A seleção brasileira em Los Gatos na Copa 1994: histórias no The New York Times
A Copa do Mundo de 1994 é essencialmente significativa para a cobertura do The New York Times porque ocorreu no país sede do veículo: os Estados Unidos. Além disso, a seleção americana, como anfitriã, obrigatoriamente integrou a competição e justamente nesta edição o Brasil se torna tetracampeão perante um público sem tradição de acompanhar partidas futebolísticas.
As comemorações da torcida brasileira, a performance em campo dos atletas da seleção canarinho e a percepção dos jornalistas brasileiros puderam ser narrados in loco pelos repórteres do jornal americano. Neste texto apresentamos algumas da narrativas sobre a passagem da seleção pela país.
Em 1994, temos cinco novos jornalistas relatando aspectos sobre a final do torneio, são eles: Michelle Quinn, Jay Privman, Jere Longman, Christopher Clarey e James Brooke, todos americanos, muito também em função da cobertura local. George Vecsey, experiente em coberturas de outras Copas, atua como colunista e a Agência Reuters emplacou um texto no periódico. Esta pluralidade de vozes mostra como um jogo da seleção brasileira extrapola os limites esportivos, moldando culturas locais (caso de Los Gatos), e movimenta torcedores em todo o mundo.
Em suma, a história é a seguinte: parte da delegação brasileira almoçou em um hotel em Los Gatos bem antes da Copa e os brasileiros teriam ficado encantados com a recepção dos garçons, fanáticos por futebol. Com a boa acolhida, elegeram a pequena cidade como sede.
Quando o prefeito da cidade, Randy Attaway, soube da decisão brasileira, pediu para o consulado brasileiro em São Francisco intermediar uma demonstração de futebol para as crianças, mas teve o pedido negado.
A história fica mais interessante nas palavras da jornalista Michelle Quinn:
“Então o prefeito decidiu ir pessoalmente ao Brasil e perguntar ao chefe da federação de futebol se o time reconsideraria. Foi sua primeira viagem fora dos Estados Unidos. Quando ele chegou, foi levado para uma entrevista coletiva, onde cerca de 40 repórteres o interrogaram sobre tudo, desde o que ele sabia sobre futebol até como lidaria com brasileiros bêbados. Ele sabia pouco sobre futebol, admitiu, e, quanto aos bêbados, pedia à polícia que os unisse aos amigos sóbrios.
Um repórter o acusou de fugir da pergunta. Foi naquele momento, disse o sr. Attaway, que ele entendeu a seriedade da Copa do Mundo para os brasileiros.
‘Isso está realmente acontecendo comigo?’ ele se perguntou na época. ‘Sou um prefeito de uma cidade pequena. Não tenho um diploma universitário e fui lançado em uma situação internacional'”. (The New York Times, 16/07/1994, seção 1, p.8).
Pode-se inferir que muito da percepção estrangeira sobre o futebol nacional está associado ao contato com a imprensa brasileira. Jornalistas brasileiros questionaram o prefeito de Los Gatos sobre o controle de bebidas alcóolicas, permissão do uso de biquínis pela cidade e contenção de possíveis algazarras, repercutindo determinados estereótipos.
Nada dessas preocupações foram registradas, apenas comemorações com samba e muito barulho, mas não ao ponto da necessidade de força policial.
Como se trata de uma matéria às vésperas da final da Copa de 1994, as perspectivas são, segundo a jornalista, que em caso de vitória brasileira, o prefeito se torne quase um ‘santo padroeiro do Brasil’ pelos empenhos em proporcionar uma boa recepção aos brasileiros e Los Gatos seja uma referência para turistas, quase um ‘lugar sagrado’, uma ‘Meca para os turistas brasileiros’ por muitos anos, a exemplo de Guadalajara, no México.
A história de Los Gatos poderia ser explorada por vários ângulos e aqui serve como um dado de realidade da influência da seleção brasileira naquela cidade e, consequentemente, em todo o país que estava começando a compreender e valorizar o futebol como esporte, alterando inclusive a forma de se referir a ele, trocando o uso de ‘soccer’ por ‘football’. “E agora eles chamam o jogo de futebol (futebol americano), não futebol” (The New York Times, 16/07/1994, seção 1, p.8).