Nasceu um grande clube na cidade – O Cruzeiro e a colônia italiana de Belo Horizonte
No dia 2 de janeiro de 1921 era fundado o Palestra Itália de Belo Horizonte, que se tornaria um dos maiores clubes do Brasil: o Cruzeiro Esporte Clube. Naquela época, muito mais do que um clube de futebol, estava sendo símbolo de união e fortalecimento da comunidade italiana na recém criada capital mineira.
Para entender melhor essas conexões, antes de chegarmos ao futebol, vamos dar alguns passos atrás e falar sobre a vinda de cidadãos da Itália para o Brasil.
A Imigração Italiana
A imigração de italianos para o trabalho nas fazendas brasileiras, principalmente as de café – informação com a qual até os mais desavisados já devem ter esbarrado em alguma novela da TV – teve seu auge entre 1880 e 1930. Esse fluxo teve São Paulo e Rio Grande do Sul como principais destinos e foi responsável pela formação de gerações de ítalo-brasileiros que influenciaram profundamente a cultura brasileira.
Depois desses dois polos, Minas Gerais foi quem mais recebeu italianos que vieram trabalhar no Brasil. O motivo era o trabalho na lavoura de café, mas com um incentivo muito menor do governo, uma grande parcela dos italianos que chegaram a Minas foi parar na capital. Ou melhor, nos canteiros de obras dela.
O início da nova capital
Belo Horizonte era a grande novidade daquela virada de século: uma cidade planejada para ser a capital do estado! Para tanto, precisou de muita mão de obra e, por isso, ao contrário de outros lugares, os italianos de Belo Horizonte se concentraram na construção civil. Eles ajudaram a erguer a cidade e nela ficaram, mas sem ser exatamente “bem-vindos”. Tiveram que conviver com a xenofobia e foram colocados na periferia, como acabava acontecendo com a classe trabalhadora – na verdade, como acontece até hoje.
Num país distante, sofrendo preconceito e ficando escanteados na sociedade, os italianos precisavam de ajuda para se inserir na sociedade que ainda engatinhava. Foi aí que entrou um certo jogo de bola.
Quando a imigração ainda estava a mil na virada do século XIX para XX, uma outra novidade veio de fora: o futebol. Chegou e rapidamente se popularizou. Já no início dos anos 20 era um sucesso popular e passou a funcionar como um elemento de integração e afirmação social – algo que os italianos de Belo Horizonte precisavam muito.
O Palestra Itália de Belo Horizonte
Com esse contexto, já dá para entender o motivo de um grupo de integrantes da colônia italiana ter se reunido para fundar um clube em 1921, né? Essa ideia foi sendo amadurecida desde o ano anterior, inspirada na notícia da criação do Palestra Itália de São Paulo, o atual Palmeiras. O processo culminou com um grupo de operários e comerciantes – oriundos das primeiras famílias italianas que se instalaram em Minas Gerais – se reunindo na Casa Ranieri, na Rua dos Caetés, centro de Belo Horizonte, para oficializar a criação da Società Sportiva Palestra Italia.
Como foi dito no início, essa atitude foi muito mais do que a criação de uma agremiação esportiva. O Palestra foi essencial para o fortalecimento da comunidade italiana de BH, usando o futebol para unir ainda mais os laços entre indivíduos que compartilhavam a mesma origem nacional.
O clube também mudou o cenário esportivo da capital mineira. Apesar de o futebol ser um esporte popular, suas ligas ainda eram muito aristocráticas e o time criado pela colônia italiana, logo nos primeiros anos, aceitou nos seus quadros jogadores vindos da sua classe trabalhadora. Algo diferente do que acontecia nos grandes clubes da época, o América e o Atlético.
Além disso, o Palestra já chegou causando polêmica, pois motivou a deserção de vários atletas ítalo-brasileiros que jogavam pelo Yale, clube que havia terminado em terceiro no campeonato da cidade de 1920. Atuar por um clube criado pela comunidade italiana, pareceu ser uma grande oportunidade, ainda mais com o Yale passando por turbulências internas.
O desempenho inicial do Palestra Itália foi empolgante. Se no primeiro ano foi o sexto entre sete equipes, logo no segundo ano já disputou o título e dali para frente passou a figurar constantemente no topo da tabela. Esse início promissor fez com que o clube comprasse um terreno da prefeitura e construísse lá seu estádio, inaugurado em 1923.
O Estádio do Barro Preto, onde hoje fica a sede esportiva do clube, foi construído com a participação de jogadores e associados, representando mais uma união da colônia italiana de Belo Horizonte. Assim como na construção da capital, os italianos puseram a mão na massa novamente, mas dessa vez, da sua própria massa.
Foi um início de história bem movimentado, com passagens como o rompimento com a Liga Mineira em 1926, o importante papel do “clã” da família Fantoni e, claro, o histórico primeiro tricampeonato de 28/29/30. De lá até precisar mudar de nome por causa da Segunda Guerra, muita coisa aconteceu e ainda mais coisas aconteceriam com a alcunha que elevaria o clube de força municipal para uma marca internacional. Mas o gigantesco Cruzeiro ainda tem muito daquele Palestra Itália. Uma origem muito ligada à de uma cidade e de um futebol que viviam seus primeiros anos em Minas Gerais. Um início com um pouco de Itália em suas raízes.
Esse assunto também apareceu lá no canal, no episódio 11 do Que História! que você pode ver abaixo.
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