Acordei às 6h para evitar imprevistos. Escovei os dentes e tomei um café da manhã sem exageros. O suficiente para não desmaiar e não ter dor de barriga fora de casa.
Esperei a abertura do portão da escola, observei uma multidão esperando a chance de um emprego estável. Para a vida toda, diziam alguns. Fiquei na segunda fileira, depois da porta de uma sala bem conservada, ainda que houvesse um chiclete na ponta da lousa e o ventilador não funcionasse muito bem, segundo a monitora.
Fiz a prova. Não estava muito fácil, confesso. Mas, os últimos dois meses estudando me deram alguma esperança de uma boa pontuação. Dava para notar uma moça ao meu lado esquerdo balançando a cabeça, em tom de negação. Foi a primeira a levantar. Não parecia ter ido muito bem. Conformada, deve ter ido aproveitar o restante do dia de sol numa praia. Fazia cara de arrependida por acordar cedo em pleno domingo.
Na volta para casa, só queria ter tempo de ver o jogo do meu time na TV. E pensei na entrada em campo com a derrota certa. Não deve haver nada além do lugar-comum na preleção quando todos sabem da inferioridade ante os 11 Golias do outro lado.
Trememos, sentimos medo, somos humanos. Mesmo com um uniforme com cara de capa de super-heróis. Não tem jeito. Saber que as 22 pernas do outro lado do campo têm uma habilidade de tratar a bola muito superior que as do lado de cá deve ser cruel.

Entrar para perder de pouco. Contentar-se com o gol de honra ou uma derrota sem humilhação. Como nos dias em que o interclasses sorteia a 5ªB para enfrentar os marmanjos da oitava série. Eles já são grandes, têm uma estrutura maior que a nossa. Não há o que fazer, senão enfrentar a derrota de frente, com algo semelhante a dignidade estufando o peito. Do jeito que der, sem baixar a cabeça.
É como encarar uma doença incurável. Pisar no gramado sabendo da derrota inevitável tem um gosto amargo que a vida enfia goela abaixo sem avisar. E é isso que faz a doce vitória causar tanto prazer quando bate à porta, de surpresa.
Durante o jogo contra um dos candidatos ao rebaixamento, só conseguia pensar na moça sentada ao meu lado esquerdo, balançando a cabeça, conformada com o destino de uma tentativa em vão. Ainda vamos perder muito, moça.
E eu preferia não ter ciência da impossibilidade dos três pontos. Sofreria menos nos dias em que a zebra pintasse o gramado, como na derrota daquela tarde, nos derrubando na tabela. Mês que vem sai o gabarito da prova.