O ano de 2019 no Brasil começou com muitas notícias trágicas logo em seus primeiros meses. As mortes causadas pelo rompimento da barragem em Brumadinho, o incêndio que vitimou os jovens jogadores do Flamengo no Ninho do Urubu, acidente de helicóptero que matou o jornalista Ricardo Boechat e a meningite meningocócica que precocemente levou a vida do menino Arthur, neto do ex-presidente Lula, são alguns exemplos que mostram como este ano começou.

Em meio a tantas notícias ruins, tem mais uma que, de modo geral, ficou em segundo plano na grande mídia brasileira. O complexo do Pacaembu está à venda. Será entregue para a iniciativa privada por 35 anos. Não há como negar que a onda neoliberal é avassaladora. Sob o discurso para justificar que a atuação do Estado seja mínima, é frequente ouvir que há muito tempo existe um rombo nas contas públicas. Tem sido assim para justificar uma reforma da previdência que retira os direitos conquistados com muita luta sob o discurso de que o sistema de seguridade social é insustentável.

É a esta mesma lógica que há uma reverberação de discursos de que há prejuízo na administração do complexo do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho, o Pacaembu. Aqui se faz necessário pontuar que o objetivo de um governo não é obter lucro, mas o de retornar para a população aquilo que ela pagou com os impostos recolhidos. Dar lucro ou prejuízo, portanto, não deveria compor o argumento para se pensar a administração pública. A administração pública funciona de um modo diferente de uma empresa privada, esta, sim, está em busca de lucros.

Panorama da fachada do Estádio do Pacaembu. Foto: Werner Haberkorn/Wikimedia Commons (Domínio público).

A meu ver, o que se pode discutir em relação ao Pacaembu é se o investimento aportado para manter aquele espaço, de fato, retorna para a população. Se a partir desta análise percebermos que há potencial para ampliar o acesso ao complexo, entendo que deveria haver uma política pública de ocupação daquele espaço, e não a sua privatização.

Para compor este quadro, é preciso sempre lembrar que o Pacaembu é tombado, por meio da Resolução CONPRESP nº 04/1988, com nível de preservação NP-1, conforme o art. 7º da Resolução nº 22/CONPRESP/2002[1]. E, portanto, esta é uma condição fundamental sobre o que se quer fazer com o Pacaembu e por isso as diretrizes de preservação do Complexo tombado precisam ser seguidas[2].

Um estudo produzido para justificar a necessidade de modernização do estádio foi realizado por sete empresas privadas de diferentes segmentos. É um documento extenso, com 541 páginas. Reproduzo algumas páginas do documento para mostrar que o próprio estudo fere a resolução apresentada acima. No documento da proposta do Novo Pacaembu, disponibilizado em maio de 2018, está prevista a retirada do Tobogã[3].

Mas para construir a minha análise será preciso percorrer os caminhos que tem levado – pois ainda não foi concretizada – para a privatização deste espaço tendo como marca o pouco diálogo com a população sobre os rumos do que é feito e oferecido na cidade.

Antes mesmo de João Doria ser eleito para prefeito da cidade de São Paulo, ele já anunciava a sua visão de cidade e o que pensa sobre a dinâmica da gestão pública. Em entrevista ao El País, em dezembro de 2015, assim se pronunciou quando perguntado de onde a prefeitura iria tirar dinheiro para investir na cidade:

Eu defendo o Estado mínimo, e vou fazer isso. A Prefeitura vai vender tudo aquilo que não for essencial para a gestão pública e a assistência à população que mais precisa. Vamos começar vendendo o estádio do Pacaembu, o autódromo de Interlagos e o parque de convenções do Anhembi. Numa mostra clara e definitiva de que o Estado não pode e não deve estar onde ele não é necessário. Quem deve administrar estes locais é o setor privado. Vamos vender e vamos vender bem, por valores que representam a dimensão física dos espaços e sua importância. E vamos aplicar os recursos onde são necessários. Principalmente saúde, educação e creches[4].

Interessante observar o discurso do então candidato a prefeito. Vender é a palavra utilizada por ele. Sob o argumento de que não cabe a administração pública gerir tais espaços. Ofertar Lazer para a população não é, segundo Doria, um dever do Estado ou do Município. Embora existam 48 Centros Esportivos gerenciados pela Prefeitura de São Paulo que oferecem atividades gratuitas para a população. Guarde outra frase dita por ele: “vender e vender bem”. Voltaremos a ela adiante no texto.

Embora não se tratasse de uma bravata de campanha a execução do andamento do processo de desestatização do Pacaembu não foi integralmente conduzido por Doria. O então prefeito teve a sua saída prematura da Prefeitura concretizada após 15 meses de cargo – deixou a prefeitura em abril de 2018 para concorrer às eleições governamentais. Suas ambições eram maiores, a de ser governador do Estado de São Paulo. E para realizar o seu plano de ação assumiu o seu vice-prefeito, Bruno Covas.

No dia 28 de março de 2018, a prefeitura, por meio de uma coletiva de imprensa, divulgou uma informação sobre o processo de concessão. Doria chegou a participar deste evento. Nele indicavam algumas premissas:

Foram definidas algumas premissas para a concessão:

  • Acesso continuará livre e gratuito;

  • Desoneração dos gastos municipais;

  • Continuidade das atividades desenvolvidas pela SEME;

  • Fiscalização rigorosa para preservação do patrimônio e prestação de serviços;

  • Todo projeto de intervenção deverá ser aprovado pelos órgãos competentes;

  • Promover mais atividades e usos;

  • Contrato de longo prazo;

  • Para a realização de eventos deverá obedecer às normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

E como forma de justificar apresentaram slides para mostrar a proposta a partir de alguns dados[5].

Embora os slides acima estejam arquivados no site da prefeitura com a indicação de consulta pública existem outras informações que remetem ao que foi discutido com a população e que são bem diferentes dos slides apresentados. As consultas, segundo o site da prefeitura, foram realizadas em dois momentos: entre 9 de janeiro e 5 de fevereiro de 2018 e depois entre 29 de março[6] e 22 de abril de 2018[7].

Vamos ver alguns comentários das consultas[8]:

05/02/2018 às 09:48 Guilherme Não concordo com a concessão do Complexo Esportivo do Pacaembu a iniciativa privada e muito menos a necessidade do PIU. Frequento o complexo esportivo a mais de 25 anos, e sempre que vou (a pé, transporte público, carro…) e usufruo da infraestrutura para a prática de esportes e lazer que ele oferece, sempre saio de lá satisfeito com o que essas atividades me proporciona. Incluo também essa mesma opinião, só que dos outros usuários (que conheço e frequentam) do complexo que residem nos mais diversos bairros e Zonas da cidade de São Paulo. Diante disso, identifico a inexistência de qualquer motivo plausível (como frequentador do complexo e cidadão Paulistano) para entrega desse bem público nas mãos de empresários particulares por forma de concessão. Logo, se realmente existe uma demanda atual de investimentos por parte da sociedade, através da Prefeitura de SP para o Complexo Esportivo do Pacaembu, não é a de uma concessão. E sim da continuidade de manutenção e reformas simples (no interior do complexo, sendo de valores irrisórios como já é sabido), assim como de zelo, investimentos em segurança, preservação da ordem pública e do equilíbrio da qualidade de vida que os arredores do Complexo “ainda” bravamente conserva. Esse é um dever da Prefeitura SP e não particular.

-x-

20/01/2018 às 21:42 Tony Costa R$ 9.000.000,00 (nove milhões de reais) anuais….. hmmmmm Quantas partidas de futebol profissional eram necessárias para se pagar esta conta? Acredito, que, exceção ao Juventus, todos outros clubes da Capital já transcendem a origem de bairro, como em outrora. Antigamente, o morador da Zona Leste era, por suposição, Corintiano, o Morador da Barra Funda era Palmeirense, o Morador do Pari torceria para Portuguesa, e assim por diante. O Corinthians tem seu estádio em Itaquera, assim mesmo, durante a construção do Itaquerão, a casa Corinthiana era o Pacaembu. O Palmeiras vai muito bem com seu novo “Parque Antartica” ou Arena Allianz, ouço dizer. Porque é que o S.P.F.C. ainda manda todos seu jogos em casa no Morumbi? Seria porque todos os moradores do Morumbi e imediações prestigiam financeiramente o S.P.F.C.? Qual é a média de público e arrecadação para jogos não importantes, no Cícero Pompeu de Toledo? Qual é a média de público e arrecadação para jogos não importantes, na Arena Allianz? Para quem não entendeu aonde quero chegar, porque não propõem ao S.P.F.C. em cotizar ou cobrir na íntegra com as despesas de manutenção ([i]nclusive de instalações públicas) em troca do uso das instalações em regime de cessão sob comodato?

Sobre os comentários é preciso ressaltar que o argumento do Guilherme ao indicar que o espaço é utilizado por pessoas vinda das mais diferentes regiões poderia ainda ser potencializado caso o espaço do Complexo fosse transformado em um Centro Esportivo. Atualmente existem 48 Centros Esportivos espalhados pela cidade de São Paulo. Vale ressaltar que o Clube Tietê foi recentemente transformado em um Clube Esportivo e oferece gratuitamente uma série de atividades.

Guilheme traz o questionamento referente aos valores e quantas partidas seriam necessárias para pagar a conta. Em relação a isto é preciso dizer que existem divergências nos números apresentados. Há um valor que se verbaliza nas entrevistas e outros que aparecem nas planilhas. De qualquer modo, entendo que o maior problema dos números é o modo como estão disponibilizados. Não está disponível uma planilha que reúna os valores do estádio. Mesmo que existam os dados referentes a renda bruta dos jogos de futebol não há uma padronização no modo como os dados estão apresentados. É preciso ter maior transparência no trato com este tipo de informação.

Ainda na dinâmica dos dados foram apresentadas as despesas referentes aos anos de 2016 e 2017, conforme a tabela abaixo[9]:

Despesas Pacaembu 2016-2017 – Contratos.

O texto do site informava o seguinte: “Os ganhos para o município com a concessão do Complexo Pacaembu, neste período de 35 anos, ficam em torno de R$ 400 milhões, incluindo investimentos, outorga, desoneração e Imposto Sobre Serviços (ISS). Em 2017, o Pacaembu obteve uma receita de R$ 2.463.298,71 milhões, já os gastos para a prefeitura chegaram a R$ 8,3 milhões”[10].

Aqui existe um jogo que é, no mínimo, cruel com a utilização dos dados. Para as despesas, há um detalhamento conforme pode ser visto na tabela acima. Para as receitas, há apenas a indicação do valor. É possível encontrar os dados referentes aos jogos de futebol, mas é preciso vasculhar o site da Prefeitura. E, além disso, não é feita a conta para mostrar o quanto foi o “prejuízo”. Fica-se apenas com o valor de referência que são as despesas e estas giram em torno dos 8 milhões de reais/ano.

Em outra notícia, a Prefeitura seguia na linha de dizer para validar como verdade inquestionável os prejuízos que o Complexo trazia para a administração pública. Assim dizia:

Assim, tendo em vista (i) os altos custos para manutenção do Pacaembu, arcados integralmente pelo Erário; (ii) uma utilização aquém de sua capacidade, especialmente após a inauguração de novas praças esportivas na cidade, o que reflete a diminuição das receitas ali captadas; bem como (iii) a necessidade de explorar novas formas de uso do Pacaembu, elevando o seu potencial como importante território urbano do Município, a Prefeitura de São Paulo tem o objetivo de realizar uma concessão do Complexo para melhor aproveitamento de suas instalações, maior eficiência na sua gestão e serviços prestados à população, reforçando sua vocação como centro de referência de esportes e atletismo, além servir de local de lazer, cultura, turismo, entretenimento e negócios no município de São Paulo, desonerando os cofres públicos[11].

A utilização a que se refere o trecho é apenas aos eventos futebolísticos e que geram uma entrada financeira para o Complexo. De fato, foram movimentados em 246 partidas, ao longo de 8 anos (2007-2010 e 2014-2017), 145 milhões de reais, dos quais ficaram em média com o Complexo do Pacaembu de 12% a 15% desta receita. Os jogos de dia possuem uma taxa de aluguel de 12% e à noite 15%. Algumas partidas com baixa arrecadação tiveram como cobrança uma “taxa mínima”, porém, esta não é especificada nos documentos sobre como é cobrada. Além do uso pelo futebol masculino também aconteceram partidas do futebol feminino e do rugby. Os dados são fornecidos pela própria prefeitura[12] e a partir deles montei o detalhamento das informações abaixo:

Os dados de 2011 a 2013 não estão disponíveis. PP – Público Pagante PNP: Público não Pagante

É preciso fazer duas ponderações em relação a estes dados: a primeira é que o Corinthians era um dos maiores locatários do Pacaembu antes de ter a sua própria Arena. Após 2014, o clube ainda jogou no Pacaembu, mas com uma frequência muito menor. O segundo fator é que o Palmeiras, durante a reforma do seu estádio, mandou basicamente os jogos no estádio do Pacaembu. Embora o clube ainda use o Pacaembu com maior frequência (provocado por shows que acontecem no Allianz Parque) em relação ao seu rival, a existência do estádio de ambos não permitirá que o Pacaembu tenha um grande número de jogos como ocorreu em alguns anos.

Mesmo em jogos de futebol o estádio municipal cumpre um papel importante diante das modernas Arenas que existem na própria cidade de São Paulo. Na Arena do Palmeiras, por exemplo, uma criança menor de 12 anos pagará meia entrada, se houver, do contrário terá que pagar o ingresso inteiro. Houve neste período de oito anos 358.427 pessoas que acessaram as partidas na condição de público não pagante. Segundo informação oficial são considerados não pagantes:

Por força de Lei Municipal menores de 12 anos e maiores de 60 anos são considerados não pagantes. Os menores de 12 anos, entretanto devem estar acompanhados por torcedores pagantes maiores de 18 anos. Os orientadores e os bilheteiros devem instruir o público que a entrada destes não pagantes, está condicionada a lotação dos setores conforme Art. 23 da Lei Nº 10.671.

O acesso dos não pagantes poderá ser feito nos seguintes setores: Tobogã ou no Portão Principal[13].

Volto a reforçar o que disse no início do texto: não deve ser considerado prejuízo ou despesa o que é investido pelo governo para atender a sua população. O argumento nunca é no sentido de dizer que a atualização aquém da sua capacidade será suprida com a utilização maciça da população por meio de projetos a serem implantados dentro do Complexo. Se isso fosse feito o termo prejuízo/despesa teria que ser substituído por investimento. E quem quer investir para a população usar os espaços públicos?

Nesta linha, houve uma retificação do edital para indicar que o uso continuaria a ser público:

  1. A) Atividades físicas orientadas pela SEME: EQUIPAMENTO TOTAL DE HORAS POR SEMANA Ginásio de Tênis (quadra interna e externa) 12 Ginásio Futebol/Handball/Basquete (quadra interna) 12 2 Salas de ginástica e atividade física (por sala) 12 Piscina 4 Pista de atletismo 4

  2. B) Atividades físicas não orientadas pela SEME: EQUIPAMENTO TOTAL DE HORAS POR DIA Piscina* 5 Pista de Atletismo* 8 Quadra Externa de Futsal 8 *O montante de horas destinado a essas atividades contempla as horas estabelecidas no quadro A acima, referentes à realização de atividades físicas orientadas pela SEME.

A Cláusula 5.98.1 do Anexo III do Caderno de Encargos da Concessionária da Minuta do Contrato referente à Concorrência Internacional nº 01/SEME/2018, passa a vigorar com a seguinte redação: 5.98.1 A associação ao CENTRO POLIESPORTIVO deverá ser gratuita ao longo de todo o período de CONCESSÃO, sendo que as regras para a associação e desassociação dos membros do Quadro de Associados do CENTRO POLIESPORTIVO deverão ser definidas pela CONCESSIONÁRIA e aprovadas pela SEME, devendo constar do Plano de Atendimento e Experiência do USUÁRIO.”[14]

Segundo projeto para o Estádio Municipal, realizado durante a gestão do prefeito Francisco Prestes Maia – Imagem publicada no Suplemento em Rotogravura do jornal O Estado de S. Paulo, 1ª quinzena de abril de 1940. Fonte: Jornal da USP.

No dia 16 de maio a Prefeitura publicou o texto abaixo tendo como manchete da informação que era o edital final da concessão do Complexo do Pacaembu[15]:

Prefeitura de São Paulo, por meio das Secretarias de Desestatização e Parcerias e Esportes e Lazer, publicou nesta quarta-feira, dia 16 de maio, no Diário Oficial do Município, o edital de licitação para a concessão do Complexo Pacaembu, composto pelo Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho e pelo Centro Poliesportivo.

O edital prevê agora a possibilidade de pagamento de outorga diluída. A outorga mínima será de R$ 36 milhões e o vencedor poderá dar um lance inicial, durante três anos terá carência para fazer apenas investimentos e, a partir do quarto ano, passar a pagar parcelas anuais para a Prefeitura, durante 10 anos. Vale ressaltar que, qualquer valor superior ao mínimo estipulado (R$ 36 milhões) deverá ser capturado no ato da licitação.

A modalidade de licitação do edital é concorrência internacional. Os ganhos para o município com a concessão do Complexo Pacaembu, que ficará sob a gestão da iniciativa privada durante 35 anos, ficam em torno de R$ 400 milhões, incluindo investimentos, outorga, desoneração e Imposto Sobre Serviços (ISS). Em 2017, o Pacaembu obteve uma receita de R$ 2.463.298,71 milhões, já os gastos para a prefeitura chegaram a R$ 8,3 milhões.

Para o secretário de Desestatização e Parcerias, Wilson Poit, a concessão deve atrair investidores nacionais e estrangeiros. “Iniciamos agora um road show em busca de investidores. Passaremos por Nova Iorque, China e Londres. Estamos lançando o edital de licitação do Pacaembu no momento certo”, afirma.

O concessionário deverá promover uma série de melhorias no Pacaembu, dentre elas, a reforma de todo o sistema elétrico, hidráulico, de telecomunicações, entre outras. Também está prevista a construção de 500 m² de novos sanitários, reforma dos banheiros existentes, vestiários, lanchonetes, pistas de atletismo, assentos das arquibancadas e implantação de geradores com painel de transferência automática.
Haverá um período de transição para a concessão. No Complexo Pacaembu, será de três meses para execução das três fases (preparação, operação assistida e operação do concessionário).

O concessionário deverá manter as atividades desenvolvidas atualmente pela Secretaria Municipal de Esportes e Lazer, além de promover mais atividades e novos usos para o Complexo.

Premissas para a concessão:
• Acesso continuará livre e gratuito 
• Desoneração dos gastos municipais
• Continuidade das atividades desenvolvidas pela SEME
• Fiscalização rigorosa para preservação do patrimônio e prestação de serviços
• Todo projeto de intervenção deverá ser aprovado pelos órgãos competentes
• Promover mais atividades e usos
• Para a realização de eventos deverá obedecer às normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).

Sobre a concessão

Tipo de contrato: concessão de serviços

Período de concessão: 35 anos

Objeto: concessão dos serviços de modernização, gestão, operação e manutenção do complexo do Pacaembu composto pelo estádio municipal Paulo Machado de Carvalho e pelo seu Centro Poliesportivo.

Modalidade de licitação: Concorrência internacional.

Critério de julgamento: maior oferta pela outorga mínima de R$ 36 milhões (valor pago em parcelas anuais) *Corrigidas pelo IPC (Índice de preços ao consumidor).

Transição: o período de transição é de três meses dividido em três fases: 
1 – Preparação – concessionária reúne documentação, elabora planos, etc; 
2 – Operação Assistida – concessionária acompanha o cotidiano da operação do Complexo; 
3 – Operação de Transição – concessionária assume a operação com apoio do Poder concedente.

Cartão postal do Estádio Municipal do Pacaembu. Obra que integra o acervo do Museu Paulista da USP. Coleção Werner Haberkorn – CHW.

Em junho a prefeitura da São Paulo, sob a gestão do prefeito João Doria, apresentou 15 slides para justificar a necessidade de desestatização do Complexo do Pacaembu[16] e para atrair possíveis investidores[17].

Conforme o próprio slide apresenta, há uma carência concedida ao investidor como contrapartida aos investimentos que realizará no Complexo. Esta é uma prática comum nos contratos de locação quando o locatário quer fazer benfeitorias no imóvel. O ponto que quero ressaltar aqui é que há uma visão, por grande parte das pessoas, de que ao sair das mãos do governo haverá o início do pagamento das parcelas, que, por sua vez, será incorporado nesta lógica às contas públicas.

Em primeiro de agosto de 2018, foram prestados inúmeros esclarecimentos pela Comissão de Licitação da Concorrência Internacional referente ao edital[18]. Um destes esclarecimentos versava, por exemplo, sobre os contratos vigentes, estabelecidos via editais, das diversas demandas que o Complexo necessita, já que são com empresas diferentes e possuem vigências também diferentes. Estes contratos referem-se:

1 – Monitoramento Aquático: Contrato nº 002.SEME.2015;

2 – Limpeza: Contrato nº 005.SEME.2018

3 – Vigilância: Contrato nº 013.SEME.2015;

4 – Placar Eletrônico: Contrato nº 028.SEME.2014;

5 – PABX: Contrato nº 089.SEME.2013

6 – Áreas Verdes: Contrato nº 093. SEME.2014

7 – Manutenção do Gramado: Contrato nº 053. SEME.2013.

Os valores e vigência podem ser vistos na tabela disponibilizada no próprio portal da prefeitura:

Assim, no dia 8 de fevereiro de 2019, a Prefeitura abriu os envelopes da concessão do Pacaembu e emitiu o comunicado abaixo[19]:

Procedimento aconteceu no Auditório A do Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa (COTP)

Na primeira etapa da licitação do Complexo do Pacaembu (abertura dos envelopes), realizada hoje, 8, pela Prefeitura de São Paulo, o Consórcio Patrimônio SP, formado pela Progen – Projetos Gerenciamento e Engenharia S.A e a Savona Fundo de Investimentos em Participações, apresentou a melhor proposta financeira pelos 35 anos de concessão do estádio: R$ 111.180.600,00.

O valor mínimo da outorga fixa era de 37.451.000,00, representando cerca de 200% de ágio.

Os demais concorrentes apresentaram as seguintes propostas financeiras:

Consórcio Arena: R$ 88.451.100,00;

WTorre: R$ 46.841.000,00;

ConstruCap: R$ 44.813.100,00.

A Ata da Sessão será publicada no Diário Oficial do Município neste sábado, 9, e será aberto o prazo de cinco dias úteis para eventuais recursos. Não havendo, será iniciada a fase da habilitação, em que será avaliada a documentação do licitante que apresentou a melhor proposta financeira.

Embora a notícia apresente um ágio de 200%, o valor representa, ao dividi-lo pelo período de 35 anos, o equivalente a 3.176.588,57 reais por ano. A efeito de comparação, a renda de 17 partidas em 2017 (sendo 4 delas de Rugby e amistosos) geraram uma receita bruta de 11.112.133 reais. O que isso significa? Existe no estádio do Pacaembu um excelente potencial para gerar renda. Se assim não fosse, as empresas privadas não investiriam tais quantias em um projeto que só produzirá despesas.

Por enquanto, o ato “final” foi dado pela Juíza de Direito Maria Gabriella Pavlópoulos Spaolonzi, que anteriormente, em dezembro de 2018, já havia pedido a não abertura dos envelopes[20], e agora, em fevereiro de 2019, conseguiu a suspensão da licitação.

O imbróglio está longe do fim. Porém, enquanto a concessão for feita sob os interesses e demandas da iniciativa privada, continuaremos a manter afastada a sociedade de espaços que ela poderia ocupar. Por que não transformá-lo em um Centro Esportivo? O Pacaembu enquanto um Centro Esportivo ainda teria o diferencial de receber partidas do futebol profissional. E, para além da modalidade futebol masculino, o estádio do Pacaembu poderia ser um grande polo para concentrar o desenvolvimento de outras modalidades, tais como o futebol feminino, o rúgby e o futebol americano pensando em esportes que utilizariam o campo.

O fato é que a cidade de São Paulo está à venda. O Pacaembu será, talvez, um dos mais conhecidos espaços a serem desestatizados. Existem muitos pontos em aberto sobre o futuro do Pacaembu. A única certeza é a de que não há um projeto de política pública para ocupação deste espaço que poderia transformar por completo o acesso a inúmeras práticas esportivas na cidade de São Paulo.


[1] Processo26288/88 – Tombamento

[2] https://minuta.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/piu-pacaembu/#/consulta

[3] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/governo/projetos/desestatizacao/pacaembu/index.php

[4] João Doria: “Se for prefeito, vou vender o Pacaembu, Interlagos e o Anhembi”. El País, 27 de dezembro de 2015. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2015/12/24/politica/1450960696_078427.html

[5] https://drive.google.com/file/d/1cFK_drSdr8oV0MFSsRIpj5VxJ_IUkkzE/view

[6] https://minuta.gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/piu-pacaembu/#/consulta

[7] https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2018/01/Ata_audiencia_publica_assinada.pdf

[8] https://drive.google.com/open?id=1tCqwAbKiqkImUo7maxb1yWWNCOEq6ZBU

[9] http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/SEME%202018/Despesas%20Pacaembu%202016%20e%202017%20-%20Contratos.xls

[10] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/noticias/index.php?p=252741

[11] https://gestaourbana.prefeitura.sp.gov.br/estruturacao-territorial/piu/piu-pacaembu/

[12] https://drive.google.com/drive/folders/0B-j2xIrFvrW5eDNwcjEwR3FxWEk

[13] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/estadio_pacaembu/ingressos/index.php?p=752

[14] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/estadio_pacaembu/index.php?p=256256

[15] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/noticias/index.php?p=260433

[16] Veja os outros espaços que serão desestatizados: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desestatizacao/

[17] https://drive.google.com/file/d/1nUiDEZIhfUyoD-hNN-Et28-LbogxlpzW/view

[18] https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/estadio_pacaembu/index.php?p=256256

[19] Prefeitura realiza abertura de envelopes da concessão do Pacaembu. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/esportes/estadio_pacaembu/index.php?p=256256. Acesso em 1º de março de 2019.

[20] Decisão liminar processo 1034029-70.2018.8.26.0053

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Sérgio Settani Giglio

Professor da Faculdade de Educação Física da UNICAMP. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Esporte e Humanidades (GEPEH). Integrante do Núcleo Interdisicplinar de Pesquisas sobre futebol e modalidades lúdicas (LUDENS/USP). É um dos editores do Ludopédio.

Como citar

GIGLIO, Sérgio Settani. Vende-se o Pacaembu. Ludopédio, São Paulo, v. 117, n. 4, 2019.
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