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O retorno do Tigre da PM

Após 25 anos sem futebol masculino profissional, o Tiradentes-PI conquistou o acesso à primeira divisão do Campeonato Piauiense. Nesse texto, entenda como um clube que já venceu os times de Zico e de Sócrates acabou encerrando suas atividades esportivas mais de uma vez.

Equipe do Tiradentes na década de 70. Foto: Acervo de Didimo de Castro.

É um fato que os clubes de futebol masculino profissional do Piauí não são expressivos no cenário nacional, nem no regional. Hoje, o Altos e o River disputam a Série D do Campeonato Brasileiro, mas entre os anos 70 e 80, havia um time que representou o estado na elite do futebol nacional, o Tiradentes.

Conhecido como Tigre da PM, por conta de sua fundação e formação militar, o clube nunca conquistou um título de Campeonato Brasileiro, mas possui o recorde de participações de um time piauiense na competição, mesmo tendo passado vários anos longe do profissional da modalidade.

Com um histórico de cinco títulos estaduais, o Tiradentes finalmente comemorou o retorno à primeira divisão do Campeonato Piauiense. A última participação do clube na segunda divisão do Piauí aconteceu em 2003, quando não conquistou o acesso e não se inscreveu nas edições seguintes.

Apesar desse período de 17 anos parado no futebol profissional masculino, o time esteve presente e já está há um bom tempo na elite do futebol feminino em cenário nacional, além de manter as atividades do futebol de base.

Porém, quem vê essas quase duas décadas talvez nem imagine que, antes de 2003, o Tigre da PM encerrou suas atividades esportivas mais de uma vez, tendo, inclusive, um episódio trágico na sua crônica.

A história do Tiradentes

Imagem: Wikipédia

Em 30 de Junho de 1959 era fundado o “Clube Tiradentes dos Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar do Estado do Piauí”, por membros da Polícia Militar do Estado do Piauí daquela época. Esse clube, a princípio apenas voltado aos militares, se filiou à Federação Piauiense de Desportos em 1969, quando começou a participar de competições amadoras.

Aos poucos, o clube começou a ser um sucesso no estado, a ponto de, em 1972, o Coronel Canuto Tupy Caldas anunciar a primeira participação do Tiradentes num campeonato de futebol profissional. Naquele ano de debutante, o Tigre venceu o seu primeiro campeonato piauiense, e voltaria a ser campeão em 74 e 75.

Porém, o grande ano para a história do Tiradentes foi 1973. Na época, a vaga piauiense para o Campeonato Brasileiro se dava pelo Torneio Seletivo. Naquela edição, River, Flamengo-PI e Tiradentes se enfrentaram em seis partidas, no total. O Tigre da PM conquistou mais pontos e o acesso ao torneio, onde os jogadores da equipe militar estariam frente a frente com grandes craques daquela década.

Em sua primeira participação, o time piauiense conseguiu passar para a segunda fase, mas terminou em 18º. No entanto, conseguiu empates contra Botafogo, Cruzeiro e Fluminense, o que já era motivo de orgulho, e ainda venceu o Corinthians de Rivellino.

Nos anos seguintes, sob o comando em campo do artilheiro Sima Barcelar – também conhecido como Pelé do Piauí ou Pelé do Nordeste -, o clube foi campeão estadual duas vezes. Em 1975, com gols de Leal, Neinha e Ruberval, eles venceram o Flamengo de Zico por 3 a 2.

Apesar dos resultados expressivos contra dois grandes ídolos do futebol brasileiro, o ano seguinte do Tiradentes foi o início de uma queda trágica e complicada.

1976: O início da decadência

Vitória sobre Zico e Rivellino, três títulos estaduais e sucesso no Piauí. Os quatro anos de Tiradentes no profissional foram incríveis e tudo indicava para a regularidade, a equipe foi bem nos dois primeiros dos quatro turnos da competição, mas abandonou o estadual por encerrar as atividades esportivas.

Isso começou por causa de um bárbaro linchamento feito por atletas e outros profissionais do clube. O cenário desse incidente foi uma boate na zona sul de Teresina. Naquela noite, os membros da equipe comemoravam o nascimento da filha de Jorge Costa, então artilheiro do campeonato piauiense com 15 gols.

O problema começou quando o lateral Célio Rodrigues se desentendeu com uma acompanhante chamada Teresa Neuma. O ápice da discussão foi quando o atleta agrediu fisicamente a mulher, após as provocações do zagueiro Ivan. A mulher correu para a mesa onde estava o corretor Jacob Ferreira Lima.

Jacob acabou se tornando o grande personagem desse incidente. Ele foi até o seu carro e pegou uma arma. Os jogadores do Tiradentes foram tirar satisfação e uma discussão começou no local. Jacob acabou disparando contra o jogador Valdeci e o roupeiro Anastácio.

Depois de fugir, o autor dos disparos foi perseguido e encurralado pelos atletas, que juntos, o espancaram até ficar em estado grave. Jacob foi transferido para o Hospital Getúlio Vargas, mas acabou falecendo.

O caso repercutiu nacionalmente. Os jogadores foram julgados duas vezes, mas recorreram em todas as instâncias e o crime acabou prescrevendo. Depois do incidente, a PM decidiu encerrar as atividades desportivas do clube.

Em 1978, o futebol masculino foi reativado, mas nunca mais foi o mesmo, ainda que tenham sido campeões estaduais em 82 e em 90. O time da PM chegou a vencer o Corinthians de Sócrates em 1983, mas, no returno, tomou a maior goleada da história do campeonato brasileiro para eles: 10 a 1.

As atividades desportivas foram mantidas somente até 1995, mantendo apenas a equipe de base e, em seguida, profissionalizando a equipe feminina, que está ativa até hoje. Em 2003, eles retornaram para a segunda divisão do estadual, mas sem sucesso. Dessa vez, em 2020, deu certo.

E agora? O que o Tiradentes tem pela frente?

Num grupo de três times, com Fluminense-PI e Oierense, o Tiradentes conseguiu conquistar sua vaga ao vencer o Oeirense por 4 a 1 na quinta rodada, marcando o retorno à primeira divisão após 25 anos. O Tigre ficou em primeiro lugar no grupo, após vencer o Fluminense-PI por 2 a 1.

Na primeira divisão, que ainda não definiu seus rebaixados e nem o vencedor, o Tiradentes vai enfrentar um futebol piauiense inconsistente e anualmente imprevisível, tendo River, apesar do momento de baixa, e Altos como suas maiores forças.

Ainda há muito o que ser trabalhado para o Tigre voltar a disputar o Campeonato Brasileiro, mas já é um reinício. Um reinício que pode ser com o pé direito, pois hoje, às 16 horas, Tiradentes e Fluminense-PI decidem o título da segunda divisão do Piauí.


** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Marcus Arboés

Acadêmico em jornalismo na UFRN, narrador esportivo em formação e apaixonado por um futebol bem jogado e com aproximações, no melhor estilo latino! Atuo no Universidade do Esporte.

Como citar

ARBOéS, Marcus. O retorno do Tigre da PM. Ludopédio, São Paulo, v. 136, n. 55, 2020.
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