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O futebol perdeu sua majestade

Pedro Zan 10 de janeiro de 2023

Foi-se Edson Arantes do Nascimento. Aquele que parecia imortal. O maior atleta do século XX. O melhor jogador de futebol de todos os tempos. O eterno Pelé.

O mundo lamenta, o brasileiro se enluta, mas o santista, esse é o que mais sofre. 

Pelé não é só o maior ídolo da história do clube, é parte indissociável de nossa história. Não existe Santos sem Pelé. E não existe Pelé sem Santos.

O Santos se tornou grande, porque quis trazer aos 15 anos o jovem de Três Corações. E Pelé se tornou o melhor jogador da história, porque vestiu a 10 do maior time da Terra.

Pelé se tornou sinônimo de excelência. Ser “o Pelé de alguma coisa” não é só ser bom. É ser o melhor. E Pelé foi.

Em termos “quantitativos”, ninguém jogou mais. E quem tenta argumentar que Pelé “não foi tão bom assim”, só pode fazer isso se ignorar quase metade de sua carreira, o que é, no mínimo, desonesto. Por títulos, gols, assistências, o que quisermos levantar, Pelé foi o melhor. E ponto. O único tricampeão mundial o é por algum motivo.

Velório do Rei Pelé na Vila Belmiro
Velório do Rei Pelé na Vila Belmiro. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil.

Mas Pelé não é o maior apenas por conta disso. Ser o maior não é apenas ser o melhor, é significar algo. E nenhum jogador jamais significou mais do que Pelé.

Mais do que um jogador, Pelé simbolizou, em 1958, a esperança de um novo Brasil, um país de ponta, na onda da Bossa Nova e do desenvolvimentismo de JK. O Brasil não era mais “o país do futuro”, pois no futebol já era o melhor. Pelé é quem personifica o orgulho de ser brasileiro, aquele que superou o viralatismo. É o próprio Brasil.

Com o Santos, foi responsável por levar o futebol brasileiro (e talvez o esporte como um todo) para os quatro cantos do mundo, em excursões “amistosas” que chegavam a levar 100.000 pessoas aos estádios. O Santos dos anos 60 talvez tenha sido a principal instituição diplomática do Brasil à época, interrompendo brevemente até uma guerra. 

Em 1970, conquistou o tri não apenas dentro de campo: depois de anunciar sua aposentadoria da Seleção no México, a Copa que Médici queria que fosse sua foi, no fim, a de Pelé. Inclusive sua aposentadoria não agradou em nada os militares, que queriam explorar sua imagem por mais alguns anos, mas não conseguiram (vale lembrar que em 1970 Pelé ainda tinha apenas 29 anos). Tanto que, ao anunciar que iria “pendurar suas chuteiras” em 1974, a CBD, emparelhada pelo regime, sequer organizou uma partida de despedida para seu Rei. Mais uma vez minúsculos, especialmente frente ao maior de todos.

E seu reinado no futebol, intransferível, é mais do que justificado. Além de ser o melhor, de ter sido algo que talvez nenhum outro jogador na história seja, um patrimônio nacional legalmente reconhecido, Pelé além disso significou, e muito, para o esporte.

Pelé também é o maior porque foi pioneiro, transformando o futebol de maneira definitiva. O primeiro não só a fazer o que fazia com a bola no pé, foi o primeiro a transcender o próprio esporte. Se hoje todo grande jogador já é uma celebridade para além das quatro linhas, é porque Pelé abriu essa porta. O Santos era chamado para excursões, porque todos queriam ver Pelé, que mal conseguia andar nas ruas de qualquer lugar do mundo sem ser alvo de multidões de fãs. Pelé era quem podia dispensar até grandes líderes internacionais, pois quem eram eles perto do Rei? Como disse Ronald Reagan, então presidente dos Estados Unidos: ele não precisava se apresentar para ninguém, porque “Pelé todo mundo sabe quem é”.

A história de Pelé, que vai se tornando cada vez mais distante das novas gerações, não pode ser esquecida jamais. E esforços para isso nunca são suficientes. Recomendo, inclusive, o mais recente documentário sobre o Rei na Netflix, intitulado “Pelé“. A memória do maior jogador da história, e do maior time da história, tem de permanecer viva, para que jamais esqueçamos o que foram para o Brasil, para o futebol e para o mundo, Pelé e o Santos.

O maior de todos os tempos.

Esse foi Pelé, que jogou no meu Santos.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Pedro Zan

Quase formado em Filosofia na Unicamp, mas bom mesmo é falar de futebol. Santista desde sempre, também tenho um podcast, "Os Acréscimos", e sou um dos administradores da página "Antigas Fotos do Futebol Brasileiro".

Como citar

ZAN, Pedro. O futebol perdeu sua majestade. Ludopédio, São Paulo, v. 163, n. 11, 2023.
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