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Não há protocolo pra quem (ainda) não é presidente?

Marco Lourenço 3 de dezembro de 2018
É questão de tempo para os mais desavisados entenderem que política e futebol são inseparáveis – assim como qualquer outra atividade humana, afinal, a política é a ação de atores sociais com efeitos coletivos tanto na esfera pública (governo) ou na esfera civil.

Sendo assim, qualquer declaração, silêncio, participação, ou ausência de um sujeito que traz impactos coletivos podem ser entendidas como ações políticas. No futebol não é diferente. Quando uma figura política importante se manifesta a respeito de algum assunto ligado ao futebol ele está fazendo política. E vice-versa.

No último fim de semana, o atual presidente eleito foi recebido no gramado do estádio Allianz Parque, casa do atual campeão brasileiro SE Palmeiras. O evento acabou dividindo até mesmo os torcedores palestrinos. *Mamilos*, não é mesmo? Afinal, quais fatos podemos destacar e o que podemos entender com esse episódio e suas repercussões?

1.
Historicamente, presidentes costumam posar com faixas e taças de equipes campeãs, mas geralmente no exercício do seu mandato – o que não foi o caso.

2.
Ao longo da história, chefes do executivo costumam receber equipes campeãs em seu exercício do mandato – não, o contrário.

3.
Ao longo da campanha eleitoral, diversas manifestações de atletas pró-bolsonaro, inclusive do próprio Palmeiras, inauguram um tipo de envolvimento inédito na história recente republicana.

 

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4
O candidato que não compareceu aos debates do segundo turno por alegar não ter condições de saúde para o evento ou temer pela sua segurança, contraditoriamente, esteve presente na partida com mais de 40 mil pessoas e, de quebra, ainda ergueu a taça de mais de 15kg.

5
O mesmo candidato eleito que já chamou imigrantes de escória é recebido com pompas de campeão pelo clube imigrante italiano.

Para além dos dados concretos em torno do evento, o que chama mais atenção é a simbologia / mensagem constituída ali:

I.
Se Jair ainda não é presidente, ele não esteve na partida como representante da república – como um protocolo usual praticado muitas vezes -, mas aproveitou a celebração para potencializar capital político e obter mais algum tipo de legitimidade.

II.
Como não era uma participação formal/oficial, boa parte dos palmeirenses que desaprovaram a presença de Jair não se sentiram representados pelo político, em especial, por erguer a taça ao lado do elenco e dentro do campo.

III.
Entrar em campo e dividir o espaço/visibilidade/prestígio com os atletas também incomodou muitos palestrinos. Muito diferente de receber o elenco em Brasília, como é de praxe, a inversão denota mais interesse do clube em se aproximar politicamente do candidato eleito do que uma mero protocolo.

IV.
Embora não saibamos com certeza quais atletas, diretores ou membros da comissão técnica sejam bolsonaristas, é possível imaginar que outras figuras, além de Fernando Prass, se sentiram constrangidos com a celebração.

 

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V.
São Marcos parece que agora é somente Marcos. Nenhuma unanimidade é imune à política.

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Marco Lourenço

Professor, Mestre em História (USP), Divulgador Científico (Ludopédio) e Produtor de Conteúdo (@gema.io). Desde 2011, um dos editores e criadores de conteúdo do Ludopédio. Atualmente, trabalha na comunicação dos canais digitais, ativando campanhas da Editora Ludopédio e do Ludopédio EDUCA, e produzindo conteúdos para as diferentes plataformas do Ludo.

Como citar

LOURENçO, Marco. Não há protocolo pra quem (ainda) não é presidente?. Ludopédio, São Paulo, v. 114, n. 3, 2018.
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