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Entre razões e emoções a saída é planejar, mas como definir o sucesso?

Eduardo Fantato 5 de agosto de 2011

Em 2007, o torcedor de futebol apaixonado, seja corintiano ou não, deve relembrar o final da partida entre Grêmio e Corinthians no estádio Olímpico. Digo isso porque o jogo marcou o rebaixamento da equipe paulista para a série B do futebol Brasileiro. Marcante para os torcedores que “sofreram” o baque do rebaixamento…marcante para os rivais que “curtiram”esse momento.

Mas considero marcante, ou pelo menos assim deveria ser do ponto de vista do planejamento de futebol, sob a perspectiva da montagem de elenco e do trabalho contínuo de um técnico no comando da mesma equipe. Isso porque nesse jogo estava o personagem que dá indícios de um caminho que pode ser promissor (espero que não seja utópico) para o futebol profissional nacional. Tal personagem é Mano Menezes.

Sei que utilizá-lo como foco de um texto neste momento, com a recente eliminação brasileira na Copa América, pode revoltar tantos apaixonados pelo futebol. Para estes, peço esculpas pelos sentimentos despertados, mas alerto que neste momento trago um olhar pautado no profissionalismo, ainda que não possamos descartar nossas emoções, mas que sejamos racionais o máximo possível que o futebol permita.

Mano Menezes é o personagem que naquele jogo estava no comando do Grêmio e que depois dessa partida assumiria justamente a equipe a qual ele acabara de ver rebaixada frente a seus comandados. Era seu último jogo como treinador gremista antes de assumir o Corinthians.

Bom, com todas as emoções que o episódio e o personagem possam despertar no amigo leitor, vamos aos fatos.

Mano Menezes, técnico da seleção brasileira. Foto: Márcia Feitosa/VIPCOMM.

Vivemos a discussão do profissionalismo no futebol nacional, e temos que tomar cuidado com uma dicotomia marcante. De um lado, os que acreditam fielmente que esse é o caminho para o futebol, já que cada vez mais é um negócio e como tal necessita de processos racionais para obter sucesso. Por outro lado temos os críticos desse processo e defensores do romantismo, da paixão e significados culturais que o futebol possui. Tanto um como outro devem considerar a outra parte, já que os extremos não são condizentes com uma administração necessária ao futebol. Sim, o futebol é um negócio, e como tal seus resultados ainda que possam aparecer financeiramente é bem mais potencializado quando vem junto ao resultado de jogo, isto é, junto a conquistas e vitórias.

Como complemento, não adianta apenas usar os processos gerenciais de grandes multinacionais e trazê-las ao futebol, haja visto que as emoções sempre existentes no mercado como um todo, porém, fazem parte de forma incisiva e marcante no ambiente esportivo , seja para o torcedor, para o diretor do clube, jogadores, enfim todas as partes envolvidas.

O técnico no futebol brasileiro tem vida curta e isso acabou se tornando normal e justificável para muitos dos envolvidos. Nesse ponto o trabalho de nosso personagem começa a encaixar com o tema que será discutido.

Mano Menezes assumiu o Grêmio em 2005 e ficou até o fim de 2007, levou a equipe Gaúcha de volta a Série A, foi bicampeão gaúcho e levou a equipe a uma final de Libertadores. Saiu para assumir o Corinthians, de 2008 a 2010, de onde só saiu para assumir a seleção brasileira, conquistando pela equipe paulista o acesso a série A, um estadual de forma invicta, uma Copa do Brasil (além de um vice no ano anterior), tendo feito a melhor campanha na primeira fase da Libertadores, embora eliminada na seqüência.

Sua ida para seleção foi tumultuada pela negativa de Muricy Ramalho, porém ambos eram os nomes da vez para tal cargo.

Muricy Ramalho quando ainda era técnico do São Paulo. Foto: Gaspar Nobrega/VIPCOMM.

Trouxe esse exemplo, pois já discuti em outros momentos e textos a importância do planejamento, seja do treinador, seja da diretoria para o futebol brasileiro. Poderíamos citar ainda o Adilson Batista no Cruzeiro de 2008 a 2010, clube pelo qual disputou 3 libertadores chegando a se tornar o brasileiro com mais vitórias pela competição, ainda que seus outros trabalhos não tenham surtido tanto efeito ainda.

Amigo deve estar se perguntando onde quero chegar com esse relato. Pois bem, é no planejamento de uma equipe que está a chave para o sucesso. E esse termo: sucesso, é o que complica muitas vezes o que se entende por planejamento. Pode soar contraditório, mas sucesso não pode ser medido apenas com títulos. O torcedor fanático nesse momento vai me vaiar assim como Mano Menezes foi vaiado por diversas vezes no Grêmio e no Corinthians, onde hoje são unanimidades, assim como as vaias pela eliminação na Copa América atinge o treinador.

Porém, aí que entra a serenidade de um gestor profissional, seja ele dirigente (em extinção no futebol brasileiro) seja ele enquanto treinador (que também precisa ser um gestor em seu cotidiano).

O futebol moderno é extremamente competitivo, diria que é impossível um time ser imbatível e conquistar tudo à todo momento. Exemplo do atual Barcelona, uma das equipes que está mais perto disso, porém, não ganha tudo à todo momento, nos últimos 3 anos ganhou duas Champions League, porém foi eliminado numa semifinal entre as duas conquistas. Nem por isso troca-se o técnico, coisa normal no Brasil, haja visto o exemplo de Celso Roth no Internacional de Porto Alegre, campeão em 2010 da Libertadores, demitido em 2011 ainda na disputa da competição.

Um exemplo de causar inveja, ainda que pesem as diferenças culturais, é do técnico do Manchester United, Sir Alex Ferguson, há 25 anos no clube inglês, que logo após a derrota na final frente ao Barcelona na última Champions League foi a público dizer que foi justa e que o Barcelona é o melhor time que ele enfrentou em toda sua vida. Não me surpreenderia se fosse no Brasil, culparmos o árbitro, o gramado, a sorte, o cabelo do atleta, etc.

Alex Ferguson, técnico do Manchester United. Foto: Austin Osuide (disponível na Wikipédia – Creative Commons).

O sucesso do Manchester está intimamente ligado ao processo e planejamento e não só baseado em títulos. Os resultados nem sempre vieram em todas as temporadas – houve momentos de transição, que seriam aquelas de montagem e ajuste de elenco, e os dirigentes souberam entender, assim como o técnico que com certeza traçou os limites que seriam alcançados compatíveis com o momento.

Se Ferguson prometesse títulos da Champions toda temporada, com certeza não estaríamos falando de seu longo período. Resultado em alto nível depende de inúmeros fatores, sabemos disso, não pretendo entrar nessa questão, porém sabemos que um dos fatores que fogem ao controle direto de uma equipe diz respeito ao desempenho do adversário. Podemos estudar, mapear, analisar, mas jamais controlar – ao menos diretamente – o desempenho do adversário.

É justamente nesse ponto que nos referimos à coerência. Ao ter noção disso, um técnico deve ter claro para si que chegar em semifinais ou finais de competições de um nível de Champions League ou de Libertadores, representa uma conquista de resultado significativa, pois você se coloca ali com outras três potências em busca do resultado máximo. Mas a falha nesse objetivo não representa que não se está num nível de excelência.

É esse olhar que precisamos aprender a ter. Olhar o resultado como algo coerente com as situações das competições e ainda atrelá-lo ao momento da equipe. Se a equipe está em formação, por exemplo, uma derrota em uma fase quarta-de-final pode ser aceitável e não o fim do mundo. Por outro lado, se a equipe está num ponto maduro e perde numa final, também não pode significar esse tal fim de mundo que justificaria o tão em moda choque de gestão, que no Brasil é trocar técnico.

Nesses 25 anos à frente do clube inglês, Ferguson ganhou “apenas” duas Champions Leagues. Imagina aqui no Brasil, a cada queda numa Libertadores…

Em nosso país, temos técnicos bicampeões do principal torneio continental sul-americano, como Felipão (Grêmio e Palmeiras), Paulo Autuori (Cruzeiro e São Paulo) e apenas Lula (Santos) e Telê Santana (São Paulo) com dois títulos pelo mesmo clube.

Se Mano Menezes ganhar a Copa de 2014, o planejamento terá vencido. Se Mano perder na final, tudo esteve sempre tão errado e começou com o desempenho pífio na Copa América. Será que é assim que devem pensar futebol os que o dirigem?

Imaginem se Uruguaios, desfizessem todo o trabalho pelo quarto lugar na Copa América de 2007, a mesma posição na Copa de 2010, e que culminou no título da Copa América de 2011.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Eduardo Fantato

Mestre em Educação Física pela Universidade Estadual de Campinas.

Como citar

FANTATO, Eduardo. Entre razões e emoções a saída é planejar, mas como definir o sucesso?. Ludopédio, São Paulo, v. 26, n. 2, 2011.
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