Estilo de jogo? COMPETITIVO!
É difícil dizer, historicamente falando, qual é a forma de jogar que mais combina com o Palmeiras. Quando olhamos alguns rivais, tal forma é muito bem desenhada. O Santos, por exemplo, tem como “DNA” uma forma de jogo ofensiva, que quer o gol a todo custo, e isso acontece desde à época do Rei Pelé, passando pelos mais contemporâneos Robinho e Neymar. Da mesma forma, o Corinthians também criou um DNA próprio, da raça, vontade, entrega, no qual não existe jogo perdido de forma alguma, mesmo nos cenários mais improváveis.
O Palmeiras nunca teve esse exato comportamento. Nas décadas de 60 e 70, por exemplo, o futebol bem jogado tecnicamente por Ademir da Guia e as Academias era exemplo para o Brasil. Já nos anos 90, a primeira parte da “era Parmalat” foi marcada por craques como Edmundo, Cafu, Roberto Carlos, Rivaldo, Evair e Djalminha, muitos gols e futebol belíssimo, comandados por Vanderlei Luxemburgo. A segunda parte, mais no fim da década, se consagrou com um futebol de resultado, muito suor e a união da Família Scolari, que contava com ótimos jogadores – como Alex, Paulo Nunes, Oséias, Roque Júnior e São Marcos – mas que não era um time de futebol vistoso.
Vários anos se passaram até que o Palmeiras tivesse novamente uma equipe marcadamente vencedora. De 2015 em diante vencemos um Paulistão, duas Copas do Brasil, dois Brasileirões e uma Libertadores. O único jogador presente em todas essas conquistas foi o goleiro Jailson, importantíssimo na conquista do Brasileirão de 2016, mas reserva na maior parte do tempo. Outros dois jogadores de importância ímpar nessas conquistas e reconstrução da equipe foram Dudu e Fernando Prass, mas que deixaram o clube antes da espetacular tríplice coroa de 2020.
Técnicos, então, foram vários. Poucos se lembram, mas o projeto palmeirense de 2015 começa lá com Oswaldo de Oliveira. Depois dele, Marcelo Oliveira, Cuca, Eduardo Batista, Roger Machado, Felipão, Mano Meneses e Luxemburgo, além de alguns interinos, comandaram a equipe até a chegada de Abel Ferreira já no segundo semestre de 2020. Existe alguma marca tática ou de modo de jogo que acompanhe todos eles? Um sentido lógico? Qual é a “linha de raciocínio” de todos esses anos de Palmeiras?
Se fosse pra definir em uma palavra o Palmeiras dos últimos anos, esta seria “competitividade”. Abel Ferreira tem sido muito exaltado em sua passagem pelo clube por conquistar os resultados não importando muito o contexto da partida (e com todos os méritos), mas acredito que essa marca seja anterior ao treinador português. Há anos o Palmeiras apresenta uma incrível competitividade, sendo batido poucas vezes, disputando todos os campeonatos possíveis e vendendo caríssimo cada derrota.
Desde 2015, apenas em dois anos o Palmeiras deixou de conquistar títulos de expressão nacional ou internacional. A equipe de 2015, inclusive, talvez tenha sido a de menor poder competitivo, sendo relativamente mais fraca que as demais, em um clube totalmente em reconstrução. Ainda assim, durante a campanha vitoriosa na Copa do Brasil, venceu de forma incrível as equipes de Internacional e Fluminense nas quartas e semifinais respectivamente, antes de bater o Santos nos pênaltis na finalíssima. No começo daquele ano, antes da estreia da equipe no Paulistão, o capitão Zé Roberto pedia pra cada jogador e funcionário do clube bater no peito um do outro dizendo “O Palmeiras é grande!” e, ao fim da preleção, fez o convite: “Vamos pra peleja?”. E parece que desde então o Palmeiras se mantém pelejando.
Os times vitoriosos de Cuca e Felipão são provas disso. Jogavam pela vitória, e nada mais. Pareciam forjadas no hino “defesa que ninguém passa, linha atacante de raça”, de forma que venciam jogos improváveis e muito dificilmente eram derrotadas. As vezes pareciam até que perderiam o fôlego no campeonato, mas não, nunca perdiam. E assim conquistaram dois títulos brasileiros para a galeria palmeirense. Essas equipes, porém, foram também criticadas (muito justamente) por uma falta de repertório ofensivo, fazendo com que a equipe sofresse demais para vencer alguns jogos mais fáceis, dependendo muito do talento individual de Dudu e caindo muito de rendimento nas poucas vezes em que tinha problema em competir.
O trabalho de Luxemburgo em 2020 também teve como grande problema a falta de competitividade. Ainda que tenha conquistado o Campeonato Paulista, foi com muito mais sofrimento do que o esperado, inclusive não tendo vencido nenhum dos seis jogos contra clubes da Série A do nacional durante a campanha. No Brasileirão, sua queda acontece quando fica clara a incapacidade coletiva de competir, perdendo até mesmo para os futuramente rebaixados Botafogo e Coritiba, além de uma derrota no clássico contra o São Paulo. Todas as demissões de treinadores nesse tempo de títulos acontecem quando o time mostra uma queda no poder competitivo. As mais emblemáticas são de Felipão e Mano Meneses, que deixam o clube após derrotas fáceis contra o Flamengo nos dois turnos do Brasileirão de 2019.
A capacidade de se adaptar ao adversário parece ser o maior mérito de Abel Ferreira até aqui. Foi assim contra o River na Argentina, contra o Santos na final da Libertadores, contra o Grêmio na Copa do Brasil. Mesmo sempre tendo desfalques, a equipe tem um grande poder de adaptação e entrega até a última gota de suor em campo para buscar a vitória. Dessa forma, a equipe que parecia à beira de uma crise há um mês atrás conseguiu se reestruturar, garantir a liderança do grupo na Libertadores com duas rodadas de antecedência e chegar ao mata-mata no Paulista mesmo apenas com reservas. Se, por conta de boas individualidades, as equipes dos comandantes anteriores conseguiam buscar a vitória, agora com Abel o Palmeiras vence porque tem uma incrível força coletiva.
Os jogos contra o bom time do Independiente Del Valle (EQU) na atual edição da Libertadores são a maior prova disso. No primeiro jogo em São Paulo, a equipe sobe suas linhas, pressiona no campo de ataque, rouba a bola e finaliza rapidamente, goleando por 5×0. Já no jogo do returno, na altitude de Quito, contra uma equipe que nunca havia perdido em seus domínios na história da Libertadores, o Palmeiras recua, compacta seus jogadores, ataca muito verticalmente, chega ao gol no fim do primeiro tempo e não deixa o adversário nem se aproximar de sua área, de forma que o goleiro Weverton mal suja o uniforme. Jogo bonito? Muito longe disso. Mas foi o auge da eficiência, sem quase nenhum sofrimento para o torcedor.
Se pudermos, então, pensar numa forma de definir o estilo de jogo palmeirense dos últimos anos, diremos que é o time que joga o que o jogo exige. Não liga se vai vencer atacando ou defendendo, mas liga se vai vencer. Longe de ser retranqueiro, aplica goleadas por quatro ou cinco gols sempre que tem a chance (são quatro vitórias por 5×0 contando apenas as Libertadores de 2020 e 2021). Mas caso não tenha a chance, se contenta com o 1×0 feio que garante a vitória. Nunca será o time lembrado pelo futebol vistoso e envolvente, mas será sim lembrado como a equipe que ninguém quer enfrentar. E isso é tudo o que o palmeirense mais deseja.