Os convidados chegaram em diferentes horários. Uns batiam à porta bem antes do começo do evento, para botar a conversa em dia sem importunações. Outros carros estacionariam à frente da casa durante a execução do hino nacional.
Era possível notar dois grupos diferentes: os pachecos e os ranzinzas. De um lado, a torcida ferrenha pela seleção brasileira, com unhas roídas, gritos e emoção exagerada. Do outro, a risada sarcástica a cada reação ufanista, comentários sobre a alienação geracional, comparações entre patos amarelos e a seleção de verdade, como aquela de 2002, pois esses caras de hoje mal conhecem o futebol brasileiro.
Todos torciam pela vitória da churrasqueira. E era com ela que eu me importava. A fome de domingo crescia. Acordei cedo para ver os jogos, vi programas, análises do andamento da Copa, projeções, essas coisas.
O cheiro do churrasco aromatizava os papos. Uns se recusavam a torcer por aquele time da camisa amarela. Outros viam nessa atitude uma afronta ao patriotismo. Houve quem dissesse que todo nacionalismo é retrógrado. Cheguei a ouvir que o ufanismo é necessário, especialmente nesses tempos de autoestima brasileira abaixo de zero.
Evitei concordar ou discordar. Se me perguntavam, balançava a cabeça e enrolava o suficiente para que mudassem de assunto. E a carne não saía. Sou aquele tipo de gente que não forra o estômago com farofa, maionese e arroz com legumes antes da carne. Meus princípios alimentares impedem que belisque um petisco aqui e outro ali.
Minha torcida mesmo era pelo churrasco. Pouco me importava com o resultado do jogo, a bem da verdade. Tanto faz o campo, a Rússia, o Tite. Queria mesmo era ver a faca fazendo escorrer o sangue, meus dentes cortando os pedaços selecionados no prato, estômago cheio como a expressão da felicidade de um gol em final de Copa do Mundo.
O burburinho continuava. Olhei para o churrasqueiro e percebi um olhar diferente. Ele tirou uns espetos e os colocou em cima da forma. Aproveitei a distração sobre as grandes seleções brasileiras de todos os tempos, a CBF e os dirigentes presos, as táticas, os prognósticos dos especialistas sem espaço nos programas esportivos. Saí pela esquerda, como de costume.
A carne já estava fatiada, escolhi com o garfo os melhores pedaços. Fui atrás do arroz, farofa, maionese e uma latinha de cerveja. Percebendo que já era hora, a fila se formou diante da churrasqueira. A campainha tocou, abriram a porta. Os que olhavam para a TV durante o hino perderiam os melhores pedaços.
No apito inicial, fez-se o silêncio, só interrompido nos lances agudos.