Dois amigos se encontram em um bar. Isso poderia ser um começo de uma piada, mas é o início de outra prática comum: um debate sobre futebol em ano de Copa do Mundo.

_  Pensávamos que o futebol-arte tinha acabado com o São Paulo Futebol Clube, logo após a conquista do Bicampeonato Mundial Interclubes, em 1993.
_ Isso porque você é um otimista. Meu pai acha que o Telê bom mesmo era o de 1982. Não o culpo. Ele é santista e eu que sou são-paulino. Aí o São Paulo que conquistou o mundo duas vezes seria um espécie de transição suave para o futebol eficiente.
_ Bom, o Brasil, pelo menos, a ideia era de que a eficiência seria superior a prática. E até conseguimos comprovar essa teoria ao vislumbrarmos bons jogos da seleção, como na conquista do pentacampeonato Mundial em 2002, na Copa disputada na Coreia e no Japão; durante a primeira fase Era Dunga Treinador antes da Copa de 2010; na Copa das Confederações de 2013 e até nas últimas vitórias brasileiras em mundiais interclubes com o Corinthians, em 2012, e o Internacional, em 2006. Ou seja, bom futebol e com resultados. Com conquistas.
_ Conquistas, mas…
_ Mas “bom” para os futebolistas brasileiros é como o termo usado na avaliação média de um homem. ” Ele é bonitinho, mas…” Ou seja, algo incomoda ou está errado.
_ Exatamente!
_ Como o “Fio da Esperança” está sempre batendo à nossa porta – em alusão à uma possível reencarnação do mestre Telê Santana  – não é que o eficiente virou belo.
_ Não te entendo.
_ Olha, não sabemos o que aconteceu depois daquela derrota para o Peru na última Copa América, realizada nos Estados Unidos, em 2016. Porém, algo ocorreu e está sendo maravilhoso.
_ Explique mais.

tite
Tite durante o treino da Seleção Brasileira. Foto: Pedro Martins/Mowa Press.

_ Os mesmos jogadores que estavam sendo humilhados tornaram-se heróis depois que Tite assumiu o comando no escrete canarinho. Até da poderosa Alemanha, atual campeã mundial, ganhamos e com tranquilidade, em Berlim. Passamos de perdedores para favoritos e copiados, com arte e eficiência.
_ E a sua ideia é que…
_ Tenho certeza que Tite incorporou a alma de Telê em três períodos: O primeiro é o do 4 a 1 do Palmeiras contra o Flamengo de Zico, em 1979, em pleno Maracanã. O segundo é o dos 3 a 1, contra a Argentina de Maradona durante a Copa do Mundo de 1982, na Espanha. O terceiro é o do primeiro jogo da final da Libertadores de 1993, quando o São Paulo goleou o Universidad Católica do Chile, naquele memorável 5 a 1, no Morumbi. Os adversários não viram a cor da bola, assim como não a encontram quando jogam contra o timaço nacional de Tite.
_ Você não acha isso um pouco de exagero?
_ Veja, a empolgação é tanta que até esquecemos da Copa da Rússia. O povo só sorri e pergunta – afirmando – de “quanto foi” o jogo . O kkk no Whatsapp é comum após os jogos. Logo, a nossa alegria se deve a esse senhor chamado Titelê.
_ Titelê? Isso não é possível. Um corinthiano com um são-paulino. Isso dá arrepio em muitos.
_ Ah, independente do resultado na Copa do Mundo de 2018, tem gente querendo o treinador no comando do São Paulo Futebol Clube.
_ Você está é tirando uma com a fase do meu time.
_ Que isso! Assim, Diego Souza brilhará como na recente passagem pela seleção.
_ Que absurdo! Não tem como dar certo!
_ Bom, os corintianos vão chiar no começo, mas depois de um Carille versus Titelê, a galera irá aplaudir de pé. O pessoal é capaz de querer o retorno de Tite ao Timão após isso.
_ Só quero ver a próxima que você vai falar.
_ Como estamos desacreditados dos políticos e dos altos salários no setor público, seja no judiciário, executivo e legislativo, eu tenho uma ideia! Melhor votar em Titelê para Presidente da República!
_ Hã?!
_ Sim!  Pelo menos, teremos uma chance de nos salvar como país pelo futebol-arte.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Luciano Victor Barros Maluly

Graduado em Comunicaçao social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina (1995), Mestrado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1998), Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (2002), Pós-doutorado na Universidade do Minho em Portugal (2011) e Livre Docente pela ECA-USP (2016). Atua como professor e pesquisador na Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em radiojornalismo e jornalismo esportivo. È autor do livro JORNALISMO ESPORTIVO - PRINCÍPIOS E TÉCNICAS (Editora do Autor, 2017)

Rafael Duarte Oliveira Venancio

Rafael Duarte Oliveira Venancio é jornalista, escritor, desenhista, filmmaker e professor adjunto da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Doutor em Meios e Processos Audiovisuais pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP), pesquisa sobre narrativas midiáticas, jornalismo literário esportivo e narrativas gráficas esportivas. Possui também o mestrado em Ciências da Comunicação e graduação em Comunicação Social: Habilitação em Jornalismo, todos também pela ECA/USP. Atua no Curso de Jornalismo e no Programa de Pós-Graduação em Tecnologias, Comunicação e Educação da Faculdade de Educação da UFU. É coordenador do Grupo de Pesquisa ESPORTÍDIA - Estudos Analíticos de Esporte, Jogos e Mídia (FACED/UFU) e possui mais de trinta livros publicados, mais de oitenta artigos científicos e centenas de artigos jornalísticos, além de contribuições gráficas e artísticas.  Atualmente, desenvolve o projeto audiovisual “Triângulo do Futebol” sobre a história do futebol no Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba com o apoio da Fapemig (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais).

Como citar

MALULY, Luciano Victor Barros; VENANCIO, Rafael Duarte Oliveira. Titelê. Ludopédio, São Paulo, v. 107, n. 10, 2018.
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