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Tore Flo – o carrasco escandinavo da seleção canarinho

Apesar de histórias de sucesso dentro da Copa do Mundo, a seleção canarinho também tem em seu histórico derrotas traumáticas, apunhaladas por jogadores de outras seleções que ficaram com a alcunha de “carrasco”. Os exemplos são os mais variáveis possíveis: Paolo Rossi, Zinedine Zidane, Henry, Caniggia. Mas teve um personagem que poucos falam e ainda consolidou uma marca invicta diante do Brasil – o de nunca ter perdido para esta – Tori André Flo, da seleção norueguesa.

O jogador é um dos atletas mais conhecidos do país escandinavo. Muito porque marcou época enquanto jogou no Chelsea, bem como nos feitos pela seleção da Noruega – que não tem um histórico tão marcante na história da bola. Anos depois, ele seria conhecido até do público brasileiro pelo o que fez em confrontos diretos com o país tupiniquim.

Antes de falar um pouco mais sobre o esquecido personagem, preciso contar o motivo para fazer um texto no ludo sobre um atacante de uma nação que a bola nos pés não é forte, e sim o petróleo encontrado sob os pés dos seus cidadãos.

A ideia surgiu durante o programa “UDE EM CASA” – aliás, um grande programa que recomendo – enquanto falávamos do grande centroavante Haaland, também norueguês. Na discussão, foi lembrado do jogo da Copa de 1998, quando os escandinavos derrotaram os tetracampeões do mundo, por 2×1, na fase de grupos. Lembrei do meu dvd sobre o mundial da França e da jogada que Tore Flo fez em cima de Júnior Baiano.

Só por isso, na minha avaliação, já valia uma pesquisa especial para contar aos leitores do Ludopédio. Falar de Haaland, Odegaard é fácil e modismo, ficaria no lugar comum. Optei pelo desconhecido e carrasco brasileiro, Tore Flo.

Tore Andre Flo
Tore Andre Flo em 2006. Foto: Wikipédia

Retrospecto contra o Brasil

Historicamente, a amarelinha impõe medo aos adversários, menos para a camisa vermelha norueguesa. Os vikings nunca sentiram o sabor da derrota diante de nós. Ao todo, foram quatro confrontos, com dois empates e duas vitórias para a península escandinava, entre elas, um 4×2 histórico, em 1997, e a já comentada partida na fase de grupos do maior torneio de seleções do mundo.

O destaque desses dois revés brasileiros foi o gigante norueguês de 1,93. Apesar da altura, sua velocidade e movimentação de jogo infernizaram os zagueiros brasileiros nessas duas ocasiões. A começar pelo amistoso em Oslo, no Estádio Ullevaal.

A seleção brasileira estava em um excelente momento, estava há 46 jogos sem perder, a última derrota tinha sido para a Alemanha, em 1993, por 2×1. De lá até o dia fatídico contra os vikings, foram 1920 dias sem sentir o gosto ruim no apito final do árbitro. 

Primeiro destaque contra o Brasil

No dia 30 de maio de 1997, as duas seleções se enfrentaram pela segunda vez na sua história, o Brasil era comandado por Zagallo e vinha de uma série invicta já mencionada. Porém, isso não entrou dentro de campo. O que se viu foi um forte contra ataque viking diante de uma apática defesa formada por Márcio Santos e Célio Silva.

O destaque ficou com o grandalhão Tore Flo, que bagunçou a defesa brasileira como ninguém. Dos quatro gols assinalados, o camisa nove participou de três deles, nos dois primeiros mostrou oportunismo e faro de artilheiro, nem a presença de Taffarel na sua frente foi capaz de fazer o gigante tremer.

No quarto gol anotado por Ostenstadt, o centroavante, de cabeça, deixou seu companheiro na cara do gol para empurrar livre para o fundo do barbante. Noite perfeita para o gigante escandinavo contra a melhor seleção do mundo, segundo o ranking da FIFA na época.

E olhe que do outro lado tinha Djalminha, Ronaldo e Romário.

Segundo destaque – Copa do Mundo

A Noruega estava no grupo A da copa de 1998 ao lado de Brasil – o então atual tetracampeão do mundo -, Marrocos e Escócia. No papel, estaria brigando pela segunda colocação da sua chave ao lado do Marrocos. Os seus dois primeiros jogos foram empates contra a seleção africana e a Áustria.

No entanto, a seleção marroquina conseguiu vencer a Escócia e garantir os quatro pontos que poderiam levar para as oitavas de final, só que Tore Andre Flo e Rekdal iriam fazer história em cima da temida seleção de Ronaldo Fenômeno.

No dia 23 de junho de 1998, no Estádio Vélodrome, em Marselha, brasileiros e noruegueses se enfrentavam. Os primeiros já estavam classificados para a segunda fase, já para os segundos só restavam uma vitória “improvável” sobre a amarelinha.

A partida foi muito movimentada, os comandados de Zagallo partiram para cima, mas sem tanto brilho dos jogos anteriores. Por parte da Noruega, parecia que os jogadores estavam incorporando o espírito viking, e o seu comandante maior era André Flo.

O atacante perturbou demais a zaga formada por Júnior Baiano e Gonçalves, principalmente pelo lado esquerdo do seu campo, com movimentações rápidas por dentro, passes precisos e chutes assustando Taffarel, só faltava o gol.

Que veio primeiro para o time mais técnico, o Brasil. Já na parte final, Denilson cruzou para Bebeto marcar de cabeça o primeiro tento do decisivo jogo para os escandinavos. Cinco minutos depois, a garra viking foi recompensada pelo seu maior jogador, em termos de altura e decisão. Pela esquerda, Tore Flo dá uma caneta desconcertante em Júnior Baiano e completa para dentro da meta brasileira. Um golaço para botar fogo na partida.

Aos 43 minutos, o imparável gigante noruegês é puxado pelo mesmo Júnior Baiano, pênalti que o árbitro americano Esfandiar Baharmast assinalou. Ninguém entendeu nada, por muito tempo, os brasileiros acharam que ele tinha cavado na marca da cal. Dois dias depois, um canal de televisão da Suécia viu o puxão da camisa que o atacante sofrera. Rekdal não perdoou e virou para os vikings.

Com o resultado, a Noruega ficou em segundo no grupo A com cinco pontos, atrás apenas do Brasil – que terminou com seis -, e garantiu a classificação para as oitavas. Lembrando que os nórdicos perderam para a Itália pelo placar magro. 

Após o apito final, parecia que os nórdicos haviam conquistado o torneio da França, vários jogadores do banco entraram em campo e comemoraram bastante ao lado de André Flo, o melhor atleta em campo. Para muitos a vitória surpreendente é a maior façanha esportiva da história do país.

Pós

Muitos lembram dessa vitória marcante, em entrevista recente ao UOL, o próprio herói daquele 23 de junho relembrou que o país parou e comemorou. “Soube que as pessoas da minha vila na Noruega (Stryn) ficaram malucas. Era 23 de junho, uma data especial na Noruega para comemoração do verão. Normalmente as pessoas já não iriam trabalhar no dia seguinte. Então as pessoas comemoraram até a manhã seguinte, com fogueiras, churrasco, por toda a madrugada”, comentou o ex-atleta.

O jornalista Marius Lien escreveu em 2018 o livro “O milagre em Marselha – quando a Noruega venceu o Brasil”, que conta um pouco dessa história, além de mostrar entrevistas, bastidores dessa inesquecível vitória para o esporte norueguês.

Em 2012, aos 39 anos, o gigante herói norueguês se aposentou dos gramados no Sogndal, do próprio país, jogando ao lado do sobrinho Ulrik Flo, quinze anos mais novo. O detalhe é que seu irmão Jostein Flo, e seu primo Havard Flo também foram jogadores e estavam no elenco de 98.

Ulrik e Tore André Flo
Ulrik e Tore André Flo. Foto: Wikipédia

Pela seleção do seu país foram assinalados 23 gols, em 76 partidas. Ele é o quarto maior artilheiro da Noruega ao lado de Solskjaer, atual técnico do Manchester United.

Atualmente, ele trabalha no Chelsea – clube pelo o qual mais se destacou atuando – ajudando a monitorar o desempenho dos jogadores emprestados pelo time londrino. 

Tore André Flo marcou história no seu país mesmo o futebol não sendo o carro-chefe das modalidades esportivas praticadas. Mas suas atuações em confrontos contra o país do futebol foram essenciais para serem lembradas no coração do torcedor norueguês, é claro.    

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Pedro Henrique Andrade Dias

Estudante de jornalismo, cinéfilo e amante de esportes

Como citar

DIAS, Pedro Henrique Andrade. Tore Flo – o carrasco escandinavo da seleção canarinho. Ludopédio, São Paulo, v. 142, n. 34, 2021.
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