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A última dúvida de Tite

Luciano Victor Barros Maluly 11 de fevereiro de 2018

O povo brasileiro está orgulhoso do trabalho do técnico Adenor Leonardo Bachi, ou simplesmente Tite, à frente da seleção. O atual comandante recuperou o prestígio não só dos jogadores, mas também da própria modalidade. Fez tanto que até as críticas aos dirigentes suspeitos de corrupção diminuíram na mídia. Sem falar na retomada do respeito internacional e do orgulho nacional pela Amarelinha, que foram recuperados após a série de vitórias conquistadas em amistosos e durante as eliminatórias para a Copa do Mundo da Rússia, em 2018.

Assim como o trabalhador que espera um reconhecimento, solicito ao treinador apenas um ajuste em suas convocações. Lembre-se que o próprio Tite passou um tempo esperando o chamado da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) para assumir a equipe, enquanto assistia a derrocada da seleção em tempos de Pós 7 a 1.

Meu pedido recai sobre a posição de goleiro. O atual titular é Alisson, jogador que merece o posto pelas boas atuações e também pelo apoio do treinador de goleiros Cláudio Taffarel, tetracampeão do mundo em 1994. Ambos parecem estar sintonizados, tanto que os resultados são positivos até o momento, como observado na performance do atleta também na Roma, equipe italiana em que se firmou recentemente como titular. Já a disputa pelas outras duas vagas merece atenção. Nenhum dos atletas chamados teve uma sequência de jogos como titular. Atuaram uma ou outra partida isolada. Assim, o desempenho nos treinamentos é o principal critério de avaliação no período em que os atletas, particularmente os reservas, servem à seleção.

O segundo goleiro é Ederson, jogador que ganhou notoriedade na Europa (requisito fundamental para quem deseja ser convocado) por atuar em grandes times, como Benfica e Manchester City, clube que o contratou por um bocado de euros (€ 40 milhões). Mesmo desconhecido do público brasileiro, o arqueiro parece seguro aos olhos da Comissão Técnica, mas precisa ser testado – assim como a seleção – fora da Europa, principalmente em jogos a serem realizados aqui no Brasil. Dessa forma, o treinador avaliará os atletas simulando o mesmo clima da Rússia, ou seja, com torcida. A CBF poderia convidar equipes de qualidade e que ficaram de fora da Copa, como Itália, Holanda, Hungria, República Checa, Eslováquia, Estados Unidos, Irlanda, País de Gales, Equador, Chile, entre outras aptas para disputar interessantes amistosos com o escrete canarinho.

A posição de terceiro goleiro passa pelo mesmo problema de Ederson. Os convocados não foram avaliados devidamente. O atual dono da vaga é Cássio, goleirão do Corinthians, atual campeão brasileiro. “É homem de confiança do treinador”, dizem alguns comentaristas esportivos, o que não é uma “certeza” (as aspas são para recordar que Cássio já ficou na reserva quando Tite promoveu Walter como titular no time paulista).

O técnico já convocou alguns outros bons goleiros como Weverton (campeão olímpico, ex-Altético Paranaense e agora no Palmeiras), Diego Alves (Flamengo), Marcelo Grohe (ótimo goleiro do Grêmio e em grande fase), Danilo Fernandes (Internacional – pelo jeito com sugestão de Tafarel) e até o questionado Alex Muralha, em má fase e que, recentemente, foi emprestado pelo Flamengo ao Albirex Niigata, do Japão. Na época, Tite assim justificou o chamado: “Ele vem fazendo um grande campeonato, como já fez no Figueirense. São dois anos mantendo um padrão de atuação. Merece ser convocado. A fase do Flamengo ajuda. O jogo que vimos contra o Palmeiras, a defesa no lance decisivo com o Gabriel Jesus… Tudo isso conta”, admitiu na época, conforme descrito na matéria Tite explica convocação de Alex Muralha e admite: “Fase do Flamengo ajuda”, assinada por Edgard Maciel de Sá no globoesporte.com, em 16 de setembro de 2016.

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A última dúvida de Tite. Foto: Pedro Martins/Mowa Press.

Agora, retornaremos no tempo e também ao meu pedido. O titular na última Copa era Júlio César, que foi aposentado da seleção após o vexame contra a Alemanha. O segundo goleiro era Jefferson do Botafogo (RJ) que, após a Copa de 2014,  começou como titular no time de Dunga. Por azar, sofreu com contusões e, aos poucos, está ganhando confiança no regresso aos gramados.

O terceiro goleiro foi um sujeito esquecido por Dunga em 2010, e lembrado, com justiça, por Felipão em 2014. Junto com Fábio, goleiro do arquirrival Cruzeiro (que também merecia uma chance), ele permanece, com poucos questionamentos, como titular em seu clube. Ambos são tratados como milagreiros (ou santos) por seus torcedores. Uma idolatria pelo reconhecimento aos trabalhos prestados, ou mais, uma honra que poucos conseguiram e que nem Neymar ainda conquistou junto aos brasileiros.

Tite anda dizendo que as vagas (e as oportunidades) continuam em aberto. “Joguem muito. Coloquem pressão na cabeça do treinador. É um processo claro, limpo, transparente: botem pressão no técnico da seleção”, afirmou o técnico, conforme noticiado na matéria Tite abre portas e pede a não-convocados: “Botem pressão em mim!”, que é assinada pelo repórter Thiago Arantes do Yahoo Esportes, em 3 de dezembro de 2017.

Se os critérios anteriores forem seguidos, novidades ainda estão por acontecer. Tomara que o treinador não cometa os mesmos erros ou injustiças que alguns colegas fizeram no passado, quando atletas em grande fase foram cortados ou esquecidos das convocações para a Copa do Mundo. Só para citar alguns casos não tão distantes: Jorge Mendonça (1982), Renato Gaúcho (1986), Neto (1990), César Sampaio (1994), Romário (2002), Ronaldinho Gaúcho, Neymar e Paulo Henrique Ganso (2010), em tantos outros.

Também é importante relembrar que, devido ao curto tempo para montar a equipe, o nosso comandante resolveu aproveitar a base deixada por Dunga e Luiz Felipe Scolari. Sendo assim, por justiça e mérito, o guarda-metas Victor, titular do Clube Atlético Mineiro, merece uma chance não só nas próximas listas de convocados, mas – assim como os outros goleiros – de ser titular da Seleção Brasileira de Futebol em, pelo menos, um jogo. Os títulos de Corinthians (Brasileiro), Cruzeiro (Copa do Brasil) e Grêmio (Libertadores) são uma vantagem para os arqueiros dessas equipes, mas experiência de Victor poderá ser um trunfo para a conquista do hexacampeonato mundial. Agora, torço para Tite ler este artigo e atender ao meu pedido.

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Luciano Victor Barros Maluly

Graduado em Comunicaçao social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina (1995), Mestrado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1998), Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (2002), Pós-doutorado na Universidade do Minho em Portugal (2011) e Livre Docente pela ECA-USP (2016). Atua como professor e pesquisador na Universidade de São Paulo. Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em radiojornalismo e jornalismo esportivo. È autor do livro JORNALISMO ESPORTIVO - PRINCÍPIOS E TÉCNICAS (Editora do Autor, 2017)

Como citar

MALULY, Luciano Victor Barros. A última dúvida de Tite. Ludopédio, São Paulo, v. 104, n. 11, 2018.
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