92.25

Faça as contas, sou de humanas

Leandro Marçal 28 de fevereiro de 2017

Desde pequeno tenho dificuldade com os números. Foi um professor do Senai, o mestre Orsatti, quem ensinou uma forma mais simples de pensar o mundo das exatas – uso a regra de três até na hora de comprar pão na padaria e sou feliz assim, sem prejuízo.

Talvez ele pudesse me ajudar a entender as contas dos títulos dos times brasileiros, já que fica difícil entender qual campeonato é o que vale quando torcedores fanáticos e clubistas gritam penta, octa, bi, enea ou qualquer palavra que mais lembre as aulas de geometria no ensino fundamental.

Cresci ouvindo meu pai e os programas esportivos apontarem o Atlético Mineiro como o primeiro a vencer o Campeonato Brasileiro, em 1971. Em 2002, as ruas da Baixada Santista foram tomadas pelos alvinegros comemorando seu primeiro título – antes que me xinguem, era isso mesmo que as pessoas de todas as idades diziam com lágrimas nos olhos.

Quando a CBF unificou os títulos antes de 1971 e TUDO virou Brasileirão, as aulas do professor Orsatti foram irrelevantes na hora de contar quantos nacionais cada time havia ganho. Houve quem fosse contra, outros celebraram.

Minha mente bugou e passei a não entender mais nada.

Palmeiras Campeão Brasileiro de 2016 - Ricardo Stuckert/CBF
Jogadores do Palmeiras comemoram o título de Campeão Brasileiro de 2016. Foto: Ricardo Stuckert/CBF.

Se é óbvio que em um país que não respeita seu passado devemos sempre reverenciar e reconhecer os grandes campeões de outrora, fica difícil entender a seriedade de quem não reconhecia, passou a reconhecer e depois jogou tudo num mesmo liquidificador. Todo mundo é campeão e eu não entendo mais nada.

Quando o clubismo toma conta, eles dizem “vá reclamar com a CBF”, como se isso garantisse um mínimo de seriedade a esporte amado e surrado – bastar procurar quantos formatos o nacional já teve e reservar sua vaga no manicômio.

Não duvide se daqui a alguns anos a falecida Copa dos Campeões também entre na conta ou uma Sulamericana tenha o mesmo peso da Libertadores, essa várzea continental com grife.

Já desisti e entender a cabeça do torcedor e dos cartolas por aqui.

Afinal, de um modo geral vale para o sujeito se o seu time for um dos beneficiados, o que me leva a crer que uma boa (no sentido de quantidade, não de qualidade) parte dos que discordam da unificação assim o fazem porque seu clube não ganhou nenhuma estrela a mais na camisa.

No mais, deixo as contas para quem tem intimidade com elas. Sou de humanas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Leandro Marçal Pereira

Escritor, careca e ansioso. Olha o futebol de fora das quadras e campos. Autor de dois livros: De Letra - O Futebol é só um Detalhe, crônicas com o esporte como pano de fundo publicado (Selo drible de letra); No caminho do nada, um romance sobre a busca de identidade (Kazuá). Dono do blog Tirei da Gaveta.

Como citar

MARçAL, Leandro. Faça as contas, sou de humanas. Ludopédio, São Paulo, v. 92, n. 25, 2017.
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