O goleiro
O goleiro é a antítese.
Joga com a mão, veste-se diferente de todos os demais, está ali para evitar o que faz o jogo ter sentido.
É aquele que silencia o fanático, às vésperas da implosão do grito alucinado.
E único a quem o erro não é passível de perdão.
O goleiro é um autêntico colecionador de ingratidões.
Um mártir.
Que se joga, que se entrega, que usa o próprio corpo como obstáculo ao rival.
É o destemido. O ensandecido. O atrevido.
O solitário, também.
Aquele que grita quando todos emudecem. Que comemora sozinho, na imensidão de sua área, quando poucos lembram sequer de sua existência.
O goleiro é um matemático. Um geômetra.
Que calcula ângulos, raios, parábolas, na velocidade de um instante. Que subverte a óptica, a noção de espaço vazio, a lógica.

O goleiro é um jogador de pôquer.
Um blefador nato.
Que, na pura incapacidade de ocupar toda a linha derradeira, insinua-se, provoca o adversário, escancara um lado de propósito para que o outro tenha a ilusão do desleixo, da desproteção.
É um ilusionista, portanto.
Que oferece esse lado para que, justo lá, a defesa seja possível. E assim evitar mais um gol que se julgava certo.
O goleiro é um estrategista. Enxadrista. Protagonista de um dos mais belos duelos do futebol.
Quando, diante do artilheiro, se agiganta, torna-se maior do que de fato é. E, frente a frente, no limiar de suas possibilidades, define o futuro de toda uma geração.
É mais do que uma questão de gol e defesa.
É a história sendo escrita.
E o goleiro estará lá. Em toda a sua complexidade. Para provar que, afinal, a magia pode estar também no não-gol.
(26 de abril – Dia do Goleiro)