163.14

Enquanto Lionel Messi chorou de emoção, o futebol mundial sorriu

A Copa do Mundo do Catar terminou consagrando em uma épica final um dos maiores jogadores de todos os tempos, Lionel Messi. O tricampeonato mundial  argentino conquistado após uma boa campanha marcada por fortes emoções acabou coroando o cerebral atleta que já tinha recebido todos os títulos possíveis na sua brilhante carreira futebolística.

A odisseia do herói argentino desde sua primeira participação no longínquo torneio disputado na Alemanha em 2006  passou por diversas provações e dúvidas até a celebrada conquista do último dia 18 de dezembro. Gols, decepções, a frustração de ser derrotado em uma final no Maracanã, a idade chegando, muito suor, sangue e finalmente lágrimas de um campeão mundial. O choro e a intensa comoção de um atleta que sempre se caracterizou pela frieza representaram simbolicamente a conclusão da trajetória de um herói esportivo que para muitos críticos tinha apenas uma face mas que revelou durante esse torneio ter talvez mais que as mil apontadas na clássica obra de Joseph Campbell.

Sobre a questão da idolatria esportiva rapidamente veículos da imprensa e as novas mídias passaram a propagar o eternamente estúpido debate comparativo entre grandes craques do futebol Messi x Maradona x Pelé x Mbappé, provavelmente seu sucessor nos próximos anos como a maior estrela internacional do futebol. Os memorialistas e estatísticos que amam se debruçar nessas comparações não percebem o quanto elas são anacrônicas, insolúveis e robotizadas. Muitas vezes o ser humano é esquecido com todas as suas complexidades e idiossincrasias e quando os grandes craques não conquistam um torneio mundial os “especialistas” tendem a diminuir a importância de suas incríveis carreiras como foi por exemplo com Zico, Sócrates, Platini, Cruyf, Di Stéfano e tantos outros.

L´Équipe
Capa L´Équipe/Reprodução.

Felizmente para Messi, a Argentina e o futebol aquela defesa incrível do goleiro Emiliano Martinez no último minuto da prorrogação estabeleceu na minha opinião algo justo no mundo futebolístico que frequentemente é marcado por profundas injustiças. Tudo bem que segundo o filósofo alemão Immanuel Kant a ideia de justiça não passa necessariamente pela razão, mas sim pela emoção, pelos sentidos. Sentimos o que é justo ou injusto assim como sentimos o que é bonito ou feio, certo ou errado.

Mesmo os que torceram contra a Argentina, e aqui no Brasil foram muitos em função principalmente do acirramento recente das rivalidades futebolísticas entre brasileiros e argentinos, e também de alguns argumentos generalistas e profundamente marcados por estereótipos culturais e políticos extremamente equivocados tendem a concordar que o atleta Lionel Messi merecia ser campeão mundial.

Messi Copa 2022
Messi. Foto: Alvaro do Cabo.

Acredito que futuramente o enquadramento de Memória sobre essa Copa para os argentinos, mas também para grande parte dos apaixonados por essa tradição inventada chamada de Copa do Mundo de futebol, independentemente das boas atuações dos atacantes Di Maria e Juan Álvarez, das defesas de Martinez, da marcação incansável do De Paul e da ótima participação do novato técnico Scalone, também Lionel, estará centrada na figura eterna de Messi.

Enquanto a primeira conquista argentina, apesar da boa equipe que jogava coletivamente com destaques como Mario Kempes, Ardiles, Passarela, Tarantini, Filol, ficou maculada pela conjuntura histórica da ditadura do “Processo” e as polêmicas durante a realização do evento no país, o título de 1986 e agora a redenção do futebol argentino e também sul-americano que não vencia uma Copa desde 2002 com o Brasil, ficarão marcados na memória coletiva argentina pelas trajetórias marcantes desses geniais jogadores de futebol.

E nesse caso, na minha opinião ambos já estavam e permanecerão eternamente no panteão dos deuses do futebol, sendo  igualmente geniais, memoráveis e pelo bem da bola também campeões do mundo de seleções.

Maradona e Messi
Reprodução.

Artigo publicado originalmente em História(s) do Sport.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
Seja um dos 14 apoiadores do Ludopédio e faça parte desse time! APOIAR AGORA

Como citar

CABO, Alvaro Vicente Graça Truppel Pereira do. Enquanto Lionel Messi chorou de emoção, o futebol mundial sorriu. Ludopédio, São Paulo, v. 163, n. 14, 2023.
Leia também:
  • 178.18

    Hinchas, política y 24M: la Coordinadora de Derechos Humanos del fútbol argentino, emblema de trabajo colectivo

    Verónica Moreira
  • 178.12

    Jogo 2: Estreia da Arena na Libertadores

    Gustavo Cerqueira Guimarães
  • 176.10

    Forte Apache: cinema da conquista, militares brasileiros – mas também Carlitos Tevez

    Alexandre Fernandez Vaz