66.1

Athletico Mineiro Football Club, tricampeão do Brasil

Ewerton Martins Ribeiro 1 de dezembro de 2014

Setenta e sete anos depois de sagrar-se o Campeão dos Campeões, 36 anos após consagrar-se o maioral na Copa dos Campeões, o Clube Atlético Mineiro torna-se novamente Campeão do Brasil. Sim: isso está acontecendo pela terceira vez.

Era o início do ano de 1937. O grandioso Athletico Mineiro Football Club (ou devemos chamá-lo de Club Athletico Mineiro?) enfrentava os melhores do Sudeste – os melhores do país: mas não lhes deu chance, como conta a História.

Superou sem parcimônia (vocabulário de época) campeões de São Paulo, Rio e Distrito Federal (que se acusa ter sido a capital do estado-Rio, mas há quem duvide da História), além de Espírito Santo – pois amém. O tapa do título levou foi o Rio Branco, ou melhor, cinco tapas titulares: fora o baile (sem metáfora, que aquela era mesmo uma época de bailes), o placar fechou em 5 a 1.

Ainda houve tempo de o Galão, já campeão, meter 3 a 2 na Portuguesa no jogo final: isso depois de ter vencido o jogo de ida contra a Lusa por 5 a 0. (O Fluminense fora o vice, mas, como aquele era um tempo de tapetes menores, tudo ficou como tinha de ser: Atlético campeão da Copa dos Campeões e Flu em seu devido lugar.)

Em 1978, novamente o Atlético se sagrava: dessa vez, campeão da Copa dos Campeões do Brasil (uai, mas não é a mesma coisa?). Mais uma vez – como não poderia deixar de ser numa Copa do Brasil; como não poderia deixar de ser numa Copa dos Campeões –, o Galo consagrava-se enfrentando o que de melhor se podia recolher na nação do esporte bretão – digo, mineiro.

Galo, Campeão dos Campeões dos Brasis.

***

Maicosuel tenta fazer o gol do Atlético-MG na final da Copa do Brasil contra o Cruzeiro. Foto: Bruno Cantini – Clube Atlético Mineiro.

2014. Neste ano, contudo, o buraco seria mais embaixo. (Ao menos em tese.) Como de praxe no cenário contemporâneo, desta vez a competição incluía não apenas adversários do Sudeste, mas tudo quanto é pretenso campeão que despontasse na nação: os 86 melhores clubes de todas as federações do país se dispunham a tentar a sorte: “ataque ao Galo!”

A verdade é que, nos bastidores da redação dessa grande ficção que é o futebol brasileiro, sorvia-se uma doce esperança entre os redatores do enredo: encontrar time à altura de enfrentar o Atlético na grande final. Que espetáculo seria!

Assim sendo, redatores dispuseram os melhores campeões pra matar-e-matar, por todo o país, desde o início do ano: a esperança era de que, no embate entre distintos estilos de jogo, fosse possível ir elevando a nota de corte até que se encontrasse um time digno de enfrentar o Galo nesta já inesquecível quarta-feira 26 (opa, já são 27; nem vi).

Bem, não se pode negar que era um plano grandioso. Só esqueceram, como já dissera o Mané, de combinar com os russos (pois é russo enfrentar o Galo.) Ou melhor: é alemão; o Galo é quase alemão. (E desvendar seu jogo é como investigar um suposto irmão alemão que se suspeita existir sabe-se lá onde.)

Pois convidaram o Galo a entrar no páreo depois de eliminarem as gorduras, decididos a achar o caminho. “Ataque ao Galo!”. Que ironia: das oitavas em diante, separado o filé, viria o Galo a enfrentar outra vez times exclusivamente do Sudeste: “Campeões”, poder-se-ia dizer. Quem ganhasse seria, portanto (ora vejam-me só), novamente o “Campeão dos Campeões”.

Mas Palmeiras; Corinthians; Flamengo; Cruzeiro: risco? Ora pois. Como poderiam trazer dificuldades a um escrete que não toma conhecimento de nenhum resultado adverso? Como poderiam estes times – e deixe-me ser ainda mais antigo no meu modo de contar – complicar a vida do scratch alvinegro se ele não considera nenhum resultado adverso uma dificuldade, seja ele qual for?

Impossível superar um time que vira qualquer jogo. Simples assim. Impossível. O Brasil entendeu. O mundo entendeu. Aplaudiu. Chamou de absurdo. E abraçou o absurdo.

No caso de então, no entanto; neste caso de hoje (digo, ontem): nem foi preciso o recurso. Face aos 2 a 0 do primeiro jogo, o 1 a 0 do segundo acabou parecendo descaso. “Fora o baile!”, grita o retardatário da festa que me passa correndo à porta. (Sim, ainda se baila à atleticana).

Tardelli comemora seu gol na final contra o Cruzeiro. Foto: Bruno Cantini – Clube Atlético Mineiro.

Nas palavras prévias do diretor do espetáculo: “O impossível não existe pra gente”. Curioso é que ninguém, nem imprensa, nem adversários, tomou a fala de Tardelli pelo sentido figurado quando ele a pronunciou, há algum tempo. Foi como se interpretassem assim: “Sim, o impossível não existe para vocês. Mas isso você não precisa falar, que é óbvio, oras. Agora… Precisa tripudiar?” – e vai-se embora o interlocutor num vlw flw deveras constrangido face ao absurdo.

Há que se reconhecer, de toda forma, que o Deus Acaso fez uma escolha espetacular: não havendo time à altura do Atlético, surge a criativa ideia de fazer da final um überclássico. “Pois que se eleja o Cruzeiro!”, sugeriu Deus Acaso como se inventasse a internet: e que se faça o espetáculo.

Bem, não adiantou muito (sem tripudiar). O Cruzeiro, numa das melhores fases de sua história, com o mais regular de seus escretes, não fez cócega no Campeão dos Campeões. Duas derrotas, 3 a 0 em placar agregado (e fora a valsa, bola aleixando no travessão como um bolero – e nem digo mais que em metáforas musicais eu não sigo um bom passo).

A verdade é que para colocar o Atlético face a seu desafio máximo, escolheram como antagonista o “melhor time entre os brasileiros”: o campeão brasileiro, em tese o melhor time do país. Esqueceram-se, porém, que o Atlético já há muito não é brasileiro. É do Brasil.

“Do Brasil” por força de nascimento, o Atlético é efetivamente do universo – o melhor time do universo (e aqui ignoro solenemente um apagão que se deu como uma rajada em 2013). Acima de todos os bembonzinhos times brasileiros, o Atlético é o melhor time do Brasil; um time que, “do Brasil”, projeta-se para o universo – e além. Amém.

(Ainda insisto com os mais próximos que o Bayern escapou de uma…)

***

Time do Atlético-MG comemora a conquista da Copa do Brasil de 2014. Foto: Bruno Cantini – Clube Atlético Mineiro.

Desde 2013, quem joga não é mais o Clube Atlético Mineiro, o chamado Galo doido (ainda que continue mais doido do que nunca): hoje quem joga é o Athletico Mineiro Football Club, o Club Athletico Mineiro: aquele que de elitista soube fazer-se popular e de popular soube fazer-se abrangente – abrangente ao ponto de reincorporar a elite ao seu “povo”.

O scratch fora victorioso mais uma vez, e o futebol, nas gramas do terreiro (que aquilo não é um salão, e sim o terreiro de uma casa onde se fazem as mais loucas festas), voltou aos seus bons tempos: o Galo é tricampeão do Brasil.

Dito isso, cabe adendar que, se a moda do adversário é a do “reconhecimento” de títulos antigos com rótulos revigorados, o Atlético não segue a modinha: tolice é coisa para o outro lado da lagoa. O Atlético, em seus infinitos atleticanos, diz-lhes apenas: o Athletico Mineiro Football Club é tricampeão do Brasil. E conquistou o título de 2014 sobre o seu arquirrival. E com duas vitórias-baile. E…

E só.

Com isso, menos que impor (à força política) suas burocracias titulares, o galináceo confirma – como num tapa (de luvas, mineiro que é) em seu adversário – que quem manda no terreiro DO BRASIL (portanto brasileiro: terreiro bra-si-lei-ro) é o maior time do universo: Clube Atlético Mineiro.

Sem tripudiar.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Ewerton Martins Ribeiro

Escritor de ficção, jornalista da UFMG, mestre e doutor em estudos literários e bicampeão brasileiro em 2021.

Como citar

RIBEIRO, Ewerton Martins. Athletico Mineiro Football Club, tricampeão do Brasil. Ludopédio, São Paulo, v. 66, n. 1, 2014.
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