No último domingo, perto do final da partida entre TSV Bayer 04 Leverkusen e SV Werder Bremen, as imagens da TV focalizaram nas tribunas o ex-jogador e atual diretor esportivo da seleção alemã masculina, Rudi Völler. Nesse jogo, o time da casa, como se sabe, sagrou-se campeão da primeira divisão do campeonato alemão de futebol, algo que jamais acontecera em sua longa história. Quando vi aquele senhor que, em 1986, marcou um dos gols da vitória de seu país sobre a Argentina na partida decisiva da Copa disputada no México, lembrei-me de uma avaliação que fizera quando era dirigente do clube bancado pela gigante farmacêutica. Segundo disse, a presença de brasileiros na equipe trazia como que um toque de magia ao futebol local.

De fato, são muitos os brazucas que vestiram a camisa do Leverkusen, de Paulo Sérgio e Jorginho (campeões da Copa de 1994) aos vários defensores (Cris, Roque Júnior, Juan, Lúcio, André Ramalho), do pioneiro Tita, que comandou o time na conquista da Taça UEFA (hoje chamada de Liga Europa) em 1987/1988, aos meio-campistas Zé Elias, Emerson, Renato Augusto e Zé Roberto. Houve também os que pouco atuaram no elenco profissional, como o meia-atacante Marquinhos, ídolo do Avaí, que foi para a Alemanha muito jovem, mas não se firmou e voltou para atuar no Brasil.

Nenhum brasileiro estava em campo no dia mais importante da história do clube. O único do elenco de múltiplas nacionalidades, o promissor lateral Arthur, recupera-se de lesão que o levou a sofrer uma intervenção cirúrgica na coxa esquerda, e só entrou em campo duas vezes no campeonato. São tantos estrangeiros que até uma cena que ganhou as manchetes jornalísticas há poucos dias foi protagonizada por dois não alemães. Na vitória por 4 x 0 do Leverkusen sobre o Fortuna Düsseldorf pela Copa da Alemanha, Jeremie Frimpong e Amine Adli comemoram o primeiro gol simulando a produção e o compartilhamento de um cigarro de maconha, objeto que em minha juventude era chamado de baseado. A lei que libera o uso da droga até uma determinada quantidade tinha sido aprovada dois dias antes, em 1º de abril (lá não é dia da mentira). Frimpong, autor do tento, é neerlandês, mas detém igualmente as nacionalidades ganesa e inglesa, enquanto Adli é marroquino e francês. A ausência de futebolistas verde-e-amarelos talvez diga alguma coisa nem tanto sobre o campeão, mas sobre o futebol do Brasil.

Torcida o Leverkusen
Torcida do Leverkusen em partida da Copa da Alemanha de 2024. Foto de vitaliivitleo/Depositphoto.

A vitória do Leverkusen vem sendo muito comemorada, e não é para menos. O time fez uma campanha fantástica, a melhor da história da Bundesliga, e desbancou o poderoso Bayern München, que chegaria ao 12º título nacional consecutivo, se vencesse a atual edição do torneio. Na verdade, tirando o Borussia Dortmund, que chegou a três títulos, e Stuttgart, Werder Bremen (de Aílton, em 2004) e Wolfsburg (de Grafite, em 2009), os bávaros ganharam sempre neste século. Não foram poucos os que apoiaram o time da BayArena, encantados pelo jogo bonito e pela campanha brilhante dos campeões. Um amigo que é torcedor histórico do Bremen, vibrou com o Leverkusen, mesmo com a derrota de sua equipe por 5 x 0.

As campanhas que não chegam ao título, mesmo quando excelentes, são com frequência vistas como derrotas e nada mais. Quando o vice-campeonato é alcançado, não é incomum que se repita que o segundo colocado é o primeiro perdedor. O Bayer Leverkusen chegou a vários, inclusive em uma Champions League, a de 2001/2002, quando o time da pequena cidade da Renânia disputou a final com o Real Madrid, sucumbindo frente ao maior vencedor do torneio e ao talento de Zinedine Zidane, autor do golaço que sacramentou a vitória da partida disputada em Glasgow. Um dos símbolos dessas medalhas de prata, em campo naquela final há mais de vinte anos atrás, é Carsten Ramelow, que chegou a tal posição seis vezes pelo atual campeão, mais uma pelo Herta Berlin e outra representando a seleção alemã. Questionado há poucos dias qual teria sido o vice mais bonito, ele respondeu o seguinte: “É difícil dizer. Cada competição tem sua particularidade. No entanto, eu destacaria a Copa do Mundo de 2002. Estar em um elenco como aquele, pertencer ao grupo dos melhores jogadores da Alemanha, disputar no Japão e na Coreia do Sul e ainda chegar a uma final contra o Brasil – essa foi uma linda experiência, algo único. E, dito de forma muito geral, quando se fala nos vice-campeonatos: quem são os que podem dizer que estiveram em uma final? Suponho que muitos gostariam de trocar de lugar comigo. ”

O que ex-zagueiro Ramelow reivindica é que olhemos para o caminho, e não exclusivamente para a chegada. Ele tem razão. O esporte tem mais a oferecer do que apenas o resultado final. E quanto ao Leverkusen, parabéns e longa vida para ele, com muitas glórias para esse clube que, apesar de ser Bayer, é bom.

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Alexandre Fernandez Vaz

Professor da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC e integrante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq.

Como citar

VAZ, Alexandre Fernandez. Bayer Leverkusen – momentos felizes. Ludopédio, São Paulo, v. 178, n. 21, 2024.
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