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Uma mancha no manto

Felippe Guimarães 21 de outubro de 2020

Durante as últimas semanas, o Santos se viu no foco das manchetes de quase todos os jornais e páginas, esportivas ou não, pela pior razão desde sua fundação. A contratação do jogador Robinho, que fora anunciada no ultimo mês, é, pra mim e muitos santistas, o momento que mais me envergonhei de torcer e defender o Santos em toda minha vida. Nem depois do 7 a 1 contra o rival Corinthians em 2005, nem no 8 a 0 contra o Barcelona em 2013 e muito menos no 4 a 0 na final do mundial interclubes, também contra o time espanhol, eu senti vergonha de vestir o meu manto santista e sair de casa.

Robinho foi condenado em 2017 por estuprar uma mulher em um bar na Itália, enquanto ainda era jogador do Milan, a 9 anos de prisão, e isso não pareceu incomodar o presidente em exercício, Orlando Rollo, que assumiu o comando do alvinegro praiano após o processo de afastamento de José Carlos Peres no mês passado, e muito menos os dirigentes que fazem parte do conselho deliberativo do clube. Após o anúncio dessa lamentável contratação, a repercussão negativa nas redes sociais foi tão grande que chegou ao ponto de os patrocinadores do clube ameaçarem romper os acordos se Robinho atuasse pela equipe. Com isso, a diretoria resolveu recuar e suspender o contrato do jogador, para que, segundo nota emitida pelo clube, o mesmo pudesse “se concentrar exclusivamente na sua defesa” durante o julgamento, agora em segunda instância, que ocorre na Itália.

Robinho ao ser anunciado pelo Santos em 10 outubro de 2020. Foto: Santos FC/Divulgação.

Como santista, e também como ser humano, repudio veementemente a contratação de Robinho. É inadmissível o Santos querer dar apoio a uma pessoa com uma condenação dessas. Isso é uma ofensa sem tamanho a todas as mulheres do mundo e, principalmente, às que vestem e apoiam o manto alvinegro. É bem verdade também, que esse que aqui vos escreve não é mulher e, portanto, só consegue imaginar o tamanho do desgosto de uma ao ver uma contratação dessas.

Com isso tudo, levanto aqui um questionamento que não saiu dos meus pensamentos durante todas essas semanas: “como continuar torcendo pelo Santos com isso tudo? Da pra comemorar gol e vitória de um time com essa atitude?” O Santos está comigo desde meus primeiros meses de vida e ocupa, pelo menos, uns 15% de todos os meus dias, seja assistindo a jogos, lendo notícias ou o defendendo nas discussões com amigos. Por isso, cheguei à conclusão que seria impossível deixar de ser santista. E, justamente por continuar santista e não abandoná-lo jamais, que sempre cobrarei atitudes dos dirigentes que condizem com o que essa camisa defende e representa. A diretoria atual do SFC que tomou essa atitude deplorável deve ser repreendida e todos os santistas devem entender que isso é inteiramente culpa dela.

Robinho, ao ser anunciado, posa ao lado do presidente em exercício do Santos, Orlando Rollo. Foto: Santos FC/Divulgação.

Robinho é dado por muitos como um dos maiores ídolos do clube, foi ele que fez muitos santistas, eu inclusive, se apaixonarem por futebol lá em 2002 na conquista do Brasileirão. Ele também fez parte do grupo que brilhou em 2010 e encantou a todos que amam o esporte com seus dribles, golaços e dancinhas que retrataram muito bem o espírito moleque, “ousado e alegre” dos meninos da Vila, e isso não vai se apagar. Entretanto, hoje é impossível se alegrar com Robinho dentro de campo sabendo do que ele fez fora. Sabendo que tem uma mulher traumatizada e completamente afetada com o estupro coletivo do qual ele mesmo participou. Sabendo que ele, neste momento, é condenado na Itália e mesmo assim repousa na liberdade e na condição de ídolo.

Robinho, obrigado pelo que você fez em 2002, 2004 e 2010, você ajudou a me fazer santista, a me apaixonar pelo estilo de futebol ofensivo e alegre que você desempenhava em campo, mas hoje não posso dizer que você me representa como ídolo. Não posso dizer que tenho orgulho de ter contado cada pedalada em cima do Rogério quando eu tinha apenas 6 anos. Não posso ter orgulho em dizer que chorei de alegria na sua reapresentação acompanhado de Chorão na Vila. Não posso dizer que você me representa como santista. E diretoria atual do Santos, por favor, tomem atitudes condizentes com o tamanho desse time, antes que, porventura, todo esse sentimento que agora tenho por Robinho tome posse do meu manto que, no momento, fica apenas guardado na gaveta pela vergonha que me toma em vesti-lo ao sair de casa.


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Felippe Guimarães

Graduando em educação física, santista da gema desde 1996.

Como citar

GUIMARãES, Felippe. Uma mancha no manto. Ludopédio, São Paulo, v. 136, n. 48, 2020.
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