O futebol transcende sua condição de fenômeno esportivo, se tornando também importante elemento sócio-cultural e espacial, construindo uma instância da espacialidade própria: o espaço de representação do futebol. Este trabalho tem como objetivo analisar o futebol amador sob um enfoque geográfico, a partir das territorialidades construídas através da apropriação dos elementos do espaço de representação do futebol, no contexto da pós-modernidade. Para tal, foi desenvolvida uma discussão teórico-metodológica, que visou estabelecer aproximações entre as formulações de Maffesoli (sobretudo as relacionadas ao paradigma da socialidade, típico da pós-modernidade) e de Lefebvre (principalmente aquelas acerca da vida cotidiana e da espacialidade, mais especificamente daquelas dos espaços de representação). Da aproximação entre estes autores e outros (como Soja e Moscovici), derivaram-se alguns conceitos, como o de vida cotidiana pós-moderna e o de trialética da existência pós-moderna. Desenvolveu-se também uma discussão temática acerca do fenômeno futebolístico em suas dimensões esportiva, sóciocultural e espacial, a fim de estabelecer uma definição de futebol amador, que parte de Tamburrini, bem como de formular o conceito de espaço de representação do futebol. O futebol amazonense foi escolhido como objeto da pesquisa de campo, na qual foram feitas observações in loco, realizadas 24 entrevistas com atores do espaço de representação do futebol amazonense e coletada uma diversidade de materiais publicados sobre o futebol amador amazonense (reportagens, documentários, relatórios, regulamentos). A análise destes dados, a partir do desenvolvimento teóricometodológico e da Análise do Discurso, confirmou a prevalência simbólica do futebol amador no espaço de representação do futebol amazonense. De acordo com a apropriação dos elementos do espaço de representação do futebol, foram identificadas três principais manifestações do futebol amador no Amazonas: futebol associado a festejos (religiosos e folclóricos); campeonatos vinculados à Federação Amazonense de Futebol (ligas municipais e Copa dos Rios de Seleções); e o Campeonato de Peladas do Amazonas (Peladão). A esta última manifestação foi dedicada uma análise mais profunda, devido à sua complexidade e ao fato de ser uma das mais completas manifestações da trialética da existência pós-moderna. Dividido em seis categorias (Categoria Principal, Peladinho, Master, Feminino, Indígena Masculino e Indígena Feminino) e organizado a partir da centralidade subterrânea, bem como da lógica da tribalização, o Peladão é considerado o maior campeonato de futebol amador do mundo. Além do torneio de futebol, o espaço de representação do Peladão abrange outros universos simbólicos derivados de outras manifestações, como o concurso de Rainha do Peladão (um concurso de beleza vinculado ao campeonato de futebol) e as barcas (confraternizações pós-jogo realizadas pelos times do Peladão). A articulação destas três manifestações constrói complexas territorialidades que se organizam a partir de uma rede sócio-espacial, que tem como características principais: a organização horizontal, a tribalização, uma estruturação identitária que promove a fusão entre elementos locais e globais, a conexão entre a prática social do Peladão e a prática social cotidiana pós-moderna, o orgiasmo, os momentos de presença e a montagem mitológica trágico-dionisíaca.
Palavras-chave: Futebol. Futebol amador. Futebol amazonense. Peladão. Espaço de representação. Espaço de representação do futebol. Pós-modernidade. Espacialidade.