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O futebol que me dá nome (alguns anos depois)

Ewerton Martins Ribeiro 18 de dezembro de 2021
Evérton
Um time feito só de parônimos e homônimos: tempo do evertonverso no esporte. Foto: Ewerton Martins Ribeiro

Contei há algum tempo sobre o mistério que envolve o meu nome, escolhido em homenagem ao Éverton Nogueira, artilheiro que fez história no Clube Atlético Mineiro nos anos 1980. Ainda hoje, quase uma década depois de eu trazer a questão à tona pela primeira vez, ninguém lá de casa consegue explicar como eu pude receber, em 1981, um nome que homenageia um jogador que só viria a jogar no time dos nossos corações em 1984, isto é, três anos depois de eu nascer e ser registrado.

Quem quiser saber mais sobre essa insólita anedota pode consultar o livro Futebol: fato social total, de 2020, em que a crônica que a registra, O futebol que me dá nome, foi publicada em sua última versão. Organizado por Elcio Loureiro Cornelsen, Francisco Ângelo Brinati e Gustavo Cerqueira Guimarães, o volume pode ser baixado aqui mesmo, na biblioteca digital do Ludopédio, gratuitamente.

Pois bem, Éverton Nogueira e eu. Decidi voltar ao tema ao notar que hoje, se organizar direitinho, dá para montar um time inteiro só com os nossos parônimos e homônimos em atividade na primeira divisão do futebol mundial. Estranhei ao notar isso, pois a coisa nem sempre foi assim — antes o contrário, na verdade…

Em geral, os Évertons e suas variantes sempre foram mais pontuais no futebol. Havia sempre uns dois ou três, no máximo, atuando simultaneamente em times de ponta — às vezes, nenhum. De uns tempos para cá, contudo, os xarás começaram mesmo a pulular por aí, como se alguma confluência astral tivesse dado ensejo a uma espécie de evertonverso no esporte…

Sem saber como avançar nas razões desse mistério, limito-me a fazer um esboço de escalação para essa geração.

Weverton
Foto: Cesar Greco/Palmeiras/Fotos Públicas

O evertonverso no 1-4-3-3

Para início de conversa, temos já de saída uma opção de alto-luxo para o gol: Weverton, do Palmeiras, titular da seleção brasileira. (Não fosse a pequena alteração no final do seu nome, teríamos ainda o Éverson, do Galo, goleiro que também começou a ser convocado, depois de ajudar nosso time a conquistar o brasileiro deste ano.)

Também contamos com uma opção de primeira linha para o ataque: Everton Cebolinha, jogador do Benfica que já andou sendo destaque na seleção brasileira nos últimos anos, como na última edição da Copa América realizada antes de o mundo entrar no atual estado de suspensão pandêmico. (E que também anda sendo especulado para o Galo de 2022, não escapo de lembrar…)

É claro que, para cumprir a minha regra nominal em todas as posições, vou precisar diminuir as expectativas em alguns casos. Ou ao menos ser mais, digamos, “criativo”. É nessa linha que, ainda para o ataque da minha seleção de xarás, convoco o Éverton Cardoso, ex-futuro-craque que anda às voltas com a diretoria do Grêmio, e uma jovem promessa do Flamengo chamada Werton — rapazote que, de tão novo, ainda nem conjugou o verbo ser de nosso famigerado nome, mas que anda prometendo.

Quando chegamos ao meio de campo, a coisa complica mais um pouco, e começo escalando nomes que talvez eu preferisse no time adversário. (Mas é como diz o amigo Danilo Barroso, um Licença B em ascensão que sabe tudo de futebol: “a gente não escala com o que quer, Ton, a gente escala com o que tem”. E é pensando no que tenho que eu…) Escalo já de saída o Everton Felipe, do Sport, um meia que, no alto nível do Brasileirão de 2021, nem fedeu nem cheirou. Bem, é como diz o ditado: muito ajuda quem já não atrapalha…

Para triangular com ele, trago também o Ewerton Pereira, jogador que retornou recentemente ao Portimonense, de Portugal, depois de passar pelo Porto e pelo Urawa Red Diamonds, do Japão. Por fim, para comandar o meio-campo, dou a braçadeira de capitão para o Éverton Ribeiro, craque do Flamengo que seria meu xará de nome e sobrenome, não fosse meus pais terem cismado de me imprimir um dábliu no lugar do vê — isso para não falar da falta de acento na proparoxítona, essa sofrida mácula cartorial para quem trabalha com palavras, como eu.

Éverton Ribeiro
Foto: Rafael Ribeiro / CBF/Fotos Públicas

Passando à cozinha, sou obrigado a baixar ainda mais as expectativas e, na falta de um xará canhoto para a lateral (resisto em escalar Weverson, do Bragantino, para não convocar nenhum “son”), escalo dois destros, e eles que se virem: Weverton, também do Bragantino, jogador cujo feito de maior destaque foi dar uma caneta no Neymar quando completava um treino da seleção, e Ewerthon Diógenes, do Sport, que eu não me lembro de ter visto em campo, apenas afundando uma rodada aleatória do meu Cartola.

A coisa complica de vez quando chegamos à zaga, o meu calcanhar de aquiles. Sem opções de proeminência para a posição, acabo tendo de escalar o Everton Sena, zagueiro reserva do Cuiabá que não joga há meses, em razão de um joelho bichado. E, como dupla para ele, faço uma interpretação criativa do meu critério e convoco o Ewerton Páscoa, zagueiro reserva do CRB, que jogou com honras a série B do Campeonato Brasileiro deste ano.

Como desculpa para a convocação de um jogador de fora da elite do futebol mundial, faço lembrar que, há não mais que alguns meses, no mata-mata da Copa do Brasil, o CRB desclassificou ninguém menos que o Palmeiras, time que mais tarde se revelaria o campeão da Libertadores deste ano — logo credenciando-se para ceder um jogador para a elite do eversonverso futebolístico, completando nossa escalação. (Regra da biriba: toda canastra aceita um curinga.) Plantel montado, agora é partir para o jogo.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Ewerton Martins Ribeiro

Escritor de ficção, jornalista da UFMG, mestre e doutor em estudos literários e bicampeão brasileiro em 2021.

Como citar

RIBEIRO, Ewerton Martins. O futebol que me dá nome (alguns anos depois). Ludopédio, São Paulo, v. 150, n. 26, 2021.
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