Queria muito acompanhar a rodada do meio de semana. Eram bons jogos, me geraram alguma expectativa. Tudo bem que uma e outra aposta influenciaram minha vontade por ver futebol na TV da sala, comendo o lanche da tia Sônia, na esquina de casa, e tomando o restante de cerveja guardado na porta da geladeira.
Entrei mais tarde no serviço e optei por umas horas extras para ter mais facilidade para pagar uns boletos. A coisa não está fácil. Na volta para casa, recusei a carona de um colega chato, desses que não param de falar de trabalho, mesmo no bar ou no velório.
Liguei o rádio pelo celular. A abertura da jornada esportiva sempre me empolgou. O clima do pré-jogo, as escalações, a expectativa. Fico imaginando os repórteres à espera dos ônibus com os elencos. Uma pena que os jogadores colocam os fones de ouvido gigantes, fingindo ouvir músicas de mau gosto para não dar sua palavra às torcidas. O microfone da minha estação de preferência fica no vácuo e o atleta vai embora com ar blasé.

O som das torcidas no aquecimento, os repórteres trazendo estatísticas, a palavra dos técnicos sobre as estratégias. Tudo acontecendo enquanto eu esperava no ponto a chegada do ônibus meio vazio – sou um pessimista incurável. No meu horário de saída, a maioria das pessoas já voltou para casa.
Quando dei sinal com o braço direito, o juiz apitava o início da partida. O locutor falava em uma velocidade característica, o repórter relatava cada lance, o comentarista trazia análises detalhadas do que estava por acontecer. Uma voz grave, a do plantão, informava os resultados das outras partidas pelo Brasil. Eu me empolgava, não via a hora de sentar no meu sofá e ver todo aquele show.
A cada vinheta e propaganda dos anunciantes, sentia angústia. Em cada ponto parado para a descida de um trabalhador cansado, tinha mais pressa. Nos semáforos, torcia pela sorte de não estarem vermelhos.
Do ponto em que desci até minha casa, menos de cinco minutos a pé. Peguei meu lanche, como de costume. Liguei a TV, abri a geladeira. A partida parecia menos movimentada, a equipe de transmissão da TV tinha o mesmo clima do motorista do ônibus – acho que eles também só aguardavam o fim do expediente.
Barriga cheia, dei uma cochilada. Estava vestido com a roupa do serviço e minha cabeça se inclinava no sofá, como um avô pescando em frente à TV.
No intervalo, fui tomar banho. No banheiro, liguei o rádio outra vez. A empolgação voltou. Enrolado na toalha, desliguei a TV. Ouvi a rodada até o fim e só acionei o controle remoto na hora dos gols. Não queria o fim de uma ilusão ouvida. Não via algo tão bonito quanto gargantas distantes descreviam, em velocidade maior que a do ônibus, que a da telinha.