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As mudanças da FIFA para suas competições internacionais

Guilherme Eler 20 de maio de 2018

A Copa do Mundo de futebol da Rússia, que será realizada entre junho e julho de 2018, deve ser a penúltima edição do evento a adotar o modelo atual de 32 seleções. Já para a Copa de 2026, ainda sem sede definida, a Fifa (Federação Internacional de Futebol) pretende organizar o torneio para 48 países. A expansão foi aprovada em janeiro de 2017, mesmo com forte oposição de seleções europeias.

De acordo com a entidade, o objetivo é criar um mundial “mais inclusivo”, em que o maior número de vagas estimule o desenvolvimento do esporte em locais onde não é tão tradicional. Em abril de 2018, o presidente da Fifa, Gianni Infantino, chegou a externar o desejo de que o modelo com 48 seleções fosse implementado já para a Copa de 2022, no Catar. A questão deve ser discutida no 68º Congresso Anual da Fifa, que acontecerá às vésperas da Copa, em 12 e 13 de junho, na cidade russa de Moscou.

A discussão sobre a mudança de formato do principal torneio de futebol do mundo faz parte de um importante pacote de propostas que vêm sendo levantadas pela Fifa nos últimos meses. Além de uma Copa com mais equipes, a entidade planeja, também, expandir o atual modelo do Mundial de Clubes e criar uma Liga de Nações, que daria acesso a uma espécie de “Mini Copa do Mundo” e seria disputada a cada dois anos.

Sorteio dos grupos da Copa do Mundo de 2018. Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti
Sorteio dos grupos da Copa do Mundo de 2018. Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti.

Super Mundial de clubes

Diferentemente do atual formato, a nova competição interclubes aconteceria a cada 4 anos. O projeto é contar com a presença de 24 equipes, dos cinco continentes, que jogariam 31 partidas em 18 dias de torneio. Metade das vagas seriam ocupadas por times europeus – a princípio, os finalistas das últimas quatro edições da Liga dos Campeões teriam lugar garantido.

Os 24 clubes seriam divididos em oito grupos, com três equipes cada. Após jogarem entre si, apenas um de cada chave avança para, daí em diante, disputar confrontos “mata-mata”. O atual Mundial de Clubes conta com apenas sete equipes. Além dos campeões continentais de cada uma das seis federações, AFC (Ásia), CAF (África), Concacaf (América do Norte, Central e Caribe), Conmebol (América do Sul), OFC (Oceania) e UEFA (Europa), junta-se ao grupo, também, uma equipe representante do país-sede – no caso, o último vencedor do campeonato nacional.

Caso seja aprovado, o novo formato deve passar a valer em junho de 2021. 75% dos US$ 3 bilhões orçados para cada edição do torneio devem ser destinados ao caixa dos clubes. De acordo com o jornal The New York Times, China e Arábia Saudita já se mostraram interessados em sediar o evento.

Sorteio dos grupos da Copa do Mundo de 2018. Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti
Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti.

Liga de Nações

A nova competição é uma tentativa da Fifa de organizar melhor o calendário das seleções ao redor do mundo. Ela teria a participação dos 211 países federados, em confrontos que aconteceriam nas chamadas “datas Fifa”, dias comumente utilizados para amistosos internacionais. Em cada continente, as seleções seriam distribuídas por divisões, de acordo com sua posição no ranking da Fifa. Dentro das divisões, as equipes são separadas novamente em grupos. Os vencedores de cada grupo se classificam para um torneio mata-mata. Esse torneio, chamado “Final 8” e apelidado “Mini Copa do Mundo”, seria disputado em anos ímpares a partir de 2021, sempre entre os meses de outubro e/ou novembro.

Se confirmados, a Liga das Nações e o “Final 8” acontecerão paralelamente aos torneios internacionais de seleções que já existem, como a Copa América, Eurocopa ou Copa Africana de Nações, além das eliminatórias para a Copa do Mundo. A tendência é que o novo torneio substitua a atual Copa das Confederações, evento-teste que a Fifa realiza um ano antes e que conta com oito seleções – sete campeões continentais, mais o país sede. Discute-se que um modelo semelhante, com 16 seleções, seja adotado também para o futebol feminino.

O que motiva as mudanças

Os dois projetos de novos campeonatos foram apresentados  ao público em 9 de abril de 2018, com a divulgação de uma proposta de investimento recebida pela Fifa. Um grupo de investidores chineses, japoneses e sauditas, encabeçado pelo banco japonês Softbank, estaria disposto a investir US$ 25 bilhões (R$ 88 bilhões) para adquirir 49% dos direitos das duas competições. A ideia é que o dinheiro seja utilizado ao longo de 12 anos.

Conforme apurou o New York Times, a oferta é bem superior ao valor que a Fifa esperava. No atual ciclo de Copa do Mundo, entre 2015 e 2018, os gastos totais da entidade foram de US$ 1,8 bilhão. A proposta foi apresentada por Gianni Infantino às federações durante a última reunião do Conselho da Fifa, realizada em março de 2018, na Colômbia. Segundo o presidente, o grupo de investidores exigiu um prazo de 60 dias para que a proposta inicial fosse aceita. Por conta da falta de detalhamento do projeto, a proposta foi negada no Conselho.

Em uma nota enviada aos líderes das federações internacionais a que a rede BBC teve acesso, a Fifa defende as mudanças, argumentando que elas “estreitariam a relação entre fãs e o futebol a nível mundial”. “Isso claramente não está acontecendo no formato atual mundial de Clubes da Fifa e da Copa das Confederações”, completa o documento.

Sorteio dos grupos da Copa do Mundo de 2018. Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti
Lado a lado. Putin com o presidente da FIFA, Gianni Infantino. Foto: RIA Novosti.

O que pode frustrar esses planos

Para discutir as demandas, a Fifa convocou uma reunião extraordinária com representantes das seis confederações continentais. O encontro aconteceu em Zurique, na Suíça, na última segunda-feira, 30. Enquanto América do Sul e a África são os continentes mais entusiastas, os novos modelos de competição enfrentam forte resistência por parte de seleções da Europa.

Federações nacionais europeias pressionam a Fifa para que se desconsiderem os planos de expansão, e, ao invés disso, foque em garantir menos partidas, maiores intervalos de descanso e calendários de competições mais razoáveis aos clubes. Acredita-se, também, que a criação de um Mundial mais extenso possa prejudicar a Liga dos Campeões , campeonato entre os campeões da Europa e principal competição entre clubes do mundo.

Em nível internacional, a proposta entraria em conflito com as propostas da Uefa e da Concacaf, que já planejaram a implementação de uma Liga própria, disputada entre países do próprio continente. A primeira edição da Liga das Nações da Uefa deve ser disputada em setembro de 2018, e a forma como vai funcionar está descrita neste vídeo. Em comunicado, a Associação das Ligas Europeias declarou na quinta-feira (3) que suas 32 equipes integrantes são “estritamente contrárias” aos mais recentes planos da Fifa.

Cobrando mais transparência e a consulta das partes envolvidas, a organização classificou a medida como “a forma como a velha Fifa agia”, em referência aos recentes escândalos de corrupção que prejudicaram a imagem da entidade. “Nós queremos ver coisas concretas e documentos. Já aprendemos com o passado. Então, isso deve ser feito da maneira correta”, disse Jesper Moller, membro do comitê organizador de competições da Fifa e presidente da Federação Dinamarquesa de Futebol, em entrevista à agência Reuters. Para serem implementadas, as propostas precisam ser aprovadas pelo conselho de 37 membros da Fifa. De acordo com a BBC, uma nova reunião deve ser convocada ainda em maio de 2018.

nexo_jornal_logoEste texto é uma republicação de artigo publicado no site Nexo Jornal.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Guilherme Eler

Estudante de Jornalismo na USP, estagiário do Nexo Jornal e fã de futebol, a maior invenção humana

Como citar

ELER, Guilherme. As mudanças da FIFA para suas competições internacionais. Ludopédio, São Paulo, v. 107, n. 20, 2018.
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