26.6

Repetir os erros, corrigindo os acertos

João Paulo Vieira Teixeira 19 de agosto de 2011

A eliminação da Seleção Brasileira na Copa América foi suficiente para que a grande imprensa colocasse em xeque o futuro dos comandados por Mano Menezes. Resumida nas figuras de Neymar e Paulo Henrique Ganso, esta “nova geração”, antes do início da competição continental, era apontada pelos jornais como a última chance de se resgatar o “verdadeiro futebol brasileiro”. Ignorando a discussão sobre qual seria essa “essência do nosso futebol” (assunto já abordado por Helal), é possível notar que este discurso foi muito alterado após o fracasso brasileiro.

Mano Menezes, técnico da seleção brasileira. Foto: Márcia Feitosa/VIPCOMM.

Depois do injustificável vexame nas cobranças de pênaltis contra o Paraguai, as capas dos jornais, dos grandes portais na internet e mesmo os comentários nos programas de televisão foram todas muito parecidas e podem ser exemplificadas abaixo:

Falta de gols e firulas marcam 1ª crise na geração Neymar, Ganso e Pato. » Portal Uol Esporte

Copa América derruba mitos Ganso e Neymar e ex-jogadores esperam mais maturidade. » Jornal Extra Online

Geração Perdida. » O Globo Online

Era inevitável esperar análises críticas que apontassem os erros cometidos pelo time e sugerissem correções no caminho a ser traçado até a Copa do Mundo de 2014. No entanto, parece inconcebível propor um rumo totalmente distinto do inicial e que fora defendido anteriormente pelos mesmos que agora são algozes.

A seleção atual (se é que já podemos caracterizá-la como um conjunto claramente uniforme) vinha sendo construída, tanto no discurso oficial da CBF, como nas matérias de jornais, como a antítese daquela que representou o Brasil na Copa do Mundo de 2010. Basta lembrar que, logo após a eliminação na Copa da África, o presidente da entidade que comanda o futebol no Brasil fez questão de “lavar as mãos” pelo que tinha ocorrido e garantir que, a partir dali, tudo seria diferente.

Fazendo um breve exercício de recordação, fica claro que nos últimos tempos, o futebol da seleção brasileira tem sido comandado seguindo sempre um mesmo princípio: se deu certo basta repetir tudo o que foi feito. Se deu errado, é preciso fazer tudo de forma diferente. Sem análise, sem reflexão. Não há nenhuma lição a se tirar da derrota, nem tampouco ressalvas a serem feitas nas vitórias. Basta negar ou repetir o passado, esta seria a receita do sucesso. Obviamente, a receita não tem dado certo, mas o que nos intriga é o fato de que imprensa esportiva gosta de embarcar nesta onda.

Se voltarmos para logo depois do último título mundial, em 2002, veremos que a história é sempre parecida. Na Copa do Mundo seguinte, a lembrança do pentacampeonato ainda estava muito viva e, por isso, manter as principais estrelas (principalmente o atacante Ronaldo) era algo incontestável. Não importava a forma do fenômeno, sem ele, certamente não conseguiríamos o hexa. Imprensa e CBF concordavam nesse ponto, pelo menos até o momento em que Henry fez o gol em Dida.

Ronaldo, o Fenômeno, em seu jogo de despedida da seleção brasileira contra a Romênia. Foto: Dorival Rosa/VIPCOMM.

A partir dali, o holofote foi colocado sobre todos os defeitos existentes. Condenamos os culpados e tivemos certeza de que para que o título viesse na África do Sul seria preciso uma seleção menos festeira e mais comprometida com o futuro da nação. Era preciso acabar com o Carnaval e criar um exército. Nas palavras do narrador Galvão Bueno: “Alguém um dia talvez consiga explicar. Faltou, não se sabe o porquê, atitude à seleção Brasileira. Faltou jogar com a raça com que jogou a Alemanha, com a raça com que jogou Portugal”.

Assim foi feito. Com Dunga como general, o Brasil formou uma seleção disciplinada e que não repetiria a conduta anterior. Bons resultados e muito comprometimento credenciavam o grupo. Vigor físico em excesso e limitações ao trabalho da imprensa incomodavam. Após a derrota, Galvão Bueno novamente apontou o caminho: “Quantas vezes se falou, que talvez um pouco mais de talento no banco de reservas seria necessário para um momento como esse. Talvez tenha faltado”.

Dunga e Jorginho, quando eram técnico e auxiliar da seleção brasileira. Foto: Paulo Favero.

Agora, os talentos estavam disponíveis e chegaram à Copa América com a oportunidade de “devolverem ao país” a “verdadeira seleção”. Também não deu certo. Precisamos de outro caminho? Ele existe?

Toda esta argumentação não se propõem a encontrar os culpados pelos últimos resultados negativos da Seleção Brasileira. Seria contraditório. Incluir passagens do narrador Galvão Bueno foi apenas uma alternativa fácil de resumir o que se pretendia demonstrar. Ele não é o único a expressar opiniões deste tipo. Não é o vilão da história. É apenas o emissor cujas palavras tem o maior alcance. A tentativa – superficial e resumida – foi de mostrar como a grande imprensa é capaz de alterar seu discurso de acordo com a mudança da maré. E de que forma a CBF procura estar sempre alinhada a estas variações.

Trocar o locutor não resolve nada. Mesmo assim, se você quiser, bastar mudar o canal. Há opções. Trocar o comando da CBF é algo um pouco mais difícil.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
Seja um dos 14 apoiadores do Ludopédio e faça parte desse time! APOIAR AGORA

Como citar

TEIXEIRA, João Paulo Vieira. Repetir os erros, corrigindo os acertos. Ludopédio, São Paulo, v. 26, n. 6, 2011.
Leia também:
  • 98.2

    Alerta de pessimismo

    João Paulo Vieira Teixeira
  • 80.3

    Futebol, televisão, dinheiro e notícia

    João Paulo Vieira Teixeira
  • 72.4

    Significado de Corrupção

    João Paulo Vieira Teixeira