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Ronaldo Helal

Equipe Ludopédio 22 de julho de 2019

Há muito tempo queríamos entrevistar o professor Ronaldo Helal. Foram muitos anos de desencontro até que conseguimos realizar a entrevista por ocasião de um evento no Rio de Janeiro. O professor Helal nos recebeu em sua residência e logo avisou: “tenho uma reunião na Universidade e não vou poder ficar muito, mas vamos conversar”. Quando o papo é bom a gente não vê a hora passar, a tarde caiu no Rio e a chuva chegou e nós continuamos a conversa com ele. A sorte dos leitores e leitoras do Ludopédio é que o professor Helal falou por mais de quatro horas e a reunião ficou para outro dia. Mais do que uma conversa, Helal mostra na entrevista como a sua história se entrelaça não só com o futebol, mas como a Comunicação Social e inúmeras pessoas que cruzaram a sua trajetória. Boa leitura!

Professor Ronaldo Helal durante a entrevista. Foto: Equipe Ludopédio.

Quais são as suas primeiras lembranças do futebol na sua vida ?

Eu lembro muito vagamente de estar no estádio do Maracanã na final do Carioca em 1962, Flamengo perdeu de 3 x 0 para o Botafogo, eu estava na arquibancada com meu pai, lembro que o Garrincha pegava na bola e o pessoal falava “perigo perigo”, eu só lembro disso, não entendia nada do que estava acontecendo. Depois em 1963 eu estava na final e o Flamengo foi campeão, 0 x 0 contra o Fluminense e foi o maior público da história do Maracanã de partidas entre clubes. Teve um jogo da seleção brasileira contra a do Paraguai em 1969, pelas eliminatórias da Copa de 1970 que passou este público. Fla x Flu em 1967, se não me engano, teve 177 mil pagantes fora os não pagantes, foi um número muito expressivo e eu estava no Maracanã. E depois as lembranças foram aumentando e meu pai muito cedo se tornou dirigente de futebol em 1967. Meu pai tinha 36 anos e eu 11, aí eu passei convivendo nos bastidores, principalmente no Clube de Regatas do Flamengo. Na época mais amadora, as contratações eram feitas na casa do meu pai e os técnicos de futebol, Tim, por exemplo, um grande técnico, frequentou a minha casa bastante tempo. São lembranças mais fortes de personalidades exclusivas. E Doval, por exemplo, foi contratado lá em casa, ficou hospedado nas primeiras semanas, ele não quis ir para o hotel e eu lembro que a vizinhança ficava cercando a gente em casa. Depois tem toda a história da minha família com o Zico, não sei se vocês sabem, da importância, meu pai ficou amigo da família do Zico muito cedo e ele ajudou a manter ele no Flamengo, porque o Zico com 17 anos ia para o Vasco da Gama.

O Celio de Souza, que era o técnico do juvenil do Flamengo queria levar o Zico para fazer todo o trabalho que foi feito depois no Flamengo. Ele queria levar para o Vasco da Gama, aí o seu Antunes, pai do Zico, chegou para o meu pai e marcou uma reunião com o presidente do Flamengo e diretores. Na reunião eles acharam que o Zico era bom, mas não valia todo aquele trabalho, aí o seu Antunes, falecido pai do Zico saiu arrasado da reunião e meu pai falou “não, fica tranquilo com isso”.

O pai do Zico falou “mas o Flamengo não vai pagar”, mas meu pai tinha dinheiro na época, era dono de loja, eles quebraram depois de 1983, mas meu pai tinha muito dinheiro na época. Aí ele ajudou todo o trabalho que foi feito com o Zico de musculação, almoço e passagem de ônibus. Ele ficou tocando isso por seis anos sem o Zico saber, ele só foi saber em 1974, após o Flamengo ser campeão Carioca e aí quiseram armar uma relação cada vez mais estreita, meus pais foram padrinhos de casamento do Zico. Então, era comum ele na minha casa em festas de aniversário, estar Zico e Junior em casa era comum, e para mim era difícil conviver com o Zico. Ele um dia ficou sabendo disso porque um dia eu tive que falar para ele, era muito próximo, namorava a Sandra e eu namorava a minha primeira namorada e íamos para teatro e cinema juntos, mas o pessoal cercava achando que eu era irmão do Zico, aquela coisa né, e aí fim de semana a gente ia direto para casa quando não tinha jogo, e tinha um terraço e a gente tinha ping-pong a gente jogava e ele sempre ganhava da gente. Um dia eu falei para ele, mandei uma carta, já estava com meu doutorado em Sociologia em Nova Iorque em 1982 e o Flamengo ia fazer um jogo de despedida do Carlos Alberto Torres, do Cosmos, e o Flamengo foi convidado para o jogo. E aí meu pai foi assistir a delegação, eu fui ao treino do Flamengo, joguei uma pelada de dois toques com o time, quase fiz um gol (risos). Aí na hora de sair depois do jogo, foi 3×3 Flamengo e Cosmos, saiu eu, ele, Sócrates e o falecido Figueiredo. Aí eu fiz uma carta para ele explicando da dificuldade, queria que ele soubesse, aí meu irmão entregou a carta para ele, ele leu e ficou sabendo disso. Eu já comentei algumas vezes isso, mas eu acho que ele não tem muita dimensão ainda não, como era difícil e ainda é um contato com ele tão natural assim.

E em algum momento você quis ser jogador?

Olha, no início, quando eu era novo, sim. Na realidade, até os 13 anos eu era somente um peladeiro raçudo, não tinha bola perdida para mim. Eu comecei a ter uma certa habilidade depois dos 13 anos, mas eu sei que eu tinha deficiências com bolas mais altas, para cabeçada. Eu era bom com a bola no pé, eu era ponta direita, botava na corrida jogava para frente e cruzava. Teve uma vez um campeonato na Gávea de torcidas, eu não sei o nome, horrível, os filhos do Ivan Drumond junto com o do Jorge Ben Jor, eles fundaram a tal da Fla Tribuna, horrível esse nome (risos), eu joguei na ponta direita, joguei razoavelmente bem. O Luizinho que era jogador do América, eu tinha 19 anos, 18 ou 19, tentou convencer meu pai a me levar para o América, mas eu fiquei pensando e vi que não era uma vida para mim não, é uma vida de muita renúncia. Nas poucas peladas que eu joguei com jogadores, você pode pegar um jogador horrível e colocar para jogar pelada com a gente, o chute deles é mais forte e tem mais explosão. Eu sempre gostei muito de estudar também, fiz duas faculdades, fiquei muito em dúvida entre jornalismo e sociologia, eu gostava de estudar, mas achava que ia ser jornalista. A vida foi me levando para o meio acadêmico, eu fui para fora e não fui eu que escolhi fazer a docência, a docência que me escolheu. Eu queria ser um grande jornalista, fui para a docência, estou há mais de 32 anos nisso e adoro ser docente.

No caminho para a universidade, esse interesse vai ser despertado só na Pós-Graduação ou já na Graduação?

Eu fiz duas graduações ao mesmo tempo. Eu fazia Ciências Sociais no IFCS, Instituto de Filosofia e Ciência Sociais da Federal, anos difíceis, eu entrei em 1976, início da abertura, a polícia entrava na porta, tinha casos de colegas que tinham sido torturados. Em 1978, na abertura, começou um pouco mais de festa. Darcy Ribeiro voltou, disse que a gente estava brincando de esquerda, disse que a gente não sabia o que é ser de esquerda, perguntou o que a gente tinha vivido. Eu fazia Comunicação Social de noite na PUC-RJ. Como eu estava um ano adiantado em Ciências Sociais, eu tinha isenções em todas as disciplinas teóricas no curso de Comunicação da PUC. Eu me lembro de ter duas disciplinas do professor Everardo Rocha, que é meu amigo até hoje. Ele oferecia a disciplina Fundamentos Científicos da Comunicação e no trabalho final ele aceitou que eu escrevesse alguma coisa sobre a simbologia do futebol. Eu tinha lido um texto que não era muito acadêmico, mas era um bom texto, do Anatol Rosenfeld, Futebol no Brasil. Tinha um texto muito bom do José Carlos Rodrigues, o Rei do Rito. No livro “O monopólio da fala”, de Muniz Sodré, o último capítulo sobre futebol, teatro e televisão é o capítulo menos apocalíptico de todo o livro, fala que a torcida era ativa no espetáculo. Depois eu tomei conhecimento da dissertação da Simoni Guedes e logo depois a dissertação de mestrado do Ricardo Benzaquem de Araújo. Fui ler o Gilberto Freyre, e descobri o texto “Football Mulato” do Gilberto Freyre, um dos maiores cientistas sociais do Brasil até hoje. E a Simoni Guedes continuou trabalhando no Universo do Futebol, organizado por Roberto DaMatta em 1982. Naquela época não havia muita coisa de esporte. Eu tinha as duas faculdades, aí fiquei um ano e meio trabalhando em um jornal que nem existe mais, no bairro de Jacarepaguá que era muito mais longe do que é hoje para a gente. Eu trabalhei ali durante um ano e meio e não gostei. Comecei a sentir uma saudade enorme de estudar e eu tinha uma vontade muito forte de estudar fora do Brasil. Antes eu tinha estado em Nova Iorque em 1980, em julho. Cheguei a pensar nesse período em fazer mestrado na USP com Fernando Henrique Cardoso. Mas eu tinha o desafio de querer morar fora. Fiz tudo, preenchi todos os formulários para duas universidades: a New School for Social Research e a New York University. A Universidade de Nova Iorque respondeu falando da possibilidade de bolsa, aí eu falei, vou, o caminho é esse. Saí do Brasil dia 31/05/82, cheguei em Nova Iorque no dia 01/06. O Flamengo tinha acabado de ser bicampeão Brasileiro contra o Grêmio. Lembro que na primeira partida o Flamengo empatou 1 x 1 com um gol do Zico no final da partida, e lá foi 0 x 0 e eu fui para Porto Alegre. Aí houve uma terceira partida e o Flamengo foi campeão com um gol do Nunes.

Viajei para Nova Iorque, mas eu não sei se tinha ideia do que eu ia fazer da minha vida, eu sabia que queria estudar, fazer as disciplinas, e do mestrado fiquei para o doutorado. Antigamente no Brasil você demorava anos para terminar o mestrado, não tinha prazo, hoje é aquela coisa de 24 meses. Quando eu fui para Nova Iorque já era assim, então eu já peguei um modelo que acabamos copiando também. Então eu fui para ficar dois anos, mas aí eu fui gostando, gostei muito de Nova Iorque, da cidade. Para mim foi importante porque eu saí do Brasil muito tragado pelas ideias marxistas da época. Eu fui para a capital do consumo do capitalismo e simplesmente amei. Claro, Nova Iorque não é bem uma cidade norte-americana, é uma cidade que tem imigrantes. Gostei muito da cidade, fui ficando e ficando, comecei já no doutorado a tomar conhecimento da Sociologia do Esporte nos Estados Unidos, uma disciplina consolidada por lá naqueles tempos. Não tinha no meu Departamento, mas tinha em outras universidades, tinha no Departamento de Filosofia, eu cheguei a ser ouvinte dessa disciplina, Filosofia do Esporte. Fui a um congresso em Boston, conheci um cara que era especialista em hooliganismo, acho que é Yan Taylor. Eu comecei a tomar conhecimento do assunto. Antes de fazer a tese do doutorado você tem que ter uma qualificação, mas é uma qualificação que você escolhe três áreas de atuação, uma lista de leitura para cada área, três questões em cada área e você vai para a qualificação e eles podem fazer qualquer pergunta dentro daquilo que você colocou ali. Eu falei, caramba, o que eu vou fazer no Brasil com doutorado em Sociologia? Eu era um cara que tinha pânico de falar em público. Para participar de um seminário no qual eu tinha que falar, era um sofrimento de dois meses com antecedência. Falei, cara, eu vou dar aula e vou vencer esse desafio, eu vou fazer um exame oral, muitos faziam escrito e eu falei não, vou fazer o exame oral. Nunca mais esqueci que eu cheguei e dei uma travada. Eu acordei 5 horas da manhã e não consegui mais pegar no sono. Eram 10 horas quando eu cheguei lá e dei uma travada legal. Não sei se foi 1 min ou 2, nem me lembro mas eu acho que a banca tentou me tranquilizar. Hoje eu estou do lado de cá e eu sei como é. Eu dei uma abaixada na cabeça e aí de repente comecei a falar, fui bem e aprovado com louvor, na qualificação. Pensei em fazer a tese de doutorado e continuar lá, fazer algo ligado a poder, mas minha outra namorada, que eu acabei conhecendo lá em Nova Iorque, quis voltar para o Brasil e, por isso, também voltei. Então, o tema da tese tem a ver com a minha história familiar, do meu pai como dirigente esportivo. Decidi pesquisar a tão falada “crise do futebol brasileiro”. O título da tese foi a crise do futebol brasileiro como um problema sociológico. Eu estava pegando todo aquele embate que tinha acontecido: queda de público, êxodo de jogadores, a imprensa sempre reclamando. Alguns mais progressistas, como João Saldanha, diziam que o futebol era o último reduto​ da ala reacionária no Brasil. A minha tese, que depois virou livro, trata muito de organização esportiva e é ligada ao campo da comunicação. Como eu tinha graduação também em Comunicação eu fui fazendo a junção de mídia e campo esportivo. Quando eu voltei para o Brasil, minha vida ficou um caos, eu terminei com a minha namorada e conheci minha atual esposa. E no meio disso tudo, hoje acho até que ajudou, mas não aconselho ninguém a fazer, eu escrevi um livro, onde eu coloquei muitas das coisas que vinham da Sociologia do Esporte dos Estados Unidos. No momento em que o Brasil falava muito em escassez de trabalhos acadêmicos sobre futebol, era comum você começar um texto falando do descaso da Ciências Sociais, do preconceito, era uma coisa muito comum o tema no Brasil, mas acho que me ajudou, porque hoje vejo que eu consegui juntar no livro as minhas ideias de mídia e esporte.

Em 1992 eu recebi uma carta da Universidade, dizendo que eu estava expulso do programa porque eu  tinha estourado o prazo que eram 10 anos desde o momento em que eu entrei em 1982. Aí pensei, cara, o que eu vou fazer? E tinham dois doutores na Faculdade de Comunicação, era o Everardo Rocha e o Eduardo Neiva. Mas eu falei, não, não vou nadar, nadar e morrer na praia. Peguei o telefone e liguei para o meu orientador. Ele então me falou: “olha, você vai ter que fazer uma carta justificando e eu vou levá-la para o Conselho Departamental, ele deve referendar, mas só tem um probleminha, você vai ter que voltar a pagar as taxas de reingresso” que eram uns 500 dólares. Disse, tudo bem, eu pago. E aí eles vão te dar um novo prazo. Me deram um prazo para maio de 1994, eu defendi antes, no dia 28 de fevereiro de 1994. Minha mulher estava grávida do primeiro filho. Depois disso montei um projeto integrado de pesquisa com a professora Maria Claudia Coelho, que trabalhava com objeto da fama, dava aula na Comunicação da PUC junto comigo. Fiquei um tempão dando aula na PUC e na UERJ, e aí ela foi para a UERJ também. Montamos um projeto que integrava o meu projeto com o da Maria Claudia, os dois ligados com idolatria. Além da bolsa de pesquisa que a gente recebeu, fomos agraciados com três PIBICs ou iniciação científica e duas bolsas de aperfeiçoamento. Desses, dois bolsistas colocaram o texto em inglês para português. Para virar livro eu cortei um monte de coisa, porque tese é sempre muito chata, e claro, eu fiz uma tese para os americanos, tem coisa que eu não precisava detalhar para os brasileiros. Depois disso a história começou. Em 1996, a UERJ entrou com o programa intitulado Pro-Ciência, que era a dedicação exclusiva, então tive que largar a PUC e, em 1997, eu fundei com o Hugo Lovisolo, das Ciências Sociais da UERJ, o grupo que tem até hoje, o Esporte e Cultura, que foi cadastrado no CNPQ em 1998. Tem um aluno que me lembrou, que estava fazendo 21 anos, desde que está cadastrado, 21 anos de grupo. Tem um artigo do Wilson Bueno sobre grupos de pesquisa em comunicação e esporte no Brasil que aponta o nosso grupo como o mais antigo na área de comunicação. O artigo é de 2011, deve ser até hoje, não sei, o Bueno dizia que o nosso grupo era o que tinha maior número de produção para o número de pesquisadores, é um grupo muito produtivo. O grupo de pesquisa ganhou em 2010 um blog, graças ao Fausto Amaro, que era meu bolsista de iniciação científica na época, que é o Comunicação, Esporte e Cultura. Em 2013, no final deste ano, conquistamos o edital universal do CNPq que ajudou a montar o LEME, o Laboratório de Estudos em Mídia e Esporte. O LEME foi montado com a ajuda valiosa do Fausto Amaro, meu mestrando na época, e do Filipe Mostaro, outro mestrando. Hoje os dois já são doutores e foram orientados por mim. Sou muito grato a eles. Fizemos um documentário, organizamos três seminários. Conquistamos o auxílio da FAPERJ para realizar em 2014 depois da Copa e publicamos o livro, eu e o Édison Gastaldo, que saiu ano retrasado, em 2017, intitulado Copa do Mundo 2014: futebol, mídia e identidades nacionais. Eu sempre falo que a minha equipe e meus alunos são quem sempre me mantém muito motivado. Porque às vezes eu tenho vontade de puxar o freio, mas eles me levam para frente, eu digo que não estou aguentando mais, mas eles falam, vamos fazer isso e tal. De vez em quando passa pela minha cabeça aposentadoria, até voltaria a dar aula se fosse na PUC porque é do lado da minha casa e a UERJ é mais longe. Eu adoro a UERJ, tenho uma história longa com a UERJ. Uma das marcas do nosso Programa de Pós-Graduação em Comunicação são as minhas pesquisas na área de mídia e esporte, então eu queria passar isso para alguém. Já falei isso para a professora Leda Maria da Costa, que ela está com a bola da vez, que eu vou poder sair um dia tranquilo sabendo que as coisas vão continuar. Leda tem me ajudado muito. É uma pesquisadora de ponta, antenada com as pesquisas da área.

32 anos depois, ou até mais, continuamos com a crise no futebol brasileiro ou são outras crises?

São outras crises. Eu me lembro que teve uma hora na defesa, que um professor me fez uma pergunta muito interessante que me fez pensar muito. Ele falou assim. “Define crise para mim, o que é crise?”. Eu disse que crise é um processo que vai levar a alguma coisa. Pois é, se está dizendo que o futebol está em crise nesse período todo, se a crise é uma constante, então não tem crise, faz parte ter crise. E isso me fez pensar. Ele não estava sendo contra, ele queria pensar junto comigo essa questão. De fato, a queda de público nos campeonatos regional e brasileiro existia. Só que era muito mais dramatizada na imprensa do que nos dados que eu tinha coletado. Claro, hoje tem muito mais por que os estádios encolheram. Eu fiz algumas entrevistas importantes naquela época, entrevistei jornalistas, entrevistei Juca Kfouri e anos depois foi ele quem me entrevistou algumas vezes. Ficamos amigos. A gente esteve ano retrasado no Conversa com Bial. Eu estava lançando meu livro e ele estava lançando o dele. A gente esteve junto. Entrevistei Sandro Moreira e João Saldanha, ele já estava muito doente, tossia muito, apoiava no meu braço. Ele demorou a aceitar a entrevista dizendo que estava com o tempo meio curto, eu levei uma fita cassete e foram 3 horas e tanto de entrevista, Eu tinha um caderninho e eu fui anotando tudo, porque foi um papo maravilhoso com o João Saldanha. E o Sandro Moreira falou uma coisa profética e na época eu achei que ele estava senil. Ele falou que essa coisa de estádio de 100 mil pessoas estava com os dias acabados, tudo isso iria acabar. Os estádios vão ter entre 40 e 60 mil pessoas e o restante do público que vai hoje aos estádios, vai assistir as partidas pela televisão. E ele acertou. Você vê que o Maracanã tem a capacidade máxima de 78 mil. Eu fico indignado, Flamengo na final da Copa do Brasil e eles colocam 62 mil ingressos à venda. Fica aquele espaço grande, buracão. Aí você pergunta o que é isso e falam que a polícia diz que não pode. Como não pode se antigamente eram mais de 100 mil? De fato, os estádios ficaram bem menores nesse sentido. Entrevistei o Márcio Braga e o Carlos Miguel Aidar, o presidente do Palmeiras, o Ricardo Teixeira da CBF, o presidente da Federação Paulista de Futebol, esqueci o nome dele, acho que é Farah. Entrevistei aqui o presidente da Federação Carioca, o Eduardo Viana. O fato é que quando eu voltei de Nova Iorque, no final de 1986,  aconteceu um episódio interessante, pois em 1987, quando fiz a minha pesquisa de material de jornal, eu peguei O Globo e o Jornal do Brasil, o campeonato de 1986 não tinha terminado em 1986. Você nunca sabia se o brasileiro iria ser no primeiro ou segundo semestre ou os regionais, que tinham uma importância muito maior do que tem hoje em dia. Então em 1986, que era para terminar em 1986, ampliaram para terminar em fevereiro de 1987. Só que os clubes do RJ, SP e MG estavam no Campeonato Brasileiro e não queriam disputar os regionais, não queriam fazer as coisas paralelamente. Criou-se uma confusão. Em abril, o então presidente da CBF, declarou que a CBF não tinha condições financeiras para organizar o campeonato de 1987. O Carlos Miguel Aidar – não sei se foi dele a ideia, mas aparece assim nos jornais – convida o Márcio Braga para liderar o movimento dos grandes clubes do Brasil. E por que os 13? Eram os 12 que todo mundo sabe quem são, não precisa ficar explicando, são os 12 até hoje. E o décimo terceiro do Nordeste, o Bahia. A imprensa, pelo menos da região Sudeste e pelo menos no Jornal do Brasil e O Globo, apoiou o campeonato, dizendo que era uma coisa legítima, que os 13 tinham legitimidade, com mais índice de jogador indo para a seleção, que tinham as maiores torcidas etc. Só que tinha um problema jurídico. A imprensa apoiava, mas os 13 sabiam que se eles colocassem o campeonato em prática, os jogadores teriam passe livre. Ficou uma luta até dia 4 ou 5 de setembro. Em cima da hora foi noticiado o acordo da CBF com os 13 e iam ter mais 3. Bom, foi um sucesso o campeonato na época, lembro que teve alguns probleminhas, a Coca-Cola patrocinou, mas o Flamengo não quis entrar em um acordo com a Coca-Cola. Em 1991, quando eu casei e fui passar a lua de mel em Nova Iorque, em uma dessa minhas andanças em algum lugar eu encontrei um livro de histórias do Campeonato Brasileiro. Sobre o campeão em 1987, estava Sport, com a fonte CBF. Eu voltei para o Brasil e fui pesquisar na CBF e estava lá: Sport. Quando eu entrevistei o Márcio Braga em 1992, depois que estenderam meu prazo para a defesa, ele falou assim: “liga não meu filho, todo mundo sabe que é o Flamengo. Aí eu falei: “não Márcio, está escrito em documento da CBF que o Sport é o campeão”. Ele repetiu: “não adianta, todo mundo sabe, ninguém está contestando isso”. De fato, ninguém estava contestando. Mas eu pressentia que isto ainda iria gerar confusão. A crise hoje é um pouco diferente porque naquela época a gente tinha um problema mais sério, era uma desorganização muito grande. Nós não temos mais isso, não no Brasileirão. Ele é um campeonato que quando começa, você sabe que no dia 27 de outubro, por exemplo, vai ter o jogo tal. Antigamente, se você pesquisar um pouco, você deve saber que as rodadas eram feitas rodada a rodada.

Helal é professor da Faculdade de Comunicação Social da UERJ. Foto: Equipe Ludopédio.

Depois de voltar dos EUA, você foi para a Argentina e para a França. Como essas experiências se aproximam e se diferenciam?

Às vezes eu fico em dúvida: se eu utilizo o futebol para entender as culturas, a do Brasil, por exemplo, ou se é para entender o futebol como fim em si mesmo. Roberto DaMatta estudou o carnaval para o entender o Brasil. Às vezes acho que faço isso, às vezes acho que não. Nesse caso com a Argentina foi muito mais para entender as relações. E como é que começou? Conheci Pablo Alabarces no Congresso da Intercom em 1998. O Pablo estava lá com meu livro e na hora que ele foi falar, ele saca o livro e fala que quando veio ao Brasil o primeiro livro que ele tinha achado que falava de esportes era o meu livro. Saímos e fomos para a casa de Hugo Lovisolo – eu, Pablo e Antonio Jorge Soares – para fazer parte do grupo que ele havia montado sobre desporto e sociedade. E o Pablo começou a ir aos nossos congressos. Jairo Vieira e eu tínhamos fundado um grupo de Esporte, Política e Cultura na ANPOCS, que é o congresso mais importante em Ciências Sociais no Brasil. Em 2003, o Eduardo Archetti foi também – ele faleceu prematuramente em 2005, uma perda grande para o campo. Após ver o Pablo e o Archetti, comecei a ler as coisas que eles escreviam. Quando eles falavam da fundação simbólica do futebol argentino, eu notava muita semelhança com o Brasil. No final de 2003 em outubro, eu passei 5 ou 6 dias na Argentina com a minha esposa, e achei o Buenos Aires uma cidade encantadora. Minha mulher nunca tinha estado lá. Quando eu voltei eu estava lá na ANPOCS com o Pablo Alabarces tomando uma caipirinha no Hotel Glória de Caxambu, que é onde costuma ser realizada a ANPOCS. Eu falei para ele que a cidade dele era maravilhosa e que queria fazer um Pós-Doc lá. Ele perguntava se eu estava falando sério. Eu disse que não. Aí ele me disse que era o pró-reitor de Pós-Graduação e Pesquisa da Universidade de Buenos Aires e me disse o que tinha que fazer para eu fazer um pós-doutorado lá. Eu disse que não sabia e que ia ver ainda. Aí quando eu voltei eu vi que ele precisava só aceitar o projeto. Então, eu tinha que ter o projeto, comecei o projeto que estava mais ou menos na minha cabeça. Só que tinha uma coisa que eu quase desisti, eu tinha que passar em uma prova de espanhol na casa da Espanha, que é uma prova que eles fazem para o mundo inteiro naquela mesma data e a próxima data que podia fazer era dia 27 de agosto de 2004. Comecei a pensar, vou fazer o projeto e vou entrar no curso de espanhol aqui perto. Aí chegou em julho, bem na época das férias da UERJ, estudei, contratei um professor para dar aulas particulares duas vezes por semana e eu estudava todos os dias. Fiz e passei na prova, tudo isso em novembro de 2004. Em 2005 estava lá em Buenos Aires e a ideia era trabalhar com as Copas do Mundo. A Copa do Mundo é o momento mais emblemático para discutir. Eu pegava as Copas de 1970 até 2002. Como eu estava lá em 2006, acabei fazendo sobre a Copa de 2006 também. Pegava o El Gráfico e o Clarín. Depois eu tirei o El Gráfico e coloquei o Olé a partir de 1998. E eu tinha percebido que estaria lá no momento em que ia ter Brasil e Argentina nas eliminatórias. Eu fiquei sabendo quando já estava perto do jogo. Eu falei “caramba, vai ter Brasil e Argentina aqui”. Eu fiz sociologia 24 horas por dia e fiz observação o tempo todo, observava tudo. A primeira coisa que me chamou a atenção foi o humor argentino. O humor é mais irônico, mais ácido que o nosso, não sabe se está brincando ou não. No primeiro dia que eu cheguei fui pegar um táxi. O taxista perguntou se eu estava fazendo turismo. Falei “não, vou morar aqui um ano”, e acabei ficando quase dois anos. E ele falou: “mas você vai fazer o que nesse país de bosta, essa porcaria?”. Começou a falar mal da Argentina. Na Argentina eu percebi o seguinte. O Brasil estava na moda, as pessoas usavam sandálias havaianas com a bandeirinha do Brasil. Naquele momento eu não imaginava a gente usando uma peça do vestuário com a bandeirinha da Argentina. Lembro que tinha um programa de humor na Rede Globo que todo sábado tinha um argentino sendo tripudiado. Todo sábado tinha piada contra argentino. Eu via em campos de pelada, enquanto eu ia procurar apartamento, muitas pessoas com as camisas do Rivaldo, Ronaldo, Romário nas costas, e eu achava que eram brasileiros, mas chegava perto e eram argentinos mesmo. Comecei a conversar sobre isso com o Pablo e ele dizia: “não, você vai descobrir outras coisas”. Quando eu comecei minha pesquisa sobre a Copa de 1970, que a Argentina não foi porque tinha sido eliminada pelo Peru do técnico brasileiro Didi, mas que ainda tinha três sul-americanos – Uruguai, Brasil e o Peru – eu sentia que os jornais estavam meio inclinados para os clubes sul-americanos, um pouquinho mais para Brasil e Uruguai, menos para o Peru. Até porque também tinha menos importância.

Quando o Brasil ia jogar com o Uruguai, houve um momento que eu pesquisei que era verdade, e eu nunca tinha ouvido falar nisso, que o Brasil foi beneficiado naquela partida com o Uruguai. Não era para jogar em Guadalajara. Ele tinha que jogar em Puebla. Mas Guadalajara tinha uma vantagem enorme, não só porque a torcida era toda do Brasil, como o Brasil estava muito aclimatado na altitude, lá ficou dois meses antes treinando. Os uruguaios chiaram horrores e os noticiários argentinos anunciaram isso. Os noticiários estavam comprando a briga dos uruguaios. Quando o Brasil ganha do Uruguai ele vai para a final com a Itália, o que eu imagino? Eles vão tender a torcer para a Itália. Tem momentos que os dois correspondentes falavam assim: deixaram de ser objetivos e neutros e passamos a torcer abertamente para o Brasil. Percebi que a seleção de 1970 passou a ser o paradigma, uma referência do futebol. Acho que não é só na Argentina. Todo mundo fala daquela seleção como modelo de bom futebol. Comecei a elaborar categorias: Brasil, não se parece com Brasil e Brasil é sempre Brasil. Brasil não se parece com Brasil não era uma categoria de regozijo, é de lamento mesmo, de que o Brasil não estava jogando do jeito que era esperado.  Em 1978, na Copa da Argentina, o Brasil fez as duas primeiras partidas, empatou os dois primeiro jogos. Um jornalista muito famoso fala assim: é uma pena ver esse Brasil que não se parece com o Brasil. Estava sentindo falta! A Copa é na Argentina e o jornalista estava sentido falta de ver o Brasil jogando igual a 1970. Em 1982, quando a seleção é eliminada pela Itália, eu lembro que o Clarín começa assim: “O Brasil perde para Itália, agora vamos dizer que o futebol brasileiro não faz nada? Não, nós continuamos com a mesma ideia, melhor futebol do mundo”. A adoração pelo nosso futebol era muito explícita. Em toda rivalidade tem muita admiração. Desde a Grécia Antiga, gregos e troianos. Outra coisa que eu descobri: Pelé era colunista do Clarín em 78, 82, 86, 90: “Vamos ter a honra de mais uma vez ter o Pelé como nosso colunista”. Não tinha comparação. A comparação era Maradona e Zico em 1982 e 1986.

O material de pesquisa me chamou a atenção para outras coisas, que são coisas de pesquisa de campo. A importância do Maradona na Argentina. Eu via o Maradona nos jornais junto com Che Guevara. Uma vez entrei na livraria Prometeo, que é uma livraria “cabeça” de livros de ciências sociais, e tinha uma foto do Borges, outra do Cortázar e outra do Maradona. O Maradona tem uma presença muito forte naquela sociedade. Acho muito emblemático a maneira como a Argentina ganhou em 1986 depois da Guerra das Malvinas. Depois esse material foi crescendo, Pablo Seman e Alejandro Grimson, da Universidade de San Martin, souberam da minha pesquisa, me chamaram pra participar do grupo de estudos deles, e me perguntaram se era possível eu cruzar o meu material com o mesmo período aqui no Brasil. Thiago Bartholo, que era orientando do Antonio Jorge Soares, foi quem me ajudou com esse material. Participei com as minhas análises do Grupo de Estudos do Seman e do Grimson, que publicou um livro e pediu para eu escrever um artigo da pesquisa que eu fiz na Argentina, sobre a relação futebolística entre Brasil e Argentina. Um pouco antes, tinha acontecido uma partida entre Quilmes e São Paulo, e o jogador do Quilmes, Desábato saiu algemado do campo sobre acusação de racismo contra o Grafite do São Paulo. Na ocasião, eu pesquisei o assunto e observei que a acusação não tinha muito fundamento e fui conversar com Pablo Alabarces, que defendia com veemência a prisão do Desábato. Até que em um momento, Pablo disse uma frase emblemática que atravessou minha pesquisa:

“A verdade é que os brasileiros amam odiar os argentinos e os argentinos odeiam amar os brasileiros”.

Teve Brasil e Argentina, em junho de 2005, pelas eliminatórias da Copa de 2006, eu coletei o material dos três jornais – La Nación, Clarín e Olé – e fui ao jogo. No estádio, não pude perceber muita coisa para a pesquisa porque me colocaram do lado dos brasileiros. Nós não conseguimos entender o que eles estavam cantando, porque os brasileiros ficavam gritando “pentacampeão”. Depois o Pablo Semán me disse que tem uma música que se canta muito na Argentina entre as torcidas do futebol e que eles vão adaptando ao adversário. “Agora todos sabem que o Brasil está de luto, são todos negros, são todos putos”. A questão racial começou a me chamar a atenção depois que a Argentina ganhou da gente de 3 a 1. Antes do jogo eu fui pegar o material e eu comecei a perceber que os argentinos nessa partida estavam mudando a identidade por causa do Brasil. Na minha análise, eles estavam me dizendo que tinha que ter uma boa aplicação de volantes, uma boa aplicação de tática para conter a habilidade dos profissionais do jogo bonito, sempre escrito em português, e eles falam “jogo bonito” o tempo todo. E o Ronaldinho era o cara, todo mundo encantado, Maradona foi até a concentração para falar com Ronaldinho. Os três jornais colocaram na primeira página “o melhor da história com o melhor de hoje”. O diário Olé, um ou dois dias após essa partida, mostrava o time da Argentina com os 11 jogadores, todos eles meio que maquiados de preto, os lábios mais grossos e escrito “jogo bonito” em português. Pensei, como vou interpretar isso? Minha mulher “pô, isso é racismo”. Será que é? Acho que tem mais haver com estereótipo, pois aquela seleção tinha dois brancos, teve uma hora que eles saíram e ficaram todos mestiços na seleção. Mandei para o Fernando Andacht, grande sociólogo, especializado em semiótica, que eu tinha conhecido nos congressos no Brasil. Falei para ele dar uma analisada e ele disse que não via racismo ali, que havia um estereótipo de que os brasileiros são os profissionais do jogo bonito, mas que quem jogava bonito eram os negros brasileiros. Então tinha uma coisa de admiração mais ou menos explícita. 21 dias depois, para minha sorte, teve outra partida entre as duas seleções. Foi pela final da Copa das Confederações, na Alemanha. A seleção brasileira venceu por 4 a 1. Lembro que os jornais estavam muito encantados com o Brasil. Lembro que as matérias do Brasil diziam que eles estavam colocando pressão na gente. Eles falam aquilo acreditando nisso. Quando você olha o outro e o outro é uma nação, o que você faz: homogeneiza esse outro. Quando você homogeneiza, trabalha com os estereótipos. Os argentinos, quando olham para a gente, eles fazem isso, mas nessa homogeneização dos brasileiros, os atributos são mais positivos. As piadas que o Pablo Alabarces me contava sobre os brasileiros não tinham graça nenhuma, eram positivas. Brasileiro mesmo com problema financeiro está sempre sorrindo e de bem com a vida; e o argentino todo cheio da grana, mas sempre dizendo que a vida está mais ou menos. Pablo só me contou algumas piadas após eu insistir muito. Observemos que a letra de samba é tão triste quanto as de tango, o ritmo pode ser mais alegre, mas as letras do samba são tristes, mas fica na memória a alegria. Então, quando eu cruzei para ver como que os argentinos olham, eu não vi um modelo de melhor futebol como tinha na seleção de 70. Eu via o Maradona englobando toda a narrativa de 1986 e 1990. Inclusive tem uma coluna, acho que é do Sandro Moreira, que fala assim: “estou chorando, Maradona me fez voltar a gostar do futebol”. Eu percebi os estereótipos: catimba, por exemplo, tem uma coisa moral, quando a gente faz é malandragem. Fiz amizade com o Walter Vargas, que era um dos colunistas do Olé. Ele me contou que, por conta de sua coluna no Olé, tem uma coisa engraçada. Ele recebia muitos e-mails malcriados de brasileiros. Um dia perguntei se ele podia me mandar alguns desses e-mails. Fiquei com vergonha. O cara xinga a mãe dele, disse que vai estuprar a filha dele, é de uma agressividade muito forte. Eu peguei o telefone e pedi desculpa para ele, que gentilmente me disse que sabia que aqueles e-mails não representavam os brasileiros, que “boludos” existiam em todo país do mundo. Ele me disse que teve uma vez que ele ficou com vontade de responder a um e-mail, chegou a escrever, mas não respondeu. Se você me perguntar se eu manteria as conclusões da pesquisa de 2006 para hoje a resposta é não. Eu acho que houve uma mudança que os argentinos, por conta da internet, começaram a ter mais ciência de que a gente torcia contra eles e eles começaram a revidar, o que é natural. Eu me lembro que em 2006, quando a Argentina foi eliminada pela Alemanha, todos os jornais brasileiros se regozijaram falando da derrota da Argentina. Eu falava e ninguém acreditava que era assim, acho que não tinham ciência. Acho que mudou. Quando a Inglaterra perde, o buzinaço é muito grande, não só na hora do gol, mas quando termina o jogo tem um buzinaço de 15 segundos.

Em 2014 os argentinos invadem Copacabana, 80 mil. Gente, é normal que você cresça quando está no território do vizinho, ainda mais em um lugar tão emblemático como Copacabana. Aquela música cantada, são muito criativos. Os brasileiros começaram a ficar ofendidos, não sabem brincar. Relações jocosas são próprias do universo esportivo. Minha preocupação hoje em dia é disso virar relação de intolerância, como qualquer torcida de futebol também. Tem gente que o time nem está jogando e está lá secando o Flamengo. Eu nunca vi uma briga em restaurante e bares que transmitem as partidas do Flamengo. Porém, quando se briga é notícia, eu vejo gozações. Não brigo com ninguém porque acho uma bobagem. Eu tenho um sogro que odeia o Flamengo, o primeiro time dele é anti-Flamengo e o segundo time é Vasco. Eu nem respondo porque acho uma bobagem, parece adolescente de 15 anos.

Essa pesquisa na Argentina foi muito legal. Depois eu atualizei um artigo que eu fiz junto com Álvaro do Cabo com material de 2006, com as coisas que eu fui pegando de 2010 a 2014, preocupado com essas relações de intolerância. Em 2010, tinha umas coisas que o Maradona falava, que saía aqui e eu ia ver o que ele tinha falado, e os nossos jornais interpretam tudo errado. “Maradona critica o Brasil”. Não estão criticando o Brasil, estão falando o que nós estamos falando também.

O Olé tem uma linha editorial de deboche explícito e localmente eles são assim. A importância que nós damos para o Olé é muito engraçada. O Olé colocou assim, online, após a partida entre Brasil e Colômbia na Copa de 2014: “E seguem chorando”. E saiu no Jornal Nacional falando isso.

Meu irmão ligava e falava que eu estava defendendo a Argentina e eu dizia que não estava defendendo. Logo depois, quando se constatou que a lesão de Neymar era grave e o atleta estava fora da Copa, o jornal corrigiu: e é para chorar. E o texto lamenta a ausência de uma das estrelas daquele Mundial. Isto não saiu aqui depois. Ficamos só com a primeira versão. O jornal localmente é debochado. Em 2006, por exemplo, os dois correspondentes que foram ao jogo do Brasil, estavam encantados com aquele quadrado mágico. A gente não sabe ler o Olé.

Em um desses congressos, acho que foi Simoni Guedes, quase certeza, que levantou a hipótese de que a fundação simbólica do nosso futebol teria surgido na Copa de 1938. Nós estávamos discutindo o texto do Gilberto Freyre, o futebol mulato. Ele dizia que foi naquela Copa de 1938, por conta do Leônidas e muito pelo olhar dos franceses do nosso futebol, que essa simbologia começou a ser construída. O Brasil de 1950 a 1970 montou quatro seleções fantásticas. Aquela que perdeu, o Saldanha falou que era tão boa, que Zizinho foi tão bom quanto Pelé. Não tem como comprovar essas coisas, mas foi o que ele falou para mim. Pensei em fazer essa pesquisa na França, só que o Arlei Damo já tinha feito, foi mais rápido do que eu. Arlei fala de uma ambiguidade no olhar dos franceses sobre o Brasil de 1938. Ao mesmo tempo em que elogiam as habilidades dos brasileiros, criticavam a falta de jogo coletivo. Minha ideia era pegar as Copas emblemáticas: 1958 e 1998. No primeiro mundial, a seleção brasileira ganha da França de 5 a 2 nas semifinais. Em 1998, Brasil já era tetracampeão e perde para França na final. Pegar esses jornais esportivos e não esportivos e ver se essas ambivalências que o Arlei tinha verificado, se elas iriam permanecer. Apesar de ter sido um período muito curto, fiquei dois meses e uma semana na Biblioteca Nacional – linda a biblioteca da França, não sei se você conhece, mas dava vontade de ficar lá mais tempo. Eu peguei também só as partidas de 1986, mas não analisei ainda, e de 2006 também não analisei. Eu só fiz análise do que eu apresentei no Congresso da LASA – Latin American Studies Association, em Barcelona, o material que eu fiz sobre 1958 e 1998. Em 1958, antes da partida contra a França pelas semifinais, a seleção brasileira recebia vários elogios, mas tinha a opinião do olheiro do time francês, um ex-jogador que auxiliava o técnico, que dizia que o Garrincha era muito bom, mas que os franceses não tinham que se preocupar muito com o Garrincha porque ele não fazia nada pelos companheiros da equipe e o futebol é um jogo coletivo. Então essas coisas permaneciam. Quando o Brasil ganha da França, os jornalistas ficaram encantados com o Brasil. Foi até engraçado, depois que o Brasil ganha de 5 a 2 da Suécia, eles falam que eles eram os vice-campeões. Eles falam que perderam de 5 a 2 para o Brasil jogando com um a menos. As narrativas falam muito dessa questão da natureza, dos trópicos, uma coisa bastante racista, ou francocêntrica ou eurocêntrica. Em 1998 é um outro momento, o Brasil que estava se consolidando como democracia, economia mais estável. O Patrick Mignon, quem foi que me ajudou na pesquisa, só entendeu o que eu estava fazendo quando foi tomar um café comigo, me disse para comprar um livro, que seria o elogio do encanto, do esquivar, do drible brasileiro. Representa, segundo Patrick Mignon, o que a imprensa francesa e os franceses pensam do futebol brasileiro, que tudo isso tem a ver com os trópicos, com o Brasil. Qual é minha conclusão nesse momento? Eu ainda vou continuar essa pesquisa. Mas eu fico em dúvida se nessa visão que o outro tem sobre nós, se nós não somos responsáveis por essa visão. Se nós também não vendemos um pouco dessa ideia. Se o Brasil, por um lado, se queixa desse egocentrismo, imagino que não faça muita coisa para mudar. A França, no Brasil, tem uma importância muito grande. A nossa bandeira tem a influência de um pensador francês, Augusto Comte, “Ordem e Progresso”. Então eu acho que a gente é atormentado por essa coisa de “Ordem e Progresso”, ao mesmo tempo, a gente enfatiza a coisa do improviso, da irreverência e fica essa ambiguidade. Acho que é uma via de mão dupla. Se os franceses viam isso dessa maneira, a gente também vendia um pouco dessa imagem para eles. Eu preciso refinar um pouco, eu não tive tempo de analisar ainda. O maior erro que eu cometi foi sair do lugar sem ter feito análise, como eu fiz na Argentina. Lá eu fiz análise. Na França não deu tempo. Isso estava na minha cabeça desde que a Simoni falou disso. Depois quando li o artigo do Arlei, pensei que a pesquisa dele precisava ser atualizada. Arlei até me deu umas dicas da Biblioteca Nacional.

Nesse trânsito com outros pesquisadores, você teve a oportunidade de receber o Hans Gumbrecht. Como foi essa experiência?

Em 2012, a Intercom, pela primeira vez em um congresso acadêmico, colocou como tema central o esporte: “Esporte na Idade Mídia – diversão, informação e educação”. Fui chamado para fazer a palestra de abertura da Intercom Sudeste em Outro Preto. Fiquei bastante honrado, lisonjeado e achei que meus trabalhos estavam dando resultado, o preconceito da academia está diminuindo cada vez mais. No Intercom nacional em Fortaleza, foram duas mesas: Roberto DaMatta abriu e Gumbrecht fechou. Foi muito engraçado, DaMatta dava um show. Mas ele foi bastante humilde, ele falava: “Acho que eu não caibo no universo do futebol que me chamaram para fazer aqui, estou vendo aqui na plateia meu amigo Ronaldo e outros, que são muito mais especialistas do que eu nesse assunto”. No final, o Gumbrecht foi apresentar. Eu não conhecia o Gumbrecht, só os trabalhos dele. Ele fala muito bem português. Fiquei surpreso, não só pela erudição dele em termos de filosofia e sociologia, mas a erudição dele em termos de todos os esportes, inclusive do futebol e do futebol brasileiro. Quando terminou, ele perguntou como é que estava o João Santana no Flamengo. E ele falava de vários esportes. Lembro que fiz uma pergunta para ele da plateia. No livro dele, tem um artigo no qual ele faz uma certa aposta que o fascínio dos esportes estaria na beleza dos corpos em movimento. Ele até fala que a intelectualidade não consegue apreciar porque não enxerga a beleza dos corpos em movimento. Eu fiquei pensando, pode até ter uma certa razão. Para quem é um aficionado por um clube de futebol, eu acho que a questão dos corpos em movimento é muito secundária. Qual teu time? Corinthians. Há anos que o Corinthians está brigando para não cair. Aos 48 minutos do segundo tempo de um jogo da última rodada do brasileiro, um bate-rebate, uma bola bate na canela de um cara do Corinthians e ela passa da linha. Você ia pular que nem louco.

Você quer ver algo interessante no caso da brasilidade? Em 1994, toda a imprensa do Sudeste estava metendo o malho na seleção e via somente o Romário como o representante dessa linhagem tipicamente brasileira. Se um time brasileiro ganha uma Libertadores, uma Copa do Brasil, como em 1994 ganhou, ninguém iria estar preocupado com beleza. A gente ainda tem um pouco disso. O Santos, em 2011, tinha Neymar, Ganso, Elano, tinha um pouco aquela coisa da brasilidade. Mas essa é uma exceção. Aquele jogo entre Santos e Flamengo foi um momento muito raro que o Neymar e o Ronaldinho Gaúcho estavam muito inspirados e seus coadjuvantes também estavam muito inspirados. Outra falácia foi dizer que aquilo foi um brinde ao futebol. Eu duvido que um santista tenha ficado feliz, eu não ficaria feliz. Quem não era Flamengo não gostou, queriam ter vencido. Quando a seleção está presente tem outros instrumentos para analisar o que vem mudando. Acompanhei muito em 2018 toda a narrativa sobre o Brasil. As coisas que supostamente seriam para a brasilidade não apareceram tanto dessa vez. As narrativas foram muito mais em outra questão, era um time muito sólido na defesa, muito arrumado.

Tem uma coisa importante na minha pesquisa, que foi quando eu participei da defesa de tese do Antonio Jorge Soares. Teve o famoso debate em cima do livro do Mário Filho, O negro no futebol brasileiro. Em 1998, o Antonio Jorge defendeu essa tese, sobre futebol, raça e nacionalidade. Eu já estava estreitando a amizade com o Hugo Lovisolo. Eu conhecia o Hugo de vista na UERJ e aí começamos a conversar. Foi uma defesa brilhante, foi um trabalho muito legal que eu acho que hoje em dia as pessoas vão achar que ele é racista, quando não é essa a questão, não é uma questão de racismo, é uma questão talvez do que vem a ser o objeto da história. Ele teria uma visão mais dura de historia, história dos fatos. Eu, como sociólogo, vejo que a dramatização dos fatos é mais importante que o fato em si para analisar. Eu não sou um detetive, em partes somos, mas se eu estou trabalhando com um objeto midiático eu quero ver como a mídia retrata isso.

Mostrei a tese do Toni, que é como chamamos o Antonio Jorge Soares, para o Cesar Gordon, que foi meu aluno de PIBIC na UERJ e depois seguiu o caminho da Antropologia no Museu Nacional. Toni categoriza dois tipos de narradores: o tipo A que são tragados totalmente pela narrativa do Mário Filho; ou tipo B, o Cesar entrava ali, mas o Cesar ficou meio irritado. O Toni tinha o jeito meio debochado, na qualificação estava pior. O Cesar falou para escrevermos um artigo junto. Ele fez o primeiro esboço e me mandou. Estava muito agressivo, falei para ele escrever sozinho porque daquele jeito não iria entrar. Eu já tinha ficado amigo do Toni. Falei para eles tomarem um café juntos, que o cara era boa praça para caramba. A gente escreveu o artigo Sociologia, História e Romance na construção da identidade nacional através do futebol, que é mais ou menos essa a ideia do que vem a ser o objeto da história. O Toni levou vantagem no debate porque nós estávamos respondendo a tese dele. Quando o Hugo estava organizando o número 23 da revista Estudos Históricos da Fundação Getúlio Vargas de 1999, ele mostrou nosso artigo para o Toni. O que o Toni está fazendo é uma tréplica. As pessoas acham que estamos respondendo esse daqui, quando o Toni já tinha lido o que a gente escreveu em cima dele. Ele muda umas coisas ali que não estavam na tese, mas tudo bem, o debate foi muito importante. Um dia o Cesar Gordon encontrou comigo e falou assim: “estive pensando, acho que o Antonio Jorge tinha razão em muitas coisas, a gente era muito tragado por um certo romantismo”. O debate transcende o meio acadêmico. Em 2002, foi o Toni quem reparou: a gente tinha montado uma mesa. Tinha várias mesas, mas quando montou a nossa mesa a sala encheu. O Toni falou assim: “Ronaldo, você reparou que a sala encheu? Acham que a gente vai brigar”. Eles estavam querendo ver o pau comer. Achavam que era uma coisa pessoal, mas não era nada pessoal. Por conta desse debate, a quarta edição do livro do Mario Filho tem o prefácio do historiador Luis Fernandes e ele cita o artigo do Toni, no livro que publicamos juntos, “A invenção do país  do futebol”. O debate que estava na revista Estudos Históricos da FGV foi republicado no nosso livro. E quando fez 100 anos do nascimento do Mário Filho, o João Máximo fez uma coluna especial sobre as obras do Mario Filho, e ao falar do livro O negro no futebol brasileiro, ele cita o debate. Foi o Toni quem me mostrou. Então, o debate transcende um pouco universo acadêmico. Acho que ele foi importante para todos, os historiadores quando vão trabalhar as fontes históricas tomam um certo cuidado. O que eu estava falando na época para o Antônio Jorge na defesa era que no momento em que o campo não existia, quando estava se consolidando, as pessoas iam buscar as suas fontes e encontravam poucas referências. Para trabalhar o nosso futebol encontravam no livro do Mário Filho uma certa historiografia daquele período até 1947. Tem o prefácio do Gilberto Freyre, que não diz que é um livro de sociologia, mas que é um livro quase sociológico. Isso fez com que o livro entrasse mais facilmente no meio acadêmico. De qualquer maneira, eu continuo achando que o livro é também objeto de história. Eu não acredito na história dos fatos puros, então, o livro do Mário Filho passa a ser mais um documento da história por que você vive aquilo como sendo verdade e se você vive em uma coisa como sendo verdade, acaba sendo verdade nas suas consequências. Eu sempre digo que é muito mais uma discussão epistemológica do que vem a ser objeto da história do que uma discussão sobre questão racial. Por exemplo, ano passado, na aula de Pós- Graduação na UERJ, estava dando Tópicos Especiais de Comunicação e Esporte, dei os textos do debate para a turma ler, eram 9 pessoas. Em um belo momento eu vi que tinha duas meninas incomodadas com o texto do Toni, e eu tentando explicar. Uma delas perguntou assim: “esse Antonio Jorge é branco?”. Eu disse que sim. Este Cesar Gordon é branco? Eu disse que sim. Aí ela me perguntou: “você não acha estranho três brancos para discutir uma questão racial?”. Eu respirei fundo e falei: “olha só, primeiro, não é uma discussão sobre racismo, é um discussão sobre o que vem a ser um documento da história; segundo, você falou em lugar de fala, vamos imaginar que eu só posso falar em lugares de fala do que você vê como identidade, então só vou falar de homens brancos, héteros, de classe média, que são professores da Faculdade de Comunicação Social da UERJ, são cariocas e torcem para o Flamengo, a minha sociologia vai ficar muito limitada, e aí a turma começou a rir. Então eu não posso falar de mulher por que eu não sou mulher? Não posso falar de gay por que eu não sou gay? Não posso falar de racismo por que não sou negro? Eu tive a felicidade de ser aluno da Lélia Gonzalez, que foi uma das maiores lideranças do movimento negro brasileiro. E eu nunca a ouvi falar: “olha Ronaldo, nesse assunto você fica mudo”. Ela dava aula para conscientizar os alunos, ela falava de coisa acadêmicas, científicas e de relatos muito importantes para todos nós. Mas hoje eu entendo um pouco o Antônio Jorge, eu falei milhões de vezes para ele publicar o livro, mas acho que ele não publica o livro porque ele vai ter que brigar muito. Porque talvez as pessoas possam interpretar erroneamente. Eu acho que em várias passagens da tese ele não trabalha com a plausibilidade dos fatos. Por exemplo, a saída do Vasco da Gama da liga em 1923 não teria uma questão contra os negros, então ele diz que não foi racismo. Havia de fato uma tensão entre amadores e profissionais. Mas eu falei: “Toni, eu acho que foram as duas coisas”. É plausível porque as culturas africanas eram proibidas por lei; umbanda era proibida, a capoeira era proibida, então talvez tivesse racismo mesmo. De uma forma geral, acho que o Toni fez um trabalho fundamental e fantástico para o campo. Ele teve o cuidado de comparar a edição de 1947, raríssima, com a de 1964, que é a edição que a maioria conhece. Toni mostra que Mário Filho modificou a de 1947 para falar que a democracia é incompleta. Mário Filho era amigo do Gilberto Freyre, eles conversavam. Ele deu uma modificada ali para poder fazer sentido, pegar a perda de 1950 e o bicampeonato em 1962. É uma edição super rara a de 1947. Eu fui presenteado recentemente pela Leda, ela já tinha um e conseguiu outro, nem sei quanto ela pagou, deve ser uma fortuna! Tive a honra de participar recentemente da banca para progressão à professor titular do Toni. Ele foi brilhante, como sempre. Somos amigos e chegamos a conclusão, não por conta da amizade, mas por conta de argumentos sociológicos, que convergimos muito mais do que divergimos. O comentário do Cesar Gordon dando razão a ele anos depois, mostra que diante de argumentos e observações, podemos mudar nossas “conclusões”.

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