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Neymar está cansado ou nos cansamos de Neymar?

João Paulo Vieira Teixeira 5 de junho de 2013

Há exatos dois anos o grupo de pesquisa responsável por manter o blog Comunicação, Esporte e Cultura se reunia para investigar como a imprensa escrita estava construindo a imagem do jogador Neymar. Àquela altura, o garoto impressionava o Brasil com um vasto repertório de dribles e belos gols. Observando hoje aquele momento, é possível perceber que nós pesquisadores, assim como a maioria dos amantes do futebol, estávamos deslumbrados com as façanhas do menino.

Acredito que todo este sentimento (talvez um pouco exagerado) fosse motivado, principalmente, pelas atuações inesquecíveis do atacante durante o Campeonato Sul-Americano Sub-20, realizado nos dois primeiros meses de 2011. Naquele momento era difícil conter a euforia.

Neymar comemora gol contra a Colômbia pelo Campeonato Sul-Americano sub-20. Foto: Mowa Press.

No entanto, a exigência de uma pesquisa acadêmica séria (que resultou em dois artigos: Organicom e Intercom) nos obrigou a ter um mínimo de distanciamento. O curioso é que mesmo envolvidos na frieza dos números e das páginas de jornais, tivemos a certeza de estarmos diante de um fenômeno relevante. As atuações do garoto e seus recordes já eram suficientes para justificar a pesquisa, mas o que mais impressionava era sua onipresença na mídia. Neymar dominava o noticiário esportivo e os anúncios publicitários.

Os veículos de imprensa o identificaram como um protagonista do futebol brasileiro nos próximos anos, talvez por isso já comecem a vigiá-lo de perto. As informações sobre a vida particular e os feitos dentro de campo não interessam apenas ao torcedores do Santos, mas a todos os brasileiros que consomem futebol (p.13).

Esse diagnóstico se confirmou. Se Neymar, em 2011, já era figura constante no noticiário esportivo passou a ser personagem obrigatório em todos os programas de rádio, TV, nos jornais impressos e na internet. A diferença é que sua imagem extrapolou o noticiário esportivo. O corte do cabelo dele virou notícia também nos programas de celebridade. Essa exposição maior foi acompanhada de outros belos gols e dribles ainda mais espetaculares. Com o Santos, Neymar ainda conseguiu títulos importantes, como o da Libertadores da América.

Neymar e seu cabelo moicano. Foto: Mowa Press.

Mas isso não foi o bastante. Mesmo com estatísticas muito acima da média, o jogador começou a ser questionado por parte da opinião pública. Após criar uma expectativa muito grande, qualquer deslize tornou-se suficiente para se questionar a qualidade do menino. Em coluna publicada no último domingo, no jornal Folha de São Paulo, Tostão apresentou uma síntese interessante do momento vivido pelo craque:

Se a situação do futebol brasileiro fosse outra, seria ótimo Neymar ficar por aqui. Muitos argumentam que é muito melhor vê-lo jogar mais de perto, do que fora, como se Neymar fosse um produto de consumo, à nossa disposição. A sociedade do espetáculo idolatra, consome e descarta rapidamente seus ídolos. A impaciência com Neymar já começou. Querem que ele dê show em todas as partidas. O maior compromisso de um artista é com sua arte e com a busca da perfeição, sem nunca alcançá-la. Ficar no Brasil, porque ganha mais do que Cristiano Ronaldo e é o rei da cocada preta, seria estagnar, prostituir seu talento.

A impaciência citada por Tostão é encontrada em comentários como os que dizem que Neymar é “mais uma invenção da mídia”. Esse discurso apareceu de forma muito enfática nos últimos dias, após a confirmação da transferência para o Barcelona. É preciso deixar claro que esta fala encontra pouco eco nos veículos tradicionais. Nos jornais e na TV encontramos apenas exaltação ao talento de Neymar. Mas nas conversas informais e nessas novas (e malucas) esferas chamadas redes sociais não foram poucos os que protestaram contra um eventual excesso na cobertura midiática.

Minha hipótese é que o torcedor/leitor/consumidor se cansou. Enjoou do cabelo moicano, das aparições constantes na TV, das declarações vazias, repetitivas e, principalmente, da falta de informação. Parece antagônico, mas não é. Apesar do assunto Neymar ter dominado o noticiário, não havia fato novo. Assistimos e lemos intermináveis discussões sobre os benefícios da permanência do atleta no Brasil. Opiniões gabaritadas se confrontavam com palpites sem sentido.

Neymar chega para a concetração do Brasil para disputar a Copa das Confederações de 2013. Foto: Alexandre Loureiro – VIPCOMM.

Enquanto isso, nada de diferente era divulgado. Nenhum órgão de imprensa conseguiu um furo. Nada além do óbvio foi divulgado como informação. Opiniões tínhamos aos montes, o tempo todo. Mas as informações eram raras. Este talvez seja um sintoma de que a comunicação na contemporaneidade caminha num sentido perigoso. Enquanto blogues pessoais e perfis em redes sociais se multiplicam, os sites de notícia se encolhem. A impressão que querem criar é que a informação é um bem cada vez menos valioso. Se é assim, não vale a pena investir tanto quanto é necessário para se conseguir uma informação precisa. Basta compartilhar, curtir ou comentar o que já foi dito.

Definitivamente não concordo com essa lógica. E acho que a repercussão da ida do Neymar para Barcelona pode ajudar a mostrar os efeitos perversos dessa escassez de informação precisa no meio de uma enxurrada de opinião.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Como citar

TEIXEIRA, João Paulo Vieira. Neymar está cansado ou nos cansamos de Neymar?. Ludopédio, São Paulo, v. 48, n. 2, 2013.
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