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Jornalismo, torcidas e ”Futebol Moderno”

José Luiz Noleto 9 de novembro de 2016

“O futebol não precisa das organizadas, não precisa da festa delas. Ele precisa de torcedor comum, neutro em estádio.”

Assim um dos mais famosos comentaristas do futebol brasileiro, Marco Antônio Rodrigues rebateu Caio Ribeiro quando o mesmo falava da parte “boa” das organizadas, no programa bem-amigos do Sportv daquela segunda-feira.

Caio alegava que conhece de perto torcedores organizados e sabe da presença de bons cidadãos nesse meio, apesar da violência e criminalidade que lá existem. Ele representava pelo menos de forma justa a classe do trabalhador que acorda cedo, do bom cidadão que tem seus direitos e cumpre seus deveres.

Marco Antônio, sempre carrasco e conhecido por seus exageros, acusações e perguntas delicadas. Outra passada, por exemplo, em pleno sucesso da seleção, acusa Tite de nepotismo por ter seu filho como auxiliar técnico. Sem coerência com os fatos e compromisso ético ele “deu as caras” mais uma vez naquela noite de segunda-feira.

Fez uma série de elogios a PM do Rio: Segundo o mesmo ela estava “melhorando”, se aperfeiçoando e o futebol carioca vivia mais em paz com a mesma. A mesma PM que não conseguiu apartar uma confusão dentro do estádio, a que usou do autoritarismo, prendeu e humilhou cidadãos inocentes dentro estádio e a que não foi capaz de respeitar os direitos humanos apesar de que houvesse sim pessoas com más intenções ali. E pior, como foi dito no começo, ele julga e generaliza todas as torcidas organizadas do país como um “câncer”. Ele julga o pai de família, o trabalhador, a esposa e o cidadão honesto sim, que existem nessas organizações. E fala sem nenhum compromisso com os fatos e o contexto ético. Uma generalização sem senso crítico. Lamento muito. Apenas lamento.

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Torcedores do Corinthians são forçados a tirar a camisa em pleno Maracanã. Foto: reprodução.

Porém a discussão sobre Marco Antônio e seu discurso vai mais longe. O discurso do jornalista (e também de boa parte da ”grande mídia”) evidencia mais ainda a crescente opressora e irracional corrente do nosso futebol. O tal, o famoso e conhecido ”Futebol Moderno”. Queridinho das elites, das arenas superfaturadas, dos presidentes fascinados em dinheiro, dos ingressos caros e dos carrascos do STJD e outros órgãos disciplinares que mais exageram do que formulam ideias e ações efetivas para o cenário da violência em nosso futebol. O futebol moderno opressor, selvagem, que não abre os olhos pro verdadeiro torcedor, pra geral, pras festas da arquibancada. Futebol moderno que ignora o senso crítico e social.

E ele cresce em disparada. Tomado e organizado por superiores ele toma conta dos estádios e afasta a essência deste fantástico esporte. Os  discursos de Marco Antônio só o faz se fortalecer e proliferar de forma absurda.

Vamos falar sobre ele.

O tema da parada é sinalizador em estádio de futebol.

não portar ou utilizar fogos de artifício ou quaisquer outros engenhos pirotécnicos ou produtores de efeitos análogos; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).” Isso é o que diz o estatuto do torcedor.

E perguntamos: quantos incidentes perigosos tivemos com sinalizadores em nossos estádios, quantas pessoas se machucaram, quantas entidades sofreram com isso? É de total relevância que seja mostrado a falta de coerência desse estatuto que não foi capaz de se basear em dados estatísticos para formular um estádio mais seguro para seu público-alvo. O torcedor, principalmente o organizado, que pelo menos não para e segue resistindo, mas contra a lei. E assim prejudicando seu time, enquanto criminoso de rua, o assaltante de estádio, o baderneiro e o quebrador de cadeiras segue impune e a festa nas arquibancadas se precariza.

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Torcida do São Paulo utiliza sinalizadores no clássico contra o Corinthians. Foto: Fábio Soares/Futebol de Campo.

Outro tema é as punições às organizadas. Geralmente quando a organizada de seu time briga, infringe alguma norma ou outra coisa do tipo ela pega punições como a não uniformização, a proibição de ir aos jogos, entre outras. E quem vai a estádio sabe o quão irrelevante isso é, pois o baderneiro continua indo aos estádios e promovendo o terror e afastamento daqueles que querem paz.

Portanto, fica mais evidente ainda o despreparo dos órgão responsáveis em nosso futebol. Eles vivem a ficção, o imaginário de como se combate a violência em estádios. Não há pesquisa, busca, aprofundamento e diálogo com o assunto. Há superiores que muitas vezes nunca foram ao estádio e acabam prejudicando só o torcedor de bem e a festa nas arquibancadas.

Temas como esse só mostram como passamos por um crise de identidade em nossos estádios e uma democratização ruim que não deveria acontecer.

O mais engraçado é que, justamente na Europa, onde todos são conhecidos por bons modos é onde há diálogo e resistência a esses abusos e a esta falta de coerência

A resistência tem que partir da ruas, dos times, das diretorias, do povo e daqueles que querem o futebol puro de volta. Puro, bonito e NA PAZ!

VIVA AS ARQUIBANCADAS!

 http://canelada.com.br/caneladas-sortidas/os-sinalizadores-e-o-futebol/
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José Luiz Noleto

18 anos, doente pelo Fortaleza Esporte Clube, estudante de Direito e viciado em futebol. Seja em qual for o âmbito.

Como citar

NOLETO, José Luiz. Jornalismo, torcidas e ”Futebol Moderno”. Ludopédio, São Paulo, v. 89, n. 4, 2016.
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