Pedro Zan

Quase formado em Filosofia na Unicamp, mas bom mesmo é falar de futebol. Santista desde sempre, também tenho um podcast, "Os Acréscimos", e sou um dos administradores da página "Antigas Fotos do Futebol Brasileiro".

Como citar

ZAN, Pedro. Do arroz de polvo à empanada. Ludopédio, São Paulo, v. 165, n. 7, 2023.
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