13 minutos do primeiro tempo
Começo com o grande colorado Luis Fernando Veríssimo:
“Só o futebol permite que você sinta aos 60 anos exatamente o que sentia aos 6. Todas as outras paixões infantis ou ficam sérias ou desaparecem, mas não há uma maneira adulta de ser apaixonado por futebol. Adulto seria largar a paixão e deixar para trás essas criancices: a devoção a um clube e às suas cores como se fosse a nossa outra nação, o desconsolo ou a fúria assassina quando o time perde, a exultação guerreira com a vitória. Você pode racionalizar a paixão, e fazer teses sobre a bola, e observações sociológicas sobre a massa ou poesia sobre o passe, mas é sempre fingimento. É só camuflagem. Dentro do mais teórico e distante analista e do mais engravatado cartola aproveitador existe um guri pulando na arquibancada” (2010, p. 25).
Como um quase camuflado (quase porque sempre fui um apaixonado, mesmo quando o exercício intelectual ou a militância política me obrigou a ficar contra o meu clube/time), também sei que o esforço acadêmico é uma farsa para nos deixar mais próximos daquilo que nos faz crer que somos quem somos. Mas me autorizo a discordar do nosso genial cronista gaúcho. Além do clubismo que nos diferencia. Acho que não se sente exatamente a mesma coisa aos 40 que se sentia aos 6, aos 15, 30… Seguimos apaixonados, mas essa paixão se reconfigura. Tem momentos que o mais importante é ser campeão. Em outros queremos ganhar do rival (acho que esse desejo é o mais permanente). Mas em outros momentos a única coisa que verdadeiramente importa é quem está vendo o jogo conosco.
Desde que fui promovido a pai do Martin, ando monotemático e não estou preocupado com isso. Essa desregulada coluna tem estado cada vez mais escassa. Mas foi justamente a partir de um encontro com um novo amigo feito no meu mais importante ambiente de socialidade do momento, a escola do meu filho, que me inspirou a retomar o diálogo. As próximas linhas foram escritas pelo meu amigo Israel Rosa, pai da Olívia e do Matias, mostrando como nossa paixão, por vezes, artificialmente racionalizada pode nos proporcionar distintas experiências e emoções mesmo em jogos menos espetaculares:
13 minutos do primeiro tempo
Sou gremista. Desde os meus 8 ou 9 anos. Desde que comecei a sentir algo pelo futebol, sou gremista.
Tive a felicidade de ir a muitos jogos do Grêmio, ver batalhas épicas, campeonatos, rebaixamentos, viradas heroicas, derrotas inimagináveis, pênaltis, defesas, dias de chuva, de sol, de frio.
Durante muito tempo, eu só tinha o Grêmio e estava bem, achando que, em matéria de futebol, tudo estava certo. Nada poderia ser maior.
Acontece que dentre todos os jogos, de todos os lances, dos mais engraçados aos mais inacreditáveis, nem um, NADA, para mim foi maior ou melhor que um certo gol.
Dia 30 de Abril de 2022, Grêmio x CRB pela segunda divisão do campeonato Brasileiro. Aos 13 minutos de jogo, Diego Souza dá um passe açucarado para Elias e ele chuta para o gol.
Havia cerca de 17 mil torcedores na Arena.
Nada demais, comparado aos números dos grandes clássicos, dos grandes jogos assistidos no velho estádio Olímpico, dias de “casa cheia”.
Mas entre esses quase 17.739 torcedores havia uma torcedora em especial.
Seus olhos brilharam ao entrar na Arena, quando viu a torcida cantar. Tudo era encantador: água, pipoca, o campo, as cadeiras, as camisetas, o gramado, os corredores, as pessoas, as luzes, os telões.
E o gol.
Depois de tantos gols, achei que era só mais um.
Mas ver ela celebrar um gol, pegá-la no colo, comemorar…
Os olhos que brilhavam para o estádio agora olham os meus:
- Gol do Grêmio, pai?
- Gol do Grêmio, filha.
Nada pode ser maior.
Com amor,
Israel Rosa