40 Anos da Copa de 1978

Depoimentos de jogadores da Seleção

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Waldir Peres durante a entrevista no Museu do Futebol.

 

Nota Explicativa

Esta série é parte integrante do projeto “Futebol, Memória e Patrimônio”, desenvolvida entre os anos de 2011 e 2012, com o apoio da FAPESP. A pesquisa foi realizada em parceria pelo CPDOC, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), e pelo Centro de Referência do Futebol Brasileiro (CRFB), equipamento público vinculado ao Museu do Futebol/Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Nesta seção, serão apresentadas as edições de 10 entrevistas concedidas por atletas brasileiros que estiveram presentes na Copa do Mundo de 1978, na Argentina, a décima primeira edição do torneio organizado pela FIFA. São eles:Emerson Leão, Oscar, Edinho, Carlos, Valdir Peres, Reinaldo, Zico, Nelinho, Zico, Rivellino e Polozzi. O propósito dos depoimentos, com base em sua história de vida, método caro à História Oral, foi rememorar as lembranças dos futebolistas acerca de sua participação na competição, de modo a destacar os preparativos para o Mundial, os jogos e a volta ao Brasil. O depoimento a seguir foi concedido no dia 11 de novembro de 2011, no auditório Armando Nogueira, nas dependências do Museu do Futebol, cidade de São Paulo. Para assistir ao vídeo com a gravação completa, clique aqui.

Entrevistadores: Fernando Herculiani (FGV/CPDOC) e Clarissa Batalha (Museu do Futebol); Transcrição: Roberta Zanatta; Edição: Pedro Zanquetta

Waldir Peres
Waldir Peres. Ilustração: Xico.

 

Waldir Peres

Nasceu no dia 02 de janeiro de 1951, na cidade de Garça, São Paulo. Estreou como jogador profissional em 1969, no time local. Em agosto do ano seguinte, foi para a Ponte Preta e despontou como revelação. Em 1973, ganha projeção nacional com a transferência para o São Paulo. No tricolor paulista, fez 611 jogos e conquistou muitos títulos, a exemplo do Campeonato Brasileiro de 1978. Na preparação para a Copa de 1974, foi convocado no lugar de um goleiro contundido. Em 1975, fez a primeira partida pela Seleção. Esteve em campo em 27 oportunidades e sofreu 17 gols. Em 1978, também foi à Copa e ficou na reserva de Leão. Em 1981, foi presidente do Sindicato dos Atletas Profissionais de São Paulo e lutou pela mudança nas estruturas dos campeonatos. Assumiu a titularidade do gol na Seleção Brasileira na Copa do Mundo da Espanha. Deixou o São Paulo em 1984 e transferiu-se para o América, do Rio de Janeiro. Um ano depois, voltou ao futebol paulista, dessa feita para o Guarani. Nos anos seguintes, passou pelo Corinthians, pela Portuguesa de Desportos e pela Ponte Preta. Encerrou sua carreira de jogador no Santa Cruz, de Pernambuco, em 1990. Atuou como treinador no São Bento de Sorocaba, na Inter de Limeira e passou por diversos outros clubes de pequeno porte.

 

Depoimento

Agradecemos sua presença no Museu. Muito obrigado! Estamos felizes em recebê-lo. Conte um pouco sobre a sua infância e o futebol.

Sou eu quem agradece. O trabalho do Museu e da Fundação Getúlio Vargas, recuperando as memórias do futebol, é muito importante. Meu nome é Waldir Peres Arruda. Nasci em 12 de Janeiro de 1951, em Garça, interior de São Paulo. Meu pai era ferroviário e quando eu contava uns quatro anos ele foi transferido à cidade de Lácio, quase encostada em Marília. Morei e estudei no grupo escolar de lá, e já demonstrava nos recreios, hora da brincadeira, a minha condição como goleiro. A própria molecada me forçava ao gol. Morávamos numa colônia dos ferroviários e naquela região tinha uma molecadinha, uns dez garotos, todos do meu tamanho, e às cinco horas da tarde – depois da escola –, nos reuníamos atrás do armazém da estação, onde havia um gramadinho, no qual colocávamos traves pequenas de tijolo e batíamos bola. Eram Os Ferroviários X A Cidade. O rachão durava até seis, seis e meia, enquanto ainda havia claridade para vermos a bola. Sempre fui goleiro.

Como era a sua família?

Meu pai, minha mãe, uma irmã e um irmão, já falecido… Vivemos em Lácio até voltarmos à Garça – meu pai foi novamente transferido –, e ali comecei a cursar o antigo ginásio. Também jogávamos no recreio e nas festividades.

E Várzea?

A várzea já era outra fase da minha vida. Voltei a Garça com 11, 12 anos e jogava na rua e nos campos de futebol – também no colégio –, uma peladinha com a molecada. Sempre no gol. Quando fiz 15 anos, comecei a atuar em um time chamado Corintinha, lá de Garça, e disputava uns campeonatos. De lá, fui chamado pelo Paulista, pois o campeonato varzeano havia parado e voltara a existir nessa época, 1965, 1966, por aí. Nesse campeonato, não havia problema de idade: Podia ter 40, 30, 20 ou 15 anos e participar. Existiam umas equipes tradicionais da cidade, como a Ferroviária, o Mercado, o Bangu, já consagradas, pois tinham conquistado títulos nos campeonatos varzeanos. Aí, o Paulistinha entrou com um time de garotos, todos jovens de 15, 16 anos, e disputamos com alguns veteranos, inclusive atletas do Garça. Nosso time foi vice-campeão da cidade. A disputa era dividida em turnos e o campeão do primeiro turno disputava contra o campeão do segundo . Ganhamos o primeiro e o Mercado, o segundo. A decisão ocorreu no estádio do Garça, o Platzeck[1], perdemos e o Mercado se tornou campeão. Mesmo assim, nos tornamos a sensação da cidade, pois éramos uma garotada jovem e vencemos equipes tradicionais como a Ferroviária, o Bangu e o Ipiranga. A partir daí, começaram a falar do Paulistinha e passamos a ter um reconhecimento dentro da cidade.

Seus pais apoiavam o futebol?

Não. A minha mãe sempre dizia: – Bola não dá camisa a ninguém. [risos] Tinham preconceito. Naquela época existia isso em relação ao jogador de futebol, principalmente, no interior do Estado de São Paulo… No Brasil todo, também. Porque os atletas bebiam, saíam e freqüentavam lugares proibidos. Eram muito mal falados. E a minha mãe era contra, mas quando comecei a atuar e disputar o campeonato ocorreu um fato interessante com meu pai. Não fazíamos compras no mercado e sim no trem. Ele vinha, parava na cidade e ficava lá a manhã toda, para os ferroviários. Havia de tudo, mantimentos e tal. E o meu pai conseguiu a minha primeira chuteira no trem.

Você torcia por algum time?

Tive a influência do meu tio, são-paulino roxo. Ele era de Vera Cruz e sempre falava, conhecia e gostava muito de futebol. O meu pai não era muito ligado nisso, mas o meu tio era, então torci pelo São Paulo desde pequeno.

Sua carreira prosseguiu e você jogou pelo Garça, seguido da Ponte Preta. Foi jogando pela Ponte, contra o São Paulo, que aconteceu o interesse deste time por você? 

Sim. Eles demonstraram interesse e me negociaram com a Ponte Preta. Compraram a mim e ao Chicão. O São Paulo tinha algum negócio com a Ponte, porque no ano anterior haviam negociado o Nelsinho Baptista, o Teodoro e o Samuel. Então eu e o Chicão fomos juntos ao São Paulo.

Você ainda torcia por eles?

Torcia. Era são-paulino roxo. [Risos]

O seu tio deve ter ficado orgulhoso.

Ele acompanhava pelo rádio, até ter televisão. Deve ter ficado satisfeito pelo sobrinho ser goleiro do São Paulo, sim. Quando cheguei, o time seria reformulado, eliminando atletas que já atuavam lá há muito tempo e montando uma nova equipe. Comecei a treinar como reserva do Sérgio Valentim – considerado o São Sérgio, em 1970, 1971. Veio o campeonato brasileiro e numa partida contra o Coritiba, estávamos ganhando de 2 x 0, mas eles empataram. A torcida pegou no pé do Sérgio e ele discutiu, criando um problema. No próximo jogo, estreei contra a Portuguesa, numa quarta-feira à noite.

O treinador era o José Poy, que também foi goleiro? Vocês conversavam muito?

José Poy. Conversávamos, sim. Ele gostava muito de mim e foi quem pediu a minha contratação. Sempre fui dedicado e fazia todo o treinamento. Levava a coisa muito a sério, afinal, era a minha profissão e eu jogava todas as minhas fichas. Terminei o normal em Campinas, fiz até o segundo ano de educação física e vim ao São Paulo. Enquanto fiquei na reserva, viajava a Campinas para ir à faculdade e voltava. Quando me tornei titular, comecei a ficar cansado, tinha um peso maior, uma grande responsabilidade. Passei a atuar – antes ficava sentado no banco, assistindo a partida –, e a ter mais responsabilidade dentro do jogo. Sempre treinei muito, era exigente e correto, muito profissional. Deixei então a faculdade. Optei por ser titular do São Paulo e apostar as minhas cartas nisso.

E, muito rapidamente, você recebeu uma convocação à Copa do Mundo?

Sim. Nesse Campeonato Brasileiro – no qual entrei no lugar do Sérgio, joguei contra Portuguesa e virei titular –, o São Paulo ficou entre quatro times na decisão do título: Botafogo, São Paulo, Cruzeiro e Palmeiras. A final foi São Paulo x Palmeiras, no Morumbi, 0 x 0. Eu fui bem, e justo nessa época, aconteceram as convocações da seleção brasileira.

Já estavam na preparação?

Sim. Na preparação de 1974. Com esse jogo, o meu trabalho foi reconhecido, não é? Quando fui reserva do Wilson, na Ponte Preta, o treinador Cilinho[2] o mandou fazer uma temporada na escola de educação física da Urca, no exército. E lá havia a comissão técnica da seleção de 1970: O Carlesso[3], o capitão Cláudio Coutinho, o Chirol[4], o capitão Camerino[5]… E eles perguntavam ao Wilson sobre o time: – Quem está na Ponte? Quem são os goleiros? O capitão Carlesso era o treinador de goleiros da seleção brasileira e houve essa troca de informação, mas, na época, o assunto morreu. Neste momento, a informação da CBF[6] – que havia observado o meu trabalho –, coincidiu com a informação do Wilson. Aí a seleção viajou a Europa – eu ainda não, mas entrei, porque era necessária uma lista de uns 40 jogadores, caso algum dos 22 se machucasse, e só poderiam convocar os atletas da lista. Entrei nessa lista. A Libertadores[7] começou e a seleção já estava na Europa treinando para a Copa. Joguei muito: Campeonato Paulista simultâneo a Libertadores. Dez dias antes da Copa do Mundo sairia a lista dos 22 e o Wendell, goleiro do Botafogo, se machucou e então fui convocado. A minha camisa era a 22. Junto comigo veio o Mirandinha, no lugar do Clodoaldo, também machucado. Chegamos uma semana antes do inicio da Copa.

Você esperava essa convocação?

Não esperava. Foi uma surpresa.

E o momento no qual recebeu a notícia?

Eu treinava no São Paulo, e alguém falou. Os jornais também noticiaram os cortes e que havia a possibilidade de eu e o Mirandinha irmos.

Havia outro goleiro entre os 40 da lista?

Não me lembro. Veio a confirmação da convocação e o São Paulo nos comunicou. Então, eu e o Mirandinha tomamos um avião logo cedo ao Rio, porque à noite viajaríamos para a Alemanha, e nos levaram lá para arrumar um terninho, colocar isso e aquilo… Eu tinha 22, 23 anos, e fiquei super empolgado!

Você já havia saído do Brasil?

Só aqui na América do Sul. Viajar a uma Copa do Mundo! Eu, que acompanhei a Copa de 1970, vi o Rivelino, o Pelé… Não eram todos, mas a maioria estava lá: Jairzinho, Rivelino, Carlos Alberto – ele não era de 70 –, o Piaza, o Marco Antônio, o Paulo César… Muitos grandes jogadores.

Quando chegou, o ritmo da preparação já ia muito avançado?

Já, muito! E eu, fiz o quê? Uma semana de treinamento, acostumando-me ao fuso-horário, até chegar lá na concentração. O hotel da seleção não era como é hoje, era no meio do mato. No início da preparação, eles ficaram na Floresta Negra, na Alemanha, em um hotel reservado, como acontecia com todas as equipes. Os cozinheiros iam junto também, uniformizados, para cozinhar. O nosso cozinheiro era o Mário.

Para preparar comida brasileira?

Isso. Tinha feijão, arroz… Faziam lá no hotel. 

E os outros goleiros? Era o Leão e quem mais?

O Renato. O Leão era titular e o Renato ficava na reserva. Eu não fiquei na reserva em nenhum jogo. Antigamente tinha a CBD[8], e brincávamos entre nós sermos a turma do come, bebe, dorme e sobe para assistir a partida da arquibancada. Podiam ficar dezesseis – onze atuando e mais cinco no banco –, os seis restantes subiam. Assistimos ao Brasil x Iugoslávia, 0 x 0. No segundo, contra a Escócia, acompanhamos ao lado do Emerson Fittipaldi e do Jackie Stewart, outro piloto, escocês, ambos daquela época. Foi 0 x 0 também.

Como era esse time do Zagallo?

Teve um começo difícil e foi uma seleção campeã em 1970. Então, contra a Iugoslávia, a expectativa era repetir as atuações do México, e isso não ocorreu. O Brasil começou bem, empatou 0 x 0, 0 x 0 e precisava ganhar do Zaire de 3  – se o goleiro deles não tivesse ajudado, teríamos voltado antes. [risos] Uma seleção na qual houve muita preparação e a discussão para Alemanha. O próprio Ademir da Guia foi contestado – o Zagallo só o colocou contra a Polônia, na decisão do terceiro e quarto lugar.

O grupo era unido ou existiam problemas?

Esse grupo ficou um pouco dividido. Hoje isso já não existe tanto, mas, antigamente, o bairrismo entre paulistas e cariocas era muito forte.

Isso se refletiu no grupo?

Refletiu bastante. O Palmeiras, por exemplo, tinha cinco ou seis atletas, e havia o pessoal do Rio.

Você sentiu isso logo quando chegou?

Senti… Fiquei perdido, uma semana antes da Copa.

E eles já estavam juntos a mais de um mês?

Mais de um mês, não! A preparação durava três meses antigamente. Para mim, era tudo festa. 22 anos na seleção, em uma Copa do Mundo?! Tudo certo.

O Brasil jogou contra a Alemanha Oriental e depois enfrentou a Argentina.

O Brasil se classificou, 3 x 0 contra o Zaire. O Valdomiro, do Internacional, fez o terceiro gol. Aí o Brasil pegou a chave: Alemanha Oriental, Argentina, e Holanda. Quem ganhasse, decidia o título. Quem ficasse em segundo, disputava terceiro e quarto lugar. O Brasil ganhou de 1 x 0, gol do Rivelino de falta, com o Jairzinho na barreira, enquanto a Argentina perdeu de quatro contra a Holanda. Ganhamos de dois a um deles, então fizemos seis pontos. A Holanda, por sua vez, ganhou da Alemanha Oriental. Aí a decisão ficou entre Brasil e Holanda. Quem ganhasse, disputaria o título. Na outra chave, a Alemanha ganhou. E o Brasil, no início, teve duas oportunidades contra a Holanda, mas não fez… Depois sofreu dois gols, o Luis Pereira foi expulso, e o Brasil acabou sendo desclassificado da disputa do título.

Fala-se muito, até hoje, desse time da Holanda. Era realmente diferente vê-los jogando?

Para mim, assistindo lá de cima, foi realmente uma revolução em termos de futebol. No meu ponto de vista, não houve uma observação muito boa por parte da CBF em relação a eles.

Não tinham um temor?

O medo era do time da Alemanha. A Holanda, até aquela época, nunca tinha tido uma seleção expressiva. Então, não mediram a importância deles em 1974. Foi uma revolução, uma maneira de jogar diferente. O Internacional de Porto Alegre tentou copiar – fazer aquela linha de impedimento, da qual saía todo mundo e nas bolas no meio do campo, também iam todos em cima, juntos. Um tipo de futebol impactante, muito diferente.

O time brasileiro sofreu ao ver aquela movimentação?

Sofreu. Não faltou uma preparação de marcação, mas sim, pela movimentação deles, a marcação ficou atrapalhada. O Brasil, na Copa de 1974, falhou nessa parte.

E veio a disputa do terceiro lugar.

Contra a Polônia. E o Brasil perdeu de 1 x 0.

Após essa partida, houve uma confusão no vestiário?

Não posso dizer, porque estava lá em cima. Também fiquei sabendo, por palavras dos outros, da briga do Leão com o Marinho Chagas, mas realmente não dava para ver nada lá do banco, e nós, os seis, não tínhamos entrada. A Copa da Alemanha teve a segurança reforçada, por causa do ocorrido nas Olimpíadas de 1972, em Munique. Vocês já assistiram a filmes de guerra alemães? Sabe aquele monte de arame farpado, guardas com sobretudo, capacetes, metralhadoras e um baita cachorro do lado? Era a segurança do hotel inteiro. Parecia um campo de concentração.

E a volta ao Brasil, a decepção da torcida?

Após as vitórias de 1958, 1962 e 1970, o Brasil era visto como a melhor equipe do mundo, e a cobrança dos torcedores, e da própria imprensa, passou a ser muito grande. Voltamos da Copa de 1974… Não ganhamos, perdemos, fomos os quarto colocados… Fomos derrotados pela Polônia, um time sem expressão nenhuma. Então houve, realmente, uma conversa, um burburinho de que a seleção não foi bem, mas a gente chegou ao aeroporto e desceu no Rio. Os de São Paulo, dali mesmo já entraram em um avião para casa. Descemos e tinha gente nos esperando, comemorando. Torcedores do São Paulo, do Corinthians, do Palmeiras, dos jogadores presentes… Fui de lá à minha casa e assunto encerrado.

Você era muito jovem, mas acha que faria diferença se estivesse lá no gol?

Olha, talvez. Não pensei tanto nisso… Pelas circunstâncias, eu só entraria se o Leão e o Renato, ambos, se machucassem. Então, não havia essa possibilidade.

Como goleiro, você fazia algum treinamento especial para pênalti?

Eu só enchia o saco dos caras. Sabe o que acontece? Na penalidade, a chance do atleta marcar é de 90%. Agora, se ele perder um mínimo da sua concentração naquele momento, a possibilidade do goleiro defender aumenta. Então, tive esse instinto, sem muita preocupação. Por exemplo, quando o Wilsinho começou a correr, eu também comecei: – Ah, vou correr atrás dele também. Então, desconsertei o cara, e ele não bateu direito o pênalti. Defendi. Fiz, fui campeão paulista e tudo bem. Durante as partidas, também fazia isso. O cara ia bater o pênalti, mas quando o juiz apitava, percebia o goleiro quase dentro da área, e isso assustava. Voltava, ele batia e “pum”: Eu pegava o pênalti. Às vezes, tentava conversar: – Vou pegar. Você não vai fazer! O gol vai ficar pequenininho. E ficava naquele bate papo, brincadeira e, de certa forma, transtornava o cara.

Você criou tudo isso naturalmente ou já tinha visto alguém fazer?

Não, nunca tinha visto isso. Uma surpresa a todo mundo, pois ninguém nunca viu. Uma ideia criada na hora, e deu certo.

Você jogou uma Copa, conquistou o seu primeiro título profissional no campeonato paulista e se tornou um ídolo. A sua vida mudou?

Claro. O meu salário já não era de jogador do São Paulo, mas da seleção brasileira, porque, depois de 1974, participei dos amistosos. Era reserva do Leão e fiz alguns jogos em 1975. Então, financeiramente, melhorou. Comprei meu apartamento, um carro melhor, e comecei a ter um ritmo de vida diferente de antes.

E foi se firmando como goleiro titular da seleção, não foi? Até ganhou algumas taças.

Sim. Disputei contra a Argentina, o Paraguai e o Uruguai. Era a Taça Roca, a Taça do Atlântico, a Copa América. Eu realmente fiquei como titular nessas partidas da seleção.

Quem era o treinador?

Oswaldo Brandão. Depois fui convocado na lista do Cláudio Coutinho e entrei nos 44. [risos] Copa do Mundo de 1978. A seleção já estava na preparação em Teresópolis quando eu, o Chicão, o Zé Sérgio, do São Paulo, e o Roberto Dinamite, do Vasco, fomos convocados.

Esse grupo era diferente de 1974?

Era. Uma seleção um pouco mais coesa, com atletas jovens, o Nelinho, o Amaral, o Luís Pereira, mantiveram o Leão, o Jorge Mendonça… O Zico iniciando, o Reinaldo numa fase boa, fazendo gol. Fui com esse grupo à Copa da Argentina.

Você era o primeiro reserva?

Não, dividia com o Carlos. O Brasil, quando vai disputar uma Copa do Mundo, é favorito, já é considerado campeão antes de acabar a disputa, muito ruim… Nessa Copa da Argentina também. Pegamos a Suécia no primeiro jogo – 1 x 1, se não me engano. Depois a Espanha, a Áustria – ganhamos de 3 x 0. Na Espanha, quase viemos embora… O Amaral tirou duas bolas de cima da área, em cima da risca do gol e ganhamos de 1 x 0. O Brasil foi bem nessa primeira fase e, na segunda, manteve o mesmo tipo de disputa de 1974. Classificando-se em primeiro e segundo, o time entrava em um grupo com mais três times. Pegamos: Argentina, Polônia e Peru. Infelizmente houve aquele problema – fizemos nosso jogo às três horas da tarde e a Argentina fez o seu às sete horas da noite. O Brasil ganhou do Peru de 3 x 0. Argentina ganhou da Polônia por bem mais… Contra a Argentina, empatamos em 0 x 0, uma partida dura, difícil. Aí a decisão ficou entre o Brasil e a Argentina, em termos de pontos, pois empatáramos. Mesmo que ambos ganhassem o próximo jogo, o número de pontos continuaria o mesmo, por isso a decisão seria baseada no número de gols marcados. Comentaram muito sobre o Peru ter entregado o ouro… A Argentina ganhou de 6 x 0 deles.

O Peru tinha um bom time, não é?

Um bom time e era inadmissível perder de 6 x 0. Mas perdeu, e a Argentina entrou. Na outra chave ficaram: Argentina e Holanda, na decisão do título, e Brasil e Itália disputando o terceiro e quarto lugar.

A Argentina vivia em plena ditadura militar. Vocês sentiam isso? Conversavam?

Olha, tínhamos alguma noção… Normalmente, interessa a Fifa[9] o time da casa chegar, pelo menos, ao terceiro, quarto lugar da disputa. A Argentina vivia realmente um momento difícil. Um dia, na concentração, os rebeldes mandaram uma carta ao Zico, dizendo que podíamos ficar tranquilos, que eles não fariam nada contra os atletas. Aquele título era importante a Argentina, pelo momento político no qual se encontravam. O negócio estava complicado lá, com tiros, mortes e uma série coisas. E a segurança… Viajávamos de uma cidade a outra no avião do exército argentino. Ficamos em Mar del Plata, depois em Buenos Aires e uma outra cidade ali perto, sempre no avião da força aérea argentina.

E, novamente, a seleção voltou ao Brasil após perder a Copa do Mundo.

Antes teve a partida da Itália, e o Brasil ganhou de 2 x 1. O Nelinho fez um gol bonito, no qual a bola fez uma curva totalmente diferente. Fomos terceiro colocados e voltamos ao Brasil debaixo da maior cobrança. Já era a segunda Copa que perdíamos como favoritos. E o Cláudio Coutinho saiu com a ideia de sermos o campeão moral, porque não perdemos nenhum jogo durante toda a Copa do Mundo. Foi por causa de partidas como a do Peru, que surgiram dúvidas em relação ao título da Argentina.

Em 1980, a seleção passou por uma reformulação, não é mesmo?

No ano de 1980, o Telê se tornou técnico da seleção brasileira e houve uma mudança política na direção da CBD – se tornou CBF e o Giulite Coutinho virou o presidente. No início, não fui convocado – chamaram o Raul Plassmann, o João Carlos e o João Leite. Fui campeão paulista com o São Paulo, mas na disputa do Brasileiro, não fizemos uma grande campanha. Passei as férias de dezembro no Guarujá e fui esquecido. Começou então, no Uruguai, o Mundialito, um campeonato armado para festejar alguma data deles com todas as seleções campeãs do mundo. Ficaram numa chave: Brasil, Alemanha e Argentina. Na outra: Itália, Holanda e Uruguai. E o que aconteceu? Fui ao Guarujá, curtir as minhas férias, fora de forma. O primeiro jogo foi Brasil x Argentina, e eu assisti lá da praia, preparado para voltar ao São Paulo no dia seguinte. Mas o Carlos, goleiro titular, lesionou o cotovelo. No outro dia de manhã, voltei com a minha família e tinha acabado de entrar no apartamento, quando o telefone tocou. Era o Roberto Silva, repórter da Bandeirantes: – Oh Waldir, tudo bem? – Tudo bem. Mais um ano de trabalho no São Paulo. – Tá louco, meu! Será convocado, ainda hoje, a atuar no Mundialito pela seleção brasileira. Você foi convocado! Quando desligamos, ligaram do São Paulo: – Waldir, você precisar chegar às sete horas no aeroporto, na Pluna – a empresa de aviação uruguaia –, tem uma passagem no balcão te esperando. Eu estava fora de forma, um mês relaxando na praia… Já tinham convocado todo mundo e eu não achava ter chances.

Você achou que nunca mais seria convocado a uma Copa?

O Telê convocou muita gente, mas não eu… Bom, cheguei ao Mundialito, fiz os primeiros treinos e nem tinha feito a pré-temporada… Aí treinei e tive dor nas pernas, não sei por quê. Contra a Alemanha, ganhamos de 4 x 1, e eu rezando – pelo amor de Deus! –, para não acontecer nada ao João Leite, pois não aguentava nem andar de dor, e não ia conseguir me movimentar no gol. Eles ganharam e fiquei no banco. O Uruguai ganhou a outra chave, e o Brasil perdeu de 2 x 1. Foram poucos dias e retornei ao São Paulo. Aí, acordei um pouco. Vi uma luz no fim do túnel e reforcei a minha preparação no clube. Quem sabe não me chamavam? Comecei a puxar no treino e entrar, o mais rápido possível, em forma.  Na primeira convocação à eliminatória, fui chamado pelo Telê. Jogamos contra a Venezuela, em Caracas, e fui o titular da partida. Atuei em todos os amistosos, menos contra a França, até o final. Comecei a me visualizar como titular. Fomos à Bolívia, na altitude, e sofremos bastante. Ganhamos de 2 x 1. Depois de uns dez minutos, o nosso time ficou cansado e eu apareci na partida duas ou três vezes, sozinho contra o atacante, e fiz as defesas. Fui me firmando dentro da seleção brasileira, até chegar à excursão de 1981, na qual o Brasil foi à Europa e atuamos contra a Inglaterra em Wembley[10]. Vencemos de 1 x 0, gol do Zico, e fomos o primeiro time sul-americano a ganhar lá. Hoje, já não existe mais, destruíram-no, mas era o templo do futebol. O time inglês jogava muitas bolas cruzadas e eu me saí bem nelas. Fomos à segunda partida, contra a França, e não entrei – o Paulo Sérgio atuou e o Carlos, da Ponte, era o terceiro goleiro.

Essa foi uma opção do Telê?

Foi uma opção. O Paulo jogou e o Brasil ganhou de 3 x 1 da França. Nessa excursão, houve o jogo contra a Alemanha, em Stuttgart, no qual voltei como titular. Também ganhamos de 2 x 1. Ocorreu a penalidade máxima contra o Brasil e o Brait foi bater. Peguei a primeira e o juiz mandou voltar. Ele bateu pela segunda vez e eu também defendi. Depois, um repórter brasileiro veio me perguntar o que eu disse ao alemão: – Sei lá! Ele não entende nada mesmo. [risos]

Mas rolou uma catimba ali também?

Não. No primeiro, eu me adiantei e consegui defender. No segundo, o Juiz não ia mandar voltar. Depois, precisei responder: – Não falei nada, vou falar o quê? Não falo alemão. [risos] Entendeu? A partir desse dia, me firmei como titular da seleção brasileira na Copa do Mundo de 1982.

E começava a ser desenhado um time.

Um time que iria revolucionar. Naquele tempo, apenas a Holanda havia revolucionado em 1974 – mas não repetiu em 1978. Então, surgiu a seleção de 1982 – hoje é lembrada por todos e, segundo a estatística da Fifa, está entre os dez melhores times do mundo! Era Zico, Sócrates, Falcão, Éder, uma série de atletas maravilhosos. Essa equipe se aprimorou com os amistosos e passamos pela seleção brasileira sem perder nada, demonstrando capacidade e ganhando a confiança do povo brasileiro. Uma decepção perdermos da Itália… Fizemos toda a preparação disputando amistosos, ficamos na Toca da Raposa por 40 dias, embarcamos a Portugal e treinamos lá por mais 30 dias, em partidas corriqueiras contra equipes portuguesas. Depois fomos à Espanha, onde treinamos mais 15 dias antes de começar a Copa. Nosso primeiro jogo, contra a Rússia, foi meio tenso, preso e acabei tomando um gol. A torcida pegou no meu pé, diziam ser um frango meu… A bola passou no meu braço e entrou. Mas o Éder fez um gol, depois o Falcão abriu a perna e o Sócrates fez o nosso segundo gol. Então a seleção encorpou, mas vivi a pressão da imprensa por ter sofrido aquele gol.

Falhas acontecem, não é?

A bola bateu e eu esperava que viesse no peito, mas ela pegou outro rumo e foi para o lado do braço. Acabei tomando um gol e fui crucificado.

Você ficou muito abatido?

Não. Não me abati. O goleiro precisa se preparar para tomar gols fáceis e difíceis. O que importa – dependendo da situação –, é a próxima defesa. Se tomar um segundo gol, a coisa complica, fica feia. Então, o goleiro precisa voltar ao normal o mais rápido possível. Lógico, mexe. Você quer iniciar, fazer uma boa campanha, ter uma boa performance, mostrar isso ao povo. Todo mundo confiando, assistindo pela televisão e você toma um gol daquele… Mas é necessário balançar a cabeça e no minuto seguinte ficar frio novamente, e enfrentar o jogo. Nesse momento, a responsabilidade aumenta: Você não pode tomar o segundo gol… Quando o Sócrates marcou 2 x 1 aos 43 minutos do segundo tempo, foi um alívio. Uma partida tensa, difícil. É preciso saber enfrentar a estréia da Copa do Mundo, começar bem e ganhar.  Fomos ao segundo, contra a Escócia, e o Brasil ganhou de 4 x 1 deles. Aí, a equipe do Brasil começou a impor o seu futebol, a sua alegria. Fizemos quatro gols – inclusive, em um deles, a bola saiu da minha mão, passou pelo Leandro e levou 11 toques, só de atletas brasileiros. Sobrou ao Éder, na ponta esquerda, e ele cobriu o goleiro. A Escócia não relou na bola! A partir daí, começamos a brilhar e mostrar um futebol diferente, muito técnico, a marca daquela seleção.

O grupo era unido?

O grupo era unido, brincávamos e a nossa concentração era maravilhosa. Não houve problema algum. Na partida contra a Nova Zelândia, ganhamos de 4 x 0 e nos classificamos. Foram dez gols em três jogos, e toda a imprensa começou a ficar em cima do nosso time. Era uma equipe que realmente atuava diferente, e não vimos mais nada igual, em nenhuma Copa do Mundo posterior.

E a preparação do Telê? O esquema do time era dele?

O esquema era do Telê, sim. Ele era um treinador que exigia do jogador sentir os próprios defeitos e treinar para corrigi-los. Quanto mais o atleta fizesse isso, melhor. Ele tinha atletas de qualidade técnica muito alta: Falcão, Zico e Sócrates… E montou um time jogando um esporte alegre, um futebol de gols. Fomos muito influenciados por ele. Realmente, nos cobrava muito e não permitia regalias a ninguém. Fomos à segunda fase e o tipo de disputa mudou: Ao invés de quatro, ficaram três equipes.  Então, nossa chave ficou: Itália, Brasil e, novamente, Argentina. E nessa fase final, concentrados, não assistimos ao vivo nenhuma partida da Copa do Mundo. E justamente, a primeira partida entre os três, foi Itália x Argentina e fomos ao campo assistir. Talvez, nesse momento, tenhamos nos descuidado… A Itália ganhou por 2 x 1, mas a Argentina dominou. O próximo, Brasil x Argentina, uma partida mais difícil, clássica. Minha melhor atuação na Copa do Mundo. Fiz duas ou três defesas – a cabeçada do Passarella, a do Maradona… Foi onde me destaquei durante a Copa. Fizemos 3 x 1 e ganhamos tranquilamente. Esse resultado no placar talvez tenha nos deixado meio eufóricos, porque o time atuou muito bem – vimos a Argentina dominar Itália… –, mas como perdeu, nos descuidamos um pouco na preparação desse jogo.

Eles tiveram mesmo uma primeira fase muito ruim.

Muito ruim. Então, tivemos a impressão de que ganharíamos a qualquer momento… Erramos.

Vocês entraram, talvez, um pouco empolgados demais?

Com a certeza de ganhar da Itália… A partida foi considerada pela imprensa espanhola uma verdadeira decisão da Copa do Mundo. Eles fizeram 1 x 0. Empatamos. Então, marcaram 2 x 1e empatamos novamente… Já no segundo tempo – aos 28, 30 minutos – marcaram 3 x 2 em um lance de escanteio, no qual o Junior ficou parado – parecia querer dar impedimento ao Paulo Rossi, porque os três gols foram dele… E o Brasil saiu fora. É gozado o sentimento… Um negócio tão rápido. O jogo acaba e fica a sensação de que tem mais… Não sentimos imediatamente e demora até cair a ficha: – Poxa, estamos fora. Perdemos de 3 x 2 da Itália. Entendeu? Eu, por exemplo, fiz 39 partidas na seleção brasileira e a única partida que perdi foi essa contra a Itália. Ganhar a Copa é a consagração da carreira do atleta e tínhamos a certeza daquela equipe ser campeã, no ano de 1982.

E o retorno?

Chegamos à concentração muito tristes… Todo mundo chateado pela perda da classificação.

Houve falhas individuais que ficaram muito marcadas: Aquela saída do Junior e também o Cerezo…

Um jogo de futebol é feito de acertos e erros. A equipe que erra menos leva vantagem, e se acerta mais, normalmente, é quem ganha. Infelizmente, uma partida atípica. Se jogássemos novamente com a Itália não perderíamos. Talvez tenha sido o momento. A Itália cresceu realmente dentro da competição e foi campeã do mundo.

O time tinha algum líder buscando colocar a equipe para cima?

Tinha o próprio Zico, o Sócrates, o Oscar… Tentamos buscar forças, virar o jogo, empatar… O Brasil teve essa oportunidade. Se fizesse mais um, a classificação seria nossa. Houve a cabeçada do Oscar, o chute do Zico… O time não se abateu até o final, lutou mesmo… Mas no futebol, existem fatalidades.

Talvez a final da Copa de 1950 e esse momento de 1982, figurem entre os mais marcantes ao torcedor. E para vocês, jogadores, marcou?

Foi. Se pensarmos no poderio daquela equipe, percebemos que deveria ser campeã do mundo, como em 1950. Mas é o tal negócio: Justamente quando todo mundo acredita na vitória, a coisa complica, não é? Imagine aqui no Brasil, o Maracanã lotado, todos acreditando na vitória do Brasil… Perdeu por 2 x 1. Pela campanha da Itália, em 1982, todos devem ter pensado que passaríamos por eles calmamente… No futebol, acontecem imprevistos dentro de campo capazes de tirar uma equipe com boa condição técnica. A própria imprensa espanhola definiu: A Copa do Mundo terminou ali, quando o Brasil saiu da competição. Fizemos uma revolução em termos técnicos e táticos, o jogo de futebol para frente. Até hoje, quando termina uma Copa do Mundo, todo mundo fala da seleção de 1982! Estamos às vésperas da Copa de 2014 e esse time ainda é lembrado, porque até hoje não apareceu outra equipe deslumbrando mais, com um futebol tão brilhante! Tal como a Holanda em 1974, e a Hungria em 1954. No futebol, além da partida em si, às vezes existe um fator – não digo sorte –, mas um fator favorecendo uma equipe naquele momento.

Você superou rapidamente o episódio?

Não. Quando voltei ao São Paulo estava realmente abatido. Pela qualidade do nosso time, não merecíamos perder daquele jeito. Foi um baque emocional muito grande. O sacrifício de um, dois anos. Eu, por exemplo: Em 1981, fiquei seis meses fora da minha casa, por conta da concentração e da viagem. Treinávamos às vezes mais do que era necessário, em busca do aprimoramento, visando nos apresentarmos melhor e armarmos uma grande seleção. Tínhamos a confiança de sermos campeões…

Como você viu as mudanças no futebol dos goleiros, ao longo dos tempos?

Houve uma transformação muito grande em relação ao goleiro brasileiro. Antes, na Europa, não éramos considerados nada. Depois do Taffarel, a coisa mudou de figura. Os treinamentos se aprimoraram e cada equipe passou a ter o seu treinador de goleiro específico – alguns que, inclusive, atuaram no gol. Hoje, sendo sincero, com todo futebol praticado, se ainda tivesse condições e fizesse um teste no São Paulo, no Corinthians, no Palmeiras ou no Vasco, eu não passaria. Querem goleiros de, no mínimo, 1,85m, eu tenho apenas 1,80m. Isso já não serve mais. Houve uma mudança geral na maneira de ver o goleiro. Na nossa época, era diferente. Quando chegava um goleiro mais alto, o pessoal brincava: – É mais fácil fazer gol por baixo! [risos] Foi uma mudança geral, mas antigamente não tinham o treinamento de hoje, específico em todas as áreas do futebol, e, principalmente, em relação ao goleiro.

Você participou de três Copas do Mundo. Qual a sua expectativa para a Copa de 2014, no Brasil?

Em termos de organização, o Brasil sofre. Muito atrasados, os estádios não estão prontos, os aeroportos, na mesma situação, com todo mundo cobrando uma posição. Já é final de 2011, e a Copa se aproxima. Precisamos correr! Talvez fazer um mutirão… Agora, a expectativa de conquistarmos o título é muito grande, não é? As equipes européias, em alguns lugares como Natal, Recife, não vão agüentar o calor, o horário das partidas… Será desgastante. Em Porto Alegre, Curitiba, tudo bem, porque será uma época de frio. Mas lá no norte, a coisa muda de figura. Em Manaus… O Brasil tem toda chance. Acompanho o trabalho do Mano[11] e ainda não existe uma definição.  Ele procura ainda achar os 22 jogadores – talvez esteja mais preocupado com as Olimpíadas, e vai cuidar da seleção a partir daí. O Brasil tem grandes atletas. Tem o Neymar, começando a explodir – tomara que faça isso na Copa do Mundo! Quando disputamos uma Copa é para sermos campeões.  Segundo e terceiro lugar, não valem nada. Além disso, precisamos nos preparar: Vão existir dificuldades, não vamos ganhar sempre… As seleções da Argentina, da França e da Holanda apresentam um grande futebol. O Brasil precisa se modificar em todos os sentidos, ir com tudo e ganhar, o que não será fácil.

Muito obrigada, Waldir!

Sou eu quem agradece a oportunidade de conversar, falar da vida e tudo o mais. Muito boa a ideia de entrevistarem os jogadores da seleção brasileira que disputaram alguma Copa do Mundo. Vão surgir histórias maravilhosas, diferentes, mostrando a maneira de ver de cada um. É realmente um sucesso! Muito obrigado.


 

[1] Estádio Municipal Frederico Platzeck.

[2] Otacílio Pires de Camargo.

[3] Raul Alberto Carlesso.

[4] Admildo Chirol.

[5] Kleber Camerino.

[6] Confederação Brasileira de Futebol.

[7] Copa Libertadores da América.

[8] Confederação Brasileira de Desportos.

[9] Fédération Internationale de Football Association.

[10] Estádio de Wembley: localizado nos arredores de Londres, inaugurado em 1923 e demolido em 2003, para dar lugar ao novo estádio de Wembley.

[11] Mano Menezes.

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Bernardo Borges Buarque de Hollanda

Professor-pesquisador da Escola de Ciências Sociais da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC-FGV).

Daniela Alfonsi

Antropóloga, Diretora Técnica do Museu do Futebol e doutoranda pela USP. Trabalha com e pesquisa sobre os museus esportivos.
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