128.18

O legado dos Bukaneros e o Rayo Vallecano

Gabriel de Oliveira Costa 15 de fevereiro de 2020

O Rayo Vallecano pode não ser um dos clubes mais bem sucedidos financeira e esportivamente na Espanha, porém seu legado para o futebol vai além das quatro linhas. Enraizada por grande importância em causas sociais, bem como a luta contra o racismo e fascismo, o time madrilenho anda em conjunto com sua torcida, os Bukaneros, como resistência operária.

Por meio de fortes apelos ideais, o Rayo Vallecano é historicamente um clube de viés político de esquerda desde sua origem. Oriundo do bairro de Vallecas, que foi uma região fundamental no combate à ditadura espanhola, o clube tem uma das torcidas organizadas mais influentes ideologicamente no futebol. Os Bukaneros, nome inspirado da tradicional batalha naval e que é anualmente celebrado na região, a torcida é famosa por promover gestos e cantos antifascistas e contra o racismo também. Com o rótulo “Ame o Rayo, odeie o racismo” e “Pequeno no esporte, grande nos valores”, os Rayistas têm o Atlético de Madrid como maior rival e o St. Pauli, da Alemanha, como “melhor amigo” no futebol.

Bukaneros protestam contra o Atlético de Madrid e o Real. Foto: Reprodução.

Bukaneros

Os ultras Bukaneros são famosos por serem os representantes da causa operária de Madrid. Certamente o caso ideológico mais conhecido pelos torcedores do Rayo foi o forte protesto contra a chegada do ucraniano Roman Zozulya em 2017. Por ter forte ligação com um partido nacionalista e ligações com neonazistas, o jogador teve sua contratação emperrada, muito pela forte pressão dos Bukaneros. Um dos maiores ideais da torcida é ser contra a comercialização do futebol.

A torcida do Rayo Vallecano constantemente está viajando para diversos lugares em apoio ao seu time nos jogos. Pela proximidade com a identidade política, os madrilenhos possuem relações muito próximas com o St. Pauli, de Hamburgo. Os alemães também se destacam pelas mobilizações de massa no futebol contra racismo e nazismo, juntos, os clubes fazem o “clássico da amizade”. Na Espanha, os rayistas possuem relações estreitas com os torcedores do Deportivo La Coruña, ou Riazor Blues. Ambos costumam ceder espaços nas arquibancadas para os torcedores quando se enfrentam na La Liga.

Por outro lado, torcedores adeptos à política de direita são inimigos declarados dos Bukaneros. Os Ultras Sür, do Real Madrid, Frente Atlético, do Atlético Madrid e Ultas Boys do Sporting Gijón são exemplos. Os Bukaneros também não costumam ser bem recebidos em Málaga, Albacete, Sevilla, Levante, entre outras regiões.

Rayo Vallecano

Apesar de não figurar entre os principais clubes da Espanha, o Rayo Vallecano sempre despertou atenção das grandes equipes e a mídia. Primeiro clube a ter uma Presidente (Teresa Rivero/1994), o Rayo também é reconhecido por promover campanhas sociais, apoio ao futebol feminino, além de adotar a causa da torcida na luta contra preconceitos. O racismo, fascismo, homofobia e outras condutas abomináveis na sociedade são amplamente combatidas pelos rayistas. 

Em 2015 o clube lançou uma linha de uniformes em favor do movimento gay, e outra, em campanha de conscientização contra o câncer de mama. As camisas produzidas pela Kelme repercutem discussões até hoje, porém, de fato foram elogiadas pelo pioneirismo.

Uniforme em homenagem ao movimento gay usado em clássico contra o Atlético de Madrid. Foto: Reprodução.

Com um estádio que conforta pouco mais de 14 mil pessoas, o Campo de Fútbol de Vallecas costuma ser um ambiente hostil para os adversários. Antes dos jogos, é comum ouvir a música “Canto de la pirata”, que homenageia sua torcida, os Bukaneros. A mídia costuma relatar a má fama que o Rayo possui diante das autoridades. O clube já foi impedido de jogar competições europeias por conta da capacidade de seu estádio, por vezes os ultras são punidos por estarem envolvidos em confrontos. 

Social

As causas sociais são destacas com atenção pelo clube. Em 2015, o Rayo Vallecano em conjunto de sua torcida ajudou a senhora Carmem Martínez Ayudo, que havia sido expulsa de casa por falta de pagamento do aluguel, e desde então o clube se comprometeu em ajudá-la com as questões financeiras.

Jogadores renomados como o antigo jogador Roberto Trashorras sempre participaram das atividades promovidas pelo clube com a comunidade. O futebol feminino é tratado com muito profissionalismo, e atualmente as mulheres integram a elite da categoria no país. Escolas da região e crianças que participam das categorias de base também são acolhidas pela fundação do clube, que desde 2001 possui uma entidade que trata de objetivos na periferia de Madrid.

Por meio dessa comunicação, os valores e os ideais que Vallecas possui no DNA, sendo transmitido ao clube, também é ensinado para os jovens que futuramente serão torcedores, atletas ou cidadãos comuns na região. O legado do Rayo Vallecano está além do futebol, é para a vida.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
Seja um dos 14 apoiadores do Ludopédio e faça parte desse time! APOIAR AGORA

Gabriel de Oliveira Costa

Jornalista carioca, tenho 22 anos. Apaixonado por futebol, fator principal pelo qual sou motivado para trabalhar com  a comunicação social, desde março realizo trabalhos direcionados ao conteúdo esportivo. Há dois anos trabalho com pautas de economia e política.

Como citar

COSTA, Gabriel de Oliveira. O legado dos Bukaneros e o Rayo Vallecano. Ludopédio, São Paulo, v. 128, n. 18, 2020.
Leia também:
  • 175.9

    Flamengo x Vasco 1999: a origem do ‘vice de novo’

    Gabriel de Oliveira Costa
  • 171.18

    A guerra em Nice: o que de fato aconteceu naquela noite

    Gabriel de Oliveira Costa
  • 170.25

    O dia que o Brasil, de Romário e Bebeto, chorou nas Olimpíadas

    Gabriel de Oliveira Costa