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Pintou o nono grande na Colômbia? Conheça a história do Deportes Tolima

Eduardo de Souza Gomes 18 de outubro de 2022

Em 08 de junho de 2021, escrevi um pequeno texto onde tentei representar um pouco daqueles que são considerados os “maiores clubes do futebol colombiano”. No total, são oito equipes que por mim foram destacadas: Independiente Santa Fé e Millonarios, de Bogotá; América de Cali e Deportivo Cali, ambos da cidade de Cali; Atlético Nacional e Independiente Medellín, de Medellín; Junior Barranquilla e Once Caldas. Essas oito equipes historicamente se destacam como sendo aquelas que ganharam o patamar de “maiores” times do país, envolvendo parâmetros como títulos, torcida, continuidade e disputa nas principais competições, dentre outros pontos.

Longe de entender que tais escolhas são definitivas ou mesmo devem ser consideradas como as mais corretas acerca do tema, uma pergunta surge ao se definir tal lista: existe a possibilidade de outras equipes serem também entendidas como grandes e pleitearem um lugar em tal seleto e privilegiado grupo de agremiações? Desde já, destaco que minha resposta é sim!

Como historiador, não posso me privar dos cuidados que devemos ter ao realizar seleções como essas, que muitas das vezes podem desvalorizar questões locais e representativas. Em outros países, por exemplo, a questão daqueles que são considerados “grandes” sempre foi marcada por muitos debates.

Na Argentina, por exemplo, se popularizou a ideia de que o país possui “cinco grandes clubes”, que seriam Boca Juniors, Independiente, Racing, River Plate e San Lorenzo. Até aí tudo bem, já que de fato estamos falando de cinco grandes agremiações que merecem ocupar tal espaço, cada uma com sua história, representação, torcida, títulos e ídolos. E tal escolha possui também referenciais históricos, que remetem às décadas iniciais do século XX, em que estiveram como principais equipes no processo de surgimento, expansão e profissionalização do futebol argentino.

Mas daí surgem outras questões: como deixar, por exemplo, o Estudiantes de La Plata, tetracampeão da Libertadores da América, fora de uma lista dos grandes do país? Ou clubes como Huracán, Neweell’s Old Boys, Rosario Central, Vélez Sarsfield e Argentinos Juniors, todos com conquistas, ídolos e muita história? Tais equipes possuem histórias singulares, tendo em diferentes momentos todas pleiteado o título de “sexto grande” do futebol argentino.

No Brasil, se popularizou chamar 12 clubes como grandes, que seriam Botafogo, Flamengo, Fluminense e Vasco da Gama no Rio de Janeiro; Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo em São Paulo; Atlético Mineiro e Cruzeiro de Minas Gerais; e Grêmio e Internacional no Rio Grande do Sul. Lista merecida, mas também injusta, pois ignora as variações culturais e regionais do Brasil, que possui outras grandes equipes espalhadas por todo seu território. Como deixar de fora o Bahia, primeiro campeão nacional e que fez parte do Clube dos 13; ou o Athletico Paranaense, um dos clubes mais vitoriosos e organizados do país no século XXI; ou mesmo Sport, Coritiba, Fortaleza, Vitória, Ceará….

Enfim, a lista é grande, assim como são todos esses e muitos outros clubes espalhados por todo o Brasil. E esse fator só aflora o debate que destaca a importância da descentralização dos olhares sobre o futebol nacional, ainda muito marcados por narrativas e construções oriundas do eixo Rio-São Paulo.

Destaquei aqui tais exemplos de Argentina e Brasil, países que assim como a Colômbia estão no cenário sul-americano, apenas para demonstrar que uma lista que se propõe a definir os “clubes grandes” de um país, além de não se estática, nunca será considerada uma ciência exata, pelo contrário: leituras e releituras devem ser feitas a todo o momento, se utilizando da história das agremiações nas suas mais variadas facetas como forma de se encontrar um caminho plausível e que possua critério na análise e escolhas realizadas.

No caso da Colômbia, como também destaquei em outra oportunidade, esse olhar cíclico se fez importante na escolha daqueles que poderiam ser considerados “os grandes do país”. Antes fora dessa lista, o Once Caldas passou a ser considerado a “oitava força” colombiana, principalmente pelos desempenhos dos últimos vinte anos e pela conquista da Copa Libertadores da América em 2004 (até hoje, apenas o Once Caldas e o Atlético Nacional conseguiram conquistar a principal competição sul-americana, dentre os clubes colombianos). Somando esses fatores ao desempenho histórico do clube, que é muito tradicional no país desde seus primórdios, se fez valer sua chancela como um dos grandes times da Colômbia.

Com isso, surge uma nova pergunta: o Deportes Tolima, que atualmente é o único clube colombiano que chegou nas oitavas de final da Copa Libertadores da América 2022 de futebol masculino, deve ser considerado o “nono grande” do país? Minha resposta para essa pergunta é positiva e irei apresentar abaixo um pouco da história do clube como forma de defender tal hipótese.

Tolima
Equipe do Deportes Tolima. Foto: reprodução.

 

Fundado em 18 de dezembro de 1954 na cidade de Ibagué, que é a capital do departamento colombiano de Tolima, o Deportes Tolima é um dos clubes mais consistentes da história do futebol colombiano. Desde sua fundação, ocorrida na reta final do período El Dorado do futebol no país (caso queira saber mais sobre esse momento do futebol colombiano, veja aqui), o Tolima só não disputou a primeira divisão (Primera A) do campeonato nacional organizado pela Dimayor  – División Mayor no ano de 1994. E venceu a competição em seu único ano disputando a Primeira B, tendo em 1995 retornado à primeira divisão, de onde nunca mais saiu.

Esse desempenho que representa uma histórica consistência, entretanto, não havia se materializado em conquistas maiores até o século XXI. Mas isso tem se modificado. Desde 2003, o clube já foi três vezes campeão colombiano (2003-II, 2018-I e 2021-I), uma vez campeão da Copa Colômbia (2014) e uma vez vencedor da Superliga da Colômbia (2022).

Tolima
Time do Tolima comemora o título colombiano em 2018. Foto: Reprodução.

Além das conquistas nacionais, o Deportes Tolima tem se mantido constante também nas disputas de competições internacionais.

Na Copa Libertadores da América atual, onde caiu para o agora finalista Flamengo nas oitavas de final, disputou o certame pela nona vez. A equipe já participou do torneio nas seguintes edições: 1982, 1983 2004, 2007, 2011, 2013, 2019 e 2022. Em 1982, logo em seu primeiro ano, chegou no triangular semifinal. Já em 2011, ficou marcado por eliminar o Corinthians na fase eliminatória da competição, o que marcou o último jogo da carreira do atacante Ronaldo, então atleta do clube paulista.

A equipe é ainda a segunda agremiação que mais vezes disputou a Copa Sul-Americana na história, tendo por nove vezes competido no segundo principal torneio de clubes sul-americanos (o Deportivo Cali lidera o ranking com dez participações, que também tem o Atlético Nacional com nove, empatado com o Tolima).

Além de todos os dados, histórias e conquistas aqui apresentadas, o Tolima está entre os nove primeiros colocados dos rankings que medem o desempenho histórico dos clubes colombianos no principal torneio nacional do país, tal como na Copa Libertadores da América, o que representa que a equipe tem cada vez mais fazendo por merecer esse lugar entre os grandes, não só pelos títulos e disputas recentes, mas principalmente pela consistência histórica que se faz ainda mais importante.

Portanto, mais uma vez, gostaria de reiterar que esse texto não possui a intenção de definir quem são, de fatos os “grandes clubes” da Colômbia ou de qualquer outro país. Porém, se com critérios críticos estabelecidos for realizada uma lista dessa natureza em terras colombianas, o Deportes Tolima, pelos pontos já aqui assinalados, cada vez mais pede passagem para, também, ser considerado um dos gigantes do futebol em seu país.

Referências

Deportes Tolima – Site oficial: http://www.clubdeportestolima.com.co

RUIZ BONILLA, Guillermo. La gran historia del fútbol profesional colombiano: 60 años de logros, hazañas y grandes hombres. Bogotá: Ed. DAYSCRIPT, 2008.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Edu Gomes

Historiador, professor e pesquisador do esporte. Doutor e mestre em História Comparada, com ênfase em História do Esporte, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Graduado em História pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com período sanduíche na Universidad de Antioquia (UdeA), Colômbia. Graduando em Educação Física (Claretiano). Atua como pesquisador do Sport: Laboratório de História do Esporte e do Lazer (UFRJ). Professor na Educação Superior e Básica. Editor e colunista de esportes do Jornal Toda Palavra (Niterói/RJ), além de atuar como repórter e comentarista da Rádio Esporte Metropolitano. Autor dos livros intitulados "A invenção do profissionalismo no futebol: tensões e efeitos no Rio de Janeiro (1933-1941) e na Colômbia (1948-1954)" (Ed. Appris, 2019) e "El Dorado: os efeitos do profissionalismo no futebol colombiano (1948-1951)" (Ed. Multifoco, 2014). Organizador da obra "Olhares para a profissionalização do futebol: análises plurais" (Ed. Multifoco, 2015), além de outros trabalhos relacionados à História do Esporte na América Latina.

Como citar

GOMES, Eduardo de Souza. Pintou o nono grande na Colômbia? Conheça a história do Deportes Tolima. Ludopédio, São Paulo, v. 160, n. 18, 2022.
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