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Algumas referências históricas sobre estádios de futebol em São Paulo

João Paulo Streapco 14 de fevereiro de 2010

As discussões sobre as origens do futebol no Brasil são enormes e giram em torno do papel de Charles Miller, da imigração, da urbanização que o país sofreu no decorrer do século XX, entre outros. Tem um aspecto que gostaria de resgatar neste artigo e que considero primordial, que é a dos espaços utilizados para a prática do futebol, desde o Velódromo Municipal até o Estádio do Morumbi.

Cada estádio diz muito do tipo de futebol que praticamos no decorrer destas décadas. Das praças paulistanas que existem hoje, a mais antiga é o Parque Antarctica ou Palestra Itália, que foi inaugurada pela Cia. Antarctica Paulista, em 1904, para que a população pudesse usufruir de um espaço público de lazer. Ela, no entanto, não é a pioneira, função que coube ao Velódromo.

Inaugurado na década de 1890, o Velódromo Municipal ficava entre as ruas Augusta, da Consolação e Martinho Prado, ao lado da Igreja da Consolação. Tratava-se de um projeto particular de dona Veridiana Prado, um presente que uma das pessoas mais ricas da cidade ofereceu aos netos para que estes pudessem praticar o ciclismo, esporte que estava na moda entre os rapazes da elite de São Paulo.

O projeto de 1886, assinado por Tommazzo Gaudêncio Bezzi (que assina também o projeto do edifício do Museu do Ipiranga), reservava um espaço para cerca de mil pessoas acompanharem as corridas, tinha um bar, depósito e área de apostas, pois além de divertir seus netos, dona Veridiana pretendia ganhar dinheiro com apostas, imitando o que ocorria no hipódromo. A construção ficou pronta em 1892, mas só a partir de 1896 foi utilizada para o futebol.

Foi neste espaço que se organizou o chamado futebol oficial da cidade através da fundação da Liga Paulista de Futebol e onde se disputou as principais partidas da cidade até 1917. O elitismo era a marca deste espaço, que não permitia o ingresso de jogadores e times o futebol praticado na Várzea do Carmo.

Demolido em 1917 por causa da expansão imobiliária avassaladora, sobrou como lembrança de algumas fotos e memórias da cidade daquela época, na medida em que o quarteirão que ocupava foi fragmentado através da abertura da rua Nestor Pestana e os times que lá jogavam já não fazem parte dos quadro da Federação Paulista de Futebol.

Nesta época, a prefeitura adquiriu a Chácara da Floresta na margem do rio Tietê e a cedeu para que as equipes pudessem construir seus estádios. Corinthians, Palmeiras (na época Palestra Itália) e São Paulo tiveram seus campos na Chácara. Os remanescentes desta época são a Associação Portuguesa de Desportos e o estádio do Canindé, o Clube de Regatas Tietê, o Clube Espéria e a A.A. São Paulo. Algumas fotos da época nos mostram que o conceito de estádio na época era diferente do que temos hoje. No máximo dez mil pessoas, arquibancadas pequenas e tubulares, que segundo os relatos de alguns memorialistas, eram montadas pelos próprios jogadores.

Em 1920, o Palestra Itália adquire o Parque Antarctica, que durante os 20 anos seguintes foi a principal praça desportiva de futebol da cidade. É bom lembrar que o estádio não tinha a feição que tem hoje. A arquibancada começou a ser construída na década de 1930, o campo (ou jardim suspenso, como dizem os mais poéticos) foi elevado já na segunda metade do século.

Por ocasião da celebração do centenário da Independência, em 1922, e por conta da popularização do futebol, a administração pública começa a discutir a possibilidade de construir um grande estádio municipal. Este projeto só se consolidaria em 1940, com a inauguração do Estádio do Pacaembu (Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho).

O projeto original foi alterado. Primeiro, pensava-se em aproveitar apenas as encostas do vale. Posteriormente, as duas encostas na parte do estádio virada para a Praça Charles Miller foram unidas, quando o estádio foi inaugurado. Finalmente, no início dos anos 1970, demole-se a concha acústica para a construção do Tobogã. Até a inauguração do Maracanã, foi o maior estádio do Brasil.

O processo de expansão do futebol foi assombroso, assim como crescimento de São Paulo. No início dos anos 1950, o São Paulo Futebol Clube começa a construir aquele que seria por muitos anos o maior estádio particular do mundo: o Estádio do Morumbi (Estádio Cícero Pompeu de Toledo). Inaugurado por etapas, de acordo com a elaboração dos anéis, ficou pronto no final da década de 1960.

Curiosamente, parte destes estádios recebe o nome de algum dirigente esportivo. Nenhum deles homenageia jogadores. E não é por falta de talentos, pois grandes craques do passado exibiram-se nestes gramados. Outras características deles são a conservação e a forma como o torcedor é recebido: pessimamente.

Já que em 2014 sediaremos a Copa do Mundo, seria esse o momento de discutirmos o papel que os estádios ocupam em nossa sociedade e que tipo de estádios queremos.

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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João Paulo Streapco

Mestre em História Social pela FFLCH - USP, onde apresentou a dissertação intitulada "Cego é aquele que só vê a bola. O futebol em São Paulo e a formação das principais equipes paulistanas: S.C. Corinthians Paulista, S. E. Palmeiras e São Paulo F. C. (1894 - 1942)."

Como citar

STREAPCO, João Paulo. Algumas referências históricas sobre estádios de futebol em São Paulo. Ludopédio, São Paulo, v. 08, n. 4, 2010.
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