O espaço da violência contra a mulher na mídia esportiva
O jogador Wesley Pionteck foi uma contratação tratada como “polêmica” pela imprensa esportiva baiana e nacional ao falar da montagem do time do Vitória para a temporada. Ela foi considerada “polêmica” porque ele cumpre pena em regime aberto após ser condenado em segunda instância por agredir uma ex-namorada em janeiro de 2019. Desde que Wesley chegou ao Vitória, ele disputou um clássico contra o Bahia e foi alvo da campanha #WesleyNão, comandada pela torcida rubro-negra, para que a contratação fosse revertida.
Wesley foi condenado em outubro de 2019 a um ano e quatro meses por lesão corporal em violência doméstica. Sua defesa recorreu da decisão, mas esta foi mantida em segunda instância, o que significa que a pena é definitiva. De acordo com os autos do processo, a mulher já havia sido agredida anteriormente pelo jogador e, na agressão que gerou a condenação, ele causou lesões corporais graves, inclusive com uma faca, e fez ameaças. A condenação não impede Wesley de trabalhar, mas ele precisa manter a Justiça informada dos seus deslocamentos.
Estamos juntos com o movimento de torcedoras rubro-negras que gritam #WESLEYNAO! A diretoria do Vitória precisa ouvir as mulheres que fazem parte da nossa torcida e entender que essa contratação, além de manchar a imagem do clube, sinaliza que as vidas delas não têm valor.? pic.twitter.com/SSrpFQDisi
— Brigada Marighella (@BMarighella) March 12, 2021
A violência contra a mulher não pode mais ter espaço no esporte, mas deve ser apontada e criticada pela mídia esportiva. A pressão midiática para divulgar os casos ajuda movimentos como a campanha #WesleyNão a conseguirem a adesão do público e a conscientizar fãs do esporte de que crimes do tipo são condenáveis. Como escreve Leda Maria da Costa (2010), a imprensa é o veículo que perpetua o esporte além do que acontece dentro da arena. Por isso, é importante que a mídia não separe os temas referentes ao futebol dos temas sociais.
É interessante observar a repercussão da campanha mesmo após a efetivação da contratação. O jogador já entrou em campo, já atuou pelo clube, mas ainda assim veículos de comunicação fizeram questão de referenciar a agressão em matérias sobre o jogador. Wesley se lesionou após a sua primeira atuação, durante um treino. A matéria, que poderia ser simples – falando quando e como foi a lesão, qual a previsão de recuperação e como o time pode ser estruturado sem ele –, trouxe um elemento a mais: a descrição da condenação do jogador.
Veículos locais como o GE, Galáticos, A Tarde e Correio fizeram questão de relembrar, em uma matéria simples sobre o dia a dia da bola, que o jogador em questão foi condenado e cumpre pena por um ato de violência contra a mulher. O crime não foi deixado para lá pela imprensa, e isto é algo que deve perdurar, já que todas as vezes em que Wesley entrar em campo, será uma reafirmação da sua condenação. Quando ele joga, é um condenado por agressão à mulher que alcança um status de ídolo de milhares de pessoas; até que ponto isto é válido?
Apontar e relatar casos de violência contra a mulher envolvendo futebolistas é importante para coibir crimes similares e para que as vítimas destes crimes sejam acolhidas pelo esporte. O mundo esportivo, por ser construído de forma masculinista, é visto por mulheres como hostil e conivente com as agressões sofridas em outros ambientes. Já passou da hora de mostrar a elas que também devem ocupar este espaço e se sentir seguras nele. Por isso, é importante também que essa mídia seja composta por vozes mais diversas, que poderão dar outro olhar a estes debates.
O papel da imprensa esportiva é informar o público não só do que acontece dentro das quatro linhas, mas também de todas as questões que permeiam o jogo. Enquanto o ambiente esportivo for conivente com a violência contra a mulher, a mídia esportiva não pode se isolar deste debate – nem de tantos outros que envolvem o mundo do futebol brasileiro.
Referências:
COSTA, LM. Futebol folhetinizado: a imprensa esportiva e os recursos narrativos usados na construção da notícia. Logos, n.33, 2010. Acesso em: 20 de março de 2021.