08.2

José Carlos Sebe Bom Meihy (parte 3)

Equipe Ludopédio 23 de janeiro de 2013

Já está gravando? Sem autorização? Olha, tem que ser assim: “São Paulo, 01/11/12, Sala do NEHO, Presentes: Marcel, Enrico, Sérgio e Prof. Sebe. 18h”. A entrevista traiçoeiramente começou a ser gravada, sem autorização, o que é o maior dos pecados, é antiético…

Assim iniciamos nosso bate-papo com o José Carlos Sebe, professor titular do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP). Pioneiro nos estudos de história oral no Brasil, Prof. Sebe coordena o NEHO (Núcleo de História Oral da USP). Mais do que uma entrevista, Prof. Sebe ministrou uma aula de história oral.

Junto com o colega e historiador José Sebastião Witter, professor da USP, organizou e publicou, em 1982, o livro “Futebol e cultura: coletânea de estudos“, obra referencial dentro dos estudos sobre a temática futebolística no Brasil.

Boa leitura! 

 

José Carlos Sebe Bom Meihy. Foto: Sérgio Settani Giglio.

 

Terceira parte

 

Pensando nas barreiras que os futebolistas constroem ao serem entrevistados, principalmente ao contarem como chegaram a ser jogadores e sobre suas famílias, quais são as possibilidades dessas barreiras serem quebradas?

Muitas, muitas. Primeiro: entrevistas múltiplas. Deixa o cara falar. Deixa ele falar, contar… Chega um ponto em que você começa a ter espaço para outras perguntas: o que você fez na escola? qual foi seu primeiro brinquedo? qual sua lembrança mais antiga? você se lembra de sua primeira comunhão? E tem mil recursos. Segundo: objetos importantes. Pegue uma fotografia da cidade em que o cara nasceu e pede para ele contar. Eu estou saindo hoje de uma entrevista com um médico muito famoso que queria falar só de uma coisa. Aí eu descobri que esse médico veio de uma família do Vale do Paraíba e que o pai dele tinha um hotel. Nós mostramos a fotografia do hotel do pai dele. O cara quebrou. Então, o grande médico, etc., começa a mostrar que tem uma vida atrás do que ele quer mostrar primeiro. O que ele quer mostrar primeiro tem que aparecer, mas tem que aparecer dentro de uma complexidade… Sabe o que fiz com José Mindlin? José Mindlin tinha dado quatrocentas e tantas entrevistas e o homem só falava a mesma coisa. Eu precisava quebrar isso. ‘Agora, o que vou fazer?’ Sabe o que eu fiz? “Ok. Vamos dar uma volta em sua biblioteca”. Ele parava e falava “Esse livro comprei em tal situação… Esse em tal”. E ele me contou uma história completamente diferente. O Apolônio de Carvalho é um desses comunistas clássicos. Acho que poucas pessoas no Brasil deram tantas entrevistas como Apolônio de Carvalho. Filmada, gravada, cinematográfica, proibida, de todo jeito. E um cara que já tinha escrito livros. Entrevistas múltiplas. Até você chegar ao ponto “E o que o senhor nunca contou?”. Então tem mecanismos que quando chegarem aos 70 anos de idade estarão prontos…

As novas tecnologias poderiam ser utilizadas?

Você pegou no meu calo mais calado. Eu não posso, por dever de ofício, ser contra a tecnologia. O gravador, a máquina, o celular, a internet, enfim. Eu tenho que ser um ancião do meu tempo. Eu não posso falar mal da tecnologia. Mas eu venho de uma tradição ferrada. Para chegar a História Oral aonde chegou a minha contribuição foi muito sofrida. Eu tive que dar satisfação de cada vírgula que eu colocava. Só para você ter uma ideia, por exemplo, quando eu comecei a fazer esta coisa de História Oral tinha uma maldição chamada Manual de Redação da Folha de São Paulo e Manual de Redação do O Estado de São Paulo, que diziam ambos: “não pode usar exclamação”, “não pode usar reticências”, “não pode usar interjeição”. Então era uma purificação da linguagem de um jeito tão neutral, como diria meu bisavô, que não tinha jeito. Empobrecia tanto a língua. E como é que eu vou trabalhar com História Oral, com teatro de linguagem, sem usar reticências? Reticências é uma delícia, é uma volúpia. Então, veja só. Sei lá, a mãe está dizendo que o filho morreu, “Meu filho morreu”. Ponto final. Ponha uma reticência, você já transmite um mistério, você já sugere ao leitor alguma coisa. Eu venho dessa tradição, que teve que fazer a adaptação do que é transcriar. Porque todo mundo, como vocês, acabam tendo uma postura positivista – quer dizer “Ah, mas não foi assim que o fulano disse” – Não foi assim mesmo, e eu sei que não foi assim, mas como é que você vai por esse gesto que eu fiz lá [o professor faz um gesto sobre a mesa]?. Essa ênfase que eu estou dando, essa mudança de cara. O que é a entrevista? A entrevista é o que foi gravado? E que tem que ser reproduzido igualzinho? Como se todas as letras tivessem o mesmo tamanho e no mesmo tamanho contivessem todas as emoções e todas as variações. Isso não existe. A transcriação é a passagem de um código oral para um código escrito que implica em uma tradução. Sabe o que quer dizer apalavra tradução? A raiz da palavra tradução é traição. Você trai. E não tem jeito de você não trair. Estou falando em termos lingüísticos (risos). Então você tem que entrar no texto. É o momento em que você colabora. Daí, isso é ótimo de dizer. No Brasil nós temos a palavra depoimento – “Ai, eu vou colher um depoimento” – Você já pensou um índio dando um depoimento… Vai fazer uma entrevista! Entre-vista. Quer coisa mais linda do que entre-vista. Você não vai colher um depoimento de um jogador de futebol, pelo amor de Deus! Você vai fazer uma entrevista com o cara. Por quê? Nós tivemos uma maldita ditadura política que não acabou na cabeça de tanta gente ainda, que ainda usa depoimento. Depoimento é o que o cara fala na polícia. Eu vivo repetindo “O casal Nardoni dá um depoimento”, porque no depoimento está a aferição da verdade, certo? Isso não vai acontecer numa entrevista. Na entrevista você está entrevistando alguém. Você está cruzando ideias. “Olha, eu não sei em que ano foi isto…”. Isso é em português que tem a palavra depoimento, porque em inglês a palavra depoimento é statement, não é interview, em francês, em turco, em qualquer outra língua, mas no Brasil é entrevista. Por que o pessoal ainda está pregadão naquela velha ideia de que entrevista é depoimento. E fala, todo mundo fala. Eu não. Outro dia fui em uma mesa redonda e o reitor de não sei onde falou: “Porque os depoimentos trabalhados…” Eu, na hora em que chegou a minha modesta vez, falei assim: “eu não sou policial, não sou delegado, detesto delegacia, não faço depoimento e nem presto, não colho, nem presto depoimento. Eu faço entrevista.”

Na chamada do site faremos “O professor Sebe presta depoimento…” (risos).

Aí você pega uma foto d’eu fazendo um haraquiri… (risos). Mas eu quero ver como vocês vão trabalhar essas coisas. Depois nós vamos discutir sobre esse depoimento (risos).

José Carlos Sebe Bom Meihy. Foto: Enrico Spaggiari.

Professor, fale um pouco dessa questão da entrevista gravada em vídeo. Isso resolveria alguns problemas?

Pois é, a entrevista gravada em vídeo. Eu venho dessa tradição de trabalhar a transcriação e etc.. Eu venho da palavra escrita. Agora, a gente fugir da importância da imagem, não é? E eu tenho colegas que vão direto para a entrevista gravada. Olha, nós começamos essa conversa hoje dizendo: “Pois é, sem querer eu sai com a camisa verde”. Eu corinthiano, imagine? Agora imagine vocês, se estão me filmando e eu com a camisa verde. Eu nunca uso camisa verde, pelo menos nesse tom. Eu tenho umas verdinhas clarinhas, umas coisinhas assim, mas assim… Se eu viesse para uma entrevista filmada com certeza eu teria o cuidado de não vir de verde. Não que eu viesse de preto e branco, mas eu daria um jeito de vir, sei lá, um azul, qualquer outra cor. Mas o que eu acho é o seguinte: a imagem, o aparelho pega você. Vocês já devem ter feitos entrevistas gravadas com mulheres, né? Aí não pode chorar. Agora imaginem uma entrevista que o cara vai tomar cuidado de não chorar. E é um problema. Para mim eu vou entrevistar alguém que vai chorar eu já começo a chorar antes da pessoa. E como é que fica essa coisa? Ele chora e eu não choro? Afinal de contas, eu não estou na entrevista? É só a imagem que eu pego que é parte da entrevista. Tem algumas questões que é assim, como faz o pessoal da USP em geral, passa-se por cima; vão fazendo e depois… Eu não. No meu caso eu tenho que discutir ética. Eu tenho que discutir como é que isso vai virar texto, certo? E tem uma discussão, que é uma discussão ferrada, para cachorro grande que é o que puxa. A voz que puxa a imagem ou é a imagem que puxa a voz? É outra coisa que a gente tem que discutir. E como é que fica a edição disso? Porque na transcriação eu sei como resolver, mas com o peso da imagem eu não sei como resolver. Olha eu fui discutir isso no Seminário lá no Rio de Janeiro. Eu quase apanhei. Mas eu quase apanhei. Porque eu coloquei essas questões. Perguntaram para mim: “Mas professor, o senhor ainda não faz entrevista com imagens?” Eu falei “Até faço. Eu cometo algumas leviandades, mas enquanto eu não tiver o domínio… enquanto eu não tiver as respostas para essas perguntas, eu não vou adotar isso como prática”. Há vantagens enormes. Você pega o semblante da pessoa. Você não precisa colocar entre aspas “risos”, “lágrimas”, mas de outro lado, como é que você vai escrever isso? E como é que você vai analisar sem o escrito? O Eduardo Coutinho, outro dia, declarou solenemente quando perguntaram para ele: “Professor, mas que livros o senhor lê?”. “Eu leio os livros de história oral.” E resolve de outro jeito. Mas ele pode, ele é cineasta. Eu estou trabalhando agora com o Sílvio Tendler. Eu estou fazendo uma coisa maravilhosa. O Sílvio mora perto da minha casa e ele está muito doente. Ele teve uma diabetes muito avançada e teve um deslizamento de medula, mas na semana passada nós conseguimos levá-lo para Caxias. E ele quer fazer a história da vida dele, e ele tem muita foto. Ele está fazendo um filme sobre a história da fotografia. Eu vi. Está uma maravilha. Uma coisa incrível. Agora, imagine você? Ele quer que eu, que venho desta tradição de gravador faça a entrevista dele que vem de uma tradição de imagem. Resultado: nós tivemos que colocar uma menininha, muito bonitinha, no meio de nós dois para conseguir ver como nós vamos fazer. Ele quer que eu vá entrevistá-lo. Então eu vou entrevistá-lo. E vamos fazer. Talvez depois disso eu tenha uma resposta… Escuta, mas essa é uma entrevista eterna? (risos).

José Carlos Sebe Bom Meihy. Foto: Sérgio Settani Giglio.

Sebe, voltando um pouco para a parte escrita, a revista Oralidades publicou recentemente um dossiê Esporte e Corpo. Muito tempo depois do seu livro, esporte e corpo aparece em uma revista. Quais os impactos?

Bem, são dois momentos completamente diferentes. Lá atrás era um ato assim “L´enfant terrible”. Era uma rebeldia. Agora é perfeitamente enquadrada dentro do espírito… Corpo, é uma coisa… Se bem que tem um artigo ali, alguns artigos, que eu gosto muito. Mas tem um artigo… como é que chama aquele primeiro rapaz? O primeiro artigo é daquele rapaz do Rio, Sérgio Barcellos, Corpo, Esporte e Tempo a partir de entrevista com Denise Mattioli. Eu acho que é um artigo excelente. Ele é muito bom. E ele trabalha mais com questão de corpo. E eu acho que aí tem uma sacada legal do Roberto DaMatta, porque nós analisamos o futebol como se o jogador não tivesse corpo. Eu acho isso incrível, né? Às vezes eu fico vendo – como é que vai aparecer na entrevista? – mas eu fico vendo aqueles negões, suando, 45 minutos, e como é que será que funciona a questão da caatinga quando ele chega perto do outro, suando? Será que isso influencia? Eu adoraria fazer essa pergunta para um jogador de futebol. Entende, como é que resolve essas questões de que, elegantemente, vamos chamar higiene no futebol. Não é legal isso? Por que será que a festa de malandragem – você vai ter que traduzir isto – dos jogadores são sempre proibidas, são sempre fechadas, etc.? Será que esse pessoal não imagina que jogador tem corpo também, tem relações sexuais? Por que essas perguntas não aparecem? Eu estou analisando – será que posso falar isso? Eu vou falar. Eu estou analisando um trabalho, um estudo sobre mulheres em presídios. Então conta a história das mulheres nas cadeias e etc., mas parece que essas mulheres não tem sexo. Nós tivemos esse problema lá no nosso grupo de estudo. Meninas que estavam fazendo trabalhos sobre jovens. “Jovens, a pressão da sociedade, primeiro emprego, etc.” E parecia que jovem não tinha sexo. História Oral, nós precisamos quebrar com isso. Na história dos presídios eu quero saber como é que é que a moça resolve os problemas de desejo. História de vida. Tem vida até aqui, e daqui pra cá não tem vida – não pode. Você tocou em uma questão que me atormenta agora. Tudo bem, vamos falar de preconceito no futebol e etc. Mas eu quero saber porque que o negão casa com a loira, certo? É apenas um fetiche histórico ou tem outras implicações? Eu queria saber por que a loira casa com o negão? Por isso que eu acho que aí tem uma conversa legal de não exclusivisar – agora a palavra é essencializar -, não essencializar um personagem, mas pensar… Nós já estamos indo, estamos avançando bem no nosso grupo. A Marta Caberi defende a tese dela sobre mulheres onde ela entrevistou homens. Que tem que ser. Como eu vou falar de história da mulher sem falar da história do homem? E também, outra coisa do futebol. Eu preciso arranjar um acadêmico macho que trabalhe com a questão do homossexualismo no futebol. Mas não é para mostrar aquele jogador do São Paulo, ou aquele casinho lá atrás. Mas é preciso que aborde essa questão, até para o cara dizer que não tem, mas não tem por isso e isso. Eu quero argumento. Onde é que está a pergunta? Então, eu acho que a História Oral ainda tem muito a avançar na questão do futebol. E pensando bem essa expansão do futebol para a família, entende?

Por exemplo, pensar na troca de camisas, que enquanto na primeira divisão se troca por uma nova no intervalo e na várzea às vezes nem se lavou do último jogo. Daria várias análises interessantes.

Você já pensou… Olha que temão! A troca de camisas. O que isso significa? Antropologicamente falando. Trocar a camisa. Pensando em termos de relações pessoais, quem troca a camisa com quem? Como essa negociação é feita? Olha só que temão que não está estudado. A escolha da chuteira. Esse é outro tema danado de interessante. A gente precisa acabar com essa história de fazer história sobre a mesma coisa. O lema do nosso grupo é “vamos fazer o que os outros não estão fazendo”. Eu não sei se vocês estão fazendo outra coisa diferente comigo do que vocês já fizeram com todo mundo, em todo caso (risos).

José Carlos Sebe Bom Meihy. Foto: Sérgio Settani Giglio.

Vamos fazer uma pergunta que todos fazem. Quais são as suas lembranças da Copa de 1950?

Copa de 50? Rapaz, olha só, eu tinha 13 anos de idade. Eu tenho uma lembrança marota. Eu queria ir para o Rio de Janeiro, me interessava muito a Copa de 50. Isso chama-se pergunta de corte, não é pergunta marota não. Quando a gente faz a mesma pergunta em todas as entrevistas, tecnicamente falando, a gente faz um corte que deve dar um metabolismo do projeto em geral. Mas uma lembrança muito forte que eu tenho é que eu queria ir para o Rio. De qualquer jeito. Eu queria ir para o Rio e para a Copa. Do jogo eu me lembro da tristeza do meu pai. Muito, muito. Meu pai era um homem muito sanguíneo, ardente torcedor de futebol, libanês. E o Brasil ganhar para ele era uma coisa vital. A certeza que ele tinha que o Brasil ia ganhar. Olha, eu nunca tinha lembrado disso, mas na minha casa o meu pai bebia bastante; era um ardente devoto dos escoceses, mas não tinha bebida na minha casa, porque ele não queria dar mau exemplo para os filhos. Mas ele tinha comprado uma garrafa, custado muito caro. Uma garrafa de uísque para comemorar a vitória. Era uma certeza. Era uma garantia. Eu me lembro também que quando comecei a tomar consciência de História do Brasil, etc., do peso da frase: “o dia mais triste da história do Brasil”. Vocês já devem ter ouvido isso. Mas como historiador isso pegou muito. “O dia mais triste da história do Brasil”. Aliás, eu nunca soube quem cunhou essa frase.

A frase é do Paulo Perdigão.

Mas eu não acho que é o dia mais triste da história do Brasil. Tem outros. Eu acho que quando o Lula perdeu a primeira eleição foi o meu dia mais triste da minha história do Brasil. Teve outros.

As lembranças da Copa de 1950 passam muito pelo seu pai?

Sim, pelo meu pai. Nossa. Porque meu pai tinha essa ligação com o futebol, muito forte. Ah, tem outra. A aposta. Meu pai apostou que ia ser 5×0 para o Brasil na final. Mas ele apostou assim porque você não apostava que o Brasil iria perder. Não tinha um outro que apostava no Uruguai. Apostava-se em quanto iria ganhar. Meu pai apostou que seria 5×0. Apostou com nhonhõ Cassiano. Nunca vou me esquecer disso. Nhonhõ Cassiano era um caipira riquíssimo que usava um anel com uma pedra de rubi. Ele apostou com nhonhõ Cassiano que seria 5×0. Vou lembrar minha irmã disso.

Professor, seu pai soube que o senhor não foi jogar naquele dia?

Soube, lógico. Eu era um completo idiota, eu falei para ele (risos). Ele teria ficado felicíssimo se eu tivesse dito: “roubaram a medalha”. Mas não, o idiota foi lá e disse: “eu não joguei”. Eu não paguei, eu dei alguma coisa para o cara jogar no meu lugar. Todo mundo ficaria feliz: o cara; meu pai teria morrido feliz; e eu, o idiota, fui lá dizer que tinha mentido (risos). Olha, a mentira tem tantas virtudes. Ela pode agradar mulher traída, pode agradar o homem traído, não sei por que a gente precisa da verdade. Por isso que gosto de História Oral. A História Oral não precisa da verdade. O que menos interessa é o depoimento; a verdade prestada, jurada. Interessa muito mais a ucronia.

E o que esperar da Copa de 2014 no Brasil?

Rapaz, eu tenho medo, porque estamos montando um circo… Outro dia eu estava no metrô do Rio de Janeiro e tinha um cara discutindo o absurdo de não ter jogo no Rio, só a final, na capital do futebol, etc. Putz grila, eu pensei: ‘imagina se só tem o último jogo no Rio e ainda perde?’. Eu tenho ido para a Espanha, tenho visto futebol espanhol. E ontem, vendo o jogo do Flamengo, que coisa horrorosa; a bola vem pra um lado, a bola vai pro outro lado, depois vem pra um lado. Não tem mais aquele joguinho curto, aquela conversa de bola pequena, de bola que vai para cá, que vai para lá. Futebol brasileiro se distinguiu muito do futebol europeu. Houve um tempo que o futebol europeu era aquela coisa reta, vai pra lá, vem pra cá, mas jogado; não é essa bola jogada pelo Flamengo, um bando de barata tonta. Eu ia falar uma coisa, mas é melhor não falar (risos). E hoje o futebol europeu é esse futebol de conversa, futebol de treino, de resistência. Nós não temos jogadores resistentes. Sabe que medo eu tenho também? Que vire uma reforma urbana nas cidades brasileiras, ter um estádio novo, transporte para o estádio, etc. Mas de futebol mesmo…

José Carlos Sebe Bom Meihy. Foto: Sérgio Settani Giglio.

Antes de encerrar, professor, o senhor quer falar mais alguma coisa, algo que deixamos de mencionar ou perguntar?

Sim, quero, três coisas. Primeiro: história empírica, entrevistar pessoas. Até podemos enfeitar com teorias estrangeiras, etc., mas fazer História do nosso futebol, da nossa gente, do nosso contexto, das nossas taras futebolísticas. Segundo: levantar aspectos que não tenham sido pensados. Nós falamos: troca de camisas, história da chuteira, história do cheiro, história das manias, essa história das pequenas coisas do futebol. Terceiro: história da família dos futebolistas. E História Oral, claro. Tudo isso com História Oral.

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