O artigo propõe um novo enquadramento do livro principal do jornalista esportivo Mário Filho, O negro no futebol brasileiro (1947). Sustenta-se que só é possível entender os argumentos internos deste, por assim dizer, “clássico” do memorialismo futebolístico à luz do conjunto da obra do escritor, especialmente o livro que o antecede, Histórias do Flamengo (1945), usualmente desconsiderado pelas análises acadêmicas. A revisão deste livro comemorativo do cinquentenário do clube carioca permite identificar as linhas mestras, tanto em forma quanto em conteúdo, da narrativa que consagraria Mário Filho dois anos depois. Junto a esse cotejo, acompanha-se igualmente o impacto de ambos os livros no decênio de 1960, quando, emulados pela crítica jornalística e literária, ambos os trabalhos assistem a reedições, sendo relançados por editoras de peso no cenário cultural e intelectual de então. Conclui-se com a reafirmação da necessidade de uma releitura de conjunto de Mário Filho, a fim de entender com mais acuidade não só o caráter prolífico de sua produção bibliográfica ao longo das décadas, como também as etapas de construção de um projeto jornalístico-letrado que se somava à decantação da tradição “nacional-popular” no Brasil dos anos de 1940 e 1960.