O futebol como conhecemos hoje nasceu na Inglaterra, em 1863, com a formação da Football Association, a primeira entidade a institucionalizar a prática nas escolas aristocratas. O jogo, que já era praticado nas ruas antes mesmo do surgimento da FA, ganhou um código de regras universais que sistematizava e simplificava algumas regras, assim, o futebol praticado nos campos das escolas das colônias britânicas poderia ser praticado a partir das mesmas regras das escolas de Cambridge.
Assim, o futebol moderno nasceu dentro do ímpeto imperialista dos britânicos, que pode ser divido em duas vias, uma institucional, e outra não-oficial. Se o jogo ganhou o mundo pelas escolas britânicas espalhadas pelas colônias em todo globo, foi na prática não-oficial que o futebol conquistou o mundo. A para além dos produtos industrializados, o Império Britânico também exportava fenômenos sociais e culturais. Como afirma Eduardo Galeano, em Futebol ao Sol e à Sombra, “o futebol era um produto de exportação tipicamente britânico como os tecidos de Manchester, as estradas de ferro, os empréstimos do banco Barings ou a doutrina do livre comércio”.
Os trabalhadores ingleses, que estavam nas colônias ou nos portos espalhados por todo o Império, praticavam o futebol nas horas livres, nos cais dos portos ou nas linhas férreas. Marinheiros britânicos e os operários das estradas de ferro foram os principais agentes na difusão do jogo em todo o globo. Outro grupo que também contribuiu para popularizar o futebol, para além da ilha inglesa, foram os filhos das famílias aristocráticas que viajavam para a Inglaterra e voltavam com a experiência do jogo, com uma bola, uniformes, chuteiras e até mesmo com o manual de regras. Não à toa, o surgimento dos primeiros clubes de futebol fora da Inglaterra datam da última década do século XIX, e no início do século XX,
Na virada do século, especificamente entre 1890 e 1910, o futebol passou a ser praticado em Portugal, Espanha, França, Alemanha, Itália, Suíça, Bélgica, Holanda, Argentina, Uruguai e Brasil, e rapidamente vários clubes surgiram nesses países. Em três décadas o futebol ganhou o mundo, sobretudo, a Europa e a América Latina. Com esse rápido crescimento, buscou-se organizar a prática em todo o globo, foi nesse contexto que a Fédération Internationale de Football Association (FIFA) surgiu em 1904.
Mesmo nos períodos mais duros das Guerra Mundiais a prática do futebol seguiu crescendo ao redor do globo, mas foi na década de 1970 que o futebol, enquanto entretenimento, começou a ganhar novos significados. Se até a metade do século XX a popularização, e a torcida dos clubes de futebol serem estritamente locais, isto é, apenas na região ou no país de origem dos clubes, na segunda metade, o futebol sofreu com desterritorialização.
O principal vetor que culminou esse processo foi a televisão, ou melhor, as transmissões televisivas que passavam por um rápido e profundos processo de inovação tecnológica. A globalização do futebol, dos anos 1970 em diante, tem como origem os avanços midiáticos.
Os anos 1980 e 1990 foram decisivos para o futebol deixar de ser apenas um jogo, para se tornar um negócio. O futebol passou a ser visto também a partir de uma lógica mercantil, antes um jogo era assistido por um número limitado de pessoas, agora poderia ser comercializado e difundido por todo o planeta, e milhões de pessoas poderiam assistir uma partida de futebol à milhares de quilômetros de sua casa, graças a televisão.
Graças às forças econômicas das redes televisivas os principais clubes europeus (os mais ricos, com patrocinadores e parceiros) se lançaram rumo à globalização. Isso implicou os clubes se organizarem interna e externamente, isto é, buscar se internacionalizar ou manter-se fiel a sua localidade. Os clubes ingleses optaram por seguir o primeiro caminho, entraram também no mercado e ações, e se tornaram verdadeiras empresas. O Manchester United, por exemplo, virou a costas para a sua origem operária, e entrou definitivamente no mercado global, fez do clube uma marca, que é explorada economicamente, e principalmente pela televisão. Do outro lado, clubes como o Athletic Club de Bilbao, mantiveram a sua identificação com a sua localidade, no caso o País Basco, e vem sofrendo por essa escolha. O clube basco recebe menos cota das televisões, se comparado aos outros grandes da Espanha, e consequentemente, com menos visibilidade, recebe menos dinheiro de patrocinadores.
No meio termo temos o FC Barcelona, que ora se mostra como um clube global –comercializando sua marca, recebendo grandes investimentos de patrocinadores, e altos valores das cotas televisivas – e ora reivindicando a sua identificação local, isto é, com a Catalunha.
Curiosamente, a questão do regionalismo catalão ganhou força, e novos significados. Diante desse processo de globalização o clube se mostra como um representante da Catalunha, papel que assumiu ao longo de sua história, entretanto, o FC Barcelona faz desse elemento como algo distintivo na lógica global do futebol. Em outras palavras, o clube catalão utilizava a sua identificação local como um produto no mercado global. Nesse sentido, a globalização do futebol, pós-anos 1990, desterritorializou os clubes e forçou uma ressignificação das dimensões locais. Os avanços tecnológicos televisivos transformaram os clubes em marcas.
Por fim, a história do futebol mostra que o esporte nasceu de impulso global, imperialista, e ao longo dos anos, foi ganhando mais força graças a difusão televisiva. O jogo que se restringia a uma determinada localidade, agora não pode ser assistido em qualquer local do globo. Um efeito significativo desse processo foi o surgimento de novas torcidas, que não estão mais ligadas pela localidade, e sim devido ao apelo midiático que determinado clube recebe.