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Celso Unzelte

Equipe Ludopédio 1 de setembro de 2010

Louco por futebol, Celso Unzelte é antes de tudo mais um do “bando de loucos”. Jornalista e pesquisador, Celso é uma autoridade quando o Sport Club Corinthians Paulista está em debate. Nesta entrevista, Celso Unzelte conta um pouco sobre a sua formação como jornalista, seu trabalho como pesquisador e sobre sua paixão pelo Timão.

Celso Unzelte, jornalista esportivo, pesquisador e corinthiano.
Celso Unzelte, jornalista esportivo, pesquisador e corinthiano.

 

Primeira parte

Antes do jornalista e pesquisador, nasceu o Celso corintiano. Quais são as suas primeiras lembranças sobre o Corinthians? Você saberia dizer quando e porque começou a torcer pelo clube?

Houve um tempo em que eu não gostava de futebol, mas mesmo assim já era corintiano. Achava um jogo chato e comprido demais. Quando acabava, já era noite, o fim de semana havia chegado ao fim e o futebol já havia roubado toda a atenção do meu pai. Mesmo assim, nessa época, lembro de ir no fundo do quintal xingar quem estava soltando fogos quando o Corinthians perdeu para o Inter na final do Brasileiro de 76. Quanto às lembranças mais antigas, o Corinthians sempre esteve tão presente na minha casa que fica difícil precisar. Meu pai, hoje com 80 anos, é um corintiano fanático desde 1935 (ele aparece dando depoimentos no filme do Centenário do clube), come, bebe e respira Corinthians até hoje. Tenho fotos antigas minhas com adesivos do Corinthians nos meus brinquedos, até o pingüim da nossa geladeira (preto e branco, é claro) tinha o escudo do Corinthians no peito. Quando era pequeno, achava que aquele R de replay que aparecia no canto da televisão era R de Rivellino, de tão corintianos que éramos e somos lá em casa.


Quais as razões para a escolha do jornalismo como profissão? Conte um pouco sobre sua formação e trajetória jornalística, e o envolvimento com o jornalismo esportivo.

Eu na verdade queria ser desenhista de histórias em quadrinhos. Mas conforme o tempo foi passando, e eu percebendo que não havia uma carreira muito linear que me transformasse em desenhista, resolvi adaptar minhas aptidões a uma nova carreira. Sempre gostei de ler, escrever, me comunicar. Então a escolha do jornalismo acabou sendo natural. Fiz jornalismo nas FIAM, as Faculdades Integradas Alcântara Machado, pertencentes à FMU, de 1986 a 1989. Comecei também a cursar História na USP, mas tive que abandonar porque comecei a trabalhar como repórter. Costumo dizer que antes de correr atrás do esporte foi o esporte que sempre correu atrás de mim: já na faculdade, o professor de rádio, Márcio Bernardes, conhecido cronista esportivo, costumava distribuir pautas de assuntos diferentes para cada aluno. E sempre me dava esporte. Certa vez me apresentei para um estágio no extinto jornal Notícias Populares. Entre vários candidatos presentes, coube justamente a mim a pauta sobre esportes. Na Editora Abril, fiz o Curso Abril de Jornalismo na redação de Playboy, cujo diretor era Carlos Maranhão, que me recomendou ao Juca Kfouri, de Placar, para fazer… Esporte! Acho que era o destino, mesmo.


Como compreender a posição atual do jornalismo esportivo dentro do campo maior do Jornalismo, tendo em vista sua “condição marginal” desde seu início e, ao mesmo tempo, seu potencial de lucro e retorno financeiro para as mídias?

Acho que melhorou muito. Aliás, o nível do jornalismo esportivo melhorou muito, merecendo um respeito maior das outras editorias. Além do que, hoje, fazer esporte é também fazer economia, já que altas somas em dinheiro estão em jogo, e até polícia, como aconteceu no caso da parceria Corinthians-MSI.


Além de pesquisador do futebol e jornalista, você também é professor universitário na Casper Líbero. Como vincular o mundo do futebol ao trabalho acadêmico da universidade?

Um número cada vez maior de alunos escolhe jornalismo para fazer esporte, principalmente futebol. E eu acho isso ótimo, desde que eles não percam de vista duas coisas:

1) esporte é uma editoria como outra qualquer, tem que ser levada a sério, dentro dos mesmos princípios da pauta, apuração, redação e edição, que eu tanto prego em aula.

2) você pode até ter uma preferência por trabalhar com esporte, mas não pode vincular sua atividade no jornalismo única e exclusivamente a isso. Seria suicídio, em um mercado cada vez mais competitivo e restrito como o nosso.

Você é conhecido como um dos maiores conhecedores e pesquisadores da história corintiana. Quando e como surgiu a vontade de pesquisar e trabalhar com a memória do clube?

Em dois momentos. No primeiro deles, como torcedor, ainda criança, eu sempre ouvia expressões como “acaba de ser escrita mais uma bela página na história corintiana”, principalmente pelo rádio. E ficava me perguntando: que páginas são essas? Onde está esse livro? No segundo momento, eu já era jornalista e não conseguia dados relativamente simples para o meu trabalho, como o número de jogos e gols de Rivellino, que até campeão do mundo foi, pelo clube. Foi aí que decidi de vez organizar o Almanaque do Timão, mais por uma necessidade, mesmo.


Como funciona o seu trabalho de pesquisa? Quais são as suas metodologias e quais são as dificuldades encontradas?

A maior dificuldade é a falta de registros. Há alguns jogos do Corinthians na várzea, por exemplo, cujos resultados são desconhecidos até hoje, pois os jornais da época anunciavam a realização do jogo no dia e depois não voltavam mais ao assunto. Por isso, não posso me dar ao luxo de ficar escolhendo fontes. Qualquer registro, em jornal, revista, depoimentos é válido. Ultimamente, a tecnologia tem sido uma grande aliada. Utilizo muito como ferramenta o programa Excel, “vitaminado” por macros para cálculos elaboradas pelo meu grande amigo Gustavo Longhi de Carvalho, que também adora futebol e estatísticas.

Como você vê a relação entre memória e futebol no Brasil? Você acredita que é possível ajudar a construir a memória da sociedade brasileira através do futebol?

Se a memória do brasileiro já é fraca, imagine em temas populares como futebol ou o samba. Geralmente as pessoas envolvidas com isso no início do século passado não tinham condições de tirar fotos, por exemplo. Isso reduziu muito o número de registros. Mas é possível, sim, ajudar a construir a memória da nossa sociedade tendo o futebol como pano de fundo. Por exemplo: nas mais antigas imagens do Corinthians em movimento, de 1929, recentemente recuperadas para o filme do Centenário, pode-se ver ao fundo a inscrição “Broadway Melody”. Trata-se simplesmente de um dos primeiros musicais da história do cinema, exibido naquele ano no Brasil.

Como vê o trabalho dos clubes brasileiros em relação à valorização das suas memórias e de seus patrimônios culturais? Ou seja, como vê a preservação dessa memória?

Infelizmente ainda é praticamente nula. Costumo dizer que com o dinheiro de um mês de salário que eles pagam para muito perna de pau por aí nós montaríamos um belo departamento de história em qualquer clube, que ficaria para sempre.

Em sua opinião é possível mesclar a “memória afetiva” e a pesquisa acadêmica no tema futebol?

Não só é possível como isso tem sido feito com certa frequência. O livro Dias: a vida do maior jogador do São Paulo nos anos 1960, do jornalista Fábio Matos, surgiu de um trabalho de conclusão do curso de jornalismo orientado por mim na Cásper Líbero.

Confira a segunda parte da entrevista no dia 15 de setembro de 2010.

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