Dedicada ao companheiro de arquibancada, Djalma Mendonça, que deu o mote para a crônica

Os cinco minutos finais são os da mais pura angústia.

São os da incerteza.

Do pavor.

Da inexatidão.

Não são de festa. Não são de dor. Não são de júbilo. Não são de torpor.

Os cinco minutos finais representam a suspensão dos sentimentos. Ou, talvez, numa perspectiva completamente oposta, a invasão total e insana de todos eles de só uma vez.

Não se torce direito. Não se canta. Não se extravasa coletivamente. Não se abraça ninguém.

Observa-se, apenas. Reza-se. Angustia-se. Anseia-se pelo fim do jogo ou pelo milagre improvável a depender do placar.

Estica-se todo de tempos em tempos. Joga-se junto. Encolhe-se diante do perigo. Fuzila-se a bola com o olhar como se isso fosse suficiente para mudar o seu curso.

Torcida Jovem Botafogo-PB
Foto: reprodução Facebook/Torcida Jovem do Botafogo-PB

Às vezes, não acontece nada. Às vezes, tudo muda.

O título, a classificação, o acesso se esvai de repente.

E, como o torcedor não tem a capacidade de prever o futuro, a regra é o sofrimento prévio.

Vive-se e morre-se em apenas cinco minutos.

Pensa-se sobre tudo. Altera-se a percepção da própria existência no curso desse derradeiro intervalo de tempo.

Aliás, falando em tempo, e mesmo que eu não tenha certezas para afirmar isso com a convicção que se almeja, acho que o físico Albert Einstein assistia a um jogo de futebol quando teve o estalo para formular a Teoria da Relatividade, em que ele diz de forma revolucionária que “o tempo é relativo”.

Os cinco minutos finais!

Vamos combinar.

Não são nunca apenas cinco minutos.

São, ao bem da verdade, uma eternidade.

Uma demorada eternidade.

Em que se perde o ar, se perde o olhar, se perde o senso de direção.

Porque o próprio futuro estará sendo definido nesses cinco minutos. A própria ideia de glória ou de tragédia se escancarará diante do torcedor dali a pouco mais.

Perceba a ironia que a vida lhe impõe.

Em qualquer outro contexto, quando se quer evidenciar que algo vai acontecer de forma célere e sem demoras, em regra apela-se para o famigerado “são só cinco minutinhos”. E, de repente, os cinco minutos transformam-se no mais intransponível obstáculo que se pode ter diante de si.

Não, não são apenas cinco minutos.

É o instante preciso e cirúrgico em que a história estará sendo escrita.

Toda a posteridade vai depender daqueles cinco minutos finais.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Ludopédio.
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Phelipe Caldas

Doutorando em Antropologia Social pela Universidade Federal de São Carlos, mestre em Antropologia pela Universidade Federal da Paraíba, graduado em Comunicação Social - Jornalismo pela UFPB. É escritor e cronista, com quatro livros já publicados. Integra o Laboratório de Estudos das Práticas Lúdicas e de Sociabilidade (LELuS/UFSCar) e o Grupo de Estudos e Pesquisas em Etnografias Urbanas (Guetu/UFPB). É membro-fundador da Rede Nordestina de Estudos em Mídia e Esporte (ReNEme).

Como citar

CALDAS, Phelipe. Os cinco minutos finais. Ludopédio, São Paulo, v. 155, n. 26, 2022.
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