97.7

O futebol amador como possibilidade de lazer

Nas capitais, grandes e médias cidades brasileiras, é comum observarmos o fenômeno social da favelização, devido principalmente a expansão desordenada destas cidades. Esta complexa situação urbana é desencadeada por diversos motivos e resulta em várias consequências para todos cidadãos, especialmente para os moradores destes aglomerados. Muitas vezes, direitos sociais básicos não são garantidos as pessoas que ali se encontram. Neste contexto, a oferta de atividades culturais e de lazer (pensando-o enquanto um direito social), geralmente também é insatisfatório.

Ciente desta realidade, aponto no presente texto, o futebol de várzea como uma representação e uma possibilidade de ofertar vivências de lazer (no que se refere a prática e a assistência dos jogos) para a população. É claro que o futebol amador não é algo presente exclusivamente nas comunidades, aglomerados e periferias, contudo estabelece com estas localidades uma relação muito forte e que de certa forma, ajuda a construir a identidade destes locais.

Alguns pesquisadores já empregam esforços na investigação da temática do futebol amador. Estes trabalhos mostram a relevância social do esporte neste contexto. O número considerável de trabalhos, evidencia o futebol como uma das mais importantes opções de vivências de lazer da população em várias regiões do Brasil, bem como a importância que este esporte possui na sociedade brasileira.

A sociabilidade que o futebol amador propicia parece ser bastante cara para a periferia e aglomerados das grandes cidades. Apesar do futebol de várzea, em certa medida ser uma tentativa de mimetizar o futebol espetáculo, por outro lado carrega uma originalidade, improviso e protagonismo dos anônimos e suas comunidades. Em Belo Horizonte, existem muitas equipes amadoras de futebol e torneios onde estes clubes se encontram e se enfrentam. A seguir, veremos um pouco do histórico e da característica de três importantes campeonatos de futebol amador da capital mineira.

futvarzea
Futebol de Várzea. Foto: Cassimano.

 

O FUTEBOL AMADOR EM BELO HORIZONTE

Copa Itatiaia

A Copa Itatiaia de Futebol é um desses campeonatos de futebol amador que acontece em Belo Horizonte. O torneio é realizado anualmente  e ficou conhecido em Minas Gerais como a “Copa do Mundo do futebol amador”. A iniciativa é da Rádio Itatiaia, uma das principais emissoras de rádio do estado, sobretudo no que tange as coberturas de jogos de futebol profissional. A disputa acontece nos meses de dezembro e janeiro, meses que o futebol profissional não se encontra em atividade. Assim os clubes amadores ganham um certo protagonismo na grade da emissora, com vários jogos sendo transmitidos pela rádio. A copa foi criada no início da década de 1960, com o objetivo de incentivar o futebol de várzea em Belo Horizonte e demais cidades da região metropolitana. O formato de disputa da copa é a seguinte: trinta e duas equipes são divididas em duas chaves. Dezesseis clubes amadores de Belo Horizonte e dezesseis equipes da região metropolitana. Estas duas chaves se subdividem em quatro grupos com quatro equipes cada um. Todos clubes do grupo se enfrentam e após três rodadas, duas se classificam para as quartas de finais, semifinais e finais de cada chave (capital e metropolitana). Os campeões de cada chave se enfrentam na grande final. Geralmente a final da Copa Itatiaia é disputada no Estádio do Independência, um dos principais do estado de Minas Gerais.

Torneio Corujão

O torneio Corujão é organizado pela Rede Globo Minas e conta com o apoio técnico da Federação Mineira de Futebol. A disputa acontece sempre no período noturno, fato que influenciou na escolha do nome do campeonato. Segunda a emissora a ideia de realizar o campeonato surgiu com o Projeto Campos de Luz, da Cemig. Este projeto visava fazer a instalação de iluminação nos campos de várzea da cidade. Assim segundo a Rede Globo, “estes locais de lazer das comunidades, que eram em áreas de risco, ganharam vida e geraram oportunidades de integração. Os moradores passaram a frequentar os campos de esporte à noite, reduzindo os índices de violência e registros de crimes. O evento tornou-se uma referência de atividade de lazer agregadora nas vilas e aglomerados.”

Trinta e dois clubes amadores disputam a taça. Dezesseis times da capital e dezesseis da região metropolitana. Os melhores clubes de cada chave se enfrentam na grande final. O início desta competição se deu no ano de 2004. Por ser uma iniciativa de uma emissora de TV, o Torneio Corujão tem uma boa visibilidade midiática com flashes ao vivo dos jogos e reportagens nos programas esportivos diários.

Copa Centenário

A Copa Centenário de futebol é o maior campeonato de futebol amador promovido pela prefeitura de Belo Horizonte. A competição integra o calendário oficial de festas e eventos do município.

Em relação a abrangência do torneio é certamente o maior da capital atualmente, maior até que a Copa Itatiaia, campeonato de maior prestigio entre os clubes amadores. Para termos uma ideia, em 2017 estarão envolvidos no torneio cerca de 4000 atletas. Serão disputados 270 jogos, utilizando para isso mais 30 campos de várzea da cidade. São cento e noventa equipes de aproximadamente 100 clubes do futebol amador de Belo Horizonte.

A  Copa Centenário  tornou-se um evento tradicional na cidade uma vez que a mesma vem sendo realizando desde 1997, em comemoração ao 100º aniversário da capital mineira (daí o nome do torneio) sendo promovido pela Prefeitura de Belo Horizonte, por meio da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer.

A Copa Centenário possui equipes masculinas nas categorias adulto, juvenil, infantil, máster e o feminino na categoria adulta. Segundo a prefeitura de Belo Horizonte, “a Copa fortalece a história das Associações Esportivas amadoras da cidade, reafirmando o seu papel político no processo de inclusão, inserção e algumas vezes dá a oportunidade à ascensão social para os seus praticantes, além de ofertar momentos de lazer às comunidades e proporcionando melhoria na qualidade de vida da população por meio da prática esportiva”.

A forma de disputa se dá com a presença de 24 equipes em cada um dos três módulos (A, B e C) da categoria adulto, 24 equipes na categoria infantil, 24 equipes na categoria juvenil e 24 equipes na máster. A categoria feminina conta com a participação de 32 equipes. A equipe campeã da Copa Centenário (adulto masculino do módulo “A”) garante uma vaga na Copa Itatiaia do ano seguinte.

O presente texto objetivou evidenciar, mesmo que superficialmente, o contexto do futebol amador na cidade de Belo Horizonte, seus torneios, equipes e comunidades envolvidas. Bem como, evidenciar a importância que esta prática futebolística possui para diversos grupos e entidades. As investigações acerca desta temática se fazem presentes e interessantes, mas ainda bastante necessárias.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
Seja um dos 14 apoiadores do Ludopédio e faça parte desse time! APOIAR AGORA

Felipe Abrantes

Graduado em Educação Física, modalidade licenciatura, pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre e doutor em Estudos do Lazer no Programa de Pós-graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer - PPGIEL/EEFFTO/UFMG. Atua e tem interesse na área dos estudos do futebol e do torcer, do lazer e da Educação Física escolar. Atualmente é professor do ensino básico na Prefeitura de Santa Luzia - MG.

Como citar

ABRANTES, Felipe Vinícius de Paula. O futebol amador como possibilidade de lazer. Ludopédio, São Paulo, v. 97, n. 7, 2017.
Leia também:
  • 178.28

    Projetos sociais e práticas culturais no circuito varzeano

    Alberto Luiz dos Santos, Enrico Spaggiari, Aira F. Bonfim
  • 178.27

    Torcida organizada e os 60 anos do Golpe Civil-Militar: politização, neutralidade ou omissão?

    Elias Cósta de Oliveira
  • 178.13

    História e contemporaneidade dos festivais na várzea paulistana

    Alberto Luiz dos Santos, Aira F. Bonfim, Enrico Spaggiari