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O retorno das Eliminatórias Sul-Americanas e sua retrospectiva

Fabio Perina 31 de agosto de 2023

Introdução

Em tempos atuais, tem sido cada vez mais difícil um discurso de valorização do futebol sul-americano como um todo na grande mídia brasileira diante de seu tradicional olhar eurocêntrico (e mais recente acompanhando a abundância de dinheiro e “inovação” nos Estados Unidos e Arábia Saudita). Seja por criticar objetivamente um calendário longo de seleções e de clubes que ao se cruzarem geram desfalques das principais estrelas dos clubes brasileiros justamente em vésperas de partidas decisivas. Ou seja por valorizar subjetivamente a vitória de preferência contra europeus em uma Copa do Mundo do que as rivalidades regionais duradouras em nosso continente, deixando um clima implícito ou explícito que: “o Brasil não tem mais rival”, “o Brasil ser ‘campeão’ das Eliminatórias é obrigação”, “o Brasil está em outro patamar…”. 

No entanto, acredito ser preciso sempre valorizar (e claro criticar quando preciso) o futebol sul-americano. Não somente entre os clubes com o tão cantado “a Taça Libertadores, obsessão” (inclusive por muito mais motivos do que apenas dar vaga no Mundial de Clubes da FIFA). Mas também entre seleções através de Copa América e Eliminatórias. (Obs: curioso algo que deve passar batido a muitos desavisados: se os maiores heróis mundialistas sul-americanos, Pelé e Maradona, tiveram desempenhos apenas coadjuvantes nessas duas competições, assim como sequer venceram alguma Copa América, isso pode ser um indício de valorizar sua competitividade equilibrada). Duas competições que vejo como complementares, pois, mesmo ao preferir o formato de disputa em mata-mata tal qual da Copa América, também valorizo a condição simbólica das Eliminatórias de permanecer deixando bem marcada uma seleção mandante e outra visitante (portanto com setorização específica nos estádios) ao invés de sede neutra (e portanto de setores mistos). E por consequência garantir que cada rivalidade regional nos rincões do continente se reencontrem pelo menos duas vezes ao longo de um ciclo mundialista. O que obviamente esse clima de “guerra” simbólica latente abre espaço a diversos escândalos e polêmicas que obviamente aqui não serão esquecidos.

Assim como outra justificativa para esse texto é para algum jovem torcedor brasileiro que não viu o Penta em 2002 saber que nem sempre houve esse formato recente de todos contra todos em pontos corridos ao invés de triangulares como antes. O que era antes um ciclo mundialista com cerca de 4 partidas disputadas em 2 meses nos anos 90 em diante passou a ser de 18 partidas disputadas em 2 ou até 3 anos. E assim se tornando o continente com Eliminatórias mais prolongadas dentre todos os demais. Portanto, nesse texto busco um convite a conhecer mais das rivalidades regionais e algumas estórias singulares ao longo do “labirinto” dos regulamentos das Eliminatórias a cada edição. 

Como breve nota de conjuntura, em setembro de 2023 se inicia sua mais recente edição visando 2026 na América do Norte. Cuja mega-ampliação de participantes de 32 a 48 seleções gera a insólita situação da versão sul-americana do torneio terminará com mais seleções classificadas do que eliminadas! Inicia-se uma edição com número cada vez maior de treinadores argentinos dentre as 10 seleções sul-americanas, saltando de 5 para 7 em relação à edição anterior. Havendo vários nomes desconhecidos em várias seleções, porém as figuras notórias são: o veterano Marcelo Bielsa no Uruguai e os jovens treinadores e ex-jogadores dos anos 90: Lionel Scaloni na Argentina, Eduardo Berizzo (ex-River) no Chile e Guillermo Barros Schelotto (ex-Boca) no Paraguai. Além da singularidade do Equador iniciar com o espanhol Félix Sánchez-Bas. No início do ano, as seleções jogaram cerca de 4 amistosos cada nas datas FIFA como preparação, sendo a maioria contra seleções centro-americanas e asiáticas e alguns confrontos sul-americanos entre si. Destaque positivo para a vitória da Colômbia sobre a Alemanha, porém destaques negativos das derrotas do Peru para o Japão por goleada e do Brasil para Marrocos e Senegal.

Sem mais delongas, grosso modo o perfil dos escândalo no torneio parece seguir uma certa tendência ao longo da história do futebol: nos anos 50 e 60 mais desorganização dos dirigentes da Conmebol e outras federações nacionais (vide os regulamentos aleatórios e sobretudo as recorrentes desistências); nos anos 80 e 90 mais violência de torcedores contra os jogadores e dos jogadores entre si dentro de campo; e nos anos mais recentes mais conspirações de manipulação de resultados e maior intervenção de federações e até de autoridades de fora para dentro de campo.

Retrospectiva

Se as primeiras Copas do Mundo de 30, 34 e 38 as vagas sul-americanas foram preenchidas apenas por convite, somente em 50 no Brasil que se planejou iniciar Eliminatórias para sua definição dentro de campo. Com o Brasil já com vaga de país-sede, o executado acabou saindo bem fora do planejado, pois as desistências de Argentina, Peru e Equador permitiram a classificação automática de Chile, Paraguai, Bolívia e Uruguai. (Obs: o que talvez simbolicamente condicionou que por diversas edições dos anos 50 a 80 o formato geral de disputa foi de 3 grupos triangulares, sensato para acomodar potencialmente 10 países no total do continente, embora com vários rejuntes adaptativos a cada edição diante de vagas antecipadas por país-sede ou vigente campeão, mas também casos de desistências e até desclassificações que seguiram ocorrendo). Inclusive a Copa do Mundo de 50 por si só já foi um rejunte de torneio ao ser composta uma primeira fase com grupos de 4, 3 e 2 seleções. Como foi o caso de uma chave direta entre Uruguai e Bolívia diante das desistências em cima da hora de França e Portugal. E mais curioso ainda por essa ter sido a única edição mundialista definida em fase final entre 4 seleções todas contra todas ao invés de mata-mata.

Selo Comemorativo do Campeonato Mundial de Futebol de 1950
Selo Comemorativo do Campeonato Mundial de Futebol de 1950 (Copa do Mundo de 50). Autor: Brasil Correio. Wikimedia Commons.

Já para 54 na Suíça finalmente as Eliminatórias Sul-Americanas estrearam, embora esvaziadas, havendo apenas um triangular em que o Brasil se classificou sem problemas contra Chile e Paraguai (vigente campeão da Copa América).

Para 58 na Suécia a conta para 3 triangulares quase se “arredondou”: o Paraguai superou o Uruguai e a Colômbia, a Argentina superou a Bolívia e o Chile, e por fim o Brasil contou com a desistência da Venezuela e superou em chave direta o Peru (embora com sofrimento por 1-1 e 1-0).

Para 62 no Chile (com vaga antecipada assim como o Brasil vigente campeão) foi preciso acomodar apenas 6 seleções em 3 chaves diretas: a Argentina superou o Equador por goleadas, o Uruguai superou a Bolívia com sofrimento, e por fim a Colômbia surpreendeu o Peru. Curioso que houve o primeiro caso de repescagem intercontinental com o Paraguai perdendo para o México. Já no Mundial propriamente dito, mesmo com um bom número de sul-americanos, apenas Brasil e Chile avançaram da fase de grupos para o mata-mata e se enfrentaram nas semis.

Para 66 na Inglaterra foi preciso voltar ao formato de 3 triangulares que finalmente foram jogados por completo: o Uruguai superou o Peru e a Venezuela; a Argentina superou o Paraguai e a Bolívia; e o Chile superou o Equador (sendo preciso um desempate extra) e a Colômbia.

Para 70 no México novamente houve um formato desparelho com 1 quadrangular e 2 triangulares: o Brasil (do artilheiro Tostão) superou a Colômbia, a Venezuela e o Paraguai; o Uruguai superou o Chile e o Equador, e por fim o Peru superou a Bolívia e a Argentina. Sendo inclusive essa a última ausência mundialista da Argentina. Como se sabe ,depois no Mundial propriamente dito o Brasil superou o Peru nas quartas e o Uruguai nas semis.

Para 74 na Alemanha outro empecilho impediu fechar a conta de 3 triangulares: a desistência da Venezuela obrigou a uma chave direta em que o Chile superou o Peru (inclusive com agônico terceiro jogo de desempate); a Argentina superou a Bolívia e o Paraguai; e o Uruguai superou a Colômbia e o Equador. Sendo que por um capricho do destino o retorno da repescagem intercontinental colocou a FIFA no que é certamente seu maior vexame: ao obrigar a União Soviética a jogar no Chile em pleno golpe de Pinochet apenas semanas antes.

Para 78 na Argentina o formato começou convencional com 3 triangulares, mas depois foi ainda mais exótico: o Brasil superou o Paraguai e a Colômbia; o Peru superou o Chile e o  Equador; e a Bolívia surpreendeu e superou o Uruguai e a Venezuela. A seguir Brasil, Peru e Bolívia jogaram um novo triangular entre si (conhecido como “Mundialito de Cali-COL”) valendo duas vagas diretas, enquanto a Bolívia que ficou em último só levando goleadas de seus vizinhos depois perdeu a repescagem intercontinental para a Hungria também por goleada. No Mundial propriamente dito, como se sabe, Argentina, Brasil e Peru se reencontraram em partidas cheias de polêmicas em um quadrangular semifinal junto da Polônia.

Para 82 na Espanha foi das poucas vezes que o formato de 3 triangulares se cumpriu sem sustos nem “rejuntes”: o Brasil superou a Bolívia e a Venezuela; o Peru superou o Uruguai e a Colômbia; e o Chile superou o Paraguai e o Equador.

Para 86 no México novamente houve um formato desbalanceado com 1 quadrangular e 2 triangulares: a Argentina superou o Peru, a Colômbia e a Venezuela; o Uruguai superou o Chile e o Equador; e o Brasil superou o Paraguai e a Bolívia. Embora surpreendentemente o Brasil apenas empatou as duas partidas em casa, porém se garantiu com duas vitórias fora. A inovação dessa vez foi juntar os 4 melhores colocados dos triangulares à exceção dos líderes em uma chave semifinal: o Paraguai superou a Colômbia; o Chile superou o Peru; sendo que depois o Paraguai superou o Chile e ficou com a última vaga. (Obs: vale uma breve menção sobre os confrontos mais recorrentes entre Chile e Equador por diversas edições seguidas. E principalmente entre Chile e Peru ao longo dos anos 70 e 80, quando o “clássico do Pacífico” esteve em seu auge inclusive disputando também várias semifinais de Copa América).

Por falar em rivalidade, para 90 na Itália foi mantido o formato de 3 triangulares: o Uruguai superou uma surpreendente Bolívia e um vergonhoso Peru; a Colômbia superou o Paraguai e o Equador (e depois superou Israel na repescagem intercontinental); e o Brasil superou o Chile e a Venezuela. Porém com novidade o início da era dos escândalos. A começar pela menção ao Paraguai 2×1 Colômbia em Assunção. Uma partida insólita em que houve de tudo um pouco começando pelo folclórico com invasões reincidentes de um cachorro ao gramado e terminando com invasão policial e arremessos de objetos. E claro durante a partida toda um duelo particular de catimba entre os goleiros Chilavert x Higuita. Inclusive lembrar que esse encontro de seleções ocorria no calor daqueles anos de confrontos agônicos entre Olímpia x Atl. Nacional pela Libertadores. Já para o público brasileiro é certamente mais conhecida a definição direta contra o Chile em dois atos agônicos: 1 a 1 em Santiago e 1-0 no Maracanã. Tendo como desfecho a partida suspensa e o decreto da FIFA de suspensão do Chile das Eliminatórias de 90 e também de 94. Ambos já reconstituídos em profundidade do contexto e de reflexões complementares em texto anterior.

Chile
O sinalizador lançado pela torcedora e a farsa de Rojas. Foto: Reprodução.

Para 94 nos Estados Unidos o que vale marcar como novidade foi a aposentadoria do formato de disputa de 3 triangulares (com seus rejuntes) e no seu lugar um modelo provisório de 2 pentagonais. (Obs: inclusive vale apenas mencionar que naquela virada dos anos 80 para 90 também coincidiu da Copa América experimentar mudanças bruscas de formatos e até a inédita entrada de convidados fora da zona da Conmebol). Se nas edições de 90 e 98 (conforme veremos) a palavra-chave foi escândalo, nessa de 94 certamente foi vexame. Nessa edição o que ficou de inesquecível foi o “rejunte” antes da bola rolar da desclassificação do Chile e depois da bola rolar como a única vez em que Brasil e Argentina estiveram em riscos reais de ficarem ausentes de uma Copa do Mundo. A última rodada de cada grupo teve pelas vagas confrontos diretos agônicos na última rodada já tratados em outros textos: o show de Romário no Brasil 2×0 Uruguai no Maracanã e o show de Rincón, Asprilla, Valderrama e outros no Argentina 0x5 Colômbia em pleno Monumental. Nos grupos: o Brasil com sustos e a surpreendente Bolívia obtiveram vaga direta ao superarem o Uruguai, o Equador e a Venezuela. Enquanto no outro grupo a surpreendente Colômbia obteve vaga direta superando a Argentina, o Paraguai e o Peru. A situação da Argentina foi muito singular e contrastante, pois entrou nas Eliminatórias como vigente bi-finalista mundial com o treinador Bilardo e vigente bi-campeã continental e invicta por 2 anos com o treinador Basile. Porém as duas derrotas para a Colômbia a empurraram para uma impensada repescagem intercontinental contra uma desconhecida e perigosa Austrália. Era um elenco dizimado animicamente e à beira do abismo com uma nova dificuldade de superar o fuso-horário e principalmente voltar a ter a “guarda alta”. Tanto é que a chave direta foi ajustada decidida apenas em dois apertados placares por 1-0 e 1-1. E contando com o retorno emergencial do renegado Maradona (de certa forma similar a Romário) para garantir uma vaga mundialista tão sofrida. (Obs: curioso que se não bastasse o drama da goleada e do risco de ausência mundialista houve um tempero a mais de conspiração pela qual os dirigentes Grondona e Havelange supostamente liberariam o anti-doping apenas nessa repescagem para que a presença de Maradona nos Estados Unidos turbinasse a venda de ingressos e direitos de transmissão até aquele momento estagnadas, e logo depois Diego já seria descartável. Como de fato ocorreu com o episódio em que veio à tona o doping e sua imediata suspensão. Aliás nunca esquecer que o “timing” das punições nunca é mera coincidência…Por fim, ao se ver como vítima, Maradona declarou a pérola inolvidável: “me cortaron las piernas”). Em suma, em poucos meses a Argentina foi do céu ao inferno depois com as derrotas mundialistas para Bulgária e Romênia e um jejum de décadas sem títulos. Já o Brasil trilhou o caminho oposto do inferno ao céu com o tetra.

Para 98 na França o formato de 2 pentagonais foi trocado pelo novo de todos contra todos em pontos corridos com duração por mais de duas décadas. Com a exceção do Brasil já ter vaga antecipada, acabou sendo um torneio de 9 seleções por 4 vagas diretas: preenchidas por Argentina, Paraguai, Colômbia e Chile. Um formato simples que ironicamente levou ao maior número de escândalos dentro de campo e de todos os tipos. Seja com uma pancadaria a cada choque em um Chile 1×0 Uruguai em Santiago em que o árbitro deu “permiso para pegar” fazendo vista grossa com os cartões. 

Ou seja em um reencontro Paraguai 2×1 Colômbia em Assunção, com a troca de cuspidas e empurrões entre Asprilla e Chilavert levando a duas expulsões e principalmente tumulto generalizado com novos protagonistas. Até aí nada muito fora do normal se não fosse a dura invasão policial e principalmente o fato novo horas depois, revelado apenas nos últimos anos, que um narcotraficante solicitou a Asprilla a autorização para matar Chilavert! O que felizmente não chegou às vias de fato. Caso reconstituído nesse texto a seguir, inclusive com curiosa menção que entre 89 a 97 os confrontos entre os dois países se tornaram mais frequentes e mais picantes. Sendo esse último simbólico da mudança de uma velha potência colombiana com as classificações mundialistas de 90, 94 e 98 e uma nova potência paraguaia com as classificações mundialistas de 98, 2002, 2006 e 2010.

Mas um caso mais grave já em um patamar mais grave foi em um Chile 4×0 Peru em Santiago, já tratado em texto anterior. Com um ingrediente adicional de picância que ambas seleções estavam desde 82 sem jogar um mundial. Tornando o encontro na penúltima rodada em Santiago contou com o “pacote” completo de provocação prévia a uma grande partida no continente: foguetórios no hotel visitante, ônibus apedrejado, jogadores agredidos por torcedores e provocações xenofóbicas. E ainda como elemento extra da vaia da torcida chilena ao hino peruano, provavelmente sendo o momento em que esse tipo de ocorrência atingiu mais repercussão em sua polêmica.

 Julio Cruz
Julio Cruz, Argentina x Bolívia, 1997. Fonte: reprodução

Outra partida que foi um “pacote” completo de escândalos foi a reabertura do segundo turno entre Bolívia 2×1 Argentina, justamente na altitude de La Paz. (Obs: sendo que as importantes vitórias de Bolívia e Equador nos anos 90 tiveram como protagonismo a altitude de La Paz e Quito respectivamente, sendo que grandes do continente como a Argentina, o Uruguai e até mesmo o Brasil sofreram por lá diversas vezes). A prévia já teve um elemento a mais hostil quando o treinador argentino Daniel Passarella, capitão da conquista mundial de 78, cunhou sua pérola se revoltando contra ter que jogar lá por ser desumano pela condição física, sendo que em sua visão: “en la altura la pelota no dobla!”. A partir de então o pacote de escândalos foi ainda mais completo que o caso anterior citado pelos insultos de Passarella a jornalistas bolivianos na véspera, levando a uma suspensão da entrevista. Depois, no decorrer da partida, não apenas houveram agressões de jogadores contra jogadores, mas o fato raro de membros da comissão técnica boliviana contra a delegação argentina. Um ponto dos mais chocantes, mas também depois mais burlescos, foi quando o atacante Julio Cruz foi agredido pelo motorista boliviano ao buscar a bola fora de campo na raia olímpica para acelerar o recomeço da partida. Porém uma observação cuidadosa de imagens no vídeo a seguir revela Cruz levando um soco de um lado do rosto, embora horas depois na foto emblemática sobre o escândalo é o outro lado do rosto que aparece sangrando! Foi o estopim de um tumulto generalizado entre todos os envolvidos. O desfecho foi uma curta suspensão temporária de alguns minutos da partida, porém ambas as equipes voltaram a campo para cumprir os minutos faltantes. Julio Grondona à distância operou uma hábil “bajada de línea” para o representante da federação junto à delegação ordenando um “siga, siga” apesar do território hostil em que se encontravam. Pois já tendo em vista o antecedente do caso Rojas de 89, ponderou que tentar retirar a equipe de campo em definitivo e depois buscar “ganar en escritorio” teria o mesmo efeito fracassado de suspensão direta da equipe por toda a competição tal qual foi feito com o Chile. E assim com essa “vivacidade” foi selado um pacto de silêncio da delegação argentina com sua imprensa.

Sobre as edições de 2002 a 2022 serei mais sucinto por envolver fatos mais recentes do conhecimento da maioria dos torcedores e também mais previsíveis (inclusive pela repetição de mesmas rodadas) e um menor número de escândalos. Primeiro do ponto de vista individual dos artilheiros esse formato permite que despontem nomes recentes como o argentino Lionel Messi, o uruguaio Luis Suarez e até o surpreendente boliviano Marcelo Moreno Martins. De lá para cá alguns elementos se tornaram previsíveis: liderança com sobras de Brasil e Argentina com poucos sustos rumo à classificação mundialista (exceto 2002 para o Brasil e 2010 e 2018 para Argentina), os seguidos sofrimentos do Uruguai como um frequentador recorrente das repescagens, a ascensão da Venezuela deixando de ser a previsível lanterna em várias edições, a ascensão ainda mais histórica do Equador com suas primeiras classificações, o declínio do Paraguai (não repetindo mais as classificações como em 2002, 2006 e 2010) e o recente revezamento entre os andinos Chile, Peru e Colômbia pelas últimas e mais agônicas vagas.

Numa breve menção aos escândalos mais recentes, eles parecem ter um perfil homogêneo de não serem tão escancarados e abertamente violentos como até o padrão dos anos 90. E assumindo a tendência de serem mais fora de campo do que dentro de campo. Como em todo torneio de pontos corridos, as últimas rodadas de cada edição se apresentam como férteis nisso, pois as possíveis combinações de resultados decidindo uma eliminação ou classificação levantam suspeitas de erros de arbitragens e supostas “malas brancas” ou “malas pretas” para seleções já eliminadas terem uma motivação a mais e interferir na classificação geral. Alguns dos escândalos mais inusitados foi com os “advogados” chilenos se especializando em buscar “ganar en escritorio” por duas edições seguidas reclamando pontos fora de campo que não obteve em campo alegando escalações irregulares do boliviano Cabrera e do equatoriano Castillo respectivamente em 2018 e 2022. E mais inusitado ainda a recente suspensão  a apenas poucos minutos de partida do Brasil x Argentina em Itaquera pela ANVISA, mostrando o contraste que em outras condições bem mais hostis se completariam os minutos de verdadeiras batalhas campais. Sendo que sequer houve posterior agendamento por falta de datas. Ora, já não se fazem mais escândalos como antigamente…

Brasil Argentina
Neymar, Messi, Tite e outros membros da comissão técnica discutem sobre o jogo interrompido. Foto: Lucas Figueiredo/CBF.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Fabio Perina

Palmeirense. Graduado em Ciências Sociais e Educação Física. Ambas pela Unicamp. Nunca admiti ouvir que o futebol "é apenas um jogo sem importância". Sou contra pontos corridos, torcida única e árbitro de vídeo.

Como citar

PERINA, Fabio. O retorno das Eliminatórias Sul-Americanas e sua retrospectiva. Ludopédio, São Paulo, v. 170, n. 31, 2023.
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