O Maraca é nosso?
Hoje estou editando um texto um pouco diferente. Não vou falar de nenhum filme específico, mas sim de um personagem ilustre: o Maracanã (e, é claro, de algumas películas que o tem como objeto/protagonista das telas).
O Maracanã, embora em forma, já é um senhor. Sua construção original se liga à preparação da Copa de 1950 (1). Do maior estádio do mundo até a configuração atual, muita coisa mudou (2). Uma coisa é certa, ao longo desses quase 70 anos, o estádio Mario Filho adentrou à história e imagem do Rio de Janeiro, de modo indelével.
Nesses dias que passaram estive ocupado em um primeiro levantamento de uma das facetas desse ente excepcional: exatamente aquela que o configura como um monumento marcante da cidade. O reconhecimento desse protagonismo de “cal e pedra” ganhou a forma de um decreto de tombamento, em julho de 2002. Nesse documento afirma-se a “grande importância histórica, arquitetônica, cultural e afetiva para a Cidade do Rio de Janeiro” (Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/web/irph/patrimonio . Consultado em 18 de junho de 2017).
Mas não é só isso. De forma mais ou menos associada ao conjunto arquitetônico, quatro “bens imateriais” foram consagrados pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, a saber: A torcida do flamengo (em 2007), as torcidas dos clubes de futebol da cidade (2012), a partida de futebol fla-flu (2012) e os gols do Zico no Maracanã (2013 – Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/web/irph/patrimonio-imaterial. Consultado em 18 de junho de 2017).
Cada um desses itens apresenta um arrazoado próprio, desenvolvido em decretos municipais específicos para esse fim. As ponderações sobre o fla-flu são impagáveis, por isso reproduzo parcialmente:
CONSIDERANDO que o Fla-Flu é uma celebração que sintetiza a identidade carioca e signo máximo do saudável antagonismo esportivo;
CONSIDERANDO as distintas manifestações artísticas e culturais que fazem referência à partida como atributo estético universal, como bem sintetizou o jornalista e escritor Nelson Rodrigues na máxima: “O Fla-Flu surgiu quarenta minutos antes do nada” (Disponível em: Rio Prefeitura. Consultado em 23 de julho de 2017).
Dadas as modificações sofridas mais ou menos recentemente pelo Maraca, entre as quais a diminuição da capacidade de receber público (que já foi de incrível 200 mil e que hoje está em 78 mil espectadores), o substancial aumento de preço dos ingressos e o fim da geral, muito se discute sobre um processo de gentrificação desse equipamento/monumento para lá de esportivo (3). Mas isso talvez fique para uma outra conversa.
Ah, quase ia esquecendo: faltaram os filmes. Para ver essas e outras discussões nas telas, estive procurando e assistindo algumas produções de fácil acesso, dentre os quais destacaria Geraldinos, de Pedro Asbeg e Renato Martins (Brasil, 2016, 1:13 horas) e Geral, curta de Anna Azevedo (Brasil, 2010, 14’ 59”). Ambos, como os títulos não nos deixam enganar, comentam a existência e o fim do espaço da geral. O Maraca é nosso? trabalha exatamente novas formas de participação coletiva da torcida em um estádio de acesso financeiramente mais elitizado. Maracaná, binacional (Uruguai/Brasil), revisita o inolvidável Maracanazo, de 1950, sob uma perspectiva que emparelha visões de brasileiros e de uruguaios e confere a Obdúlio Varela (capitão da Celeste) um papel heroico (quase mítico). E, para rever, não resisti em incluir Barbosa, esse clássico de Anna Luiza Azevedo e Jorge Furtado (Brasil, 12’, 1988). Bom fim de julho, meu caro público!
Notas:
(3) Ver, por exemplo, MELLO, Paulo Thiago. O Maracanã da gentrificação (Disponível em http://www.canalibase.org.br/o-maracana-da-gentrificacao/. Acessado em 18 de junho de 2017).
Filmes:
Barbosa. Anna Luiza Azevedo e Jorge Furtado, Brasil, 12’, 1988. Disponível em: http://portacurtas.org.br/filme/?name=barbosa . Consultado em 18 de junho de 2017.
Geral. Curta de Anna Azevedo, Brasil, 14’ 59”, 2010. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=vDCD9kL9pvI. Acessado em 18 de junho de 2017. Jogo Fla X Flu, final da Taça Rio (4X1), retratado no curta. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=IqMmWyIKoX0, acessado em 18 de junho de 2017.
Geraldinos. Filme de Pedro Asbeg e Renato Martins. Brasil, 2016 (1:13 horas). Ficha técnica disponível em http://www.adorocinema.com/filmes/filme-236958/. Consultado em 18 de junho de 2017.
O Maraca é nosso? Curta de 12 minutos, Brasil, 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=CXSuvJY-xXw&t=238s. Consultado em 18 de junho de 2017. Ficha técnica disponível em: https://filmow.com/o-maraca-e-nosso-t210903/. Consultado em 18 de junho de 2017.
Maracaná. De Sebastián Bednarik e Andrés Varela. Uruguai/Brasil, 2014. Documentário, 75’.