As minorias estão lutando bravamente. Há, por todos os cantos, batalhas diárias pela preservação dos direitos básicos dos cidadãos, respeito pela diversidade, luta pelo direito de ocupar todos os espaços, contra a violência e extermínio da juventude negra e periférica, contra o feminicídio e tantas outras que se intensificaram no último ano.
Mulheres das arquibancadas de todo o país se reuniram no Museu do Futebol no último dia 10, numa demonstração de força ímpar. Levaram relatos, demandas, proposições, debates, além de lindas fardas e amor pelo clube de coração. Mas, para além dos escudos que separam todas nós, mortais, durante a peleja, o que se viu foi um forte congraçamento em torno de um só objetivo: o respeito e o direito à ocupação dos espaços próprios do futebol.
Nesta sexta, 16, o Museu do Futebol também recebeu o encontro “Esportes nos grupos LGBT – Como tornar o esporte mais inclusivo?”, abrindo mais um espaço para a diversidade/minorias, ou seja, grupos historicamente excluídos também estão se organizando em busca da troca de ideias, abertura para o debate e luta pelo direito à ocupação dos mesmo espaços próprios do futebol.
Hoje, sábado, está rolando os “Jogos da diversidade” no Complexo Esportivo do Ibirapuera, evento organizado pelo CDG Brasil – Comitê Desportivo LGBT e pela APOGLBT – Parada do Orgulho LGBT de São Paulo.
Faço este pequeno apanhado de ações para uma reflexão acerca da participação das atletas do futebol em atividades cujo o foco é o empoderamento e a postulação de direitos.
Dentro de dois dos eventos citados – I Encontro Nacional das Mulheres de Arquibancada e Esportes nos Grupos LGBT – não houve participação das mulheres que jogam futebol em alto rendimento. Quando falo em alto rendimento, falo das atletas, as inseridas em equipes que disputam competições oficiais.
A ausência das atletas em atividades extra campo e mais especificamente em atividades em que os objetivos estão além da própria prática, é sentida e, de minha parte, cobrada quase à exaustão.
Se antes questionava a inércia e a apatia ante os abusos e absurdos que sempre permearam as relações das mulheres com seus clubes, técnicos e demais agentes, o momento crítico de polaridade no país produz não só mais indagações, como também a necessidade de compreender esse descolamento dos movimentos e o ar de “não temos nada com isso” que essa desatenção denota.
Impossível aceitar o argumento de que vivem no limbo da informação. Nas redes sociais bombam eventos, notícias, articulações, engajamento com temas que abordam especificamente o ganha pão – ou o simples direito à prática – desta classe em específico.
Avanço na abordagem. Há a necessidade de confraternizar com movimentos que abraçam o embate de ideias. A luta não pode ficar restrita ao campo e à busca por um resultado, uma classificação, a superação física ou o refinamento das habilidades. Há mobilizações acontecendo no campo futebol, que lidam diretamente com o que é praticado. Isentar-se da participação, delegando à outros grupos a luta que é comum, sem pontuar ou se organizar para que haja ao menos um pequeno grupo representante – logo um exposição mais clara de pretensões, posicionamento e articulação – é, de certo modo, negligenciar o destino da modalidade.
Compreendo os compromissos que a vida de atleta impõe, mas não acredito em falta de tempo para uma organização mais política no sentido de ter voz ativa em um momento em que direitos são retirados e violência contra mulheres e LGBT’s avança em números alarmantes, próprios de um período de polarização em que o diálogo perde para a ignorância e para o isolamento.
A sensação que tenho é a de que os problemas reais, as dificuldades, a alta taxa tributária, os preços alarmantes, o abismo social, os desamparados, parte de nossa classe política corrupta, o negócio futebol enchendo as burras de meia dúzia, não fazem parte do mesmo mundo dos atletas do futebol no geral, lamentavelmente.
Se o futebol nos representa tão profundamente, se ele conversa com tudo que nos cerca, por que raios os protagonistas do jogo se sentem excluídos – ou se excluem – da discussão necessária?
Enquanto isso, as mulheres das arquibancadas bancaram um evento maravilhoso com a presença, inclusive, de mulheres gestoras, organizadoras de eventos, jornalistas, acadêmicas e toda representatividade possível, faltou apenas as jogadoras de futebol, que, antes de jogar, são torcedoras também.
Enquanto isso, grupos LGBTs organizam competições, participam de encontros, debatem e se posicionam.
Onde, nestas duas ocasiões, jogadoras de futebol não se enquadram? Mulheres são protagonistas de muitos feitos ao longo da nossa história, basta uma visita à página “As mina na história”, da querida Bia Varanis, para constatar o tamanho da nossa representatividade.
O momento é urgente. O assunto é de interesse e não se pode esmorecer ou não assumir compromisso. Nesta gangorra que é a vida/o tempo/o espaço, não tem fita dominada. O bagulho tá muito sério e tem gente dando risada. Com o futebol não é diferente.